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Por Gabriela Bittencourt, para o EU Atleta — Aberystwyth, País de Gales


Alongar é receita para aumentar flexibilidade, necessária para executar a mecânica dos exercícios físicos e atividades do dia a dia — Foto: Istock

Quando é necessário fazer alongamentos: antes, após o treino ou em outros momentos do dia? Estudos apontam que alongamentos realizados antes do treino não ajudam a prevenir lesões. Algumas pesquisas com atletas indicam até que os que alongam logo antes de se exercitar estão sujeitos a ter suas capacidades de desempenho diminuídas. No dia a dia, no entanto, profissionais de Educação Física reforçam a importância dessa prática pelo menos após realizar atividades físicas. Como ninguém quer correr o risco de sofrer lesões ou sentir dores, é importante saber quando e como se alongar. Para esclarecer essa dúvida, conversamos com o médico do Esporte e diretor da Sociedade Brasileira de Medicina do Exercício e do Esporte (SBMEE) Ivan Pacheco e com o professor Abdallah Achour Junior, doutor em Educação Física. Os especialistas concordam que o objetivo do alongamento não é mesmo prevenir lesões. Seus benefícios são outros. Um dos principais é a melhora da flexibilidade, importante para quem pratica atividades físicas regulamente, é atleta ou até mesmo pessoas mais sedentárias. E não é preciso ser altamente flexível para ser saudável. Basta alongar-se de forma frequente e satisfatória para executar suas atividades diárias e aproveitar melhor suas habilidades esportivas.

Ivan Pacheco comenta que os estudos não são conclusivos em termos de prevenção de lesões. Por outro lado, há muitas pesquisas realizadas ao longo de décadas que corroboram os benefícios do alongamento para a melhora da flexibilidade, uma habilidade que diminui com o avanço da idade.

– Trabalhos com grandes populações demonstram que os alongamentos melhoram as dores articulares porque aumentam a eficiência dos movimentos. Especialmente em pessoas de mais idade, que têm mais rigidez muscular, fazer alongamento contribui muito para isso – observa o médico.

Autor de livros sobre alongamento e flexibilidade, Abdallah Achour Junior completa que só se alongar não será suficiente para prevenir lesões ao realizar atividades físicas. Para tanto, é preciso ter flexibilidade. Segundo ele, é ao desenvolver essa qualidade por meio de alongamentos que se alcança a mecânica perfeita dos exercícios praticados e torna-se possível evitar dor e lesão.

– Por exemplo, se eu estiver com joelho estendido e meus dedos não se movimentarem de forma suficiente em direção à minha canela por 10 segundos pelo menos, vou ter uma pisada ruim. Durante uma caminhada ou corrida, vou pisar para frente, usando parte anterior do pé, podendo provocar uma lesão no joelho ou no próprio tornozelo – exemplifica.

Em corredores, alongamentos estáticos ajudam a diminuir rigidez muscular e dor de treinos anteriores — Foto: Unsplash

Achour, que também é professor convidado do Laboratório de Alta Performance do Centro de Estudos de Fisiologista do Exercício e Treinamento (Cefit LAP), enumera os benefícios do alongamento:

  1. Diminuição da rigidez muscular, que facilita a realização dos movimentos;
  2. Aumento do fluxo sanguíneo na área trabalhada, melhorando a oxigenação do tecido muscular e reduzindo dores;
  3. Desenvolvimento da flexibilidade, conquistada apenas por meio de alongamentos.

Ainda que sejam importantes para quem leva uma vida ativa fisicamente, todas as pessoas, independentemente do seu condicionamento, tendem a se beneficiar dessa prática. Diplomado em Medicina do Esporte pelo Comitê Olímpico Internacional, Pacheco comenta que qualquer indivíduo, inclusive quem é sedentário, pode recorrer aos alongamentos para melhorar a amplitude de seus movimentos, evitando sobrecargas e prejuízos às articulações.

– O que muda é o propósito. O atleta tem que fazer o gesto esportivo e se não tiver bom alongamento esse movimento não vai ser eficiente. Mas as pessoas em geral precisam do alongamento para as ações do dia a dia. Ao pegarem algo no chão, por causa do encurtamento das costas, podem não conseguir fazer esse movimento corretamente. A pessoa vai dobrar os joelhos, pegar de lado ou fazer o gesto com dor – ensina.

