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METAMANIFESTOS NEO-NEO-HOMEOSTÉTICOS METAMANIFESTO AURORAL (perliminares nos bares) in principio erat verborreia sem crises, para que servem os manifestos? os manifestos só fazem sentido se os estivermos a filtrar por um revisionismo permanente Vestimo-nos com as roupas matemáticas de uma lúcida e combativa tolerância enquanto lançamos as crises no esquecimento. A moda dissimula a crise e é o ornamento da revolta! A revolta é um equívoco da libertação. Mas os caminhos da revolta são imparáveis e incomparáveis! As crises são icebergs de outras crises, e o esquecimento demora, e a inescrutável alegria floresce - há uma aragem de pastiches nos ímpetos revolucionários - engravidamos de homeostáse como se fossemos mães prenhes de uma inolvidável transformação de culturas futuras e, como quem não quer a coisa, fechamo-nos numa fraternidade central, num espaço e tempo construído e desconstruído para habitarmos e transgredirmos quando estivermos para aí virados, e morarmos com vaquinhas e coelhinhos, reais ou de prluche, ainda que a transgressão não passe de uma alta fachada que separa de um lado e do outro simétricos jardins bíblicos com alegorias pagãs - um Éden plural, troglodita, abismal! e cá vamos organizando e desorganizando, mais ou menos exebicionisticamente, porque alguém disse, "ide e desorganizai!", e nós reparamos que a desorganização era boa, e a voz acrescentou "vinde e reorganizai!", e de certezinha absoluta que a reorganização deveras fixe! e deixamos o corpo para sêr olhado ou reolhado, quais narcisos mergulhados nos labirintos da imagem-própria, num espelho que incontrolávelmente é transcendido em simultaneo com o que é espelhado. Marat agonia ao lado! A guilhotina corta na esquina! A menina quer ler a sina? O caos, crú, enxúto, húmido ou ardente, existe no meio destas coisas como um movimento múltiplo saído das visões vulcânicas de Empédocles, ai credo! somos os deuses dos nossos deuses?! entretanto Athena acciona um dos íntimos deuses-máquinas-métodos, uma confusão activa e não-actuante: uma paixão fria mais-ou-menos à espera do escândalo, que é apenas um misreading parvo. A deusa senta-se como um buda cheirando a sandalo que se precepita sobre a paisagem. Senta-se incandescente na sua serenidade. Enrola a paisagem e regressa ao Nirvana do Olimpo de escabeche. Podiamos enlouquecer de teorias, mas andamos a requentar sopas. Sabemos, por inexperiência, que a senilidade é a marca do mestre a que todos os aprendizes aspiram a chegar. Marca maniaca nem por isso amargurada. Mas quem sonha com uma ordem intacta e perfeita? E quem é que não sonha com desordens conspurcadas e imperfeitas? Os tigres da ira continuam a chicotear os cavalos de instrução, Manel? Contar ou não contar com as Utopias: mera questão de táctica. Embora a táctica seja pouco chinesa. Andamos a engravidar de prantos biblícos em dialeto neo-babilónico. Bradamos aos céus como se Deus estivesse entalado na garganta. Acusaram-nos de blasfémia e fomos ler Santo Agostinho. A Jerusalém Celeste era bera! E as Utopias antigas eram mediocres jogos de computador. E o que é o Homeostético?: pergunta absurda cheia de táxis, caviar, livros de bolso e arsénico... mas pertinente! Andamos muitos anos à procura da resposta com uma urgência desesperada. E ela foi vindo aos poucos como uma burla ciêntifica. Continuamos a modos como que a acreditar: mas o essêncial ainda não foi revelado! Ou, o essencial já estava revelado antes de qualquer pergunta, e continuará revelando-se depois de todas as respostas Há que fazer confluir todos os gestos para um Uno-Ùnico-Imediato, para um Múltiplo-Multiplicante que se dilui, ou para Intermédios-Neutros-Pulverizadores que compramos em pacotinhos e se misturam bem com estilos altos. ou então vamos construir um deus-manofactura ligeiro/pesado, um deus artesanal, ou comprá-lo em segunda-mão e venerá-lo, e dizer adeus-adeus a nihilismos vindouros, ou então adorar (ai adoro adorar!!!) uma pluralidade deles, sagrados e implacáveis, fazendo deslizar para o manufacto o deus e a sua catedral: que as montanhas venham visitar os profetas ou tomar chás com tias! Tudo começa nos orifícios. E os orifícios não só são sublimes como são o sublime! A natureza sem tecto fulgurando! O incandescente momento que sabe a eternidade! Minham! Primeiro, o ritual festivo da catharsis: o morder, o ganir, o conter, o envolver (a raposa disfarça-se de anagrama enquanto Deus prova o leão e diz que sabe a Glória cabalista!) segundo, o deixar-se ser envolvido, por exemplo, por uma divindade hindú de sete braços que nos manipula eróticamente! É bom demais! Acabarás por te certificares que o environment, que julgas agressivo, é uma espécie de luxúria que testemunha o que em cada época é canónico! E o canónico em cada época és tu, a tua singularidade feita de inúmeros plurais! Isto assim tal e qual. Com as unhas cheias de humor negro e branco, num acto máximo-mínimo e vice-versa: neste caso a escala deixa-nos perplexos porque repleta de fluxos e influxos, de um dentro-fora em movimento, muito esperneante, a modos que possesso. E ficas com a sensação que a tua nudez é uma regalia social. Recusarás pagar impostos? Regresso e progresso na humanidade, na infância: alegrias engravidadas dão largos partos. Começar outra vez outra vez, como quem reencarna sucessivas vezes ao longo de uma vida! Há que chafurdar na fraternidade com crimes revolucionários: nada de fanfarras militares ou bandas rock! Aguentar, adiantar, ir à luta! Porrada! porém, o projecto é sempre o mesmo, com furibunda recursividade:  revelar aquilo a que mais ninguém estava preparado. Ou, fazer a revolução (ou algo parecido) cada noite e acordar fresco que nem uma alface. O mundo ama-nos com todos os poros! É bom dormir à noite e fazer a sesta à tarde! Os poderes mostram-se desta maneira indemonstráveis, em luxuosos intímismos e em exageradas pantomimas, sem sentimentalismos frenéticos ou nostalgias de ópios com binóculos no além. A farda faz tanto o militante, o rótulo apenas prefaz assaz o homeostético. A civilização retém, a arte transborda! O homeostético está em devir. É um workin-progress digamos que progressista, com as suas hesitações reaccionárias! O Homeostético é por isso um animal sábio e absoluto consciente do seu génio. Nunca abandonamos a origem fremente que é sem-origem e se estende como inacabamento glorioso em todas as direcções do tempo! As estradas dos excessos conduzem-nos a palácios de sabedoria, enquanto a tolice persistente transforma os sagrados cépticos em profanos crentes a meta entre o arrastador e o arrastado (facto magnético) é o aqui-infinito e o ali-finito. A imanência do pavão garante a plenitude dos astros e devora as provas teológicas. A revolução, a política, a regressividade, a solidariedade, a paixão e o individualismo amam-nos profundamente (smack!): ah, ser heroi, doido, amaldiçoado ou Belo! METAMANIFESTO DESPREZO é preferivel acreditar nas imagens dos manga do que nas lânguidas instruções da perceptora Pelo ecletismo-hibridismo-mestiçagem Pelo confuso fácil, ou ordenado difícil, ou misto relaxado E pelo caos ambivalente, ambiguo, esforçado, reforçado, remendado, Assim aguardamos UM SINCRETISMO MAIOR ORIGINÁRIO E TUDO, uma escapadela a outras caças, desvios doutrinários, asceses loucas, serenas louras morenas baças E polimos as nossas belas sílabas, nossas erupções tipográficas E desfazemos as revolucionárias conquistas modernistas com possibilidades de vanguardas a prestações E vamos imprimir revistas para as gráficas E encontramos belos pedaços: SEXO E MAIS E MAIS IMANÊNCIA A fuga-fuga para. O velho Egipto Onde eu gostaria de criar galinhas E recordar velhas òperas junto a piramides que se derretem como gelados perante um sol elíptico Enfim: OLEEMOS AS METRALHADORAS A revolução apodreceu nas memórias de capitães aburguesados mediocramente em poltronas pirosas, e no sacaneia-o-próximo: diz o inclemente vidente despenteado. Que revolução? - pergunta o hábil arauto - a revolução morta? a ousadia perdida? oh, eu… Sim, tu! Claro, nós! Depois existem outros sentimentos como o 1. SENTIMENTALISMO (E SENSUALISMO) FRENÉTICO COM REQUINTES ESTÉTICOS E COM UM TIPO DE AMOR AVANÇADÍSSIMO. 2. A NÁUSEA DESENCHABIDA MAS NUNCA CRUEL COM ANJOS A ASSOBIAREM CANTATAS ENQUANTO VOMITAS NO BIDÉ. 3. A BELA PALAVRA (COM CORNOS RETÓRICOS) COMO POR EXEMPLO: HOMEOSTÉTICA (é nome de cabeleireiro ou de clínica de beleza? ver nas Páginas Amarelas) 4. A PAIXÃO ORAL, NAZAL, ANAL QUE É COMO QUEM DIZ «Ó INTRATÁVEL INSATISFAÇÃO!» - "Ó DELICIOSO DESFRUTAR!" 5. OS CORPOS: ENFIM. OU / E AFINAL. PORQUE OS CORPOS SÃO O ISSO. OU SÃO O QUE SÃO? VANGUARDA, a bela, a que (se/nos) apalpa, a que se academiza, a do catano, a com sabor a frutos do bosque, a amiga do gorila que é porteiro em certo bar E queixas-te de que não gostas dos tempos aureos da vanguarda Nem dos oportunismos dos anos 60 e 70 Nem desse lirismo infatuado a cheirar a cigarro Nem das barbas da geração de 90 Nem dos arroubos explicadistas E lembras-te, olá, se te lembras DOS POPÓS-POPS-MODERNISTAS Tipos encartados, carreiristas dos diabos, com um talento que ainda nos falta para estar nos sítios certos nos momentos certos. Mas são uns rapazes que gostam de comprar perfumes e joias às amantes das amantes, de trair as suas patroas nas subcaves das bienais, e para quem afinal a arte até é uma coisa séria (o que constitui um ENORMÍSSIMO CRIME). O RISO (sem adjectivos) É uma grande máquina de conhecimento. E os provérbios registam que a benção relaxa. A cada lamento a sua cagada sentença! Toda a aquisição é ùtil - as dissonâncias São as possiveis aquisições de algo que está a emergir muito subitamente. E a revisitação de ruinas só mostra o «dis-» Na harmonia do arruinado. Não renegarás o prazer do ruído. Não abandonarás a mulher do próximo. Não deixarás de fabricar imagens poderosas. Não considerarás a vanguarda um projecto acabado ou inacabado. Etc. - fica-se pelo decalago a metade! À àgua-de-colónia com arco-iris Opõe guerrilhas tântricas. Cuspirás nos hinos nacionais E nas músicas new-age! E irás todo contente para o campo. Quando o queres muito tê-lo-às tanto! O bom gosto condena-nos a armadilhas E a polivalência É o ùnico funcionalismo possível. Sentas um cú múltiplo em cadeiras sagradas. Quem fraqueja em coragem acaba por se doutorar em astúcias. Odisseus sobra aos ímpetos tanáticos e regressa ao azul dourado de Ìtaca. Penélope é boa na cama! Mmmmm... (…)também a educação luso-espartana e o infusionismoilusionismo no sublime extático, ou um tipo de xamanismo deslavado e mais impregnado de saudade…(...) é mesmo isso? Assim o programa de fogo-de-artifício vanguardista seguirá nestas passadas despedaçadas da UNIDADE-DEMASIADO-COMPLEXA, DITA HOMEOSTÉTICA «a única saída possível para mais uma crise!» - cada um vende o seu peixe como pode! (…)toda a parte nos devem. O todo é muito mais e muito menos que a soma das partys! Cada fragmento é uma euforia transbordante! Assim a prática do MISTÉRIO QUANTITATIVO, traduzindo o termo cultural buéréré, vulgarizado em abjectos programas infantis, desemboca na alta definição, e no supremo ateísmo tecnológico, a que alegremente nos vamos acostumando. A qualidade comanda o mundo, mas só vemos merdas mediáticas. As naves espaciais levam-nos devagar a novas galáxias artísticas. De raspão, o gurú maroto assegura-nos que chegamos lá mais depressa depois de uma boa açorda de MANTRAS cujo valor atómico (ou vómito?) é indisfarsável. A essência do prazer não pode ser imaculada. Velhas gaiteiras não dão boas freiras. Açordas requentadas não consolam as namoradas. (in "OS FILHOS DOS FILHOS DE ÁTILA") EDUCAÇÃO ESPARTANA (AL AJILLO) ENVOLVIMENTO NEO-NEO-HOMEOSTÉTICO (environment é a comédia mortal em contraponto à qual a arte se manifesta em festa na fresta) POST-PARODOXOLÒGICO (o pragmatismo criativo depois dos double binds no boudoir!) INFRACRIPTOGRÁFICO (ir às profundezas algo labirinticas do misreading com misreading cheio de piercings) E TRANSMENIPEICO (gargalhadas de bastidores nos corredores) MÈTIS + KAIROS + ENTHOUSIASMOUS ou seja 6=9=O O UNIVERSO É UM CUBO É UMA ESFERA É UMA PIRÂMIDE (por favor não fiques à espera que te piquem!) 1. Post-parodoxológico, porque as paradoxologias ainda assentam numa bestial burocracia lógica e numa categorização que traduz de outra forma a doxa tirânica/salvadora; fuja esta ou não aos canones do sistema digital. Dai à glória o que é da glória! Oferecei à Paradoxa bonbons! Colocai a Doxa dentro da Paradoxa e por aí adiante como matrioscas enamoradas de Zenão - no fundo dos fundos saberás o que há para ver. Depois voltarás a inverter o processo e voltarás a chocar com uma revelação. Será que não fomos claros? 2. Infracriptográfico, porque o sistema de decifrações e de escutas apenas tem atingido o iceberg, detendo-se na superfície das escritas e deixando por descompactificar o rumor das entranhas com o seu lindo lixo arcaico. Podes tentar ter uma ideia através dos anagramas do Saussurre, mas ficarás aparvalhado. Ousar interpretar não é preterir o nosso corpo (que também é o vosso environment) e os seus orgãos que não param de fazer coisas. Não conseguimos ler sem sermos criativos, sem a terrível fome de destruír, manipular, refutar, etc., etc. 3. Transmenipeico, porque entramos numa idade que atravessa o espaço deixado entre o não-dessacralizado; o único espaço em que ainda se pode rir, uma vez que o riso não está nele inscrito. Toda a nooesfera dialógica vê os herois multiplicarem-se na auto-destruição, ao mesmo tempo que soltam gargalhadas épicas. Para além do riso sobre o riso há casas para habitar que não são só citação ou silêncio? EDUCAÇÃO ESPARTANA (panfleto infraísta) A arte foi novamente invadida pela anemia da pintura & arredores e por uma submissão cada vez mais voluntária às instituições burguesas (galerias/museus/medias), aos caprichos do Estado (e os repugnantes estadistas!), assim como a uma classe trapalhona, muito mediana, que circula letargicamente no art world, como se fosse a estafada dona do seu nariz e do nosso! Os Gestos Canalhas repetem-se! A retórica nietzschiana ou marxista corrompe os espíritos! Invocam-se os situacionistas nos museus, por comissários que enchem de champanhe os pneus! E o pensamento vive a sua calma luxúria de Narciso em eutanásia prateada, roxa, convexa! Como é que o pensamento não pode ter pressa? Chega de conversa! A quem interessam as rosas vermelhas murchas? Quem quer revoluções falsas ou messias de aluguer? Quem quer burocratas a nivelar qualidades e oportunidades nas artes? Quem se enche à custa dos burgueses Foucault, Benjamin & Barthes? Morte à Pintura, coisa de vermes! assim como à escultura, videos, instalações, desenhos, grafitismos, fotografices, artes alternativas, coisas pseudo-malditas, fraudes performativas, sejam obras chiques ou cagadas nas sanitas A idolatria e os mecanismos que presidem às artes entaladas no mercado são os inimigos das transutopias que o progresso homeostético determina. É com uma diligente ordem de formas sobrebundantes, abstractas, elegantes e escuras que iremos impor a DITADURA DA LIBERTAÇÃO ARTISTICA (naif, mas na boa!) e a respectiva sociedade sem classas baixas nem médias, ou outras alternativas merdosas - Queremos uma única e altíssima classe! (para esses que teimam em nivelar o mundo por baixo, mesmo que seja o honrado e quase extinto proletariado, a nossa aguerrida brigada determinará as mais impiedosas perseguições, as mais lúbricas torturas, as mais crápulas execuções!) A arte hoje passa pela guerrilha total e desenfreada, pela guerra ao mercado da arte, aos crápulas abusadores do povo, e à exposição dos cadáveres de tais rançosos comerciantes, políticos e burocratas na praça pública. (no Rato, na Chiado, no Rossio, na praça Sony) para deleite estético dos enxames de moscas. A única arte verdadeiramente saudável é essa! TU SABES ISTO TUDO, e no entanto não mexes uma palha: gerações de idiotas voltarão a ter esta sensação a ranço escutando velhos hinos revolucionários ou hits de alguma banda rock muito alternativa e, zangados com os papás as mamãs a escola a policia e os colegas farão certos e inuteis actos de revolta, como quem tira um burrié e o come de seguida anarquistas de terceira agarrados à droga e à bebida! Oh doces zumbidos junto ao venenoso aroma! Arte igual a Guerrilha igual a Povo – o artista é o verdadeiro gatilho da Revolução, e não a delicodoce metáfora (género “a minha caneta é um arado, o meu pincel é um canhão”). A nós o estrondo e as dissonâncias da vanguarda, a nós os reequilibrios de uma civilização mais complexa, mais consciente, mais do "prazer", mas antes há que arrasar o obsoleto, o burocrático, o repressivo: perpétuo estado de guerra contra os facilitismos, os previlégios mediocres, a miséria sexual, a cultura de entretenimento e a irresponsabilidade social! A nós a vertigem da dizimação do balofo autómato que é o burguês e o estadista, seja liberal ou leninista, assim como o seu mais contraditório / característico representante: O Pintor! DO INFRACRIPTOGRÁFICO (um quase Metamanifesto) O Ângulo Recto desclassifica as catástrofes, mas não as suas formas, nem a sua impulsividade geométrica a) Toda a queda é um (d)efeito de òptica b) Toda a dívida é um trompe-l’oeil eco-nómico Logo 1. Não há mácula, nem marcas, nem traços, nem rasuras, nem condicionado, nem incondicionado. 2. Finalmente: não há escrita (ou inscrição), nem há ilusão para além da ilusão. 3. Que é como quem diz: não há quase nada: há o há. 4. É como se nos dessem um estado original, incontaminado, puro, embora contendo todos os híbridos. 5. Esse estado é a genealidade e sabedoria homeostética, uma sabedoria senil, demente, cómica, imatura, fácil. 6. A cada degradação também corresponde o seu inverso, como numa espécie de simetria neguentrópica para a entropia. 7. O Ângulo Recto é o que está sentadinho entre a Entropia e a Negentropia. Esta via é a inversa/simétrica do nihilismo de todo o tipo, mesmo o menos careta. A designação parece um absurdo mas é uma ginástica, quer dizer, uma forma discreta de contornar opiniões brejeiras e paradoxos mal-formados A questão está em determinar o Ser como imanência nos sentidos e o Não-Ser como incontrolável predação metafórica. Ou em assegurar a dupla impossibilidade da impossibilidade de ambos. O que não é lógico nem plausível. Logo real. DA CONTRADINDUCÇÂO GENERALIZADA (2 des-apontamentos-manifestos!) 