Para um pensamento do sul : diálogos com Edgar Morin - BVS-Psi
Para um pensamento do sul : diálogos com Edgar Morin - BVS-Psi
Para um pensamento do sul : diálogos com Edgar Morin - BVS-Psi
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
<strong>diálogos</strong> <strong>com</strong> <strong>Edgar</strong> morin<br />
SESC<br />
DEPARTAMENTO NACIONAL<br />
RIO DE JANEIRO<br />
MARÇO / 2011
SErViÇo Social Do coMÉrcio<br />
Presidência <strong>do</strong> Conselho Nacional<br />
aNtoNio oliVEira SaNtoS<br />
DEPARTAMENTO NACIONAL<br />
Direção-Geral<br />
MaroN EMilE aBi-aBiB<br />
Divisão Administrativa e Financeira<br />
JoÃo carloS goMES rolDÃo<br />
Divisão de Planejamento e Desenvolvimento<br />
álVaro DE MElo SalMito<br />
Divisão de Programas Sociais<br />
NiValDo Da coSta PErEira<br />
Con<strong>sul</strong>toria da Direção-Geral<br />
JUVENal FErrEira FortES Filho<br />
lUÍS FErNaNDo DE MEllo coSta<br />
ENCONTRO INTERNACIONAL PARA uM PENSAMENTO<br />
DO SuL: <strong>diálogos</strong> <strong>com</strong> <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong><br />
Coordenação geral<br />
EDgar MoriN<br />
Coordenação técnica<br />
Direção da Divisão de Planejamento e Desenvolvimento<br />
álVaro DE MElo SalMito<br />
Coordenação Acadêmica e Organização<br />
Marta DE azEVEDo irViNg<br />
Assessoria Técnica da Gerência de<br />
Desenvolvimento Técnico/DPD<br />
Marcia alEgrE PiNa<br />
Assessoria Técnica da Gerência de Estu<strong>do</strong>s e<br />
Pesquisas/DPD<br />
MôNica Da SilVa caStro<br />
Apoio técnico<br />
Diretoria da Escola SESC de Ensino Médio<br />
claUDia FaDEl, aNtoNio ViVEiroS<br />
Assessoria Técnica da Escola SESC de Ensino Médio<br />
roSâNgEla logatto<br />
PuBLICAÇÃO<br />
Assessoria de Divulgação e Promoção/<br />
Direção-Geral<br />
chriStiaNE caEtaNo<br />
Coordenação Editorial<br />
FErNaNDa SilVEira<br />
Preparação<br />
DUaS ágUaS | iEDa Magri<br />
Projeto Gráfico<br />
aNa criStiNa PErEira (haNNah 23)<br />
Editoração<br />
iNgraFoto<br />
Revisão de Texto<br />
clariSSa PENNa<br />
Márcia caPElla<br />
Revisão de Texto Inglês e Espanhol<br />
iDioMaS & cia<br />
Produção Gráfica<br />
cElSo MENDoNÇa<br />
Ficha catalográFica<br />
<strong>Para</strong> <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> <strong>sul</strong> : <strong>diálogos</strong> <strong>com</strong> <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong>.<br />
— Rio de Janeiro : SESC, Departamento Nacional, 2011.<br />
228 p.; 21 cm.<br />
Inclui bibliografia.<br />
ISBN 978-85-89336-57-4.<br />
1. Educação — Filosofia - Congressos. 2. <strong>Morin</strong>, <strong>Edgar</strong>,<br />
1921-. I. SESC. Departamento Nacional.<br />
CDD 370.1
5 CONvITE AO ENCONTRO INTERNACIONAL<br />
PARA uM PENSAMENTO DO SuL<br />
8 MoriN, EDgar<br />
s<strong>um</strong>ário<br />
PARA uM PENSAMENTO DO SuL<br />
22 aDÃo, aNtoNiEta caPParElli<br />
A ESPERANÇA vEM DO SuL<br />
26 agUirrE, JUlio lEôNiDaS<br />
PENSAMIENTO DEL SuR<br />
32 alMEiDa, Maria Da coNcEiÇÃo DE<br />
PENSAMENTO DO SuL COMO<br />
RESERvA ANTROPOLógICA<br />
38 alMEiDa, roSilENE SoUSa<br />
A CEguEIRA: O MOvIMENTO DO MuNDO<br />
E A REFORMA DAS INSTITuIÇõES E MENTES<br />
44 BarroS, lUiz FErNaNDo DE MoraES<br />
charrEt, hEloizE Da cUNha<br />
MEllo, EDir FigUEirEDo DE o. tEixEira DE<br />
PENSAMENTO DO SuL: uMA BúSSOLA<br />
PARA uM NOvO MuNDO?<br />
48 carrizo, lUiS<br />
TEMAS CENTRALES quE INSPIRAN<br />
EL PENSAMIENTO DEL SuR<br />