Variedades de alongamento

Achour explica como são realizados os principais tipos de alongamento.

Ao fazer alongamentos estáticos, deve-se alcançar uma posição até sentir o desconforto e permanecer por alguns segundos — Foto: Unsplash

  • Estático - quando se alonga até uma posição em que sinta o desconforto, permanecendo nela por um tempo determinado.

Nos alongamentos dinâmicos, pessoa realiza o movimento lentamente até sentir resistência e então voltar à posição inicial — Foto: Unsplash

  • Dinâmico - também conhecido como balístico, consiste em alongar com baixa velocidade até uma posição em que se perceba a resistência musculoarticular e retornar à posição inicial. Esses movimentos são repetidos algumas vezes.

No alongamento passivo, pessoa conta com apoio de profissional para realizar movimentos — Foto: Unsplash

  • Passivo - realizado com ajuda externa de um profissional, incluindo com o apoio de materiais, conduzindo até que se tenha uma resistência.

Ao fazer o FNP, vale contar com o apoio de profissional para manter a amplitude final, fazendo uma força contrária ao movimento objetivado — Foto: Unsplash

  • Alongamento mediante facilitação neuromuscular proprioceptiva (FNP) - quando, na amplitude final do movimento, alcança-se uma isometria para conseguir relaxamento e, em seguida, torna-se a aumentar a amplitude.

Como e quando realizar alongamentos

Segundo Achour, antes de iniciar uma modalidade esportiva, o ideal seria o indivíduo passar por uma avaliação para saber se sua musculatura está apta para os movimentos a serem realizados. O professor considera essencial avaliar aspectos como mobilidade, nível de força e flexibilidade para preparar o corpo para a atividade. Nesse contexto, pode ser necessário começar dedicando mais tempo aos alongamentos do que à prática do esporte escolhido.

– Há pessoas que se lesionam ao fazer crossfit. O problema não é essa atividade, que é desafiadora e tem altos níveis de força. A questão é se a pessoa tem o corpo preparado para a modalidade. Não é o crossfit que provoca lesões. Às vezes a pessoa não tem o condicionamento necessário. Isso também acontece na corrida. No início, é preciso correr menos e preparar mais aquelas partes do corpo que precisam suportar a corrida - ilustra.

Ao começar uma modalidade, pode ser preciso investir mais em alongamentos do que no treino, preparando músculos e articulações para terem flexibilidade exigida pelo esporte — Foto: Pexels

Achour recomenda fazer alongamentos antes e depois de atividades físicas e variar o treinamento eventualmente. Para tanto, é preciso que um profissional de Educação Física indique os exercícios adequados e acompanhe a realização dos movimentos para correções necessárias. Contudo, Achour apresenta algumas orientações gerais sobre alongamentos pré e pós-treino.

  • Antes do treino

Como: é preciso alternar os tipos de alongamento. A recomendação é começar por um estático geral para braços e pernas, com tempos de 20 a 30 segundos. Em seguida, deve-se realizar duas séries de dinâmico, a primeira mais leve e a segunda mais intensa, que envolverão movimentos similares àqueles da atividade física a ser realizada em seguida. Portanto, há um equívoco ao separar alongamento e aquecimento. Com as séries dinâmicas específicas para o exercício a ser praticado em seguida, faz-se também uma parte do aquecimento.

Benefícios: enquanto o alongamento estático ajuda a diminuir a rigidez, o dinâmico contribui para preparar o corpo para uma melhor performance. Atletas experientes e corredores podem até deixar de fazer o alongamento estático. No entanto, se tiverem desconforto do treino anterior, é recomendável realizar esses exercícios.

Para quem: pessoas que pratiquem qualquer atividade, embora quem faça musculação possa realizar um aquecimento no próprio aparelho.

