TRÁÁÁ, FUIIIIIM, TCHECCCC – Traduzindo onomatopeias, interjeições e outros efeitos sonoros

TRÁÁÁ, FUIIIIIM, TCHECCCC – Traduzindo onomatopeias, interjeições e outros efeitos sonoros

Afff, que classezinha de palavras ingratas as onomatopeias: a única classe de natureza não arbitrária, construída de forma a espelhar algum som ou representar graficamente algum elemento na escrita. Teoria bonita. Na prática? Tum tum, buááá, fiu-fiu, tic-tac, muuuuuuu

Na narrativa, encontramos algumas categorias distintas de onomatopeias: sons da natureza, sons de animais, sons feitos por humanos, sons que expressam sensações (ufa!), objetos e movimentos.

E é aí que começam os problemas para o tradutor (snif snif), que terá que transferir essa representação fonética de uma língua para outra, uma vez que línguas diferentes representam sons de forma diferente e de acordo com seus sistemas fonéticos específicos, portanto, um exercício bastante subjetivo e enviesado de acordo com os sons que estamos acostumados. Sabe aquela história do latido de cachorro em diferentes línguas? Woof woof em inglês, Bau bau em italiano, ouah ouah em francês. Pois é.

Ao traduzir literatura infantojuvenil, sobretudo obras ilustradas, é inevitável se deparar com essa dificuldade – oh-ou. E, para piorar, não existe um material de consulta terminologicamente preciso, não se encontram glossários onomatopaicos por aí. Também não há um referencial teórico que indique métodos e técnicas para essa tradução – no meu caso, do inglês para o português.

A língua inglesa ainda impõe uma dificuldade maior pelo seu caráter mais dinâmico, que possibilita, por exemplo, criar verbos a partir de onomatopeias. Uma onomatopeia que representa um movimento brusco e barulhento de ar ou água (WOOSH) pode virar verbo – The sword wooshed over my head. Essa malemolência linguística não existe no vernáculo na língua portuguesa, mas o tradutor terá que dar conta dela para expressar os sentidos do texto de partida.

Como a tradução, em uma perspectiva funcional, precisa reproduzir o propósito comunicativo do texto, precisamos pensar qual é a função que a onomatopeia exerce no texto de literatura infantojunvenil – sobretudo em textos que trabalham com imagens, nos moldes das HQs.

No texto infantil, elas criam ritmo, musicalidade e fazem “barulho” para ajudar na visualização das ações e movimentos do texto. O tradutor, então, precisa fazer um trabalho de visualização (ou audição imaginária — sim, ouvimos vozes!) para tentar contextualizar a situação representada e ver se, de fato, aquela representação onomatopaica é cabível naquele contexto – afinal, a língua de partida pode costumar verbalizar um som que a língua de chegada não verbaliza.

Na prática tradutória, vemo-nos diante de algumas opções:

Omitir: na falta de um equivalente, pode-se optar por suprimir para não forçar a barra. Perde-se a dinamicidade? Talvez, mas às vezes é melhor do que tentar manter todas as onomatopeias e criar um texto artificial.

Manter em inglês: cada vez mais, o leitor tem familiaridade com livros e produções e língua inglesa que facilitam a compreensão. Quem nunca viu um POW!, BANG!, CRASH! por aí?

Traduções estabelecidas: há algumas onomatopeias clássicas, como Ouch! (dor – ai!), Phew! (alívio), que tem tradução consagrada. Ufa!

Generalização: não usar uma palavra específica, mas explicar a sensação, o som, o movimento. O texto vai aumentar? Vai. Perdemos a sonoridade? Sim. Mas, de novo, pode ser um ponto para a naturalidade.

Tradução por outra classe de palavras: crash vira choque, slam vira batida de porta, bang vira disparo.

Adaptação fonética: click! Whizz! Whoosh! – Quantos k’s e e w’s! Dá para evitar esses seres estranhos na nossa escrita e usar mais vogais, para deixar com mais cara de português: Clic! Uizzzz! Uuuuush!

Não há resposta certa (buááá): é uma escolha contextual, particular e estilística. Ficam aqui como sugestões de abordagens diferentes que podem ajudar nos próximos OOOPS, KLANK, BZZZZ, POP, WHAM que aparecerem em futuras traduções. 


p.s.: ainda sofrendo e aceitando sugestões para The sword wooshed over my head! 🥲😆

Amanda Moura

Tradutora | Revisora | Professora | Estudante de Teatro

1 a

Marcela R. veja, só.

Amanda Moura

Tradutora | Revisora | Professora | Estudante de Teatro

1 a

Que belo texto, Adriana Krainski! É um assunto que me intriga bastante, e sempre estou às voltas à procura de referências sobre o assunto. Sigamos nessa pesquisa. Muito bom o seu texto.

Sofia Botelho

Analista de Relações Internacionais

1 a

Adorei os apontamentos! Muito interessante a ideia da "audição imaginária". Sobre a frase, pensei em "A espada zuniu sobre a minha cabeça".

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