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Revista de Cirurgia e Traumatologia Buco-maxilo-facial

versão On-line ISSN 1808-5210

Rev. cir. traumatol. buco-maxilo-fac. vol.13 no.2 Camaragibe Abr./Jun. 2013

 

 

Tratamento cirúrgico de fratura bilateral de côndilo associada à fratura de corpo mandibular: relato de caso

 

Surgical management of condylar fracture associated with body mandibular fracture: case report

 

 

Rodrigo de Azevedo RamalhoI; Orley Nunes de Farias JuniorII; Álvaro Bezerra CardosoIII

I Residência em CTBMF pelo Hospital Universitário Oswaldo Cruz – UPE e Mestrando em CTBMF pela Faculdade de Odontologia de Pernambuco – UPE
II Residência em CTBMF pelo Hospital Universitário Oswaldo Cruz – UPE e Mestrando em CTBMF pela Faculdade de Odontologia de Pernambuco – UPE
III Especialista em CTBMF pela Faculdade de Odontologia de Pernambuco – UPE; Mestre e Doutor em Odontologia pela UFPB

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O côndilo mandibular apresenta-se como um dos locais mais comumente acometidos nas fraturas mandibulares, sendo, na maioria das vezes, decorrente de um trauma na região de sínfise ou de para-sínfise mandibular. A ptar pelo tratamento cirúrgico ou conservador é motivo de controvérsias, principalmente devido às diversas complicações pós-tratamento relatadas na literatura. Uma das principais indicações para a redução cirúrgica consiste na impossibilidade de estabelecer uma satisfatória oclusão dentária pelo tratamento conservador, geralmente associado às fraturas bilaterais. O sucesso do tratamento está relacionado a uma aderência cuidadosa nos princípios cirúrgicos e fisiológicos e em um acompanhamento pós-operatório rigoroso, aumentando a capacidade funcional a longo prazo e possibilitando uma menor incidência de complicações. Este trabalho objetiva relatar um caso clínico de redução cirúrgica de fratura bilateral de côndilo associada à fratura de corpo mandibular, enfocando, principalmente, os aspectos relacionados às indicações e complicações desse tipo de tratamento.

Descritores: Côndilo Mandibular; Fraturas Mandibulares; Traumatismos Mandibulares.


ABSTRACT

The mandibular condyle is presented as one of the most commonly sites involved in jaw fractures, most often due to trauma in the region of the mandibular symphysis. The choice of surgical or conservative treatment is a highly controversial issue, mainly due to the various post-treatment complications reported in the literature. One of the main indications for surgical reduction is the inability to establish a satisfactory dental occlusion by conservative treatment, usually associated with bilateral fractures. Successful treatment is related to a careful adherence to surgical and physiological principles with a rigid follow up, increasing the long-term functional capacity and allowing a lower incidence of complications. This study reports a case of surgical reduction of bilateral condyle fracture associated with fracture of the mandibular body, focusing on aspects related with indications and complications of this treatment.

Keywords: Mandible Condyle; Mandible Fractures; Mandibular Injuries.


 

 

INTRODUÇÃO

A mandíbula, apesar de ser um osso denso e resistente, é um dos ossos faciais mais fraturados por apresentar-se proeminente em relação aos demais. O processo condilar é sua área mais frágil, que geralmente fratura por trauma indireto, quando a sínfise e o corpo da mandíbula são atingidos1.

As fraturas de côndilo mandibular despertam grande interesse por parte dos pesquisadores e profissionais da área, pelo fato de estarem relacionadas diretamente à oclusão dentária e, ainda, não existir consenso quanto à melhor forma de tratamento1,2.

Os achados clínicos mais comumente encontrados são: dor, crepitação, desvio de abertura bucal para o lado fraturado, limitação dos movimentos mandibulares, oclusão dentária alterada. Nas fraturas bilaterais, o retroposicionamento mandibular com mordida aberta anterior e alongamento facial1.

