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Liane Moriarty, escritora. "Acredito que todas as famílias têm segredos sombrios"

Com mais de 20 milhões de livros vendidos em mais de 40 línguas e várias adaptações para televisão, a escritora australiana é uma das damas contemporâneas do thriller e do suspense. Entrevistámo-la a propósito de Quem sai aos Seus, que, em breve, será também uma série televisiva.

Foto: D.R
03 de março de 2023 Maria João Martins

Desde Marx que sabemos que "tudo o que é sólido e estável se dissolve no ar". Na História do mundo, como na vida doméstica, o ponto de viragem, que muda um céu sem nuvens para uma tempestade medonha, pode depender de um gesto tão rápido como o salto de um gato ou o fechar de uma torneira. No novo romance da escritora Liane Moriarty, Quem sai aos seus (editado em Portugal pela Asa), os acontecimentos precipitam-se quando certa noite, o casal Delaney abre a porta a uma rapariga de nome Savannah, em busca de ajuda depois de ter sido alegadamente agredida pelo namorado. Mas a situação que era para ser passageira ir-se-á perpetuando no tempo, deixando perplexos e preocupados os quatro filhos adultos deste casal, que se preparava para ter uma reforma dourada depois de uma vida inteira dedicada ao ensino do ténis. Savannah será mesmo uma desconhecida e até que ponto esta família será tão feliz, harmoniosa e bem-sucedida como gosta de se apresentar? 

"Quem Sai aos Seus", o novo livro de Liane Moriarty. Foto: D.R

Neste thriller, em que o suspense é mesmo mantido até às últimas palavras, a autora australiana volta ao seu universo de eleição - a família - e promete repetir o sucesso de outras obras suas, como Pequenas Grandes Mentiras; Nove Perfeitos Desconhecidos e O Segredo do Meu Marido, todas elas adaptadas para televisão. O que tudo indica que também acontecerá com este Quem sai aos Seus, neste momento em pré-rodagem e com os atores Sam Neill e Annette Bening na pele de Joy e Stan Donahue anunciados para os principais papéis. A realização estará a cargo de Melanie Marnich e a escritora integrará a equipa de produção. (Atenção, a entrevista contém spoilers).

Quem sai aos seus tem um casal de idosos como protagonistas, o que não é muito habitual em ficção. Porque os escolheu?

Tudo começou quando li a notícia de um incidente em que uma jovem mulher batia à porta dum casal idoso, certa noite, para pedir ajuda. Eles deixaram-na passar a noite em sua casa mas, infelizmente, não foram recompensados pela gentileza. Pareceu-me um ponto de partida literário cheio de possibilidades. Era uma situação que eu nunca tinha usado. Claro que a Joy e o Stan "saíram-me" mais jovens do que eu tinha pensado inicialmente. Tenho a certeza que nenhum deles se consideraria realmente idoso.

Os seus livros desenvolvem-se frequentemente em torno de terríveis segredos de família, quase sempre inconfessáveis. Pensa que todas as famílias têm segredos mais ou menos sombrios, mesmo as que são consideradas exemplos de harmonia e amor?

Acredito que todas as famílias têm, pelo menos, um segredo sombrio e que, apesar dele, se integram perfeitamente na sociedade, sem levantar a menor suspeita. Aliás, se me falarem de uma família sem segredos ficarei muito desconfiada. 

O novo thriller promete muito suspense com a história da família Delaney.
O novo thriller promete muito suspense com a história da família Delaney. Foto: D.R

E os casamentos longos estão cheios de arrependimentos (muitas vezes não ditos)? É o que acontece aos Delaney....

O casamento tido por perfeito varia de caso para caso - para mim, os únicos elementos essenciais são o riso e o respeito mútuo. Mas por melhor que seja a relação, haverá sempre conflito porque envolve duas pessoas diferentes, a lidar com os altos e baixos da vida à sua maneira, em função da sua personalidade, com momentos mais críticos do que outros. Por isso, mesmo os casamentos que consideramos felizes são sempre um bom material para o escritor.

As suas personagens são muito complexas e densas. Mesmo Savannah, que faz coisas terríveis, tem um lado simpático e generoso. Acredita que mesmo os vilões podem ter um lado bom?

Julgo que sim e é essa coexistência de aspetos bons e maus que os torna interessantes. Mais do que isso, é esse lado melhor que lhes permite continuar a cometer crimes porque os outros acabam por lhes dar o benefício da dúvida. 

A escritora de best sellers revela-nos alguns detalhes do seu novo livro.
A escritora de best sellers revela-nos alguns detalhes do seu novo livro. Foto: D.R

Savannah começa por afirmar ser vítima de violência doméstica e depois acusará Stan de assédio sexual. Mais tarde, sabemos que não era bem assim. Não teme que, nos tempos que correm, essa seja uma mensagem politicamente incorreta?

Admito que pensei nisso quando estava a escrever. Mas é importante assumir que as mulheres também podem ser vilãs e são-no muitas vezes. São humanas: Mentem, roubam, traem. Pretender que não é assim seria prestar um mau serviço aos meus leitores.

Costuma participar nas rodagens das adaptações dos seus livros ao Cinema e Televisão? Fica ansiosa?

Diria que sou uma observadora muito interessada nos bastidores. Adoro visitar o plateau e dar a minha opinião se me pedirem. E claro que assisto ao produto final com muito interesse.

Como é ser uma escritora de best sellers a nível mundial, publicada em mais de 40 línguas? Pensa muito nisso no seu trabalho diário?

Sinto-me muito feliz por poder viver do meu trabalho de sonho e posso dizer que me sinto muito honrada com as mensagens que recebo de muitos leitores em todo o mundo. No entanto, quando me sento na minha mesa de trabalho, tenho de me esquecer disso e de me perder na história que quero contar. Se não o fizesse, acho que ficaria paralisada de medo e não escreveria uma única palavra.
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Mundo, Discussão, Entrevista, Quem sai aos seus, Liane Moriarty
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