52 carValho, EDgarD DE aSSiS<br />
CONTRIBuIÇõES "PARA uM<br />
PENSAMENTO DO SuL"<br />
58 corDÃo, FraNciSco aParEciDo<br />
quAIS OS TEMAS CENTRAIS<br />
quE INSPIRAM O PENSAMENTO DO SuL?<br />
66 coUtiNho, Jairo<br />
CONTRIBuIÇõES "PARA uM<br />
PENSAMENTO DO SuL"<br />
72 EStarQUE, tErEza MENDoNÇa<br />
CONTRIBuIÇõES "PARA uM<br />
PENSAMENTO DO SuL"<br />
78 Falci, NUriMar Maria<br />
CONTRIBuIÇõES "PARA uM<br />
PENSAMENTO DO SuL"<br />
84 galVaNi, PaScal<br />
RELIgAR LA ExPERIENCIA DEL SuR<br />
y EL SuR DE LA ExPERIENCIA,<br />
uN MéTODO ALTERNATIvO DE<br />
INvESTIgACIóN-ACCIóN-FORMACIóN<br />
90 gaMEro, tErESa SaliNaS<br />
TEMAS CENTRALES quE INSPIRAN<br />
EL PENSAMIENTO DEL SuR<br />
96 irViNg, Marta DE azEVEDo<br />
INSPIRAÇõES DO SuL PARA<br />
uMA NOvA POLíTICA DE CIvILIzAÇãO<br />
102 lEitE, Márcia coSta roDrigUES<br />
ALguMAS REFLExõES SOBRE<br />
O PENSAMENTO DO SuL<br />
106 MalDoNato, MaUro<br />
RuMO AO SuL<br />
112 MartÍNEz, aNa cEcilia ESPiNoSa<br />
uNA ExPERIENCIA TRANSDISCIPLINAR<br />
DE AuTO-ECO-ORgANIzACIóN DE<br />
uNA uNIvERSIDAD DEL SuR
120 MartiNS, PaUlo hENriQUE<br />
CONTRIBuIÇãO DOS ESTuDOS<br />
"DESCOLONIAIS" PARA OS DESAFIOS PROPOSTOS<br />
POR EDgAR MORIN PARA A ORgANIzAÇãO<br />
DO PENSAMENTO DO SuL<br />
126 MEDEiroS, claUDia SaNtoS DE<br />
LEONARDO E ANDERSON: ENCONTRO ENTRE<br />
OS ALPES SuíÇOS E A FLORESTA AMAzôNICA<br />
130 MiraNDa, DaNilo SaNtoS DE<br />
CONSIDERAÇõES SOBRE EDgAR MORIN E A<br />
DEFESA DE uM PENSAMENTO DO SuL<br />
136 MoraES, Maria câNDiDa<br />
CONTRIBuIÇõES "PARA uM<br />
PENSAMENTO DO SuL"<br />
146 MorEira, irlaNDo tENório<br />
CONTRIBuIÇõES "PARA uM<br />
PENSAMENTO DO SuL"<br />
150 NaSciMENto, EliMar PiNhEiro Do<br />
CONTRIBuIÇõES "PARA uM<br />
PENSAMENTO DO SuL"<br />
154 NEira, hUgo<br />
PARA uNA LECTuRA DE EDgAR MORIN<br />
160 NUoVo, SaNto Di<br />
SOME CORE quESTIONS ABOuT ThE<br />
"A ThINkINg OF ThE SOuTh"<br />
166 oSPiNa, gUStaVo loPEz<br />
PENSAMIENTO DEL SuR<br />
172 PEtraglia, izaBEl<br />
uM PENSAMENTO DO SuL E A ESPERANÇA<br />
DE uMA NOvA POLíTICA DE CIvILIzAÇãO<br />
178 riEra, ElBa DEl carMEN<br />
TEMAS CENTRALES quE INSPIRAN<br />
EL PENSAMIENTO DEL SuR<br />
182 SEBilia, aNDrES SaloMoN cohEN<br />
O PENSAMENTO DO SuL: uMA vISãO CRíTICA<br />
DO DESENvOLvIMENTO DESTRuTIvO<br />
188 SiMÕES, carloS artExES<br />
PENSAMENTO DO SuL: CONSTRuINDO<br />
uMA NOvA CIvILIzAÇãO<br />
194 SoriaNo, lUz iNMacUlaDa MaDEra<br />
PENSAMIENTO DEL SuR y huMANISMO<br />
LATINOAMERICANO EN LA TRAMA DE LO uNIvERSAL<br />
200 SotoloNgo, PEDro lUiS coDiNa<br />
hACIA uN PENSAMIENTO —<br />
COMPLEJO y CRíTICO — DEL SuR<br />
206 SoUza, Maria alicE loPES<br />
CONTRIBuIÇõES "PARA uM<br />
PENSAMENTO DO SuL"<br />
212 VallEJo-góMEz, NElSoN<br />
PENSAMIENTO DEL SuR<br />
216 VElaSco, JUaN MigUEl goNzálEz<br />
RECONECTAR LO quE ESTá DISPERSO:<br />
uN PENSAMIENTO DEL SuR PLANETARIO<br />
222 zoYa, lEoNarDo g. roDrÍgUEz<br />
TEMAS CENTRALES quE INSPIRAN<br />
EL PENSAMIENTO DEL SuR<br />
s<strong>um</strong>ário
Convite ao encontro<br />
internacional PARA uM<br />
PENSAMENTO DO SuL<br />
é <strong>com</strong> grande satisfação que a Diretoria Nacional <strong>do</strong> SESC, <strong>com</strong> esta publicação,<br />
<strong>com</strong>partilha as reflexões sobre o texto de <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong> "<strong>Para</strong> <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong><br />