1 (1985/86?) Contrainducção generalizada (teoria das fraudes elementares) 1. Estratégias reactivas (op-posição) - a determinadas caracteristicas formais, de conteúdo, temáticas, opinativas, etc., opor algo contrário que seja plausível ( a um estilo A, um estilo -A) 2. Estratégias falsificacionistas - introduzir desvios subtis que metamorfoseiam, simplicando ou complexificando certos estilos ou teorias 3. Estratégias repetitivas - através da insistência na redundância catalizar mudanças - plus c'est le même, plus ça change 4. Estratégias construtivas (constitutivas) - recombinar a partir de seguementos que alteram o programa e os sentidos implícitos 5. Estratégias des-construtivas - destruír, quer de um modo analítico, quer de um modo catastrófico (reduzir ruínas e fragmentos) 6. Estratégias sincretistas - combinar abdutivamente, intuitivamente, etc., familias de formas e de teorias diferentes de uma forma semi-subtrativa, como na genética 7. Estratégias comparativas - Criar minimos denominadores comuns, analogias, etc. 8. Estratégias semiológicas - Defenir tautologias e segui-las cegamente, como numa programação, um pouco como Soll Lewitt, mas sem ser exaustivo 9. Estratégias de inversão - operar através de quiasmos e outros dispositivos retóricos de inversão :ou, o que é o mesmo que dizer (tradução de tradução tirando o chapéu à tradução!) RECAPITULANDO 1- Determinar op-posições relativamente ao contexto de produção através de uma categorização férrea. Se o contexto é pluralista, delimitar os componentes escabrosos do contexto, inverter platónicamente as sensualites de ocasião. 2- Falsificar, mimetizar, absurdizar, desvalorizar ( o grande copianço cosmético, nem que seja das entrelinhas de DEUS ou dos silêncios das heresias), deslegitimar, parodiar, pedinchar. 3- Obcessão: criar nós de expressão, focos de atenção, padrões, environmentes. Mudar através do modal. 4- Hierarquização a partir do elementar. Back to basics. Grammar atomism. 5- Des-complexificação sem recorrência ao elementar. Só existe des-montagem ( como a criança que desmonta relógios, brinquedos, carros). Sujidade, erosão, impressionismo analítico, cubismo eclético. Ver tudo de meias maneiras. 6- Mistura e encaixe: estilo (histórico) visto como sequência (a cavalo de Kubler e Bateson). Montagem de in-sequências (estilo egipcio + estilo chinês, arte indiana + expressionismo abstracto, pintura rupestra + pintura naif, pop art + maneirismo). Exemplos ainda mais concretos: Caravaggio discipluo de Roy Lichenstein, Giotto vivendo na India no periodo Gupta, um Fídias dos anos 90, etc. Criação de irrealidades, de contextos ficcionais. Ou situações do género «como eu teria pintado a Gioconda, como eu teria filmado Taboo, etc». Não esquecer do copo misturador. Pedir emprestado à mãe a bimby. 7- Ecletismo: articulação de linguagens diversas. Nem fundamentalismo carnívoro nem vegetariano. Nem abstracto nem figurativo. De tudo um pouco. De Meca e Roma todos queremos o aroma. Ir à guerra e não dar nem levar. Ter cu e não ter medo. Foge barão que te fazem cão, mas para onde se me desfazem visconde? 8- Esquemas de sentido/ esquemas de produção de diferenças. Esquemas de esquemas. Anagramas de organigramas (queira dizer o que queira dizer!) 9- Fazer o pino através de máquinas literárias, estilo OULIPO, mas em selvagem: seguir as regras mais ou menos. Não estafar em busca da adequação perfeita a um constrangimento. Seguir a regra desregrando no seguimento. O constante regresso da história enquanto «não historiável» ( «é tudo uma questão de disponibilidade?»). A história é o momento carochinha da legitimação-ratão. A legitimação acabará por caír no caldeirão. Os valores de falsificação. Fraude fatal. Cuidado com as fraudes fatais! Cuidado com o cadáver inadiável do Braudillard que procria porcaria! Um pensamento de suspensão (de-fundado, meteoritico), mas não um pensamento enforcado no chaparro! A arte conceptual como pastilha-elástica metafísica a vender em quiosques. Arte como idiotia como idiotia. Ou: a escala (a grandalhona, não a pequenota!) é o contentamento! Contra a novidade e a diferença a todo o custo de vida ( que Novo para o Povo? Que Diferença para quem pensa?). Contra a uniformização ( contra as estéticas demasiado fundamentadas, assim como contra aquelas que vão para a cama com as mães delas sem tirar os chinelos). Fraude & Simulacro: o mimetismo. Fraudes a imitarem fraudulentamente fraudes - a civilização como macacada mimética. Porque é que o Renascimento é tão bom? Porque o mimetismo garante que quem macaqueia o excelente de uma forma natural tem fartura, ainda assim, de qualidades. Polvilhar Arte para o povo elitista/ lutar continuamente por uma arte para elites populares. Enfraquecimento da noção de verdade (in vino!), enfraquecimento ( e proliferação) de categorias (mas senhora, há que arrumar as ideias!), enfraquecimento das oposições ( enfraquecimento da «barra», da «razão»). O estado Post-paradoxológico: do double-bind à irrealização. A não-crueldade. Ser bom para os bichinhos. A não-crueldade como programa que perfere o poder de persuasão á força patêga das armas. Não, a cantiga não é uma arma nem é contra a burguesia! Os efeitos perniciosos da secularização. A masturbação retórica como reacção. Não se trata de deixar apodrecer o sagrado nem de apelar à intolerância como remédio totalitário para despejar velhos ressentimentos contra o oportunismo democrático. O sagrado, mascarado de superheroi underground, flameja nas nossas vidas. Robert Crumb regressa como santo e iluminador da Tora. O catecismo em banda-desenhada porca. Citações - A máquina das minguas costura sensatas linguas. Falar de : obra de arte total como os grandes triptícos, as catedrais, os arraiais. A obra de arte operática-buffa.A obra de arte souflé no Cabaret! A obra de arte feira-popular decadente! Falar da «recusa» de teorizar como dissuasão. Falar da recusa da recusa de teorizar como autobiografia falsa. A teoria é um secretismo para os outros que não nos pomos a bebê-lo... Ne me demandez pas de vous quitter, helás! Ne te quitte pas! Riso? Irrisão? Para tal diarreia: «transmenipeia»! Rosas? Rojões? - Só há duas soluções! Fraude? Ocultamento? « Infracriptográfico»! Frades? Faqueiros? - Maria de Medeiros! História submarina da Homeostética. Ao leme com o Capitão Nemo. O móvel na mobilidade. O mobiliário no imenso aquário. Raymond Roussel como paráfrase de Julio Verne. Simulação de sentido (Homeostática/Homeostética : diferença/diferança/diFrança - DERRIDA DERRIADO) Métis/Kairos/Enthousiasmous, ou Citta/vrittyi/nirodha? Amanhã anda à roda! 6=9=0 (úniverso cúbico/piramidal/esférico ) - uma analogia pede sempre má companhia, uma relação descobre tardiamente um meio-irmão. 2 (caderno preto) Contrainducção generalizada (outra variante) ou o estranho caso das contravenções malditas Je me bande! Je m'explique! Supor um método muito simples 1- Estratégias reactivas (isto é, fazer o contrário do que se está a fazer, do que um artista da «moda» está a fazer, ou do que se fez ao longo da longa arqueologia da História da Arte). Fazer ao contrário do ao contrário, em punhetismo dialético. 2- Estratégias construtivas (isto é, determinar linguagens «fechadas» a partir de regras simples ( Soll Lewitt) e articuladas. Efeito de jogo de cintura. Exige-se a defenição de interditos. Não se exige a indefinição das permissões. Cuidado com as papeladas das permutas. 3- Estratégias des-construtivas ( de desmantelamento de estruturas, formas e jogos pré-existentes). Tirar os tijolos? Teimar nas notas de notas de notas de rodapé. Escolástica de obra a fazer-se ao bife. Metalinguagem crítica a armar ao pingarelho? Conversa de café a altercar com as formas? Colagem cinética de vanguardas socegadas com instruções de Eisenstein às escondidas de Estaline? 4- Estratégia semiológica ( tentativa de articulação da linguagem a partir da ideia de «esquemas de produção de diferenças», que serão esquemas simples). Dicionários e catálogos de formas banais ou excepcionais. Atlas intermináveis de manias de que assim é que é. Mania das listas. Colagens com curiosidades de revistas. Warburg nos arredores. Cartografia pitagórica, tantrica e neo-suprematista das pulsões geométricas subjacentes. 5- Estratégia sincretista (mistura de estilos, etc. Reprodução, cópia, ecletismo mal-reproduzido, kitsch, etc.). A mistura é involuntária, como a missegenação. As mais belas misses são criolas. O processo neo-canibal em curso resulta destas fusões impredictíveis, e por vezes aberrantes, como o sucesso do capitalismo de Estado chinês. Establecer um sistema absurdo de classificação da arte de maneira a defenir práticas contrainductivas a partir de esquemas formais. Estabelecer vários sistemas lógicos, intuitivos, fundamentados de re-fabricar as civilizações. Um design muito especial que se estenda como um tapete devorante sobre todos os aspectos da vida-civilização-natureza-pluriversos. Nunca desdenhemos as singularidades! Pus na minha vida o que não cabia nas outras. Pus nas vidas dos outros o que não soubera caber na minha! Se não queres que as vidas alheias se ponham em ti, não vás à feira de Arte em Madrid! Caso contrário... PARAHERMENEUTICA (A FRAUDE NA FILOLOGIA) Se a hermeneutica retraça o sentido perdido/obscuro (a tal metáfora dúbia, cavalgante ovo de misteriosos bitoques) e advém de uma consciência dessa perca/obscurecimento, e da fidelidade canina a uma noiva mística (Ó Jerusalem! Ó lições de tenebrosas trevas!); a parahermeneutica, por erro, por delirio, por proximidade, por desfruto ou mesmo por estupidês; compõe um sentido fluído, uma teia problemática de ligações, um fluxo de equívocos (ou nem por isso), de abduções, que se podem adaptar à realidade como luvas se ela para isto os solicitar. Não estamos a sugerir uma arbitrariedade total no modo de ligar os fiozinhos e de apanhar choques. O leitor amigo está disposto a acreditar piamente, mas também nem sempre leva aquilo 100% cento a sério - é um pouco como a comunhão na missa. Mas toma-se e come-se. O modelo canibal é levado a sério. E porque será que não desatamos a rir? Estas interpertações, são quais novos bestiários de uma fauna monstruosa. O tempo, a patine, etc., encarregam-se de dar uma certa legitimidade, que não sendo necessáriamente cientifica, pode integrar-se nos cabinets d'amateur que fazem a história, com as suas deliciosas curiosidades. Da parahermeneutica exige-se apenas uma plasticidade dinâmica. Uma intensidade na argumentação, um certo strip-tease no display das metáforas, e no "estranhamento" (ah! Chlovsky!) que por vezes salta para uma dimensão cómica (ah! Bakhtine!), a muitas vozes caninas, como em certas práticas musicais maneiristas (contrapunto bestiale alla mente?). A verdade que desencadeia é como os tectos falsos que estão cheios de tralha. A mentira que pode sobrar é sempre o picante que será comentado com maldicência pela porteira e boa parte dos inquilinos diletantes. O jogo de cabra-cega encontra a verdade errada através de apalpadelas, mas por mais errada que seja não deixa de têr a consistência de uma verdade. Uma verdade cremosa como uma francesinha, mesmo quando reaquecida no microondas. O facto da verdade, ou o que se lhe assemelha, dar vontade de rir, não a iliba de uma certa intiligência, profundidade, e outros dotes vocais e filosofais. Que morra de seriedade quem o riso desdenha! A interpretação não é o único objectivo da parahermeneutica. Esta quando dá de chapa com uma coisa é suficientemente snicky para nem sequer ter a pretensão de achar que se está aproximar de uma coisa obscura. Provávelmente está a distanciar-se, a recuar às escuras, a gatinhar ao contrário em direcção ao útero do sentido. Mas o caminho que avança não será o mesmo que recua? Bom! Dizia que há outro modelo de avançar-recuar para a Verdade, isto é, inventá-la, construí-la, criar a realidade ou deformá-la para que o assunto se lhe ajuste. Mas há também a extrepretação, o rapto violento, inconsequente por agora mas fatal amanhã, como o rapto da Europa e outros raptos afins, caprichos divinos que mudam tudo, pontos de viragem insensatos que tornam os mortais na sua mortalidade mais dignos de admiração que os capangas divinos. Nada de cópias ou simulacros! Nada de pedir dinheiro emprestado ao papá e à mamã! A interpretação ainda tem o cuidado de ligar, de tecer, qual tarantula, os tenebrosos fios nos quais enrederá a vítima. Como diria se calhar Nietszche, admitir a causa e o efeito, é admitir que uma coisa se vinga plenamente na outra (ou não será assim?). Uma interpretação não pode ser um acto de recreminação/culpabilização. O tribunal hermeneutico-crítico deve dar lugar ao banquete parahermenetico. A Verdade faz sempre estragos letais, quer queiram quer não, e a sua vitíma principal, noblesse oblige, é ela própria! Na extrepretação há o saque, os templos incendiados à tocha ou à bomba! Que trabalho demolidor! Que glória vanguardista! O tempo que tudo desfaz acena com as suas mandíbulas sedentas, o riso selvagem dos glutões (do Presto?) arruina as pretensões conclusivas, e algo se escapa, se desvia, rompendo o cerco dos exércitos interpretativos assim como outras fileiras foleiras que nos atacam pelos flancos. A filologia, com todo o seu amor, repete sempre as suas declarações, tal como a filosofia, que é pura e simplesmente incapaz de arrancar as barbas postiças à sabedoria. Quer uma quer a outra têm os canudos do bom gosto na mão e mostram-se compreensivas, e às vezes até mesmo tolerantes para com os canibalismos extrepertativos. Porém a regra geral é o desdém hipócrita e conformista, de submissão total a uma sociedade picuínhas que prefere o ecletismo ao sincretismo por causa da mania da identidade nacional, regional ou individual, ou do internacionalismo ingénuo da 4ª ou 5ª Internacional. Nós preferimos a aculturação, a importação, o colonialismo, a mania do exótico, o patusco, a moda e o pitoresco. A identidade em que nos vamos fabricando coincide vertiginosamente com o aglomerado de não-identidades processuais. No rapto há uma cegueira fundamental, uma tradução apressada, um mimetismo súbito que se desvanece no reconhecimento de que este não passa de uma cópia ridícula, uma ilusão encantadora ( “Helena”, sempre Helena, transformada em Sofia, como o fez Simão o Mago), uma criança que descobre espelhos espelhando espelhos. Para raptar é necessária alguma astúcia e persistência, desejo e irreverência. Deixar-se raptar é tarefa de Ariadne! Tarefa em tudo mais nobre e de consequências extraordinárias, do que as decisões intérpidas de Teseus e de Dionísios. A arte de se deixar raptar, é a passagem do Outrem para uma pluralidade que já não é decedidamente algo alien, nem apropriável. Não é nosso nem alheio - é o entremeado. E o entremeado é nada mais nada menos que um fiat lux dos intermédia. Pode estar condenado ao fiasco. Mas é a salvação através da desorientação. (IN) CONTINENTES O incessante fim da arte Ou Os incessantes fins das artes Ou A arte dos incessantes fins (antes de nós – antes do “Isso”) Nos oceanos da tradução certos artistas subsistiam em ilhas, estabeleciam-se em litorais, contemplavam a costa com olhares soberanos dedicavam-se com um calor autofágico aos luxos de ver outras ilhas um pouco ao longe: contemplavam as suas cabeças nos ribeiros e sentiam fome fome fome fome. Consideravam a hipótese de um turismo imaginário. Por vezes cruzavam-se em embarcações com índigenas das outras ilhas. Falavam - "há espaços que se adensam para dentro e crueis criaturas para lá que nos querem devorar a soberania." Ser ilhota é saber que um dia os continentais quererão fazer dos arquipélagos um território suplementar. Certos ilhotas temiam não saber resistir aos tenebrosos poderes continentais, e aconselhavam-se em astúcias e preparavam guerrilhas. Outros, de traseiros olhos, babavam-se em arqueologias sem ruínas, sabiam que o passado é uma enorme pulsão que faz de nós príncipes inclementes, lobo que recusa ser cão. A busca interminável dos grandes comentadores aguça o apetite a ser comentado. Há que ser abstracto no que toca a mostrar as garras da actualidade. (qualquer coisa) Entretanto o Novo desaparecia enamorado da sua própria história numa rude anarquia de especularidades. A história era mediocre e o Novo um grito de ordem, slogan que ruge para si mesmo, cão que ladra mas não morde. Os artistas entregavam-se a simulações onânicas em magníficas performances. Compravam gravatas em saldos e comiam chicharros nas tascas. Os proclamadores do êxtase apocalíptico estavam satisfeitos. (princípio do Nirvana?) A obra de arte impotente perante os declínios do sentido e da verdade ( e seus derivados) busca saídas em corredores esfíngicos de postiços enigmas. Vai em viagens turistícas ao Egipto e planta eucaliptos em cima de eucaliptlos. A arte não é uma coisa deslaçada do resto, nem o refúgio paradísiaco para as frustrações que a sociedade e a natureza parecem prometer. A arte banqueteia-se no seu querer. É o isolamento conceptual e social da arte que a enegrece, e são os conjuntos de articulações entre a artephysis (como complexidade crescente e emergente e up-grade das forças criativas) que continentalizam a arte com o mundo, numa exuberância natural que não exclui as comunidades e as suas regras comportamentais. Unhas negras dão testemunhos canibais. Dramatizava-se o apagamento do sentido recorrendo a cenários tecnológicos, a memórias esquizificadas, a instintos aleatórios. A não-intenção toma duche de roupão. (having babys) Categorias liquidas, disseminação dos cultos da diferença e da indiferença. A solidariedade é o modelo burguês para manter a classe operária numa harmoniosa miséria. Sentíamo-nos alegremente condenados às vertigens risomáticas, a um simular desfrutante, a um inumerável apetite. As teorias francesas contaminavam as elites marxistas nas suas cátedras novaiorquinas. (estradas, excessos e palácios) A terra tinha tremido e voltava a tremer. Olhávamos de lado para as dis-posições fractais. Os fragmentos comiam ervas e as ervas comiam fragmentos. A ciência era doce, e os paradigmas insensatos. O criticismo era falsficacionismo mole. A vida parecia, de facto, um banquete. A terra e as plutónicas entranhas não queriam mostrar mais tesouros. Talvez se reservasse a um uraniano pudor. Talvez tivesse as cuecas muito sujas. Talvez tudo se tivesse dissipado. Havia também o esférico ser na sua suspensão brilhante com ciclistas a fazerem manutenção. O ser estava num sus-pendimento, com assustadores suspensórios. No meteoro de pensar / pender onde não há crueldade ou sofrimento mas apenas brilho. O brilho irritante de TOKALON. (the love of doxa and paradoxa) Crianças post-paradoxais. Instintos trans-menipeicos. Teatros infra-criptográficos. Contingências sigilares. Rizomas de subjectividades que cospem no Sujeito com S grande, e que se enterlaçam com outras subjectividades. A autoria, cultivada e anseada, confunde-se na partilha burlesca de nada ser evidente, da pluri-heteronomia entrar por portas romanescas e pitorescas nas várias vidas. Ou um desejo cruel, frenético, exigente de ornamentar com amáveis paraísos o vazio. (Continentes) Porque sim? Porque não? Porque sim e não! OS WAN-TANS DO 1º MINISTRO MANIFESTO SOBRE O ESTADO DESASTRADO DA NAÇÃO OU A ÉTICA DE MOTOCICLETA good-bye Boris!  