ÁREA: Produtos Naturais

TÍTULO: ATIVIDADES BIOLÓGICAS DO EXTRATO DICLOROMETANO DE Calyptranthes spruceana Berg. (Myrtaceae)

AUTORES: CONRADO, G. G. (INPA) ; GUILHON-SIMPLICIO, F. (UFAM) ; PINHEIRO, C. C. S. (INPA)

RESUMO: No interior do Amazonas, preparações com das folhas Calyptranthes spruceana são intensamente utilizadas com finalidades como febrífugo. Visando contribuir com o estudo científico de plantas medicinais da Amazônia, foi realizada uma avaliação farmacológica de um extrato diclorometano das folhas de C. spruceana no teste de citotoxicidade sobre Artemia salina e no teste da placa quente. O extrato apresentou CL50 de 17,075 µg/mL no teste de citotoxicidade sobre A. salina e atividade analgésica estatisticamente significativa pela via oral e intraperitoneal no teste da placa quente. Portanto, o extrato diclorometano das folhas de C. spruceana demonstrou ser elegível como objeto de futuros estudos em busca compostos farmacologicamente ativos para o arsenal terapêutico.

PALAVRAS CHAVES: calyptranthes spruceana, citotoxicidade, atividade analgésica.

INTRODUÇÃO: A família Myrtaceae possui cerca de 100 gêneros e 3500 espécies com predomínio de ocorrência em regiões tropicais do globo. No Brasil, os gêneros Eugenia, Myrcia e Calyptranthes destacam-se pelo número de espécies, tendo outros gêneros menos de 60 representantes (GRESSLER et al., 2006). Os óleos essenciais produzidos por espécies dessa família têm sido apontados como os responsáveis pelas atividades biólogas por elas apresentadas (DONATO; MORRETES, 2007). Calyptranthes spruceana Berg., é uma espécie arbórea que pode atingir até três metros de altura, sendo encontrada na Amazônia em regiões inundáveis à beira de rios. O forte cheiro de laranja que exala de suas folhas, a que deve a designação laranjinha, acha-se modificado por um odor característico de cuminho, razão porque é também denominada, por alguns, cuminirana (CAMPOS CORRÊA et al., 1972). No Estado do Amazonas o chá das folhas dessa planta é amplamente utilizado por ribeirinhos contra distúrbios estomacais, incluindo cólicas (MAIA; ANDRADE, 2009), no entanto, pouco se sabe acerca do real potencial medicinal dessa espécie. Ela produz dois tipos de óleos essenciais, sendo o tipo A, rico em limoneno, geranial e perialdeído e o tipo B, rico em pireno e citral (LIMBERGER et al., 2002). Sendo assim, considerando a necessidade de validação do uso medicinal das folhas da C. spruceana e a importância de estudos com plantas medicinais, este estudo realizou uma investigação preliminar do potencial farmacológico do extrato diclorometano das folhas de C. spruceana, visando contribuir com o estudo de plantas medicinais da Amazônia, importante para o desenvolvimento econômico da região, por proporcionar embasamento científico para o aproveitamento sustentável da sua biodiversidade.

MATERIAL E MÉTODOS: Folhas de C. spruceana foram coletadas em Itacoatiara, Amazonas. A espécie foi identificada pelo Dr. William Rodrigues do Herbário do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, onde foi depositada uma exsicata sob o número 80424. As folhas foram secas e trituradas em moinho de facas (MA 340, Marconi) e submetidas a três ciclos de maceração de 72 h com diclorometano, na proporção de 1:2. O extrato foi filtrado e concentrado em rotaevaporador (TE 211, Tecnal) e o resíduo do solvente foi eliminado em estufa (Stabil-Therm, Blue Eletric Company) a 40 °C. Para utilização nos testes, o extrato foi dissolvido em uma solução de soro fisiológico:Tween 20 (0,4:1), que foi utilizada como controle negativo. Na avaliação da atividade citotóxica, diferentes concentrações do extrato foram incubadas em triplicata com 10 náuplios de A. salina em água marinha artificial (Meyer et al.,1982). Após 24 horas, realizou-se a contagem de náuplios mortos e o cálculo da Concentração Letal a 50 % (CL50) pelo método de Probitos, utilizando software StatPlus versão 2007 (Analystsoft). No teste da placa quente, diferentes grupos de seis camundongos Swiss albinos fêmeas com pesos entre 20 e 30 g receberam doses de 100, 200 e 400 mg/kg do extrato pela via oral e de 10, 50 e 100 mg/kg pela via intraperitoneal. Citrato de fentanila (Fentanest®, Cristália) a 20µg/kg foi utilizado como controle positivo. A cada 30, 60, 120 e 180 min da administração das drogas foi medido o tempo de latência individual para o reflexo típico de dor (“sapateado”) em uma placa quente digital (EFF-361, Insight) a temperatura de 52°C (LAPA et al., 2008). Os resultados foram comparados pelo método de Student-Newman-Keuls com nível de significância de p < 0,05, utilizando o software SigmaPlot versão 11.0 (Systat Software, Inc.).