<strong>do</strong> Sul", nortea<strong>do</strong>r <strong>do</strong> encontro de 2011.<br />
Centra<strong>do</strong> na perspectiva da América Latina, este encontro vem sen<strong>do</strong><br />
planeja<strong>do</strong> desde janeiro de 2010, quan<strong>do</strong> o SESC recebeu a visita de <strong>Edgar</strong><br />
<strong>Morin</strong> e também a provocação para organizar <strong>um</strong>a reunião que pudesse<br />
agregar <strong>um</strong>a rede de colabora<strong>do</strong>res de diversas inserções temáticas e<br />
institucionais, <strong>com</strong> o objetivo de discutir as contribuições <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong><br />
<strong>do</strong> Sul para <strong>um</strong>a nova política de civilização. Desde então, <strong>com</strong>eçou a<br />
ser configura<strong>do</strong> <strong>um</strong> projeto <strong>com</strong> esse objetivo, que mobilizou <strong>um</strong>a equipe<br />
<strong>do</strong> SESC <strong>com</strong> a assessoria acadêmica da pesquisa<strong>do</strong>ra especializada da<br />
uFRJ Marta de Azeve<strong>do</strong> Irving. Assim, formou-se <strong>um</strong>a coordenação interdisciplinar,<br />
que vem trabalhan<strong>do</strong> sistematicamente nas ações <strong>do</strong> projeto,<br />
estrutura<strong>do</strong> nas fases descritas a seguir para <strong>um</strong>a melhor <strong>com</strong>preensão<br />
<strong>do</strong> processo.<br />
5
6<br />
FASE 1: MOBILIZAÇÃO PARA O PROJETO<br />
Efetivada entre abril e agosto de 2010, subdividiu-se em duas etapas:<br />
a) discussão conceitual e balizamento da proposta, leitura e discussão<br />
<strong>do</strong> texto-base, orienta<strong>do</strong>r, de <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong>, "<strong>Para</strong> <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul",<br />
reconhecimento e intercâmbio da equipe técnica e gerencial envolvida e<br />
discussão das etapas de planejamento; b) detalhamento meto<strong>do</strong>lógico <strong>do</strong><br />
projeto, definição da matriz de colabora<strong>do</strong>res, ajustes operacionais e medidas<br />
internas para a efetivação <strong>do</strong> processo, consolidação <strong>do</strong> material<br />
preparatório para convite e formalização de participação no evento e balizamento<br />
final <strong>do</strong> projeto.<br />
FASE 2: REUNIÕES TÉCNICAS COM EDGAR MORIN E EQUIPE DO<br />
SESC PARA DISCUSSÃO E AJUSTE DA PROPOSTA<br />
Realização de reuniões técnicas <strong>com</strong> a equipe de coordenação e <strong>com</strong><br />
<strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong>, em setembro de 2010, para discussão e ajustes da proposta,<br />
<strong>com</strong> base nos inputs <strong>do</strong> próprio pensa<strong>do</strong>r.<br />
FASE 3: PLANEJAMENTO DO EVENTO / ACOMPANHAMENTO TÉCNICO<br />
E GERENCIAL DE PROCESSO<br />
Implementação <strong>do</strong> projeto, iniciada efetivamente em outubro de 2010,<br />
a partir de diretrizes técnicas para planejamento e realização <strong>do</strong> evento,<br />
construídas e discutidas pela equipe de coordenação.<br />
FASE 4: ENVIO DE MATERIAL E RECEBIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES<br />
ESCRITAS<br />
Entre novembro de 2010 e janeiro de 2011 foi realiza<strong>do</strong> o processo de envio<br />
de material preparatório <strong>do</strong> encontro, sen<strong>do</strong> recebidas as contribuições