said the smugller tudo o que é fixe é o que é (espinosa) tudo o que não é fixe é infelicidade de deixar de ser Em que é que se está a transformar o homeostético (ou as suas sucessivas e descontinuas reciclagens)? Num multissexual cibernético? Num academista vanguardista? Num professor universitário (que horror!)? Ou recaíu ele (tal como tudo) num banalizado produto das industrias artísticas contemporâneas? (ouvi dizer que nem por isso!) yes, Joe, não está aqui aquilo que procuravamos, que tal uma tequilla para arrefecer os ânimos? O Drama homeostético é o drama da Santidade: como permanecer íntegro (ou bizarro) nesta opereta post-moderna cheia de sexo higiénizado (mentalmente e na prática: tipo coito interrompido com lavagem de dentes intermédia e preservativo furado à mistura) e telecomandado (de Marte, está claro!), de galerias lindas de morrer com galeristas que NÃO vão para a cama com os artistas, (mas vão com curators e directores de museus) mais o sórdido mundo do ir para o engate até de madrugada depois de intermináveis flutes de champanhe? Como permanecer patetamente à margem disso? - dizia o tipo nas lonas com um olhar frustrado e não só, como os heróis wagnerianos ou os tolinhos da távola redonda? olha-me para estes gajos a armarem-se em espertos, Franky! não voltes a repeti-lo Joe, que isso não tem graça nenhuma! estes gajos estão mesmo a pedi-las, inspector, mas a Lei é a Lei! O único caminho (aquele que está inscrito no interior do cérebro lobotomizado) é na direcção do Paraíso. Um paraíso rebuscado, interiorizado nas atenções a que a consciência se permite: canção?), ou como "pensá-lo é diz a canção vivê-lo", como (qual uma comédia platónica que eleva a Belo acima das cabeleiras postiças e deixa confundir certos vapores da gramática com os cumes premeditadamente infinitos da glória de YHVH. Entretanto as motocicletas passam ao lado em busca de alegrias ainda maiores. Que tipo de santidade está a banhar o nosso comercíalissimo e falhadíssimo movimento? A Resposta pode ser: uma SANTIDADE HOMEOSTÉTICA CONCERTEZA! O HOMEOSTÈTICO prosta-se em estado de prece: é um manta religiosa (vulgo: louva-a-deus) fleumático: aqui o macho devora a fêmea depois do acto sexual e além do mais tem uns testículos dentados. Doem-lhe os joelhos, mas também não faz mal... A fêmea, louvável feminista, soube-lhe bem. O homeostético é também um GURU viboroso, como o Thimoty Leary: arrasta pedagógicamente as massas para o nirvana imediato, sem chatices gimnicas, sem complicações e sem LSD - é um guru mas não se dá ao trabalho disso. Fica em casa, lava a loiça, põe os putos na cama e responde aos e-mails. A ambição é uma alegria imoderada que encontra demasiados espelhos pela frente! O HOMEOSTÉTICO é um teórico em diáspora e é a diáspora na teoria: neste caso consulta o rabi errado e já fez a circuncisão mental entre a TORA e FREUD, embora leia Freud a partir da Tora e a Tora a partir de Freud. Está em toda a parte e sonha regressar (meia bola e força) à terra prometida. Comprende que entre estes dois atractores infinitos surge um terceiro, ESPINOSA. "O homem é um animal desejante". O que nele é promessa fica sempre na mira de novos desejos. O riso é a expressão gloriosa do desejo triunfando sobre os medos. Expressão caricatural de um caos cultual. Ou é um degredo? O HOMEOSTÉTICO é um dogmático paradoxologista: o que é no mínimo lógico, asseado, de bom tom, ainda que duvidoso. é um estado-novista ridículo na infância, um adolescente marxistaleninista, um liberal muito liberal na idade madura e um céptico frenético depois disso. Do Estado Novo só retém o fascismo de fachada, modernista e remediado, e a retórica esclerosada e nem por isso múltipla. Monumentalismo a condizer com o Portugal dos Pequeninos. Do comunismo revolucionário mantem a esperança num futuro orgástico, em que a sociedade sem classes se confunde com um mundo altamente sexualizado, hipercriativo, e, ao fim e ao cabo melhor, o melhor possível na sua poliformia revolucionáriamente perversa. é um orientalista depravado que olha para os diccionários de sanscrito com os olhos postos no deboche estático de Kajuraho, nos diagramas jainistas, tantricos, tibetanos, no sensualismo infinito que torna massajante o caminho par o Absoluto. que tal as gajas? eram boas? sim, Slim! só é pena que estejam mortas! A REVOLUÇÃO FOI FAZER UMA PERMANENTE AO CABELEIREIRO! Estudamos o passado para que ele não se repita como uma comédia de comédia? Ou estudamo-lo para apreiçoarmos as comédias vanguardistas? Os dramas abismais são àguas de outrora-agora. O dilúvio foi uma metáfora politica para lavar a roupa suja que nem sequer chegou a ter uma pitada de graça. Bof!! O santo assiste a isto tudo com serena indiferença: OS APOCALIPSES SÃO PARA AS MASSAS! A SUA CINEMATOGRAFIA É DE PÉSSIMA QUALIDADE! afinal que o que é que a política ainda tem para nos oferecer que os homeostéticos ainda não tenham prometido? todos os sistemas políticos têm sido a caricatura de algo continuamente inadequado, entre os salvadores anúnciados e os inimigos fidagais do povo! nota: assinalar com uma cruz as respostas no fim do inquérito quando o houver As eternas moscas, as andorinhas e o verão. A vinhaça numa tarde debaixo de um sobreiro. A cascata refrescando os vidoeiros. Cantar uma cançãozinha no banheiro é legau! Tudo isto desperta no santo um sentimento do admirável, do Novo, do irrepetível. Floresta de sensações, dirão os denegridores, incapazes de compreender o deleitoso racionalismo que faz mover a maravilhosa máquina de mitos. Do Homeostético Homeosteticus se pode dizer que: 1. tem uma disciplina de Kamikase (mas tem um kamikase muito indisciplinado na familia) 2. está em tudo (e tudo está nele porque ele está a dar a dar) 3. é desperdiçador (embora não seja chic e consiga ter tinta liquitex nas calças) 4. tem a ironia de um esquiador mas não pratica desporto, muito menos de "inverno" As nossas prudências são moralíssimas. Tudo parece surtir certos efeitos, se bem que estes sejam incertos. Nada de resignações, de golpes baixos, de castelos espanhóis, de mercado negro. Se falamos de paraíso não se trata de propaganda e muito menos de escassez de ideias. Falamos porque falamos. Astrológicamente (vide Madame Min in “Mickey” nº 176, edições Abril Cultural 1973) estamos condenados às delícias paradísiacas, ao néctar, à ambrosia, aos cálices sagrados, aos pasteis de nata e à paz de alma, mesmo quando acenamos com frases guerreiras. A vanguarda é o apetite desmesurado, o amor canibal por tudo, como quem procura a teta da mãe na variedade ameaçadora do mundo. Julio Pontinha etait un porno-inteléctuel portuguais e nós gostamos de lençóis bem entalados e o que é que fizeste aos cadáveres? foram para a picadora, chefe! a minha mãe precisava de carne para uma lasanha! Há os que gostam de passar ao lado das florestas de Utopias, os que as gostam de se roçar nelas e os (h)eternos insatisfeitos que deliram com atopisses. O Homeostético, pelo contrário, é um perpétuo satisfeito que finge buscar a Harmonia como quem faz ginástica de manutenção nú. Tornou-se um novo velho mestre à custa de cabelos brancos. DEPOIS VÊM OS CRÍTICOS FAZER FICÇÃO, TELENOVELEIRAMENTE! Até à Vitória Final, Camaradas! LES ANIMACULES HOMEOSTÉTIQUES ou vai ou racha o facto de lhe chamarmos arte talvez possa ser arte mas é uma arte como mero fait-divers da consciência A Homeostética é/foi/será uma anima-colagem feita por animalcooólicos. As vanguardas não são sóbrias. O espírito é uma colagem. A luta é longa! Morram os pastiches! Cuidado com os reaccionários, os tanáticos e os sublimadores! Não temos sede (nem esperança) de novidade, pelo menos aquele tipo de novidade de que todos estão à espera para andarem atrás dela. A única novidade é morrer, e morrer é um absurdo garantido. Porém tudo aquilo que nos afasta do novo merece um profundo desdém. Que a arte está sempre no fim, no exacto ponto final de si mesma, com poresdo-sol hegelianos e outros ilusionismos crepusculares não temos dúvidas. É o mesmo que dizer que tudo está no ínicio, no ultimatum auroral com que ELOHIM fazem (plural bíblico) a Luz. Bereshit. Que a arte e a vida não têm fim nem príncipio parece-nos uma evidência clássica, comentário catita de apocalises, como quem não se desassossega com pechisbeques e lógicas malucas. O "pensamento é radicalmente metafórico", e como não me livro de metáforas o meu corpo deixa que elas floresçam como algo primaveril e surpreendente. Basta pensar. Augusto Barata, por exemplo, também se fartou de morrer (mas quem é Augusto Barata ⇒ vêr os aforismos do mesmo em página a determinar). A Exposição CONTINENTES cheirou a megalomania. Escala como conteúdo, conteúdo como colagem. Dedicatória singular ao Zé Ernesto em vez de textos sérios a sério. Nós cheiramos a des-mesura (e a mescal!): a medida com que as medidas têm que se medir. Para explicar este híbrido sentimento da “hybris” recorremos ao estafado fragmento de Protagoras (com muito molho heideggeriano e anti-heideggeriano). Isto é, o nosso excesso é a medida de todas as coisas, quer daquelas que são e parecem, quer daqueles que não são nem parecem. O nosso excesso é a intimidade de sermos cada um e de nos contagiarmos a todos - entre o mimetismo, o pastiche, a citação e a colagem. Toda a pseudo-simbologia faz pensar nas manifestações do nosso autoritarismo pró-fascista de finisterra ( numa altura em que o mundo já não tinha ponta por onde se lhe pegasse, i.é, nem principio nem fim), nos salazarengos anos quarenta e no saudoso mas não saudável MUNDO PORTUGUÊS. Falar do que nos precede é não ignorar o testemunho de quase cinco séculos de experiência que se concentraram caricaturalmente numa cultura com que fomos bombardeados na infância. Experiência deslaçada do mundo "mais avançado" deslaçamento que permite perceber a alienação desse mundo quanto aos povos ditos "atrasados". Fomos educados dentro dos ternos canones de um colonialismo carrancudo, contido e por vezes simpático, de uma pátria ultramarina com as suas províncias e rios que cuidadosamente decoramos. Um absurdo explendor geográfico com o seu quê de exótico. O nosso Salazar era um velho ridículo com voz tremida e os presidentes da républica cortavam fitas para os telejornais. Colonialismo de que somos culpados, sim senhor, mas que decedimos esquecer, entregues os territórios aos revolucionários indigenas, às suas guerras civis e consequente ruína económica. A Mea Culpa não basta! Alguns de nós nasceram nesses PALOPs (que designação mais neo-colonialista!) ou por lá andaram. A diáspora portuguesa foi naif e evangélica. Nós não somos naifs nem evangélicos. Somos mentalmente retornados e espoliados, e no entanto sem nenhuma vontade de voltar atrás nem com lágrimas de saudade. Não nos reconhecemos num país que é algo a desparecer: uma montagem de demasiadas épocas, todas fragmentárias, que se encavalitam como falhanços, umas em cim das outras. Somos retornados como todos os portugueses, mesmo sem o saberem, o são. Como Ulisses, regressamos sem glória à amada pátria, onde alguns cães nos reconhecem. Esse retorno, esse Nostos, é o retorno a partir do qual já não é possivel retornar, como dizia Kafka. E uma fatal diáspora habita-nos defenitivamente. Essa diáspora é o mundo em fragmentos, e são esses fragmentos que voltam a escrever o mundo, que se viram contra a noite e o ressentimento. Esta exposição é a cartografia de um imperialismo imaginário, sem territórios, e se quizerem, para animar os intelectuais francófonos, nómada. Não é uma sublimação, mas antes o contentamento de os vários filões do mundo não serem a sombra de uma subjectividade que os visita e os vista com roupas de pronto-a-vestir, mas o haver a possibilidade de multiplas heteronomias reinventarem, ainda que equivocamente, as lições das conexões fracticídas do planeta. O fascínio do exótico num mundo sem exótico? “Já por diversas vezes imaginei escrever um romance sobre a aventura de um yatchman inglês que em virtude de cometer um ligeiro erro de cálculo na sua rota veio a descobrir a Inglaterra, sob a impressão que se tratava de uma nova ilha dos mares do sul. Haverá, provávelmente, a impressão geral de que o homem que desembarcasse (armado até aos dentes) para implantar o pavilhão inglês nesse barbárico templo que passou depois a ser o pavilhão de Brighton devia ser considerado doido.” (Chesterton) O exotismo e a novidade são pouco mais que isto. Esta exposição é como uma esponja a redimir toda a ironia a que se possa assemelhar. Absorve, absorve, absorve. A ironia nunca é essência mas um método retórico que denota um certo pudor. Pode-se no máximo falar de uma paródia das nossas instruções primárias e dos quintos imperialismos que vão do saloio saudosismo às megalomanias místicas de Fernando Pessoa. E pode-se falar no desejo de glocalizar sem deseperos, sem caír no miserável internacionalismo de sermos mais um epígono local das provincianas disputas dos centros artísticos supostamente mais avançados. A curiosidade a que geográficamente estamos condenados, é exotismo para camone ver. Mesmo na era supostamente post-colonial, as revistas mais esquerdistas continuam a olhar para as periferias como para uma ingénua curiosidade, a frescura do nativo, a curiosidade patega, o pormenor fetichista do aculturamento. Desde UM LABREGO EM NOVA IORQUE que invertemos o nosso olhar sobre o exotismo de sermos exóticos a olhos alheios - absurdo exotismo complexado do atrasado que se revê atrasado. Não se trata de mostrar um Portugal que se olha ao umbigo ou que espreita o que o Atlantico permite espreitar, com a convicção de que o mar é uma prisão que não faz viagens trasatlanticas. Trata-se de dar a entender que o local que habitamos faz parte de uma série de ficções que se conectam a outras tantas ficções. E que o olhar ficcional sobre a localidade é um pouco como os romances de Saramago, uma equívoca, ou inequívoca, possibilidade de nos transformarmos em mais mundo. Isto mata todas as nossas descrenças numa cajadada. A INCONTINÊNCIA DOS «CONTINENTES» Fartos Do bocejo Do fumo Da honestidade protestante (com o inferno ao fundo!) Da desonestidade católica (com confessor ao lado!) Dos marchands (e suas brancas paredes!) De certos artistas (e seus caniches!) - oh excesso de galerias! - oh bolachinhas do capitalismo! - oh pralinês comprados no chinês! Deixem-nos ser fraude de fraude Deixem-nos ser tranquilos empresários que se empreendem de si para si e se vendem na auto-consciência, e na mais secreta autobiografia e na frustrada consolação de glórias evitadas e suspeitadas genialidades interrompidas ou deixem-nos passar por agricultores astutos e ecológicos Deixem-nos ser idolatras que amam mesmo ídolos e acreditam com carinho que as imagens provocam milagres. Deixem-nos ser falsos mendigos Intoleráveis forretas Os artifices da dissimulação!!! Não, não, isso não! TODA A ARTE É FRAUDE DE FRAUDE! diz (despudoradamente) Pedro Portugal TODA A ARTE É RAPTO DE RAPTO digo eu ou uma delicada estupidez ou uma exigente coragem de voltar a ser intiligente Queremos continuar a repetir frases: frases meigas e intolerantes. Frases duras e concertantes. Frases flexíveis e desconcertantes. E dar-lhes a consistência de uma obcessão maligna, de uma publicidade sem objecto. Nós temos corpo: temos um eu, ou vários, indissociável da Carne & alguns inchaços prazeres arrepiantes estomagos a dar voltas peidos malcheirosos súor ora frio ora quente dentaduras a tenderem para postiças lucidez extravavagante consciência supremamente ateísta Temos sobretudo a vertigem da ginástica e do MÚSCULO! E a nostalgia maquiavélica da moleza. Toda a arte é simulacro de fraude? Toda a fraude é simulacro de arte? Mas a Arte interessa a quem? A Arte dissimula a fraude e o simulacro? A Arte é a possibilidade de escapar à fraude e ao simulacro? Is artless art? Is art artless? Fizemos mais uma última exposição: e voltamos a fazer outras: epitáfios sobre epitáfios - palimpsestos que vulgarizam a solenidade de qualquer "FIM" Explosão sintética de machos a extinguirem-se na exuberância adolescente, Prótese anónima de riso sobre a arte demasiado preocupada com as suas exéquias E o depois. E o depois do depois. E desprezamos todos os vícios espetaculares De que se alimenta A HISTÒRIA! O FIM (qualquer fim) A QUEDA (custa a levantar!) As catástrofes finais (vistas em contrapicado!) Os invernos nucleares (nem quero pensar nisso!) As guerras (há quem as exalte a sério, porra!) O nihilismo (less than less) O terror e as metáforas jornalísticas (o pior de tudo!) O Estado, falido ou subsidiante foram vazados para o cano de esgoto da nossa cinematografia: não ficou nem pedaço de pelicula trucidada, nem ganha-pão nos arraiais da memória: este CONTINUAR é a comemoração das roliças rupturas, as vindas, as desavindas e as vindouras as enviadas, as enviezadas e as vadias o aumento das gargalhadas o choro de alegria o estar-se consigo e com os outros a vida a precisar de crescendos e diminuendos eis o principio da inocência: da grande inocência DO TERRORISTA & DO CANIBAL!!! DO CONFORMISTA & DO VEGETAL! Agora que o que fazemos é discussão do que não se virá a fazer, podemos pensar com toda a não-crueldade necessária: Quando os marchands se humanizam dá-nos vómitos Quando os nossos amigos se queixam do seu maravilhoso oportunismo que reina nestes arredores de aldeia que é a nossa querida arte nacional ou da um pouco menos querida citadela da arte internacional e se indignam com o (im)possivel aplauso a tais saloias manhas dá-nos vontade de ainda assaloiar mais de ser eterno labrego & osga nas bocas públicas! ANTES CÚMPLICES DA VIDA DO QUE EUNUCOS DA HONESTIDADE!!! E o que hoje impera é este eunuquismo sem erecções físicas ou mentais Este caminhar habilidoso na corda-bamba para uma honestidadezinha & O SENTIMENTALISMO O EU A HEROÌNA O BEM-COMPOSTO AS IMPECÀVEIS CITAÇÕES AS POSES DO CONTRA