A projeção lateral oblíqua da mandíbula e da articulação têmporo-mandibular bem como a ântero-posterior dos processos condilares, incluindo os arcos zigomáticos (projeção de Towne modificada), são as melhores radiografias para diagnóstico desses tipos de fratura. Ressalta-se, também, o uso da tomografia computadorizada, ressonância magnética e artroscopia para um diagnóstico mais apurado e um melhor planejamento cirúrgico1.

O tratamento pode ser conservador com orientação da dieta, utilizado, principalmente, em crianças ou em casos com deslocamentos e alterações oclusais pequenas, ou cirúrgico fechado, com utilização de bloqueio maxilo-mandibular e terapia com elásticos. Nos casos mais graves, cirúrgico aberto, com exploração direta do foco da fratura, redução dos fragmentos e fixação, com placas e parafusos de titânio ou fio de aço1,2.

Este trabalho objetiva relatar um caso clínico de redução cirúrgica de fratura bilateral de côndilo associada à fratura de corpo mandibular, enfocando, principalmente, os aspectos relacionados às indicações e complicações desse tipo de tratamento.

 

RELATO DE CASO

O paciente J.R.S, gênero masculino, melanoderma, 49 anos de idade, vítima de atropelamento apresentou-se ao Serviço de Cirurgia e Traumatologia Buco Maxilo Facial do Hospital Universitário Oswaldo Cruz da Universidade de Pernambuco (HUOC-UPE), em Recife - PE, com queixa de dor e dificuldade de abertura bucal devido a trauma de face.

Durante anamnese, constatou-se paralisia dos membros inferiores devido à poliomielite na infância, a sinais vitais normais e à ausência de doenças sistêmicas. Ao exame físico, observou-se limitação dos movimentos de abertura e excursivos da mandíbula com sintomatologia dolorosa, mordida aberta anterior devido à perda de dimensão vertical posterior e mobilidade com crepitação óssea em corpo mandibular do lado esquerdo (Figura 1A). A inspeção intraoral revelou edentulismo parcial superior e inferior associado à deficiência de higiene oral.

 

 

 

Na avaliação radiográfica, evidenciaram-se sinais sugestivos de fratura de mandíbula em côndilo bilateralmente e região posterior do lado esquerdo. Na tomografia computadorizada de face, observaram-se fraturas côndilares bilaterais com deslocamento medial associada à fratura de corpo do lado esquerdo em região entre o primeiro e segundo molares ( Figuras 2a e 2b e Figura 4).

 

 

 

O tratamento proposto consistiu na redução cirúrgica das fraturas sob anestesia geral e entubação naso-traqueal. Foram utilizados os acessos cirúrgicos retro-mandibular (côndilo direito) e submandibular (côndilo e corpo esquerdo). Após exposição e redução dos segmentos ósseos, foi realizado bloqueio maxilo mandibular por meio de barras de Erich posicionadas em ambos os arcos e fixação estável através de duas miniplacas do sistema 2.0 mm em cada sítio fraturado (Figuras 3a e 3b e Figura 4)

 

 

 

 

 

Foi instituída a terapia elástica além de dieta líquida e pastosa por 20 dias, associada à higiene oral rigorosa. No pós-operatório de 15 dias, o paciente apresentou ausência de sinais de infecção e edema, além de cicatrização dos acessos submandibular e retromandibular dentro da normalidade com uma estética favorável.

Na tomografia computadorizada de controle, as fraturas tratadas encontravam-se adequadamente reduzidas, e os côndilos mandibulares permaneciam bem posicionados na cavidade glenoidea (Figura 2c e 2d).

Após dois anos de acompanhamento ambulatorial, o paciente apresentou-se assintomático e com dimensão vertical posterior da mandíbula restabelecida, sem evidência de mordida aberta anterior e consequente oclusão dentária satisfatória. Os movimentos mandibulares encontravam-se preservados e sem sinais de lesões nervosas (Figura 1b).

 

DISCUSSÃO

As fraturas condilares devem, sempre que possível, ser tratadas conservadoramente (com orientação de uma dieta líquida ou pastosa e observação) ou com redução fechada (com bloqueio maxilo-mandibular e fisioterapia elástica). Contudo, nos casos em que haja fratura condilar com grande deslocamento e luxação, indica-se o tratamento cirúrgico com fixação interna1,2,3,4,5,6,7,8.