escritas <strong>do</strong>s participantes que confirmaram presença no evento. Até o dia<br />
21 de janeiro foram recebi<strong>do</strong>s os 36 textos, que estão a seguir sistematiza<strong>do</strong>s<br />
para leitura e con<strong>sul</strong>ta, <strong>com</strong>o inspiração às discussões propostas.<br />
FASE 5: REALIZAÇÃO DO EVENTO<br />
Realização <strong>do</strong> encontro, no qual temos a satisfação em recebê-los. O<br />
evento foi concebi<strong>do</strong> <strong>com</strong>o <strong>um</strong>a reunião de trabalho, estrutura<strong>do</strong> em <strong>do</strong>is<br />
momentos: a) <strong>com</strong> base na leitura <strong>do</strong>s textos recebi<strong>do</strong>s e nas questões<br />
nortea<strong>do</strong>ras, faremos a discussão em grupos, subdividi<strong>do</strong>s em três temas:<br />
<strong>pensamento</strong> econômico, questões sociais e pobreza, a reforma da educação<br />
e unidade h<strong>um</strong>ana e diversidade cultural; b) <strong>com</strong>o des<strong>do</strong>bramento<br />
das discussões anteriores, to<strong>do</strong>s os grupos discutirão "O <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong><br />
Sul para <strong>um</strong>a nova política de civilização". Espera-se, <strong>com</strong> este encontro, a<br />
construção coletiva de saberes e fazeres, consolida<strong>do</strong>s em <strong>um</strong>a publicação<br />
(Anais <strong>do</strong> encontro), de autoria <strong>do</strong> próprio grupo, que possa contribuir para<br />
<strong>um</strong>a reflexão crítica e engajada, na busca de novos caminhos e <strong>um</strong>a nova<br />
forma de pensar e agir na contemporaneidade.<br />
Com esse desafio, convidamos a to<strong>do</strong>s para a leitura desta publicação<br />
e para <strong>com</strong>partilhar conosco esse processo.<br />
A coordenação,<br />
álvaro Salmito | Claudia Fadel | Marta Irving<br />
7
8<br />
MORIN, eDGAR<br />
Retradução: <strong>Edgar</strong>d de Assis Carvalho
<strong>Para</strong> <strong>um</strong><br />
<strong>pensamento</strong><br />
<strong>do</strong> Sul<br />
O que é o Sul? Em primeiro lugar, trata-se de <strong>um</strong>a noção falsamente clara.<br />
Se é evidente que o Sul se define em relação ao Norte, <strong>um</strong> <strong>sul</strong> — <strong>com</strong>o<br />
o Magrebe em relação à Europa — é <strong>um</strong> norte para a áfrica. Na Europa, a<br />
Itália é <strong>um</strong> país <strong>do</strong> <strong>sul</strong> europeu que faz limite norte <strong>com</strong> Milão, a Lombardia.<br />
País <strong>do</strong> norte, a França tem o seu <strong>sul</strong>: a Provença, o Langue<strong>do</strong>c. Metrópole<br />
<strong>do</strong> <strong>sul</strong>, São Paulo é muito impregnada de norte. A noção de <strong>sul</strong> é relativa. Devemos,<br />
portanto, evitar qualquer reificação ou substancialização <strong>do</strong> termo<br />
"<strong>sul</strong>". quanto ao Norte, ele também não pode ser concebi<strong>do</strong> <strong>com</strong>o entidade<br />
geográfica. Ele é muito heterogêneo e não falamos obviamente da Rússia,<br />
mais próxima culturalmente <strong>do</strong> <strong>sul</strong> europeu <strong>do</strong> que <strong>do</strong> norte anglo-saxão,<br />
nem evidentemente da Sibéria. Ele tampouco pode ser entendi<strong>do</strong> <strong>com</strong>o<br />
<strong>um</strong> tipo ideal, na maneira concebida por Max Weber. Não é, igualmente,<br />