DO A FAVOR & DO PÓS! NÃO! NÃO! NÃO! Oh doce Educação Espartana, o que é que nos ensinaste? A nós as ACADEMIAS da indisciplina muscular! E o extase sem excitantes artificiais Sem eterno-feminino e sublimações ao luar Sem o desejo quase até ao espasmo de revelações definitivas que tornariam aborrecido este eclodir perpétuo desonrada de algo que é desocultação do inocultável. A nós o eterno combate a este alcoolismo punheteiro que estrangula as artes e o mundo! Oh, Musa antiga do grande Cesário Verde! Oh, Musa ainda mais antiga do Teixeira de Pascoais! Oh, Musa anterior às Musas dos Órficos e do Pessoa! Oh campo! Oh cidades! Oh nocturnidade! Oh beldades! (sempre diferentes, sempre outras!) Com esse cheiro denso Essa elasticidade de pele: amazonas desta interminável guerra SEXUAL Tecnologias absurdas e amáveis! Flores abrindo com nómadas perfumes: inchando a pele tentacularizando as nossas acções para as procriações futuras! Oh Orkhidolos Arkhidolos sem Arkhé e de hierarquia flutuante! Pulsão vegetaliforme e orgástica! Ebrieade multipla enredando as cordas do pensamento ou salto de liana para liana. Oh! Éden troglodita de fofas mamas! Oh, mau gosto às vezes Como somos saloios Pequeninos Repteis multimiméticos Em suma Adoradores in loco do que nos rodeia! Como somos pedaço de estrume Grunhido Víbora no leito de Hércules Homéricos sem a nostalgia de antigas grécias Apóstolos do contorno e druídas da vaguidão Operários das formas puras e agentes secretos do Informe Semideuses muito humanos E porque não? O MEL, A CORTIÇA, OS CARACÓIS! Há que implantar RÚSTICAS ACRÓPOLES! Ornamentadíssimas, florais! BABOSAS BABEIS SUBTERRÂNEAS Estátuas, tão colossais quanto ínuteis! Colar os restos dos deuses com o nosso cuspo! E pontapeá-los dizendo «porra, levantem-se mandriões!» CRISTO FEZ POUCO! NÓS MERGULHAMOS DE NOVO NAS ÀGUAS DE UM POLI-ATEÌSMO, NO SENSUALISMO IMODERADO DE A NATUREZA SER UMA DEUSA QUE NÃO È DEUSA COM A QUAL COPULAMOS PERMANENTEMENTE E OS OUTROS DEUSES NÃO PASSAREM DE NOSSAS CAPRICHOSAS MARIONETES, NOSSOS URSINHOS DE PELUCHE! FROM CROCODILE ISLANDs MAKE MY HEART A BUDONGUIAN MIX “Gaogaogaone! Tapaa! And the stellas were shinings. And the earthnight strewed aromatose. His pibrook creppt mong the donkness. A reek was waft on the luftstream. He was ours, all fragance. And we were his for a lifetime. O dulcid dreamings languitous! Taboccooo!” (Joyce, F.W., óbviamente) As geografias heterogeneas, délficas, fracturantes, mas de uma sintaxe (predisposição militar) marcada pelo espectro secreto e insurrecto da educação espartana. Todas as fragancias nos chegam como canoas que viajam de Oceano para Oceano carregadas de pequenas catedrais. O artista transporta-se como obra de arte. O seu corpo é arquitectura, templo híbrido, ao qual só ele mesmo se sacrifica. As ilhas são como boomerangs: penisoladas ou phenixolares. Renascem da sua masturbação e regressam com a vaga sensação de não pertencerem a nenhum arquipélago. A Oceania espalha-se nos seus pequenos pontos com japoneses aguardando o fim da segunda guerra mundial. Ter espaço como pequenos pontos que comunicam residualmente em morse que não é morse. Imenso azul sobrando ao mar e ao céu. Azul mais azul que o azul. Há uma obcessão partejante, sibilina ou socrática. Há uma vontade de entrar na cor como num extase cruel, e tornar a pintura um animal post-apocaliptico, lento, como a velocidade sensual de certas drogas. Os crocodilos confundem-se por vezes com as baleias. Exemplo (vejam-se as enciclopédias), o Leviathan. Poderiamos falar das baleias do Nilo e das canções amorosas dos crocodilos. Podiamos considerar que no crocodilo há vertigens futuristas, um caracter incendiário que vem de passados demasiado remotos. O que constitui sem sombra para duvidas, dada a sua lentidão, um crocodiletantismo. Consideram-se também os crocodilemas (da crocodilematologia), e toda uma rede interminável de capturas furtivas, pelo menos aos olhos da lei. E a lei é lei, embora dure dura. Aí os signos resignam-se. Deixam-se investir pelo vai e vem do Pudor. Ou inventam-se com exuberância produtiva, como quem se descobre actor no meio da selva e desata a gritar insensatamente. Como tal brilham (they are shinings) como pérolas asiáticas. Ou estelas. Ou por sua vez esses génios seledas por Salomão e predestinados para o esfreganço adolescente de um Aladino. Perto de Budonga ( in Samoamnésia) alguém proclama a independência de umas tais “crocodile islands”, convertidas rápidamente em Republica Popular das ditas cujas. A autonomia desejada apenas garante a guerrilha permanente implicita. A independência é a recusa de Estado. Ilhas anárquicas, sem tribo, e com mitos demasiado absurdos para acreditar. Nós, exilados à força, contentamo-nos em admirar a energia dessa gente. Energia erótica de quem ouve canções sobre Dante the Aligator & the Squizofrenetic Girls. Canções mistas de paródias de "cargo cults". Os orientalismos são tão rápidos quanto a economia de mercado. E a economia de mercado é um monstro mais inconsistente que os tigres de papel é a vertigem dos espelhos que se espalham partidos. O dinheiro multiplica-se como uma miragem que parece engolir o mundo, mas não passa de um efeito de òptica. A economia do mercado entra dentro de sonhos de gurús perversos, de feiticeiros impotentes e de velhos mandarins comunistas. Mais uma vez a deusa da Ilusão faz do Mundo um dos seus orgasmos múltiplos, e a forma dita oriental, fumegante como o òpio subindo às narinas dos deuses, torna os laços do mundo mais líquidos e vulneráveis. Mas os autoestradas de Moira são eternos. E como as civilizações se tornaram mais crioulas as cidades sagradas têm que arder, arder, arder. E os crioulos percebem que é por causa delas que há intolerância. Das suas ilhas levam tochas para incendiar os interditos. E tudo ficará mais misturado para sempre! METAMANIFESTO AB-SINTO (sentir até caír!) Ab-sinto (ab-sentes?) Eu sinto os dentes quando os escovo. Tu sentes quando beijas algo de novo? Ainda me continuas a amar como antes ou preferes ir comer lavagantes com meia-dúzia de amantes? Basta de look e de comércio! Basta de glória a prestações! Basta de hipotecas de ilusões! A arte que se vende não presta! A arte que fica escondida é indefesa! A arte que não se vende também não presta Espelhos barrocos onde são deformadas As orelhas de Bugs Bunny (Bubs Funny) Vontades de dormir sestas com muitas mulheres! A minha musa retorce-se no calendário. A sua orelha tem um recorte fabuloso As suas pregas estendem-se como autoestradas Atapetados de pele e súor. Os seus brincos são pechisbeque Como a arte moderna (to be a good artist is to sell?) Mas a sua lingua é marota Como a arte moderna (to be a good artist is to be there?) O grande artista olha para a arte de longe Depois resolve dormir outra sesta: No seu estômago Agitam-se dinossauros, Nos seus sonhos sussurram orquídeas fotografadas pelo Maplethorpe. Quem é o grande artista? Ele aceita o estado de coisas, mas não se conforma. Ele lava o cabelo com shampô E lê livros sobre a contra-reforma. Enquanto todos bebem cerveja Ele esquece. Masca chiquelétes piquena! Masca chiquelétes piquena! O seu estado é um Grande Esquecimento Cómico, A sua arte parece inconsistente como as nuvens, A sua arte parece brejeira como piadas porno, A sua arte parece pretenciosa como contovérsias escolásticas, Mas ela é a mãe dos espiritos, deuses e mensageiros Que governam os destinos dos bebedores de cerveja. O grande artista vai ao barbeiro Para cortar a barba – que interessa a sua barba? A arte moderna é como a barba do grande artista Ela deve ser cortada de vez em quando! ALGUMA PSICOLOGIA DO NOSSO SÀBIO GURU (re-escrito com a mão esquerda) NIRVANAS BUDONGUIANOS SUBTILEZAS A higiene da alma exige subtis cuidados. Todo o mistério do universo está contido em BUDONGA, a poderosa palavra que repetida de modos diversos enovela o mundo, as sensações e a experiência do suposto Absoluto. Alegoria: dois homens andavam à procura de uma toca para recitarem BUDONGA quando, ao passar, uma ervilha subtil os vislumbra  “Meu Deus, e se eles ainda abusam da hospitaleira Cornélia, a chavala de Prudêncio, o coelhinho côr-de-neve?...” Então a ervilha vai pedir conselhos ao guru Silva, um cágado cheio de tédio que vive num magnífico pantano asséptico. O cágado, subtil mestre da Ausência, apenas diz  “O Universo é um charco subtil, beliscado constantemente pelo vento, pela areia e por milhões de criaturas, onde nos espelhamos, ora quase cristalinos, ora imensamente turvos”. Ao que a ervilha replica:  “Que vaidoso! Do que tu gostas é de tomar banhos, e se o universo é um charco então eu sou uma foca amestrada!” “Plim!” Ouviu-se de seguida. E a ervilha transforma-se em foca amestrada. O que é que irá acontecer aos homens? BUDONGA é algo de tão poderoso, que qualquer verme que contemple a sua subtil beleza rastejará até ao fim dos tempos. BUDONGA não exige competências especiais aos seus recitadores nem um comportamento ético exemplar. Cumpre-se naquilo que é: vibração cruel e paradisíaca, onde os ventos do vazio sopram inclementes arrastando os recitadores para um Nirvana involuntário. Por BUDONGA tudo se opera. O Nada surge como um imenso pulsor, o tudo como um subtil divâ “molaflex”. BUDONGA é um produto genuinamente HOMEOSTÉTICO. Não é barato, é de borla! Como quase todos ps produtos desta marca. BUDONGA é a negação implacável da dúvida, e o remédio mais eficaz para a doença e a morte. Quem ousa duvidar está condenado a Suplicios Budonguianos. Sodomização até a um estado de moribundo por uma bem dotada tribo da Àfrica Austral. Se os labirintos de BUDONGA são insondáveis, então todos os caminhos vão dar a BUDONGA. RECITAR PARA CRER! ÂNSIAS RUIVAS NOS CAMARINS UM METAMANIFESTO TÃO EQUÍVOCO QUANTO OUTROS e à sombra do cavalo do Imperador jazia Wang coberto de moscas Como falar das proezas HOMEOSTÉTICAS? O extermínio dos ascetas, os bastidores do estrelato montado numa motocicleta, os ímans e o batôn, a mestiçagem de mestiçagem? A qualidade das nossas inflexões militares? De uma estratégia imparável digna de Sun Tzu? Ou de fracassos premeditados de forma a chegar ao poder através da fraqueza? Poderemos deixar Jerusalém apodrecer a nossos pés? Poderemos abandonar Thais numa infecta cabana de anacoretas tarados e adormecer em Limousines junto a um casino em Las Vegas? Poderemos ser ângustiados estrategas de outra suave, e fria, guerra? NÃO! E NÃO! E NÃO! A HORA NÃO É DE PARADOXOS, É DE POST-PARADOXOS! A HORA É DE SEIS IGUAL A NOVE IGUAL A ZERO! • AFINAL O QUE QUER ISTO DIZER? AFINAL O QUE È QUE ISTO PODE NÃO QUERER DIZER? Que o Génio não se fecha em latas de brilhantina (nem de atum), mas que existe na fermentação/catapultagem de toda a condição Neo-neo- Homeostética? Condição em construção, eterno work in progress, retorno da complexidade vanguardista contra o minimalismo burguês. isto é na redução do estrelato, no vínculo a uma moralidade anacatastrófica, na indiscrição e no violento PUDOR! Nasceu-nos o vício da predição e (ainda por cima) as profecias estão em sintonia mesmo nas inflexões mais imbecis... Imbecis... Imbecis... Imbecis... (repeat) Tal como a torneira oracular de Delfos nada mais fazemos do que mostrar. Já dizia o velho Heráclito!... Mas não acreditamos que as harmonias sejam formas de ocultação. O que não conseguimos ver só resplandece no festim do visível. O que antes era invisível tem-se vindo a tornar tremendamente visível, desde o mundo obscuro ao macroscópico. As interpretações, o sentido, os absurdos destinos que a semântica gera, isso, tudo isso, pertence a uma moralidade outra com a qual só nos cruzamos nas horas vagas. São a racionalidade da nossa desatenção! São vulnerabilidade da nossa atenção. (VOZ AUTORITÁRIA) «Tudo o que dizemos é para decorar, para repetir! A grande libertação está formulada antes do príncipio. Não há nada para compreender! A compreensão deixou de ser uma necessidade, uma exigência, um facto absoluto e cristalino para ser relegada para um cenário onde se amontoa mobiliário podre de tentativas de chegar a onde já estavamos!» VOZ ANTI-AUTORITÁRIA "Nada do que que dizemos é forçosamente repetível, tudo é para reciclar, reinterpretar, aprofundar! Não há nada que esteja definitivamente compreendido. Nada é incompreensível. Os equívocos do entendimento tornam-no mais interessante. No entanto as coisas são luminosas quer na procura quer na nãoprocura. Procurar e não procurar são ornamentos reciprocos de um festim dado pela artephysis." HOJE, MAIS DO QUE NUNCA, AS COISAS COMEÇAM E ACABAM NA DESCONCERTANTE CARTILHA HOMEOSTÉTICA - é o que estás lendo enganado leitor! NO SENTIDO EFICAZ DE ESCOLA, DE SOCIEDADE SECRETA OU de ACADEMIA! NÓS NÃO PENSAMOS NÓS SABEMOS! NÓS PENSAMOS SEM PENSAR, NÓS SABEMOS SEM SABER! E de que serve a mecânica ditirambica do pensar quando em cada inflexão vocal, em cada gestualidade mínima, somos porta-vozes de tudo quanto já foi pensado, de tudo quanto não foi ainda pensado, de tudo o que é impensado, de tudo quanto ficará por pensar, de tudo o que no pensamento é recusa de pensamento, de tudo quanto no pensamento excede (olá se excede!) o pensamento? Como tal o Homeostético é partidário do Totalitarismo esclarecido/ iluminado, ou do Pluralismo semi-obscurecedor, ou ainda de uma desperada crítica apocaliptica e politicamente radical, ou de qualquer modo de transformação artística da arte, da sociedade, do modo de vida, e outras tretas que os manipuladores gostam de vender. Perante tais convictas ganas dúbios são os caminhos da investigação prudente! Perante um idioma como este os babelismos são criptografias primárias! DA CULTURA NACIONAL NO QUE NOS DIZ RESPEITO a bem ou a mal da Nação! Aceitar os males do reino é ser monarca do Universo: vociferou um dia Lao-Tsé (ou Lao-Tan, ou o raio que os parta!). A questão Homeostética está em rever o corpo (devidamente maquilhado) das insignificantes mitologias locais, pessoais, grupais, não na sua negatividade (ò Tchuang-Tseu, ò Scotus Erigena!), mas como qualquer coisa susceptivel de se perpétuar, de ter sequência, de se articular não só como brejeira fábula que parece interrogar incondicionalmente o homem assustadiço, como indiretamente questiona as restantes (e por vezes delirantes) formas de consciencializar a consciência. A Tradição Moderna recusa para poder afirmar, a Tradição Homeostética afirma para poder recusar. A Tradição Homeostética sabe que as coisas não podem ser não-coisas. A Tradição Homeostética aceita a Tradição Moderna como a cartografia de esquivas recusas, de frívolos "nãos", de uma forma de se despir até encontrar um prestigiante e pornográfico Vazio. Nós coleccionamos esses Vazios. Nós somos recusa vanguardista a partir de um honrado acolhimento do caracter obsoleto de cada uma das modernidades. O que se veio tornando inútil renasce na Doxa, como exigente exercitação ou como liberdade desfrutando a liberdade. Nós recusamos a partir de uma situação de extrema riqueza, como se doassemos precisamente aquilo que mais adoramos. Que universalidades se podem constituir dentro deste território ilimitado em que vagamos? Que curiosidades ficam? É o mundo de Eça, de Agustina, de Ross Pyn, de M. Oliveira, de Saramago, de Damásio, de Tavares, de Herberto, de Batarda, de César Monteiro, de Jotta, de Vieira, etc., etc. Ou será o mundo de Hollywood filtrado pelos olhos de olheiras saloias e da cassete-pirata? Regresso ao território, a que nós, lisboetas, homeosteticados, cada qual como cada qual ora pois e tal, acossados pelo espectro de Ulisses/Odisseus, aquele que demora mais que os outros a regressar, que é ninguém e que ninguém reconhece, talvez nunca possamos regressar, porque somos outros ninguéns e nem nos espelhos nos reconhecemos porque nos tornamos no pluralismo autobiográfico estranhos a qualquer unicidade parasitária da subjectividade, embora mantenhamos um Eu amoroso ou colérico que nos atira para actos maravilhosos e insensatos. Por isso o nosso território é mítico, é essa tagarelice de geografias fantásticas, de mentiras de Fernão Mendes, de reinos de Além Mar, já que os de Aquem deixam muito a desejar. Este território è deslaçamento, erosão autoconsciente e vanguardista, mas também reconstrução ingénua através das sensações, sem fastasmas de que tudo seja simulacro de simulacro, ou entropia miserável de um modelo superior ou de estados mais ardentes da matéria. As sensações são inaleanáveis, pesem ou não estruturas societais ou linguísticas, e cada lugar é a sensação desse lugar. Teremos um corpo comum? Teremos uma identidade do não-identico? Não, mas temos um clima comum. Mesmo uma cidade é bairros distintos, é modos de apartar e desarrumar os quartos, é a nossa ordem/desordem pessoal e fecunda que contamina nos mínimos gestos as maneiras de os outros se mudarem quando soltamos gargalhadas na praça. O que é que os Homeostéticos têm de semelhante? Será que se pode falar de uma geração com valores e práticas partilhados? Nós que fizemos a adolescência com um simulacro de revolução às costas? Nós, que não nos filiamos em partidos e não voltamos as costas à politica! Nós que não nos pautamos em seguir enxovalhadamente os últimos figurinos de modas que já não crêem em si mesmas, mas que são o espelho de uma crescente descrença nas possibilidades ilimitadas da arte e arredores. Beleza e vortex, graça e horror. Vejamos bem! A Homeostética foi descritiva a dois niveis: 1. O espaço português em que crescemos foi um espaço de grandes tensões, de grandes deslizes, de mudanças súbitas. Foi o tipico caso de quem está a meio caminho entre o 1º e o 3º mundo, entre a idade média e a revolução informática, entre uma moralidade romano-cristã e outra anglo-capitalista. Casos semelhantes a boa parte do globo, que não teve tempo suficiente para se despir das suas supostas tradições, que não passou nem pelo new deal americano e seus suburbia, nem pelo Angst becketiano do post-guerra. O lisboeta era um labrego em nova iorque, bebendo abundantemente do seu carrascão. Agora vai-se globalizando nas lojas de marca, ou nas lojas rascas de "chineses". Já não tem nostalgia das lezírias mas também não deseja estar up-to-date o tempo todo. Acredita convictamente no Paraíso, acha sórdida a vida nocturna e consegue perfeitamente passar sem ela. O tempo passa e não passa. Existe uma febre, uma agitação, assim como uma calma, uma melancolia, uma quase estagnação. Os vidoeiros, os nenúfares, o rap, os lúsiadas, o yoga, a bebedeira machista, o sofá quentinho, o cozido à portugueza, os fast-food, o show erótico do Maxime depois de umas horas à porta do Lux. O bom lisboeta não tem dúvidas, porque as dúvidas não contribuem para a sua felicidade. O mau lisboeta (99,9%) tem ângustias porque as casas lisboetas têm janelas estreitas (será por causa do calor?) e a cidade vai-se despovoando com um triste beleza decadente com prédios realmente antigos apinhados de graffitis que são a expressão de um acolhimento imperialista do que outrora foi resistência urbana ao esmigalhamento de identidades "tribais" ou singulares. O bom lisboeta (nós?) põe muitas questões como quem tem as respostas nos bolsos. Afirma assim a polimorfia e a insolubilidade de enigmas desnecessários. Faz perguntas para que estas sejam incompletamente respondidas. O espaço português, por isso mesmo, faz rir. Está entre a fotonovela, o gongorismo, a seca tragédia grega, os comix strip (colecção Texas Jack), os discursos bacocos dos oradores politicos, as piadas de gosto duvidoso, os axiomas secos de Spinoza e as conversas (com o eterno retorno dos bicos de papagaio) das porteiras. Está no passear entre jardins Botânicos e afins, no ir-se pela cidade e perceber que quem anda nas ruas são africanos, indianos , chineses , eslavos e brasileiros, e que o novo lisboeta se refugia em sua casa no computador, em busca de uma excitação e aventura que a rua permanentemente oferece. Este estado conjuga, ou põe em tensão, a viscosa cultura estrangeira (de uma forma omnivora, saloia, insaciável) e a nossa delicodoce (os italianos dirão morbida) tendência para a coceira e o colchão. Somos, por essência, fofos, moles, isto é, quase podres, e anseamos, como Cesário, por estados crepusculares. Fruímos o que por cá se faz e o que vem da estranja, vulgo imperialismo cultural, de uma forma pedantíssima. Recusamos a priori qualquer possibilidade de glória in loco. A glória é sempre fora! Discute-se e fala-se sobretudo daquilo que se ignora, e de tanto se falar acabamos por saber alguma coisa. É como a filosofia: a certa altura subimos tão alto aos cumes de tais formidáveis palavras que sem dar por isso já não sabemos muito bem se aquilo quer dizer alguma coisa, se as mãos acariciam o sexo de quem se ama ou um não-sexo que é o vestígio gnóstico de um não-corpo. Mas conversa é conversa, e mesmo quando não sabemos é melhor falar do que estar calado, porque saber, saber ao certo, nunca se sabe. A não ser que se tenha recitado BUDONGA. 