Alguns aspectos do tratamento das fraturas condilares permanecem controversos. Existem, porém, existe um consenso em certas situações clínicas2. Desse modo, o método conservador ou a redução fechada é escolhido (a), quando não ocorre luxação, ou em crianças menores de 12 anos, devido a uma remodelação do côndilo mandibular1,2. Por outro lado, alguns autores observaram alterações clínicas tardias nos pacientes tratados com método fechado, indicando a redução aberta em casos em que ocorrem: fraturas bilaterias sem contato dos segmentos ósseos ou associadas a fraturas de terço médio de face onde sua fixação interna não é possível; fraturas bilaterais onde não é possível estabelecer uma oclusão adequada; fraturas unilaterais em pacientes edêntulos ou em pacientes dentados com oclusão instável; paciente apresenta restrições médicas que impossibilitem o uso do bloqueio intermaxilar e quando ocorre uma interferência mecânica entre os segmentos fraturados1,2,7,8,9,10.

Diversos são os fatores que influenciam o tratamento e, consequentemente, o prognóstico das fraturas condilares. E entre eles, tem-se localização da fratura, grau e direção do deslocamento do fragmento, idade do paciente, outras fraturas faciais associadas, presença dos dentes, tipo de oclusão prévia ao trauma, corpo estranho na articulação temporomandibular e fratura exposta8.

Os principais objetivos do tratamento são a restauração das estruturas e da função, minimizando a morbidade. Isso requer adequada redução anatômica e imobilização que assegure a consolidação dos segmentos fraturados1,3.

Quando duas fraturas estão presentes, existe uma tendência maior de deslocamento dos segmentos devido a uma perda bilateral de suporte. O alargamento da mandíbula deve ser prevenido, aplicando-se uma fixação interna adequada para resistir a essa tendência. Com fraturas bilaterais simples, deve-se sempre considerar uma forma de fixação mais rígida, pelo menos em uma das fraturas. Essas injúrias devem ser tratadas cuidadosamente para, primeiro, restaurar a largura mandibular e, depois, mantê-la3.

Hidding et al.4 obtiveram resultados satisfatórios em osteossíntese com fio de aço em fraturas com graves deslocamentos. Contudo para Ellis E III3; Ellis E, Dean J5; Ellis E III, Reynolds ST, Park HS9 e Hyde et al.10, a fixação por miniplacas oferece maior estabilidade e, por conseguinte, elimina ou reduz o período de bloqueio maxilo-mandibular no pós-operatório, já que este, segundo Chacon EG, Larsen PE1, influencia, de maneira negativa, a ATM, provavelmente privando o côndilo de sua nutrição, devendo ser evitado.

Alguns autores, ainda, afirmam que não há dados estatísticos suficientes em estudos de longo prazo que discriminem qual das duas técnicas (aberta ou fechada) apresenta melhores resultados com o mínimo de complicações, considerando que este assunto necessita de maiores estudos4,7,8.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O sucesso ou a falha do tratamento está relacionado (a) a uma aderência cuidadosa nos princípios cirúrgicos e fisiológicos, associados a um correto diagnóstico e acompanhamento pós-operatório detalhado. Quando indicada de forma correta, a redução cirúrgica aberta está relacionada a um retorno mais rápido dos movimentos mandibulares, aumento da capacidade funcional a longo prazo e uma menor incidência de complicações.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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9. Ellis E III, Reynolds ST, Park HS. A method to rigidly fix high condylar fractures. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral Radiol Endod, 1989 Oct; 68(4): 369-374.         [ Links ]

10. Hyde N, Manisali M, Aghabeigi B, Sneddon K, Newman L. The role of open reduction and internal fixation in unilateral fractures of the mandibular condyle: a prospective study. Br J Oral Maxillofac Surg, 2002 Feb; 40(1): 19-22.         [ Links ]

 

Endereço para correspondência:
Rodrigo de Azevedo Ramalho
Av. Gal. Newton Cavalcanti,1.650.
Tabatinga, Camaragibe / Pernambuco – Brasil
CEP 54753-220