Alongamentos pós-exercício devem promover uma soltura muscular e relaxamento — Foto: Unsplash

  • Depois do treino

Como: o alongamento nesse momento deve envolver movimentos de soltura muscular. Repetir os movimentos realizados antes do treino é um equívoco. O alongamento pós-treino deve ser feito de forma suave com séries de 60 a 180 segundos na posição. O objetivo é reequilibrar o corpo, fazendo uma descompactação articular e um realinhamento do tecido conjuntivo.

Benefícios: as pessoas aprendem a gostar de reequilibrar o corpo e a sentir prazer com o alongamento. Ao realinhar o tecido conjuntivo, que se desorganiza quando trabalhado intensamente, prepara-se para que cresça no ângulo alcançado no alongamento e evita-se a compressão musculoarticular.

Muitas vezes, a rigidez pós-treino compromete as raízes nervosas. Com o tempo, essa compressão aumenta e pode causar dores crônicas, fazendo com que se interrompa a rotina de exercícios. Porém, treinando direito e se alongando corretamente, é possível melhorar essa rigidez e evitar dores e lesões.

Para quem: pessoas que pratiquem qualquer atividade.

Varie treinos de alongamento e realize movimentos distintos antes e depois das atividades física — Foto: Pexels

Frequência é importante

Pacheco também comenta que fazer alongamentos antes do exercício ajuda a realizar os movimentos de forma otimizada. Quem corre, por exemplo, precisará de amplitude para aumentar a passada e os exercícios para os membros inferiores ajudarão nesse sentido. Mas, segundo ele, mais importante do que alongar antes ou depois do treino é fazê-lo com frequência. A recomendação vale até para quem faz caminhadas, atividade que não demanda um alongamento prévio.

– Digo sempre que é melhor fazer do que não fazer. Pode ser antes ou depois dos exercícios ou em dias alternados, mas tem que ser com regularidade. Não adianta fazer uma vez antes da atividade física e não fazer de novo durante alguns dias. Para o tecido muscular ter complacência, o alongamento tem que ser feito com regularidade – comenta.

Achour dá exemplo de alongamento que pode ser feito durante o dia, no trabalho — Foto: Divulgação/Abdallah Achour Junior

No trabalho

Vale até realizar os alongamentos em outros momentos do dia. Quem passa muito tempo sentado no trabalho pode tirar muito proveito dessa atividade se conseguir encaixá-la em sua rotina. Achour sabe que nem sempre é possível adotar esse hábito. No entanto, se a pessoa tiver oportunidade, a cada 50 minutos é interessante tentar fazer alguns movimentos para melhorar o fluxo sanguíneo nos músculos e ajudar a voltar a atenção para a postura. Após esse tempo, o indivíduo tende a perder a concentração no corpo.

Sempre que possível, exercícios devem ser realizados a cada 50 minutos no trabalho — Foto: Divulgação/Abdallah Achour Junior

– Quando se está sentado, a carga na coluna é 140% maior do que quando deitado. Ao longo do tempo, a pressão nos discos vertebrais pode causar dor e afetar a qualidade de vida. Se a pessoa não tiver flexibilidade, força muscular e consciência corporal, não conseguirá se posicionar bem – explica.

O professor de educação física demonstra como fazer movimento para alivar a carga na coluna quando se passa muito tempo sentado — Foto: Divulgação/Abdallah Achour Junior

Respeite os seus limites

De acordo com o professor de Educação Física, flexibilidade é de 50% a 70% genética. Mas a realização de alongamentos ajuda as pessoas a serem mais flexíveis. Com paciência, orientação profissional e o cuidado de realizar os movimentos sem dor, apenas com um desconforto, é possível melhorar a saúde musculoarticular, dentro das capacidades de cada indivíduo, após um período de dois a três meses de treinamento.

– Não é preciso encostar a cabeça no joelho, com ele estendido, para ter uma coluna lombar saudável. A pessoa tem que respeitar o seu limite, aumentando a flexibilidade com o tempo e treinamento, até atingir o seu ponto ótimo e mantê-lo. Esse é um cuidado importante. Há pessoas que querem sempre aumentar mais, mas devem entender que todos têm um ponto limite – alerta.

Pacheco enfatiza que é apenas por meio do alongamento que se pode melhorar a flexibilidade. Não há outra forma de desenvolver essa capacidade. Porém, na ânsia de acelerar esse processo ou ao se comparar a outras pessoas, o médico diz que muita gente acaba cometendo o erro de não respeitar suas características individuais e limites.