2. O visionarismo NEO-NEO-HOMEOSTÉTICO. Isto é, apesar disto o ir para a frente, sem queixumes, sem desculpas de miserabilismo, em mais uma tentativa contrainductiva de negar o que aqui é suicidio cultural adiado que procria. Temos no sangue uma espécie de ambição infatigável, mesmo que esta tenha contornos de paródia quinto-imperialista. Grandes e desenganadas (roucas?) epopeias animadas pela típica e camoniana grandiloquência (neo-latina). Grandes obras, nem que seja à força, só pela escala. Grandes Utopias ( que mantemos subterraneas, escondidas de todos para que não nos ridicularizem). Sem ambições (o dever ético de progredir no explendor devorante da vida!) qualquer disciplina fica adiada, e o adiamento é o pai do sofrimento. As pequenas ambições ficam-se sempre pela estrada, são o lastro burguês do ter lar, fazer filhos e ter uma carreira. Queremos mais! Queremos algo que não caiba na vida inteira! DE ALGUNS MOVIMENTOS DE ARTE VISTOS RETROSPECTIVAMENTE Conceptualismo - Simulacro de Ideia enquanto Ideia. Hospitalização neoplatónica de uma pseudo-epistemologia de raíz artística. Quando vejo muitos diagramas acho-os bonitos. Têm um ar técnico com aspirações poéticas. Quando leio as teorias dos artistas fico com vontade de ler um romance do Nabokov ou um verdadeiro e maçador livro do Wittegenstein (ou do Saussurre). Arte Povera - Snobismo do material enquanto materialismo snob. Pura patine com poesia surrealista a fingir interesses pelas velhas fábricas onde os proletários sofriam (arqueologia nostalgica do industrial, com ferrugem de preferência). Minimalismo - Anacronismo da industria como arte. Asneiras da diferença enquanto escala. Imbecilidade da repetição enquanto conteúdo. Limpeza puritana. Conforto dos espaços amplos e arrumados. Boa inspiração para cadeias internacionais de hoteis. Land Art - Piqueniques para intelectuais pequeno-burgueses. Interesse pela degradação da degradação. Pernicioso interesse pela arquitectura nãoeuropeia. Happenings - Vandalismo, se é para ter interesse, caso contrário são tentativas vâs de envolver os participantes em actos em que não vale a pena estar envolvido. Performances - Teatro maçador amador e pretencioso. Morder de preferência o performer logo no princípio. Prefiro o cheiro a Snoopy do que o cheiro a pseudo-Snoopy/ o exageradamente querido ao querido com pretensões intelectuais/ o ranço do comerciante à etiqueta das calças do galerista - e mesmo assim/ lá teremos que vender uns quadrinhos e sermos amigalhaços sinceros de tais merceeiros/pactuar com os agentes da degradação/ ver publicitado o inexistente, mas existente, «Me» / ufa ufa! METAMANIFESTO (para abuso pessoal-colectivo) Soluções? Salvem-se se puderem! (heterónimo anónimo) Há o amor, sim senhor. Ligeiro, brutal, alado e cruel. O amor com gente lá dentro que idealiza os gestos do ser amado como algo concreto e ideal, casto e lúbrico, harmonioso e vertiginoso. Somos sacudidos por ele periodicamente, sofremos o anedótico, o erótico e os revés. As amantes lançam dardos que nos ferem os pés. As pirâmides destinam-se a outros, são o remendo bicudo da eternidade a passar a ferro. Os mistérios fazem o míopismo do pensamento que não dá passos em frente nem para trás. As farsas espirituais não têm lugar no nosso cabide. A profundidade é encontrada à força de tiques e suspiros, de sentimentos voluntários e involuntários, de memórias remotas e recentes, do feed-back que os nossos inseguros pensamentos bordam sobre a teia caótica das coisas. Aqui não há lugar para oceanos de simulações ou qualquer outra vastidão. No limitado está a Fortuna, no ilimitado uma ambição. Algo nos reflecte estupidamente e por momentos julgamo-nos espelhos. Constatamos que estamos espelhados. Sabe-se que as esfinges e os devidos enigmas correspondem a um gosto por perucas, rimel, verniz das unhas e o cheiro a acetona (e a azeitonas). O Egipto é um sítio bom para morrer com o ar de um romance polícial. Os mistérios da vida prolongam-se como quem enfia supositórios no cú do Além. Mas não se prolongam senão nos espectros da arte. é fofa é roliça é galhofa é hortaliça Os especializados consideravam do seu ângulo agudo que o único criticismo era olhar para os umbigos (e os bigodes talvez). Coleccionavam citações de Baudelaire, Nietszche e Benjamin. Tinham a mesma pastosa graça de quem se condena a têr graça a tempo inteiro, como uma neurose que retorna cada vez mais degradante. Nós tinhamo-nos condenado a essa tristeza, ilustre, austera e vil talvez, de ter a desgraça por sobremesa ( mas antes...que festim!). O heroísmo, moldado a plasticina, e vendido (Deus o sabe!) ao Diabo, não nos autorizava sequer a sermos rascas, ou canalhas, ou malditos, ou cantores de Fado. Um heroísmo sem pele a arriscar verdadeiramente. O desprezo abateu-se sobre nós, e em vez de saírmos para a rua, ficamos em casa, no mais terrível abandono. Ficar fechado em casa não faz bem à psique. é morena é torneada é pequena e amanteigada A estrada dos excessos, que, por engano, conduzia ao Palácio da Sabedoria, levou-nos ao senhor Destino do Palácio das Gargalhadas estúpidas. Considerou-se que se tinha seguido a estratégia errada, e que tinhamos de encontrar uma "plataforma de entendimento" mais conforme os nossos virtuosos e nobres propósitos. Mas quem não sabe de seus defeitos não tem lugar para a alma, caso a haja metafórica ou concreta, no peito. Fez-se espionagem, e descobriu-se que a arma secreta dos nossos rivais (mas temos rivais?) era a Intiligência. Ficamos parvos. Tanta palhaçada para nada. Tantos sentimentos, aspirações, paródias inuteis e conjecturas em vão! A nossa adaptação à Intiligência foi dolorosa, mas com resultados desiguais. Talvez tenhamos ficado a meio caminho, o que para já não é mau. é geitosa tão roliça a manhosa é estaladiça Considerada de longe esta aventura pareceria uma parceria irónica, mas a ironia foi apenas um acidente no Triunfo! falhanço generalizado. Aos porcos o E os correspondentes arcos que não disfarçam o nojo implícito do triunfar nem com polidíssimos mármores. Contentamo-nos, babamo-nos e continuamos na mesma. Uma tentativa nunca vem só, pois vem sempre mal acompanhada! Na terminologia insistiamos em termos ôcos e pomposos como Metacatástrofe, o que queria dizer, mais ou menos, uma catástrofe às arrecuas. Um espaço depois de todas as invocações apocalipticas, sofimentos, depressões e etc. Este tipo de nomenclatura não serviu para seduzir ninguém. Só nos restavam conversas do género és Carneiro, Balança ou Sagitário. Foi muito tempo depois que descobrimos a fórmula mágica: fala-nos do teu pai e eu mostro-te até onde vou. Estavamos a ser usados pela sociedade pluralista e capitalista, como carne para canhão. Pastavamos, ruminavamos e pagavamos as contas de eletricidade. Um certo espirito naif e adolescentino persistia. Iamos para o campo lêr poemas às àrvores e apaixonavamo-nos platónicamente por raparigas morenas (ou ruivas) com tranças que iam com a bilha à fonte. Não queriamos pedir muito, mas o mundo estava a ser pelo menos mau, ou quase muito mau de um modo inconsequente, sem ser de propósito, com aquela maldade da qual aceitamos todas as desculpas embora seja indesculpável. Se o mundo fosse radicalmente mau, um distrito do Diabo (que por sinal não vai lá muito à bola com os gnósticos!), uma provincia subalterna do Inferno, então Satanás falhara. E o falhanço de Satã não é em nada mais menosprezável que o falhanço do bem, da plenitude e de outras supremas e virtuosas realidades. Que tortura ser protagonista das imperfeições do Bem e do Mal, actor da sua degradação, da sua prostituição. Cantavamos canções românticas: Neste mundo mau,mau,mau, eu vivo e sofro sofro, sofro... Acabou-se o heroísmo, mas nada de resignações! Avante Camaradas!Avante! Segundo Metamanifesto para impessoalíssimos abusos ( que a classe operária nos perdoe!) “é pá, o que a malta estápr’aqui a dizer não tarda vai ser uma cena completamente diferente.” A lingua é doce e traiçoeira, ó Vizir, e os desertos estão cheios de poeira. Largamos as redes na bebedeira, lançamos bombas de um bombardeiro. E os boatos circulam na medina: certamente rolarão cabeças. Há um pânico e caridade generalizados (é essa a teoria). Os pescadores pescam às cegas, os cachalotes arrombam os botes e os mendigos insultam os estrangeiros. Os estrangeiros, por seu turno, lêem Rimbaud e Paul Bowles em hoteis assépticos. Sentem o exotismo como algo que os predispõem a aventuras sexuais furtivas. Mas as aventuras são decepcionantes, o sexo equívoco e o exotismo crú. A lingua é doce e traiçoeira, ó Vizir, e os desertos estão cheios de poeira. Somos, ó comendador dos crentes, vulcânicos ao amanhecer, mas à noite ficamos quietinhos fumando narguilé e bebendo uns vinhos. Tudo são conjecturas! Que Allah nos proteja de qualquer refutação. As refutações, pelo contrário, não nos protejem de Allah. Elas são a nossa vulnerabilidade de dandys, pseudo-cépticos, miúdos que jogam insensatamente com as palavras. Luz e Simetria! - exclama um outro profeta. E nós viramo-nos pavlovianamente para Meca. Lemos extensas biografias de All Hallaj. Simpatizamos com os mártires e com os místicos. Os textos sobram ao sobrepovoamento do divino. Começamos a familiarizarmo-nos com algo que se emancipa de qualquer orientalismo - o Eu fulmina-nos com furibundas identidades. Vamos carpinteirar frazes eternas, tecer hinos, epopeias, catecismos. Podemos falhar e recomeçar de novo. Criar uma extensa literatura que não sabemos ainda ao certo para que vai servir. Ou pensam que é tudo treta?! O grande ornato é nosso prato, hiperbarroco ou hindú concreto ou abstracto vestido ou nú o grande ornato é nosso prato. In principio, quando o Verbo ainda não era bem Verbo, estavamos nús como Adão, com os pelos das costas à vista. E as tatuagens fitavam a face de Deus. Depois inventou-se a morte e a doença e os impostos e outras burocracias, e os comentadores, as madrastas e os carrascos. E finalmente, a terminar o desfile, a Eternidade (aqui posta ao serviço da classe operária, porque a vida para ela é um pesadelo), como um feriado imenso, um aborrecimento contemplativo, como se o fluxo de imagens ou a cessação definitiva delas não fosse imprescindível. O grande ornato é a irrupção do Ausente. Deixem as portas abertas para o pródigo entrar! Houve um profeta que disse: é fugindo que nos encontramos! Técnicas a administrar: planos quinquenais, saturnais (e jejuns), interrogatórios socráticos, horários monásticos, paródias desconcertantes... Talvez tudo fique assim (ó saudosistas) como dantes! Mas não ficará, porque nada recua no tempo, e cada mitologia encobrirá e dissimulará outra. As várias versões de Deus pressupõem uma quantidade de obscuros palimpsestos que recuam até tempos cada vez mais animais. E doravante estaremos num tempo que é a memória gratificante de todos os tempos, que recolhe a alegria da abundância, tornando-nos ainda mais selectivos e exigentes. Caminhamos para o abismo, ó ingratos! Ou pelo contrário: os paraísos não são artificiais... Não nos daremos ao trabalho de queimar, condenar, trucidar certos casos clínicos eivados de rancores, de espirito totalitário ou de obscessão por legislações - o humor, a generosidade e a liberalidade talvez sejam antídotos frageis e ingénuos combatentes, mas são armas deveras eficazes. Há quem diga que isto é um charco de intelectualóides (sem estrutura). E ainda bem! - cantarolou Ariadne. METAMANIFESTO para a vegetalização do pensamento e seus derivados e enlatados O Estilo serve para pôr uma certa unidade e ordem na desordem radical do pensamento. O Estilo também serve para fabricar pluralidades e desordens na inclinação natural do pensamento para a Totalidade. O Estilo evidência-se no como o fragmento sabota o sistema e no como o sistema resiste às sabotagens do fragmentário. O Estilo põe visibilidade onde antes era cegueira, quando os crentes andavam às apalpadelas. O Estilo repõe a ideia de uma certa invisibilidade, de que a ordem das palavras fala ao lado das palavras: é um silêncioso excesso que acompanha um aparente ascetismo. Havia uma visibilidade natural (biológica, não-sintética) de que a Terra estava grávida por extensão. A Terra recorria às narrativas para forjar o seu sentido. Não lhe bastavam hinos ou metáforas. A Terra era tudo quanto ainda havia de mineral no pensamento. Rebentava vulcânicamente como uma coisa que quer berrar incendiáriamente. O pensamento da Terra é o pensamento silêncioso da Vida Silenciosa, é o pensamento que é interregno entre catástrofes ditas naturais. A Terra pensa por interpostas pessoas, com uma fecunda doçura e uma agitada imprudência. A violência das catástrofes são os Manifestos da Terra. A doçura anacastrófica é a convicção de que há uma delicadeza que incita a fazer pequenas coisas que excitam e consolam - é o pequeno ruído, ou a Vida Silênciosa. A Vida Silenciosa abunda em pequenas catástrofes que mimam e parodiam as grandes. A paródia já é em si uma defesa da Terra e um falso triunfo dos homens, porque este triunfo parece um triunfo dos homens sobre os homens. O Estilo é um mimo desse mimo, uma paródia dessa paródia. A artificialidade natural que se pode opor aos ímpetos colossais da Terra é tímida, mas consegue-se ter sensações fulminantes - a arte não se restringe a ser arte, o estilo não é só estilo - é o que intensifica uma prática que transborda para si o que parecia ser uma mera exacerbação de soberana autonomia. Poder, ou magia, ou muito mais do que isso. O que é exterior à Terra começa nas plantas: há no mundo vegetal um secreto desejo de emancipação, de desenraízamento, de deslocação com que o animal se satisfaz. Nomadismo vegetaliano, Há no animal a nostalgia do enraízamento que o leva a marcar TERRITÓRIO. Territorialismo faminto. É a fome que faz com que o animal vague. O asceta, que internaliza os movimentos da consciência aspira à condição da planta. Mas será que essa condição é libertação? A ambiguidade das Plantas é Uraniana. As plantas deixam-se comer para não permanecerem eternamente ligadas ao solo. As plantas anseiam devorar as estrelas ou serem devoradas por elas? As plantas necessitam dos raios dourados do sol para sobreviverem. É como se o ouro entrasse no seu corpo através da luz. O homem não pode recuar à Terra senão na Morte. O homem teme a terra e respeita sua côr ocre como se esta côr estivisse impregnada de antepassados. Toda a sua vida é um protesto contra a Morte, um lamento em face da Terra, uma assustada veneração pelas vidas daqueles que teimam em retornar á terra. Daí que ele assuma as reivindicações dos Animais e das Plantas e queira reintegrar em si todas as formas que eles procuram. A arquitectura, por seu lado, é uma paródia da Morte. Habitamos para descansar. Construímos casas para sentir os hálitos do repouso. Construir, habitar, e depois pensar dentro das casas é convidar à aniquilação, nossa ou alheia. Só se pode pensar decentemente fora. Pensar no meio das cidades. Pensar nos jardins urbanos, por mais domesticados que sejam. E Co-habitar, isto é, habitar com a cidade e com os outros, com as plantas, os animais, em suma, com os co-habitantes. A visibilidade de que o estilo é portador é polimorfica, desenraízada, serve uma multidão de estilos que transformam uma desordem radical numa ordem plural. E uma ordem plural na sua simplificação unitária, e essa simplificação em inúmeras sequências que ora se exibem como inclinação predadora, ora retrocedem como algo cansado, atraído na dificuldade da complexidade pelo descanso promisssor da Terra. O Antropomorfismo, só, é a demissão desse protesto, é o espelho reclinado para a zona anal, para uma higiene demente, cristalina, mortal. Construímos as casas a partir da ideia do asseio das nádegas. Aninhamo-nos na limpaza como numa distância. A distância é sempre uma interrupção sexual, como se cortássemos a cópula que une a Terra à negra massa dos astros. As perspectivas, os enquadramentos e a geometria, são irradiadas pela multiplicidade sensorial: partem da pele, dos olhos, das orelhas, do nariz, do sexo, do ânus. O olhar sobre a casa é sensorial, o habitá-la é sempre uma expressão do inerente medo. Nós