RESULTADOS E DISCUSSÃO: O ensaio de citotoxicidade sobre náuplios de Artemia salina é um método simples, rápido e barato que tem sido utilizado para screening inicial de atividades farmacológicas de diversas substâncias há vários anos (LHULLIER et al., 2006). Existem correlações positivas entre citotoxicidade sobre A. salina e atividade tripanossomicida (ZANI et al., 1995), antioxidante (MATHEWS, 1995) e antitumoral (SIQUEIRA et al., 1998). A CL50 do extrato diclorometano das folhas de Calyptranthes spruceana no teste de citotoxicidade sobre A. salina foi de 17,1 µg/mL o que indica que esse extrato pode apresentar várias atividades biológicas ainda não investigadas. Apesar dos animais não poderem verbalizar a dor, eles produzem respostas comportamentais, motoras e fisiológicas que servem de parâmetro da sua resposta álgica. No teste da placa quente, o tempo de latência para a resposta característica de dor, onde o animal troca rapidamente o apoio dos pés (sapateia), levanta ou lambe uma das patas, pode ser considerada um indicativo da intensidade da sua resposta nociceptiva decorrente de integração com o Sistema Nervoso Central (SNC) (LAPA et al., 2008). Neste estudo, o tempo de latência para a resposta nociceptiva foi significativamente maior (p < 0,05) nos animais tratados com as diferentes doses do extrato diclorometano de C. spruceana, que nos animais tratados apenas com o veículo, por ambas as vias (oral e intraperitoneal), o que comprova seu potencial como droga analgésica de ação central. Não foi verificada diferença estatisticamente significativa em relação ao controle positivo (Citrato de Fentanila), como pode ser observado na figura 1.

Figura 1 – Resultado do teste da placa quente. A, via intraperitoneal; B, via oral. Valores de p versus controle negativo: *p < 0,05.




CONCLUSÕES: O extrato diclorometano das folhas de C. spruceana mostrou ser farmacologicamente promissor, sendo uma possível fonte de substâncias biologicamente ativas. O efeito desse extrato sobre o SNC deve ser melhor investigado, em virtude da ampla utilização medicinal empírica da planta, o que pode representar risco aos usuários. Pode-se concluir que este trabalho contribuiu com o estudo de plantas medicinais da Amazônia, onde a maior parte do potencial econômico da biodiversidade permanece obscura.

AGRADECIMENTOS: Os autores agradecem ao INPA pelo auxílio na identificação da espécie, pelos animais utilizados nos experimentos e pelos equipamentos cedidos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA: CAMPOS CORREA, H.G.; DA SILVA, M.L.; MAIA, J.G.S.; GOTTLIEB, O.R.; MOURÃO, J.C.; MARX, M.C.; DE MORAES, A.A.; MAGALHÃES, M.T. 1972. Óleos essenciais de espécies do gênero Calyptranthes. Acta Amazonica 2(3): 53-54.

DONATO, A. M.; MORRETES, B. L. 2007. Anatomia foliar de Eugenia brasiliensis Lam. (Myrtaceae) provenientes de áreas de restinga e de floresta. Revista Brasileira de Farmacognosia 17(3): 426-433.

GRESSLER, E.; PIZO, M. A.; MORELLATO, L. P. C. 2006. Polinização e dipersão de sementes em Myrtaceae no Brasil. Revista Brasileira de Botânica 29(4): 509-530.

LAPA, A. J.; SOUCAR, C.; LANDMAN, M. T.; CASTRO, M. S.; LIMA, T. C. 2008. Métodos de Avaliação da atividade farmacológica de plantas medicinais. São Paulo: Lagoa Editora Ltda.

LHULLIER, C.; HORTA, P. A.; FALKENBERG, M. 2006. Avaliação de extratos de microalgas bênticas do litoral catarinense utilizando o teste de letalidade para Artemia salina. Revista Brasileira de Farmacognosia 16(2): 159-163.

LIMBERGER, R. P.; SIMÕES-PIRES, C. A.; SOBRAL, M.; MENUT, C.; BESSIERE; J. M.; HENRIQUES, A. T. Essential oils from Calyptranthes concinna, C. lucida and C. rubella (Myrtaceae). Revista Brasileira de Ciências Farmacêuticas 38(3): 355-360.

MAIA, J. G.; ANDRADE, E. H. 2009. Database of the Amazon aromatic plants and their essential oils. Química Nova 32(3): 595-622.

MATHEWS, R. S. Artemia salina s a test organism for measuring superoxide-mediated toxicity. Free Radical Biology and Medicine, v. 18, n. 5, p. 919-22, 1995.

SIQUEIRA, j. M.; BOMM, M. D.; PEREIRA, N. F. G.; GARCEZ, W. S.; BOAVENTURA, M. A. D. 1998. Estudo fitoquímico de Unonopsis lindmanii – Anonnaceae, biomonitorado pelo ensaio de toxicidade sobre Artemia salina Leach. Química Nova 21(5): 557-559.

ZANI, C. L. et al. Brine shrimp lethality assay as a pre-screening system for anti-Tripanossoma cruzi. Phytomedicine, v. 2, 47-50, 1995.