– Tem gente que mesmo fazendo alongamento vai passar a vida inteira sem conseguir alcançar os pés sem dobrar os joelhos. Outras pessoas fazem isso com muita facilidade. Há pacientes que tentam forçar e acabam com dores. Os exercícios de alongamento que servem para uma pessoa podem não servir para outra. Por isso, é preciso que o instrutor passe um treinamento individualizado – reitera.

Nem todo mundo consegue alcançar os pés com joelhos estendidos e isso é uma questão genética, não um problema — Foto: Unsplash

Com prática, cada pessoa pode alcançar o melhor de sua flexibilidade. Contudo, Achour ressalta a importância de começar esse preparo quando criança, seja com alongamentos dinâmicos, que podem interessar mais à garotada e desenvolver a coordenação; ou estáticos, para conquistarem o hábito de prestar atenção ao próprio corpo. Afinal, a rigidez muscular vai aumentando com a idade.

– A pessoa que não fez alongamento na infância vai ter encurtamento muscular, sim. Dá para começar na idade adulta, mas o desenvolvimento será diferente. O segredo é paciência. Não adianta querer pagar a dívida de não ter treinado antes e sentir dor. É preciso ir até o desconforto para começar a gostar da atividade e conseguir aumentar a flexibilidade – afirma o professor de Educação Física.

Dicas para adultos desenvolverem a flexibilidade

  1. Contar com a instrução de um profissional de Educação Física, que vai passar um treino considerando as suas capacidades e atividades praticadas;
  2. Ter paciência ao realizar os exercícios. Não adianta querer recuperar o tempo perdido;
  3. Evitar o dor. O certo é fazer os movimentos até o desconforto;
  4. Respeitar o próprio limite.

Não se alongue até sentir dor! O certo é realizar o movimento até o desconforto — Foto: Pexels

Articulações

Com o avanço da idade, é natural que se perca flexibilidade e força muscular. O médico do esporte explica que, por esse motivo, há um comprometimento das articulações e os gestos tornam-se mais dolorosos, especialmente se a pessoa é mais sedentária e não trabalha para reduzir a rigidez.

– A recomendação do padrão-ouro do esporte e do exercício tem três pontos: exercícios aeróbicos, que melhoram a parte cardiovascular e pulmonar; de força, porque vamos perdendo essa capacidade com o passar dos anos e isso compromete a qualidade de vida; e alongamentos, que ajudam na saúde das articulações. Se conseguir fazer um dos três, é melhor do que não fazer nada. Mas se fizer todos, será ótimo – diz.

Ainda que tenha sido feito o alerta de contar com um profissional de Educação Física ao realizar alongamento, algumas pessoas precisam de atenção especial nessa hora. É o caso de quem tem osteoporose, lombalgias e degenerações na coluna, entre outros. Pacheco comenta que, em geral, quem apresenta problemas como esses deve consultar um ortopedista ou um médico do esporte para realizar os alongamentos com segurança.

– Muita gente com degenerações na coluna e pequenas hérnias consegue diminuir a pressão nos ossos com alongamento. Pessoas novas que sentem dores nas costas podem ter uma melhora com alongamento e reforço muscular, sem precisar de medicamento, inclusive. Esses exercícios são recomendáveis para esses grupos de pessoas, mas precisam ser supervisionados, como no caso de quem tem osteoporose, pelo risco de fraturas – observa o médico.

Alongamentos ajudam a aliviar comprometimento e dores nas articulações decorrentes do avanço da idade — Foto: Pexels

Achour acrescenta que, apesar de ser uma atividade altamente benéfica quando realizada corretamente, alongamento não é solução para todas as dores nas articulações. Em alguns casos, a pessoa pode ter uma inflamação e é preciso consultar um médico para um diagnóstico.

– Muitas vezes a pessoa tem algum tipo de dor e acredita que o alongamento pode resolver. Mas não dá para eliminar todo tipo de dor com esse treinamento. Às vezes, é preciso procurar um médico para identificar a causa do problema – sugere.

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