percorremos essa escala, lideramos essa massa de protesto, essa revolta contra a mineralização e fossilização. As nossas perspectivas são multiplas e nómadas. Deslocamo-nos porque nos vegetalizamos nos desejos. As nossas perspectivas não se agarram a nada, são como um ornamento sulcando livre as várias dimensões do Espaço. Somos dominados pela necessidade de implacáveis metamorfoses. O nosso elemento é a transformação, o mobilis in mobile. Metamorfosear, misturar, criar pontes cada vez mais expressivas entre o homem, os animais, as plantas, os céus e a Terra. O nosso recuo, o nosso aparente arcaísmo, separa-nos não só dos demónios terrestres como dos demónios celestes. Os demónios que nos acompanham são híbridos, nascidos de cópulas entre estes dois atractores, ou de seus descendentes. Os daimones são os nossos representantes junto dos deuses, são os entreactores das nossas exaltações e agonias. Os deuses sabem que eles são nossos mensageiros e temem o seu aspecto estranho, assim como a nossa fome de metamórfico que os torna obsoletos e os acabará por exilar. Aquilo a que chamamos Cultura é o nosso Ethos, não um território, mas uma cadeia de relações que se abre a todas as dimensões. Algo elástico, como uma força obscura que parece dotada de consciência. Que esse Ethos seja natural no seu desenraízamento, que a Cultura procure as suas ordens na desdomesticação! O ESTILO está ao serviço de uma performatividade, isto é, forma e reforma o informe da TERRA. Procura a concentração do poder nas geometrias mais imediatas. Explora a vontade das geometrias diferirem de si mesmas através jogos e de um namoro com certos aspectos empáticos do visível. Daí que multipliquemos os decisores, como num rio, cujas origens são multiplas fontes, e cujas àguas não deixam o SENTIDO quieto, mas profundamente inquieto . Daí que o modo como nos atemos ao eu que filtra as sensações seja o de fazer emergir outros eus, que multiplicam suas sombras em formas de obra. Sombras que permanecem como o ideal de vida perpétua, de erótica irrequietude que continua a enlaçar os múltiplos aspectos da natureza. Trabalhamos atrelados ao DIVERSO, contra as indistinções, fragmentados por uma harmonia verde e omnívora, exaltando todas as formas sexuais que começam na planta e que habitam desde aí o homem nas suas deambulações inquietas, celebrando o apetite por tudo o que floresce entre o Céu e a Terra. Trabalhamos como se vivessemos na plenitude de uma gravidês continuamente fecunda. O que nos é corpo é sempre a possibilidade de várias histórias dizerem quão astutos são os pequenos eus que se expandem miraculosamente num grande Eu vegetalizado e em desagregação, pequenos eus. ou omnivorizado Espelhos e ânfíbios em de concorrência uma astúcia com os que se desentranha da flora e aque percorre com levíssimos pés as diversas faces da Terra. OS CADERNOS TÃO MODERNOS DO SR. JACQUES PASTICHE UM TIPO MUITA FIXE! (traduzidos do francês por um tal Agapito Gonçalves) o subtítulo como sobremesa generalizada meus senhores: Escrever manifestos é coisa desagradável. Os comunistas gostam disso. Eu, sinceramente, não! Só sou comunista quando vou à missa. Mas nunca ao domingo! A hóstia lembra-me sempre certos ímpetos vanguardistas, como o expulsar vendilhões do templo, ou de alguém ser unilateral e canibal sacrificando-se ritualmente pela comunidade faminta! Eu escrevo manifestos e metamanifestos contra a minha vontade - revolto-me por comodidade ou vício, mas nunca por desespero. EU NÃO PROCURO: DESENCONTRO-ME! Vou em busca da minha autenticidade e só encontro citações distorcidas. Constituo-me em parte no onanismo de me diferir. Não sou hipócrita, mas esforço-me sinceramente para sê-lo. Dizer que me banqueteio no estilo dos outros pode parecer uma condenação - mas quem é genuíno mesmo genuíno? Quem é que não é vulnerável aos pastiches que certa localidade e circunstâncias fabricaram? Freud é tão falso quanto Picasso, mas não o demonstra continuamente. Os artistas tornam-se as crianças que não foram. Desaprendem a ser crescidos, formas acabadas, definitivas. A imaturidade é a possibilidade de continuarem a diferirse de uma suposta imagem de marca. A maturidade, mesmo em termos psicanalíticos, é o estar condenado a uma sensata e adaptada repetição. Sempre a mesma dieta! Vamos lá às Dissecações fanáticas: 1. a vida intacta é cadavérica, eu prefiro a vida em retalhos - dividir coisas, como quem divide uma nota de música lânguida e lenta em muitas notas pode ser louvável 2. analisar os problemas a saca-rolhas - porque os problemas são mais vagos sob o efeito de uma boa pinga, embora regressem como pérfida ressaca 3. olho e o que olho ensombra-se - a arte elimina as necessidades mais evidentes como o comer e o foder em prol de uma desnecessidade suplementar, a criar - a verdade nunca se realiza através da mentira - mas a mentira irreliza-se através dela mesma cada vez mais 4. prefiro comer as sobras com molho - um bom artista vai à caça para roubar - eu sou como as hienas, fico com as sobras dos roubos, fico com os estilhaços do sucesso 5. os cadáveres são avaros - falta-me energia romanesca e tenho os pés doridos assentes num quotidiano frágil onde me esforço por ser educado e generoso com as pessoas - as vizinhas cumprimentam-me, mas não me convidam para ir para a cama com elas - o que também não me agradaria, mas seria bom para este ego de pastiche 6. da mesma forma, cada haver é vários - vou aos museus e vejo os mestres e como os mestres são seguros - vou para casa com a minha frágil saúde e uma maior insegurança - arrisco a ser-me uma má cópia, com a mão a tremer, com as composições distorcidas - repito-me várias vezes em bera, sou uma grande merda - à força de se repetir isto torna-se épico 7. o aborrecimento das couves do vizinho do lado - cada acto de cozinhar couves é criativo? Nem por isso. A criação pode ser destrutiva, porque transforma radicalmente certas coisas noutras, mas a destruição, regra geral, não é criativa - atulhamo-nos em lixo - reciclamos as coisas, fazemos colagens, e enchemos os museus num instante, quase sem dar por isso 8. o enburrecimento de ir para a cova - boa parte da arte é realmente palha que se dá a burros, os coleccionadores e os museus - os museus, já se sabe há muito tempo, são covas, e as caves dos museus, são covas de covas 9. obeliscos provisórios - eu começo com muitas ideias ou com a falta delas depois tento o estilo asséptico e impessoal de deus, ou o estilo ainda mais asséptico e impessoal das "novas tecnologias" - concluo que deus é mais sujo, mais agradável, mais provocador e mais vanguardista que os soidisants vanguardistas - além disso, definitivamente, deus não é lá muito post-moderno 10.preservativos-oblíquos - por vezes pago a putas para me sugerirem obras de arte, para me fazerem desenhos em vez de broches - tento mostrar às putas que são talentosas, como quase toda a gente, e que a grande arte nasce da vontade de dar ao corpo - não acho que os artistas sejam mais putas do que putas - mas tenho a sensação que o meio artístico é uma prostituição hipócrita e escabrosa - a vida refresca o amor quando a inspiração nos surpreende com um grande e involuntário tesão - desculpem a ordinarice! 11.belisquem-se as provas - a minha mãe disse-me em pequenino - vais ser grande, mas não o maior, haverá sempre um idiota que sendo mais estupido parecerá melhor, mais convicto e determinado - tu serás a sombra intiligente da sua idiotia, e serás a multiplicidade que os outros evitam - os objectos pensam-te antes de tu olhares para eles - a arte é o deixar-se ser fitado - já dizia a minha mãe: deixa-te de fitas! 12.preparem-se para as polvorosas belicosas - prefiro pensar as oisas mecânicas, isto é, o lixo, como algo já detriorado, único, filho directo das infecções sábias da natureza - atiro-me às obras de arte com crueldade, mas acabo, algo frustrado em delicadezas - no entanto o primeiro impulso é sempre o do cão faminto que quer dar cabo do osso FARSA EM EPÍTOME O tédio dos gracejos. As tardes a rir com o rabo a empinar-se na gargalhada. A barriga agita-se e bem. Rir é o melhor remédio para a prisão de ventre. É claro que pode ser inconveniente... Ela tinha, toda a manhã, um génio de Astracan (a propósito de uma costureira)! A hormonia que se esconde é mais bela que as peles e joias que se exibem - o exibicionismo é uma decepção - o que interessa no sexo e na arte é o funcionamento e o prazer, não a propaganda. Ele era ciclista (falando de um platónico, de um hindú e de um nietzschiano!) por vezes eu ia para a casa de banho do escritório de um amigo meu ler Stirner que ele mantinha numa mesinha junto à retrete, e ficava preplexo porque o meu eu, que podia generosamente aceder à sua liberdade sado-masoquista, por cima ou por baixo de outras liberdades, não se assemelha a um eu, mas a vários, assim como a várias inclinações para várias liberdades - continuo para aqui sem saber exactamente como me reinvindicar e saborear o instante ou o nada assim sózinho - sou um tipo muio contaminado e solitário!... O seu coração gostava de se sentar numa poltrona à procura do fumo do charuto. O motivo de muitas obras de a arte é o eu ter vontade de foder certas mulheres que têm ar de deusas. Acho, e continuo a achar, que se for bemsucedido elas vão querer ser minhas amantes, pelo menos durante algum tempo, até ficarem profundamente decepcionadas - é um ideal limitado - mas não o troco por nenhuma filosofia! O meu tio era famoso por ser um alfarrabista cornudo. Era escultor nos tempos livres e dizia que a escultura era a melhor forma de critica literária - a escultura nunca é suficientemente abstracta - quando pontapeias uma escultura arriscaste a ficar com o pé partido. As correntes de ar trazem frases com tenazes. Dizia Picasso "Copiar os outros é necessessário, copiar-se a si uma patetice!" Eu copio os outros mas sinto-me pateta na mesma. E quanto mais copio mais pateta me sinto. Olho para as cuecas que uso e já estão furadas, velhas. Este eu que vai envelhecendo não se sente mais maduro ou repetido, mas mais esburacado. Uma mãe tem de ser de qualidade superior. Um tio pode ser barato desde que não dê escandalo. Uma tia pode-se comer de escabeche. A arte não é conceptual porque os conceitos não existem, ou existem como uma memória muito hipócrita e confusa de certas sensações como mamar, ter fome, sentir-se molhado do chichi, etc. É claro que colocamos hipóteses como quem apalpa o terreno - mas o sentido das hipóteses é o apalpar, e não o que as palavras procuram nas palavras. NAS CORRIDAS Que Hipódromo! Que domagem! Que Hipnotismo! Os despertadores tocam, e eu toco a trabalhar como se a possibilidade de ser famoso, rico e cheio de gajas dependesse desta disciplina. Mas acabo por me levantar por uma única razão não gosto da moleza da cama - e os sonhos (com corridas de cavalos) são ainda mais moles que essa moleza. Tudo o que compreendera estava estendido com o resto da roupa! A natação aprefeiçoava o seu nihilismo de pacotilha! O MEU PRIMO EM LINGUAS MORTAS Tenho um dirigível na casa-de-banho. E um submarino também. Fartei-me de ler livros do Julio Verne e também li o senhor Roussel, que admiro com muitos parenteses em ambos os lados da admiração. Amar sem dedos, mas com a alma avacalhada! E sobretudo deixar as obras de arte a meio, abandoná-las como fazia Leonardo. Ao fim de algum tempo a excitação vai-se, e começamos tudo de novo, como quem muda de vida ou de eu. A alma continua a mugir reconditamente. Saber qualquer coisa é sobretudo SOBRETUDO! Temos que fazer algum esforço para que os outros nos odeiem e para garantir o sucesso. A melhor maneira é arruinar a poesia, qualquer que seja o género de poesia, recitando-a solenemente. Tudo o que cai acaba mais cedo ou mais tarde por subir. Quando era novo diziam, vais acabar por cair em ti. Mas são os outros que têm caído em mim... REGRESSO DO RETRATO DO MARQUÊS Bom dia senhorita Souza. Que surpresa encontrá-la numa mercearia tão ordinária. É portuguesa? Sabe o hino?…eu?…nem pensar! Sou extremamente barbudo, mas a barba não é minha, é dos meus antepassados! Vou tomar nota… não me esquecerei! Sabe que a verdade tem que ser inventada muitas vezes até se tornar convicente?... as mentirinhas perturbam-me... afinal tenho que confiar em alguém... Que azarado! Passo a vida a defenir e redefenir as "cousas" porque prefiro uma substituição refinada a uma má restituição. As flores esquecem-se muito mais depressa! As camas são boas para partir e usar a madeira para a lareira. O aconchego de um colchão no chão... Escrevo os meus manifestos de joelhos... Escrever manifestos provoca-me certas erecções... perdoem-me as senhoras mais uma vez... Mas a minha alma e os propósitos mantêm-se puros sem uma migalha de maldade. Sempre que um objecto vem parar a uma obra de arte, desconfio que ele me quer chantagear. Não me diga?! Vou já telefonar ao meu advogado!… Com licença! Amanhã irei passear para o campo com uma armadura. Assobiarei. Suarei. Uma grande derrota para as artes. Uma surpreendente vitória para as humanidades. Açucarismos do mundo. As palavras só fazem amor umas com as outras onde as coisas no mundo se recusam a fazê-lo. Excursões muito bíblicas. Não existem regras, mas existe a carne de Deus. Deus é um perpétuo manifesto que assola e incomoda a consciência. Podemos colocar o amor acima de tudo tal como devemos colocar a pátria o mais ao lado possível. Já há muito tempo que encontro encantos, embora mediocres, no "meu" provincianismo, assim como vejo uma ingenuidade e um certo kitsch no cosmopolitismo. Só consigo ser refém daquilo que conheço bem. E encontrarei Deus! Sei exactamente onde mora! A propósito, tenho um amigo que tentou em vão apagar uma biblia com uma borracha. Dizia-me que se sentiria satisfeito se conseguisse apagar, mesmo que numa insignificante cópia, a palavra do Senhor. Queimá-la, destruí-la, seria fácil e desprezível. Tempestade analfabética + Assoadelas grotescas = Infidelidade matemática. Estou interessado em ideias que não se interessam por ideias. As minhas ideias, que me ocorrem como carros a passar sobre uma poça, molham-me. Fico sujo delas e vou para casa secar-me. Nos sarcófagos cai uma chuva amnésica. Para contrariar tento jogar xadrês, mas fico febril. Sou um tipo ansioso, e nunca confundiria a beleza do xadrês com a beleza da arte. Parte da beleza da arte advém do facto de poder ser comercial. Sempre se pode vender ou trocar por outra coisa qualquer. E isso é tão poético! VIBRACCIONÁRIO (inscrições) Neste hediondo Odéon sofro, graças aos bons mármores, quilos de pesadelos. Hermes mostra a tua tenebrosa Arte. A arte não perturba nem a ciência assegura. Os incómodos poéticos da arte são no minimo pitorescos. Uma bomba incomida a valer. Uma peça musical aleatórea pode irritar, tanto ou mais que um concerto punk. Quanto à ciência, não me deixa nada em posição confortável. Quando estou doente, a última coisa que faço é chamar o médico. Ir ao hospital nem pensar. Saíu-me um HYVH na lotaria! Eu gosto de regras imponderadas que expandem as emoções. A minha emotividade aguça-me (como um lápis que se afia!) a intiligência. Deus me livre de andar a corrigir emoções a torto e a direito! Pousa a harpa: ladrou Penélope! Quando as ideias desaparecem começam as obras de arte. As intenções vão desaparecendo com o uso. O lado poético depende de uma certa nostalgia. A beleza de um poema advém do tempo perdido a escrevê-lo. Rimar é o modo mais seguro de cometer tolices. Sempre que trabalhas a partir da natureza ela improvisa-te. Quando não trabalhas a partir da natureza esforças-te realmente mas chegas a impasses. "A pintura é apenas outra maneira de manter um diário.", disse Picasso. Uma frase completa que torna os esforços artísticos uma mera autobiografia, seca ou molhada. Revejo-me nisso, embora tenha tendência para baralhar datas ou falsificá-las. No meu diário, vou sempre acrescentando coisas de agora às memórias de outrora. Logo, a arte é um outrora agora a disseminar-se em incompetentes interpretações. DESFRAGMENTAÇÕES de uns manifestos jamais projectados A disciplina é a nossa decadência: nela encarnou o vício e vice-versa. A indisciplina é a sobrevivênciaa conta-gotas, goste-se ou não. Perdemos as capacidade de argumentar a partir do momento em que a arte se torna meditativa. As academias (as melhores, as piores e as mais ao menos) são uteis como as aulas de natação, e perpetuam os nossos cómicos e viciosos designios. Não é o programa da academia institucionalizar, mas partilhar criticamente. Isto é, relembrar o que se futura e futurar o que se relembra: anamnése advinhatória. Entretanto os nossos pensamentos vegetarianizaram-se apressadamente. Antes disso já eram possuídos por hábitos vegetais. Agora pretendem nomadizar as grandes àrvores. Ou tornar os animais mais plantas e as plantas mais animais. Não somos percursores de algo demasiado misto, mas somos percursionistas de uma beleza mais híbrida. O génio é uma alegoria fatal. A declaração de génio pode parecer-vos uma clássica manobra de propaganda, um exebicionismo pretencioso, uma prova de estúpidez, um sintoma de insegurança, etc. Para nós é uma consciencia intimista e uma transparência anímica para lá das fatalidades genéticas. O facto de termos génio ( e todos o têm) destina-se a um uso exclusivamente pessoal dele, muito portátil, como uma conversa de café ou um fetichismo personalizado. O que transborda para os outros é obra do acaso, é a compreensão/incompreensão mais ou menos suportável a que temos direito. Em suma, é mais fácil ter génio que talento. Sobretudo quando a sua presença é incontornável. Sonhos Carnívoros No caso das sereias estamos perante um canibalismo cujo denominador comum são os rabos de peixe e as postas de humaníssima carne. Os amantes das sereias morrem eternamente jovens, porque o seu amor é estupidamente infinito. E se os Deuses fossem convexos e a alma concava?... Em todo o caso, satisfaz as Musas até à exaustão! Hoje sonhei que me pastavam uns arcádicos cordeirinhos. Eu era uma imensa pasta verde, muito almofadada, onde os coelhos e as cabras largavam suas caganitas. Mesmo assim é bom ter a sensação de ser uma natureza que se alimenta de ruínas antigas. Os ascetas gostam de ter sonhos carnívoros com odaliscas carnudinhas cheirando a pargo. Tudo na audácia acena para uma felicidade estúpida. Vemos sem espelhos, embora em enigma. A Face e os Abismos reservam-se a serem contemplados de costas, mas deixam projectar as suas horrendas sombras numa espécie de Film Noir. Quando olhamos temos a parede tão rugosa, escura e cheia de grafittis dos antigos, quando ainda não se usava spray. Intuimos nas catástrofes os seus reversos. A irreversibilidade é um mito piegas que só serve para uma adequação às tristes realidades mundanas. Lá no alto, e talvez cá em baixo, há acontecimentos que são histriónicos. O que parece uma farsa é na verdade a outra face que nem Jesus oferece. Esses acontecimentos só são detectáveis através de uma obcessão geométrica e ornamental. A geometria faz coincidir curvas com rectas e angulos rectos com os demais. O número pode dar um ar exacto mas refere-se sempre a um poder ondulatório, a uma vibração genésica que é inevitávelmente sexual. Sabedoria é Entusiasmo, é a encenação da multiplicidade de estilos, é a docta ignorantia que é reavivada numa boa gargalhada. É um luxo que não perguiça, por mais inútil que possa parecer. Não castrem as flores! SEMI-METAMANIFESTO A mãe-ânus e o pai-vulva. A mãe que se torna doce como inversão dos tentáculos da fala. O pai misterioso e genésico, mas com pentelhos medusantes. Considerações intrompestivas: A época é reconstrutivista: parte das ruinas não para usá-las mas para reconstruir o grande edifício da Arte. A época descalça-se. As multidões sentem-se interrogadas. As assinaturas tornam-se mais preciosistas nas obras: há uma inigualável elegância no ar. Não há autores mas apenas entractores? Não: há entreactores heteronomizantes. A colaboração a várias patas transforma-se numa multipla partilha de heterónimos com muitas garras. Nada de luzes cínicas, de risos de alçapão, Nem deus é autor, deus também é entreactor. (variação: os deuses são entreactores sub-contratados) O artista desdobra a eternidade, mas não tem a insensatez de a ir passar a ferro. Lavemos as mãos do destrutivismo, Sejamos os Pilatos que garantem os grandes mitos. É bom ter mais alibis que o livre arbitrio. EX-CURSÕES HOMEOSTÉTICAS (1986) Contra o neo-construtivismo - A propagação decadente de um modelo esvaziado, como uma apetência retorcida, ou comercial, pelo budismo. O último atalho da metafísica, radicado na estética da incomensurabilidade, na arkhé do significante, nos objectos luxuosos de design minimalista ou retro. O neo-construtivismo é um deserto nihilista, anti-artístico, baseado nos critérios do não-dispêndio, da retenção do interjeccional, num narcisismo sem rasuras e sem corpo - como tal é abjecto, como o são todas as coisas relativas à essência do objecto. Gostariamos que fosse um devaneio anarquista, mas só há duas maneiras de fazer batota, e nenhuma delas convém revelar. Educação Espartana - A flexibilidade e a força de uma disciplina que se pratica com regularidade, mas sem exageros! De uma guerra subtil a todos os artistas instalados no seu trabalho hipnótico, escasso, balofo que vivem da indisposição para o Enthousiasmous da arte. Por isso opomos o músculo, a elasticidade e a força, a vertigem diária de uma ginástica, o horizonte de um inimigo permanente, multiforme, qual monstro oriental que perpétuamente é atingido e que perpétuamente se transforma. Sabemos que o pior de tudo é quando esse inimigo mora como um cego no nosso interior e nos aperta às apalpadelas o pescoço. Um batalha artística nunca está ganha. Os paradoxos tornam-se robustos, mesmo debaixo de robes de seda. Este músculo nómada que constantemente funda (dá fundo), é um novo Alexandre devastando e infligindo uma marca duradoura às àsias artisticas - novas capitais desta purgatorial muscularização. Não devemos recusar a mais ignóbil das prostituições: a assinatura? Ou pelo contrário devemos recusar essa recusa diabólica, esse pacto perverso que acabará por fazer rápidamente desaparecer as sombras da face da terra. O estilo - Se o estilo é essa excessiva proeminência das saliências e das pregnâncias, então sou um idolatra do estilo, um praticante dos seus mistérios, um cultivador dos seus segredos. Caio no estilo como quem se humilha ou apanha chuva. Porém, há que levar mais longe o estilo na sua dissolução, acentuando ainda mais as suas convexidades e concavidades, aumentando o delirio das diferenças, retendo as guerras e os ímpetos. Esse estado explosivo e cruel é deveras uma criatura minunciosa, apta frequentemente para as mais espectaculares economias assim como para os faustosos dispêndios. Mas o estilo degenera em mania de superioridade. Pode-se sempre pensar que a morte, tal como o sono, é uma sucessão de pequenos interregnos na vida. Contra o estilo - Contra os cultores monológicos, o empobrecimento, a redução ao mínimo, a ausência do carnavalesco, etc.. O estilo é funcional porque reduz ao máximo as interjeições. Mesmo os construtivismos e as vanguardas estão pejadas de um apetite doentio pela uniformidade. O estilo, como o hábito, é a pior das domesticações: há um tempo para o estilo, mas toda a perpetuação, toda a posteridade, é um nojo. Só chegam à posteridade os estilos que a recusam. Ou os estilos que multiplicam com os seus infractores. Para cada vanguarda o seu carnavalesco motim. A glória está nas divergências polifónicas. A posteridade - Se somos inevitávelmente proféticos isso não resulta de um desejo de assentarmos nessa futuração: pistas são pistas e o que vem é sempre outro. Eis uma das razões para essa in-disposição do futuro. A nossa disponibilidade para o futuro é o ser contra a posteridade, isto é, o sabermos a radical não-posse que é o devir. Quem teme enfrentar os problemas modernos? - Os artistas modernos nas suas luxuosas colmeias vivem a letargia do trabalho de abelhas que não conhecem a luz do dia, nem o polén. Conhecem a arte como pequena nogociata, empresários chiques de um negócio proibitivo. Como não trabalham nesta paz uraniana a ruína das flores vai sendo inevitável. Detêm-se hipnotizados pela compactidão do conforto ou pela aceleração dos seus importantes contactos que os fazem ter num mês mais exposições em Museus do que um artista modernista a vida toda. O homeostético sai para as clareiras, dorme ao relento, constroi pequenos abrigos - não teme a doença, a fome, as catástrofes, porque Kairos o conduz. Mais Museu menos Museu - para quê tanta velocidade? Ainda o estilo - A radicalidade da desmesura entendida como uma obcessão: o grande compasso estilistico neo-neo-homeostético. Desmesura nas mais ínfimas orquestrações. Contenção distribuída em afinações orientais. O estilo não é a interjeição domesticada por um código, mas o "polemos" entre a interjeição e os códigos (oposição entre a noção clássica de estilo e a homeostética). O polemos vai-se revelando como a subtileza de um restauro. Mas não é o restauro que interessa mas o regresso deliciante do ruído. Não temos pressa do Novo - Nenhuma ansiedade: somos vagarosos - o Novo encontra-se apenas nessas mínucias temporais. O Novo é o que transcomunica na desconversa, uma vagarosa pressa. Que idealismos! Que canduras! Que friquismo! - Exclamam os detractores da Homeostética, palitando os dentes. A arte nunca será casta como Gandhi. O que faz a sua força infecta os arredores. Mas de que necessitam os nossos daimones mais que esses dinamismos, essas canduras impetuosas, essa errância despreocupada! Os deuses favorecem esta nossa aventura. E se eles não a favorecerem favorecemo-la nós sem dietas ou amarguras. Só fora da arte que se parece com a arte é que estamos expostos às inclemências. Perante as sua consumada impotência os espectadores retorcem os seus entediados grunhidos. A arte não existe para se concretizar em hábeis metalinguagerns ou irónicas encenações de sentido anedótico. A arte é um trilho para a sua superação enquanto algo que não a abandona. O ideal de super-arte ("a arte que se parece com a arte e quer ser mais que a arte") é como um palácio a querer ser habitado. Habituamo-nos a fazer o que não fariamos: nesta determinação seguem todas as indeterminações. O azul-homeostético do céu refresca-nos e preparamo-nos para insuflar entusiasmo em toda a gente. Os erros - É fugindo que nos encontramos (sic). Não é o equívoco um dos nossos principais motores? Passados os equívocos dos equívocos a arte ainda promete?! Sim, promete como super-heroína decadente! Os malfeitores ainda vão acabar mal! TENTATIVA DE METAMANIFESTO DEPRIMIDO A QUERER PASSAR POR ÚLTIMO Pois é: há uma grande dissolução por aí, e os caniches passeiam-se, os rotweillers também, acompanhados dos respectivos galeristas nas exposições e mijam o soalho e isto cheira mal. Será que não cheirou sempre mal? Os Enigmas estão podres, ó impiedosa dama! E as nossas almas estão cheias de merda, de ácidos provavelmente sulfuricos, de percevejos de caserna. As esfinges andam de baloiço (um pouco fin de siécle). São queridas, têm fofas mamas e um par de asinhas. Édipo, como é lógico, tem a corda ao pescoço. As suas filhas tentam evitar que se mate, e comem nas choradeiras quilos e quilos de chocolate. Nós ainda não estamos fartos (finalmente alguém diz isto). Tivemos a sorte de ter nascido num fim de qualquer coisa menos século: Uma época sofisticada, anestesiada, morna, com falta de ponta. Além do mais seremos acusados de machismo e outros invariáveis ismos. Seremos? Não, já o fomos com a candura hipócrita de quem oferece o cu diáriamente a um crítico de arte. (bate punhetas pequena, bate punhetas, não há outra realidade senão bater punhetas! não há outro Absoluto para além daquele que aí se adivinha!) As nossas obras nasceram de cópulas com esfinges postiças, e a nossa intolerância é cada vez mais intolerante com os tolos dos intolerantes! A beleza dos “soutiens”, mas mais ainda daquilo que sustém. A beleza dos desejos à força, de uma inequicoca e monstruosa fachada que nos faz delirar estupidamente com as miragens pela frente e por detrás do sexo. Estamos fartos da pornografia (mas não estaremos viciados?) do infantilismo teórico, prático, e do anódino, da provocação que já não provocam nada, das feiras cheias de arte conceptual, radical e tal, dos truques maquiavélicos de promoção, de toda esta prostituição social sem contrapartidas. Estamos fartos dos queixumes sobre as ilusões balofas do hipercapitalismo, assim como os lamentos sobre as crises inevitáveis que nascem do regaço das abundâncias. Há que aproveitar e fazer dietas junto ao nada, sem monges tibetanos a sorrir com a cara muito lavada. Queremos ser heróicos, mas se calhar ficar em casa agarrados aos sofás, mornos, colados à televisão, atrelados ao computador adormecendo com uma rapariga ao lado fartos do esplendor quotidiano. Ou com um molho de criancinhas a interromper constantemente os fios do sublime que se entrançam na mente. Temos idade para estar sossegadinhos, quietos e irreprimíveis, enclausurados, absortos, megalómanos. Temos idade para muito mais do que isso com o ecran negro da Morte ao fundo (ah, ele está sempre lá!). Porque senão os comentadores desportivos da actualidade artística vêm daí, arreganham os dentes e “não estão para aturar brincadeiras adolescentes”? Adolescência cada vez mais senil, vanguarda de lar de teceira-idade, gritos de revolta com dentadura-postiça, tesão com medicação, mesmo que não se levante. Faltam palavras para termos a concisa consciencia do desespero, mas esmeramo-nos nas ilusões concretas que sobram aos masoquismos plenamente justificados da revolucionária desilusão permanente. Entretanto veio a máquina dos risos, triunfal, com o seu ar vitalício e académico meus senhores e minhas senhoras: há quem diga que vamos ficar por aí, aborrecidos, a cismar, a pensar em Deus, a pensar no pensamento do Nada ou em valha-me deus, ou em foda-se caralho. Caducos, Pesados, gordos, caindo para o tapete, vamos acabar como toda a gente, sem aquele ar jovial que nos caracterizava E ainda bem (stop?)! “O tempo passou e ela não voltou...” Outras beldades andam a passear-se nas paragens de autocarro, e a emoção deslocada, a vertiginiosa e sumarenta atracção do tipo senil pela peituda madonna é a veneração divina consciente da vagina. Teremos coragem para nos divorciarmos das nossas ex-futuras-mulheres? Teremos vontade de nos reconciliar com as nossas actuais, os adolescentes e os pais? Será que vale a pena viver assim? Sim! Teremos o direito de sermos inumanos. Nem por isso! Embora haja quem justifique toda a violência, desde a bastonada do monge zen até à morte por apedrejamento. Não vamos por essa maneira! As crianças crescem e nós vamos passear com elas e dar-lhes bom-bons com muito veneninho. Os adolescentes não perdoam nem a tolerância nem a arrogância, nem a proteção, nem as veladas liberdades, nem a nossa inocência, nem as desavindas fragilidades, nem nada, nem nada de nada. O falhanço depois das ambições consumadas em parte vem num cocktail com a ânsia de reeditar os sucessos idos em melhor, ou mesmo em um pouquinho pior. Os senhores dos ministérios já não vêm visitar-nos para ver os nossos quadrinhos. Galeristas de terceira convidam-nos para expôr em obscuras galerias de provincia. Cedemos à sobrevivência e desistimos da carreira! Somos seres ardentes e sociais. Somos gajos socegados, inquietos, banais. E um riso homérico sacode-nos, um riso terrivelmente inúmero que pasta sobre as nossas sensações verdes. Um riso retórico, ou um riso de corpo inteiro? Um riso maroto, ou um riso nervoso que sobe do escroto? Há idades para tudo, uma para revoltas, pastilhas elásticas e chupa-chupas e outras para não ir a sitio nenhum e tratar da carreira (como deve ser?!) e outras para tentar ir para todo o lado com os restos da carreira. Queremos a inteligência porque é uma deusa parda ou incolor Queremos a legitima estupidez e todos os seus noivos. Queremos os paradoxos que legitimam a irritação sincera, pois claro, que se confunde com o desapontamento com o real em primeira, segunda ou terceira mão. Ou queremos de novo a fraude falsa, como um acto de bricolage intelectual, uma exaltação biográfica dos nossos passados com veleidades velozes, aguardente de pera e pãezinhos sem sal? Nós queremos uma arte cheia de tiques, mas também não vale a pena pendurar carne podre. Será que nos institucionalizaram? É muito provável (bis) Será que o queríamos? É mais que provável (uh!) Será que já nos esqueceram? Em boa parte pá (hmmm...) Será que nos voltarão a recordar? (mas com baixo orçamento, nada de caviar...) Pobres constatários da nossa inércia piedosa. O tal riso seria uma estratégia de acordo com aquilo que a época pedia. Ou será que a época pediu piadas de mau gosto? Stand-up comedy com ressentimentos no fundo da garrafa, tristeza banal de um domingo de inverno, deprimente visita ao amigo moriobundo no hospital. Nenhum de nós quis partir a loiça ou os dentes ou dar simplesmente caneladas por debaixo da mesa. Apenas ameaçamos partir a loiça, e fizemos disso uma piada, uma teoria e uma canção. E tudo isso foi parar ao negócio e ainda rendeu uns tostões. (melancolia!, dizia a minha tia – embora não se saiba exactamente o que é nem para que serve) Imploramos ignorância e deram-nos pão contendo uma carcassa de frango resfriado. Estamos excitados, queremos fundir-nos com a mãe natureza, ou apanhar uma bebedeira e dar uns vómitos, ou cair para o lado de sono, ou dormir a sesta. Ora porra!, em certa medida até triunfamos! Não temos o queixume de termos tentado e ficado à margem, fomos singularmente hiperproductivos. Em vez de ficarmos numa litania de lamentos ad eternum à espera que a glória bata à porta e diga “venham daí, nunca é tarde” sempre fizemos alguma coisita. Mas a glória é uma chachada! Pelo menos esta glóriazinha miserável e nacional, embora não seja muito diferente da outra glória a que acena com cheques chorudos e casas confortáveis e tudo aquilo que queiramos comprar ou desejar, e o frenesim de andar de aeroporto em aeroporto dizendo mal de artistas melhores e pagando a amantes para fazerem abortos, convidando para jantar certos curators da treta ou indo para casas de passe com coleccionadores que lavam dinheiro e se fazem chupar por uma nota preta. A glória deve ser uma enorme chatice, um aborrecimento, uma vida a prestações, algo parecido com o absolutamente nada, e com um nada cada vez mais absoluto vodka. Uma magnifica postura – Ó sr. Manuel Vieira veja lá faça qualquer coisinha com um ar mais apresentável, não seja displicente! Não nos ponha caralhadas pela frente. Ora porra queremos aplaudi-lo! Trabalhe, seja honesto, mude um bocadinho, nós até queremos ser os seus sensatos admiradores! Nós até gostamos dos seus desenhos um bocadinho! Mas o melhor de tudo é ouvi-lo a tocar num bar! – grita um sem número de vózinhas ao fundo da sala, com relógios chiques, casacos de marca, e um ar de quem lhe falta ar. Alguns dos nossos amigos começaram a deprimir-se quando a sua vida é o oásis com que sonharam! (Foda-se, a minha mulher faz-me perder o tesão? Foda-se o meu tesão fez-me perder por outra mulher que também já não me dá tesão!) Queremos ou não ser académicos? Vá lá, façam um jeitinho! Professores universitários olhando de contrapicado para certas mamas de silicone, como se fossem criaturas de neandertal. Se calhar ainda não começamos a ser verdadeiros homeostéticos, andamos atrelados à nossa ironia, e (como é óbvio) cada vez mais individualistas, fechados cada um na sua gaiola, convivendo duas vezes ao ano com velhos amigos ou dando no metro esmola. Não, não temos espirito de revolta, nem nunca tivemos. Continuamos a ter a retórica da revolta porque esta se instalou em tudo, embora a nossa retórica seja mais vistosa. Certos actos despropositados dão o testemunho caricato de que fizemos o trabalho sujo, assumimos as nossas responsabilidades, e não recusamos uma boa pancadaria, ou uma rápida fuga da pancadaria. Também não fundamos comunidades pseudo-friques, nem sonhamos com comidas muito puras e darmo-nos todos muito bem muito bem com miudas complicadas e insipidas. Um dia destes acordamos e desatamos aos tiros uns aos outros. A nossa moral podia ter sido “tanto faz”, mas não foi. Foi ou vai ou racha, ou nem vai nem racha. Aqui para só nós, a homeostética não podia ter existido num desses amáveis períodos heróicos com terriveis crises a amparar de que os historiadores de arte se gabam e que os guias dos museus têm que recitar. Fomos a paródia possível com nostalgia de nostalgias por vir: excitados por vanguardas com as quais não nos identificávamos e divididos entre o desejo de agradar e de provocar. Tornamos claras, como ninguém, essas ambivalências, e navegamos entre dificeis opções, entre convenções duras e um asco sincero e indisfarsável por quem se agita nos meandros medonhos do poder. Não demos assim tanto o cú para sobreviver. Nós queríamos ter uma relação com as senhoras musas e as coisas do passado, e as coisas do presente, e as coisas do presente que se insinuam no passado, e as coisas do passado que se insinuam no presente, uma relação digamos como que despreocupada, sem aqueles tiques de suores e lágrimas e suspiros e um ar extremamente circunspecto e funerário. As pulsões de todos os tempos prometem explodir na vertiginosa delicadesa da arte e na forma como nela estamos, com boas ou más justificações. Não queríamos nem queremos ser sérios, embora haja uma imensa tentação e de que por baixo da tampa escapista da irrisão haja um trabalho sério, aturado, e mais-do-que profundo segundo os "moldes convencionais". Os críticos marxistas transatlânticos devem pensar que somos macacos para entreter esta post-sociedade com mais um ingénuo e deplorável espectáculo, “entertainers” num vazio com uma plateia de marionetes. A revolta idealista como quem está de férias, ou impressionisticamente vá para o campo para olhar para as paisagens indiferentes e polutas. Ou a revolta à moda do leste, com violência a sério, com auto-destruição sem complacências, com frontalidades sem inocências? O campo! Blurps! Essa coisa que nos engorda e nos acalma! A cidade! Beurk! Com o suburbio inclemente, a corrupção, o mercado negro e ma enorme impiedade! E os deuses no seu olimpo de bricolage? Meu caro, e você que anda para aí a dizer tolices deite-se, fume um cigarro e sinta-se relaxado, tome um Lexotan da nova geração depois do habitual Prozac, e deixe o seu espirito afogar-se numa doce mistura de Nada com Qualquer coisa. Ah, gloriosa insensibilidade! A recessão vem aí, ou então já estamos nela, e andam todos alarmados etc e tal. A recessão vai e volta e volta a voltar, inclemente, rigorosa, impiedosa, economia dos números negativos, desemprego sem dinheiro para preservativos, impostos em atraso e louça suja a feder. O espirito apocalíptico está na raça, como um vírus que a atravessa duma ponta a outra. A recusa permanente do apocalipse garantido é ainda nossa convicção? Sim! Mas só enquanto formos vivos! Depois vamos para os bares esperar que eles fechem e a seguir vamos discutir para casa porque chegamos tarde, e a pessoa com quem vivemos dirá como somos egoístas e que não pensamos nas coisas ou que somos aéreos e despistados, vitimas injustificadas de um egocentrismo que temos às vezes quando calha: cavaleiros de um narcisismo espatifado! Ou ficamos em casa porque nos falta a força para ir a qualquer bar, porque as ressacas agora são a duplicar, e o fígado a doer, os triglicérido elevados e o coração em recuperação de certa trombose vieram para ficar. não somos justos, mas apesar de tudo as pessoas lá nos vão amando dia após dia, isto é, somos justos na medida em que conseguimos ser justos sem nos termos que estar sempre a justificar o Pedro Portugal dizia que não pensava – (risadas) “o amor é para mim duvida alucinante” – escrevia o Manuel Vieira (gulp!). O amor continua a contaminar o ar, sem hollywood, com Robert Crumb em versão recente a beleza instala-se com a sua crueldade, e caducos ou não, lá vamos nós em grande velocidade Caramba! MARMÓREO ODEON OU MAIS UM MANIFESTO PÓSTHUMO DANDO CONTA DE VELHAS PREOCUPAÇÕES Antes da Grécia a arte era um enterposto comercial com os poderes do nãovisivel. Entre o que nos deuses adivinhavamos como possibilidade de socorrer anseios, e a nossa vontade de pôr em prática algo através de uma troca, a arte atravessava a vida como algo que não era arte - depósito mediático de medos e esperanças. Este negócio com o divino e os demónios adjacentes foi de tal forma desacreditado que a principal preocupação dos artistas da época clássica se concentrou quase exclusivamente no vísivel. O que na arte infundia terror ou era poder curativo, desaparece como inclinação para o pormenor, para a persuasão, e para os encantos enlouquecedores das miragens. Dar conta desse vísivel, das suas ilusões e outras trapalhadas semelhantes pode parecer-se com a atracção pela ciência, como curiosidade Aristotélica ou faitdivers helenistico. Esse paradigma, que se repete em parte no renascimento e que nunca deixou de estar na mira dos artistas ( e que nobremente constitui a fotografia) é o avesso do paradigma filosófico, no sentido em que a filosofia se preocupa com o coração simplificado das coisas, como uma chave que possa tudo abrir. Daí a sátira do bom Platão quando compara o artista a um copista em terceira mão, a um ser passivo. Mas também podemos sugerir que aquilo a que hoje chamamos arte, continha (na Grécia e não só), antes de ceder às minúcias do visível, aquilo que a filosofia não cessa de tentar agarrar, ou recuperar, ou assinalar - um foco imenso de poder, a imanência de uma geometria, intuitiva ou não, no cerne das coisas, uma capacidade de agarrar o espectro de todas as coisas om pequeníssimas fórmulas. A escultura começa a sua emancipação do modelo egípcio com os Kouroi. Estes mortos não são mortos para a morte, congelados no seu hieratismo piramidal, mas erecções póstumas do morto que ri. Luciano, muitíssimo mais tarde, configurará a morte como o lugar dos diálogos paródicos, onde o riso surge como exorcismo da própria morte e como sexualização polimórfica dos vivos e das suas pobres leis, que se estendem como um manto que abrange a natureza e as cidades (o Nomos, ou para os indianos, o Dharma). Este riso subterrâneo que vem do passo em frente (das ousadias) destes rapazes e raparigas maciços prefigura o Ser e a sua Impossibilidade tautológica, e regressa no século XX com o Dadaísmo, local entre a Arte e Anti-Arte, entre o Ser e o não-Ser, entre o Nihilismo e a Revolução. O passo em frente é a transgressão num sentido que já não é ciclíco, como nas festas das sociedades estáveis, mas passa a ser uma brecha definitiva e emancipadora: o riso desagua nos escritos de Abhinavagupta, de Nagarjuna, de Longchempa, e de vários mestres Zen, como uma corrente de libertação que flui de poente para nascente, como se quisesse inverter o tempo através da sua inversão geográfica. A pintura helenística, que foi tão grega como romana, tal como as prosas romanescas, revela-se na fixação instantanea da narrativa e não teme a cópia, o pastiche, a reprodução "técnica", a fraude. Se o que hoje podemos ver são na maioria cópias, elas revelam uma excelência que a filosofia não soube conhecer, porque a filosofia converteu-se rápidamente em escrava da sua legitimidade, e a sua repetição, ainda que com nobreza, no império romanohelenístico, trás o selo do “papagaísmo”. Foram necessários 20 séculos para que o neo-subjectivismo jesuíta a renovasse de uma forma decisiva com Des Cartes. Se este errou ou não, não foi diferente dos outros filósofos. Só que a máquina filosófica encontrou um folego insuspeito. Isto é, descobriu novas miragens com que se entreter por mais alguns séculos. Não queremos dizer com isto que coisas notáveis não se tenham passado entre Homero e os últimos neo-pitagóricos. Ou que a corrente que mantém o pensamento vivo, na filosofia cristã, àrabe, judaica, gnóstica, hermética, etc. não tenha sido pródiga em construir imagens, inventariar problemas, ou prolongar certas delicias eristicas em conceitos, e belíssimos livros, que hoje podem amparar criticamente, mais do que o pensamento filosófico ou ciêntifico, as razões mais ou menos obscuras ou claras da arte. Pintura e retórica desejaram ser convicentes, mantendo-se ao lado dos Sofistas, neo-Sofistas, esquecidos e ridicularizados até hoje. A pintura como engenhosa máquina de ilusões e fantasias não cessa de afirmar o gosto pelo artíficio e a sua associação às aparências das aparências. De Apeles a Leonardo (mantendo a "Idade Média" de fora), e mesmo até aos Impressionistas, o que conta é a simulação de um espaço plausível, como um prato que dá a provar as "coisas", ou a natureza delas . Se um certo realismo triunfou frequentemente em deterimento da atracção abismal do fantástico, este, no seu gosto pelo paradoxo, manteve-se, muitas vezes aliando-se a géneros menores. O grotesco, e a sua irrisão metamórfica surge muitas vezes como a ameaça (ou a miragem) do não-ser. Basta ler o príncipio da Arte Poética de Horácio. Por isso o grotesco é relegado para as margens, algo desprovido de sentido, como se apenas afirmasse a imagem que persiste no vislumbre daquilo que não existe e que nada quer afirmar ou provar. Há no entanto uma Grécia nossa, uma origem disseminada, ou arruinada. Origem que não se quer reconstruir nem unificar, onde os deuses se passeiam amigos. Deuses que já não são terriveis, que já não servem para nada. Deuses, que através de trivializações sucessivas constituiram o aparato decorativo do século XVIII. A secularização coincide com uma renovada importância das pequenas coisas. A secularização diz que os deuses são nossas criações, obrasprimas de arte no sentido actual, ready-mades que foram variando ao longo de gerações. Tornamo-nos deuses dos deuses - mas podemos continuar a venerar neles e nos seus mitos o que é mais nosso, o que através de formas e narrativas é excitação e interrogação, ininterrupto contentamento, e beleza que contamina a nossa visão das coisas das relações entre elas. Mas essa Grécia que não é a Grécia "autêntica" (porque não há uma Grécia verdadeira, nem uma lingua grega que fale mais do que aquilo que agora possamos dizer) mas que a cada momento nasce dessa suposição tem qualquer coisa da Arcádia virgiliana e das ruínas de Propécio. É uma amável paisagem que convida à contemplação inteligente, onde os pastores discutem como filósofos. É as paisagens de Claude Gelée e de Poussin e dos diálogos pastoris quinhentistas. Parecem rústicas, mas é o conceito que lhes dá quer a quietude quer a inquietação: ET IN ARCADIA EGO. O sentimento de mortalidade é sinonimo do desejo de apaziguação. E essa apaziguação é uma eterna aurea mediocritas, alternativa ocidental ao absoluto hindú e o seu negro gémeo, o nirvana budista. Por isso se inventaram outras Grécias. A Grécia de Hegel e Holderlin. A Grécia de Nietzsche, que não é uma Grécia mas um chinfrim de aproximações. A Grécia tautológica de Heidegger com as suas digressões etimológicas em que o Ser treme no seu jogar às escondidas enquanto vocifera sotto voce ridiculas imprecações nazis. Também a arqueologia se encarregou de forjar novas Grécias. As Grécias romanas de Herculanum e Pompeia e as labirinticas Grécias anteriores à Grécia de Creta. Constatou-se, além disso, que afinal Tróia era mais que um fantasma de uma cultura. E que as ruínas fazem com que as mãos que construiram casas e que moldaram estátuas continuem a provocarnos um espanto nem por isso filosófico, e delicosas descargas de adrenalina ou uma fetichista excitação sexual. Os helenistas mudaram muito em função dos filósofos e da antropologia. Descobriram-se Grécias Irracionais e Racionais. Também os filósofos começaram a mudar em função dos helenistas. E hoje será difícil encarar a Grécia como algo "originário", sem integrar o fluxo enorme de contribuições de múltiplos povos que a contaminam decisivamente, e que reciprocamente se deixam contaminar pela irreverente e borbulhante cultura destas cidadesestados. A Grécia depois de Burcket ou Vernant, de Dods ou Cassin ainda não se reenconrou na produção em arte. Porquê? Porque a Grécia era um dos modos mais frequentes de legitimação. O recurso ao mito era prova da erudição ou da astúcia do artista. A sua interpretação do assunto visava frequentemente outros fins. Hoje é passadismo? Há excepções pictóricas na confrontação com o helenismo: Piero di Cosimo, Ticiano e Poussin. O neo-platonismo do sec. XVI reintroduz a Ideia autonoma, livre, capaz de se satisfazer em modos auto-combinatórios, ou de influir no mundo através de teurgias. Mas quem são os nossos mestres? Heráclito, os Sofistas, os Cínicos, os Cépticos, os Cirenaicos e a Nova Sofística, especialmente Luciano. Se Heráclito instala o elemento móvil, assim como o pudor, os Sofistas propõe uma arte de refutação lúdica, de puro jogo, em que o Kairos, como golpe que tira partido de uma Tékné, desempenha um papel fundamental. O Kairos é o elemento criativo, o Acaso que se torna evidente através da associação fortuita. Os Cínicos tornam o aparato de legitimação ridículo, isto é, desfazem o desejo de agradar ou de desagradar que os Sofistas consideram essêncial. Mas tal como os ensinamentos de Krishna no Gita, as formas de compromisso ou de renuncia ao mundo são paradoxais. Assim o verdadeiro cínico não toma o cínismo à letra, assim como o verdadeiro Sofista está mais interessado em descobrir novos argumentos ou falar pelo prazer de falar do que ceder a instituições ou protectores. É em função de uma epicultura, uma cultura de excelência, que nós (Homeostéticos ou suas versões futuras!) lutamos, sabendo que a excelência exige a libertação de todas as amarras enganadoras, de qualquer burocracia, etc. Mas porque não recuarmos a Creta, cuja plasticidade poucos ecos tem encontrado na produção artística?... Na arte Cretense o elemento móvel, o Poikilos, é mais evidente do que em qualquer outra época ou estilo. Os seus motivos polposos e marinhos de uma ligeireza preciosista parecem ecoar nesses raros fragmentos a que ousamos chamar Manuelino ou na arquitectura Gupta, sobretudo nas estátuas ejaculantes de Kajuraho. A Àgua de Thales conjuga-se com o nodoso Apeiron de Anaximandro. Há um frisson sem fim que é ondulatório, e que determina uma relação absolutamente sensual com o que é inquietante e prazenteira (ao mesmo tempo) no Universo que dispomos. Quando à meia dúzia de décadas Callois fala no mesmo livro de mimetismo e de Creta estava a criar involuntáriamente uma interface entre os dois que torna mais explicito quer o mimetismo quer Creta. Ora o mimetismo, o mimar, o imitar, o iludir, são precisamente os propósitos que fizeram com que a Grécia divergisse. Do camaleão ao louva-deus passando pelo puro travestismo a Grécia constitui os seus tópicos e as suas dissidências que cada vez se tornam mais explicitas e quiméricas. Provávelmente hoje somos muito mais gregos na nossa vida, no nosso respeitável e infra-magro dadaísmo de quinta geração, no nosso desejo de sincretismos sem limites, de criar conhecimento sem preconceitos, de responder pelo prazer de responder, de considerar a história como um empreendimento privado e não como hipocrisia nacionalista ou pseudo-internacionalista. Sem a história a Iliada e Odisseia seriam filões impossíveis, e sem estes dois livros a Grécia seria uma mera hipótese "Académica". È a vontade de biografar, incutida na nossa estrutura comportamental, que os gregos levaram adiante como arte de pensar, de estreitar os laços entre as nossas infímas autobiografias, dos pequenos aos grandes gestos, e as consideraçãos ambiciosas sobre o mundo que também constituem, quase como milagres, o Universo. A história não se destina a servir de prova ou exemplo, como moralidade de contos que custaram vidas e que garante a cruel vaidade dos actos ambiciosos. A história é nossa a partir do momento em que refaz as nossas vidas através da excitação da ficção, em que se torna actual, ou em que nos deleita com narrativas que acabarão por se transformar, mais tarde ou mais cedo, em obras de arte: livros, pinturas, filmes, peças de teatro, séries televisivas, peças musicais, etc. Por isso não será disparatado dizer: a história é a confluência da excitação de todas as modas, na sua singularidade, no seu sincretismo e na sua potêncialidade. A história é a morfologia que torna mais rica e creativa a nossa plenitude! A história é o vulcanico passado que torna pertinentes as explosões das vanguardas! METAMANIFESTO SOBRE A IMPOSSIBILIDADE DE PÔR PONTOS FINAIS Marmóreo Odeon. Acrópole em view-master. 0s gatos fazem ron-ron. Os cães ladram e as virgens passam. O artista está apático e não olha para absolutamente nada. Em baixo ouvem-se murmúrios de máquinas de lavar. Os contrários andam à guerra, reconciliam-se, casam-se e vão-se divorciar. Uns suspiram - se isto fosse tudo um espelho falso a esperar uma princesa falsa... Mas é um breve momento de generosidade rocaille um conto que podia ter lugar e que apenas dá um libretto fútil para Mozart. Acordo e vejo um peterodáctilo junto à janela. A frivolidade tem feito de mim um tipo casto. Esquecer, esquecer - diz António. Lembrar, lembrar - diz Amélia. Demo-nos ao luxo da desordem quando podiamos ter ficado no mesmo galho. O fim da Homeostética surge num letreiro numa palmeira (Homeostética finis - cultivada em portugal) mas não vemos ciprestes em redor. Uns dizem que não que isto não acabou, outros dizem que sim "finalmente em decomposição o cadáver desse amadorismo idiota"! Outros chegam tarde e não dizem nada. Calam-se. Há quem se desate a rir. Há quem desista e não volte mais. Há quem finja desistir e pretenda voltar. Sempre que escrevo poemas uso "Splendor" (esponja de brilho instantâneo). Talheres e garrafas de Vodka. As nossas amigas usam colares para tornar os quadrados negros de Malevich mais brilhantes e mais vazios. Mendonça sente-se mal e diz que vai vomitar, corre para os lavabos, simula ruídos, depois diz para si "sou uma fraude", mas podia ser uma pessoa intiligente. Mendonça entretem-se com as suas obras-primas: "sou um acaso mais forte que a morte nenhuma posteridade me esgotará!" É pretencioso, este Mendonça! A pessoas vão-se tornando cada vez mais sérias. Arranjam empregos. Compram casas. Trabalham e preocupam-se com quase tudo – têm discussões sem qualquer espécie de paixão, são cruéis na gramatica. Avolumam-se as suspeitas... De resto estão quase mortas. Salivam e fumam cigarros. Depois passam a ter discussões com motivos verdadeiros e chegam a entusiasmar-se, a ter vontade de partir tudo. É um intermezzo diabólico, como o xadrês de Duchamp. Não há nada mais ridículo do que a arte moderna? Moderna hoje: uns procuram as perucas de Velasquez, outros os patins de Minie, outros ainda os reflexos do dólar na estatística do mercado, e finalmente chegam os servos do platonismo que voltam a atacar com as estruturas e a linguagem: não são novos, nem os mais novos entre os mais novos. E depois os remendados servos destes servos, nostalgicos, consumistas das industrias neo-revolucionárias, que se empanturram de Xanax e Zizec As relações sexuais são o pudim flã. As revistas vão acabar por falir. Não, não nos vamos dividir. Entre as Hipo-homeostéticas e as Hiperhomeostéticas, entre as sub-sensações e a fraude mais radical, o que sobrevem são comicheiras que farão coçar milénios e patinar em descomunais bebedeiras.