<strong>um</strong>a noção redutora que esqueceria todas as qualidades oriundas <strong>do</strong><br />
Norte. Na verdade, o que hoje denominamos Norte era há alg<strong>um</strong>as décadas<br />
chama<strong>do</strong> de Ocidente, quan<strong>do</strong> o opúnhamos ao Oriente; ele se tornou<br />
Norte, oposto <strong>do</strong> Sul, quan<strong>do</strong> o termo "Terceiro Mun<strong>do</strong>" caiu em desuso.<br />
<strong>Para</strong> o Sul, existe de fato <strong>um</strong>a hegemonia <strong>do</strong> Norte, que é a hegemonia da<br />
técnica, da economia, <strong>do</strong> cálculo, da racionalização, da rentabilidade e da<br />
eficiência. Essas noções não devem ser rejeitadas, embora <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong><br />
9
10<br />
<strong>do</strong> Sul talvez deva se expressar de maneira consciente e crítica a respeito<br />
delas pelo fato de que essa hegemonia insufla intensamente seu dinamismo<br />
no planeta <strong>com</strong>o <strong>um</strong> to<strong>do</strong>. E mais ainda porque o Norte está atualmente<br />
devoran<strong>do</strong> — ou tentan<strong>do</strong> devorar — o Sul.<br />
Existem evidentemente vários "suis", muito diferentes uns <strong>do</strong>s outros,<br />
mas que são submeti<strong>do</strong>s à concepção única vinda <strong>do</strong> Norte, <strong>do</strong> atraso, <strong>do</strong><br />
subdesenvolvimento, <strong>do</strong> imperativo <strong>do</strong> desenvolvimento e da modernização.<br />
Essa visão impede perceber que nos "suis" existem qualidades, virtudes,<br />
artes de viver, mo<strong>do</strong>s de conhecimento que deveriam não apenas ser<br />
salvaguarda<strong>do</strong>s, mas também propaga<strong>do</strong>s pelos "nortes". <strong>Para</strong> chegar à<br />
plena consciência das qualidades e virtudes <strong>do</strong> Sul, seria preciso <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong><br />
<strong>do</strong> Sul. <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>com</strong>o esse ainda tem que ser elabora<strong>do</strong><br />
a partir das experiências <strong>do</strong>s diversos "suis".<br />
<strong>um</strong> esclarecimento preliminar é necessário. Afirmei que Norte e Sul<br />
eram noções relativas. é preciso acrescentar que não é preciso idealizar<br />
nem desvalorizar <strong>um</strong>a ou outra. qualquer cultura ou qualquer civilização<br />
(aqui a distinção entre ambas pouco importa) têm qualidades, virtudes,<br />
ilusões, imperfeições.<br />
Oriunda <strong>do</strong> Ocidente europeu, desenvolvida no mun<strong>do</strong> anglo-saxão, a<br />
cultura <strong>do</strong> Norte trouxe a democracia representativa, os direitos h<strong>um</strong>anos,<br />
os direitos da mulher, as autonomias individuais. Mas também possui carências<br />
profundas concentradas no poder e nos desenvolvimentos materiais;<br />
ela tem suas cegueiras, suas ilusões, expressas até <strong>um</strong>a época recente na<br />
ocultação da relação vital entre o ser h<strong>um</strong>ano e o mun<strong>do</strong> natural ou no mito<br />
de <strong>um</strong> progresso concebi<strong>do</strong> <strong>com</strong>o lei inelutável da história h<strong>um</strong>ana.<br />
Do la<strong>do</strong> <strong>do</strong>s "suis", n<strong>um</strong>erosas culturas mantêm a autoridade incondicional<br />
<strong>do</strong>s poderes políticos e religiosos, a <strong>do</strong>minação <strong>do</strong> homem sobre a<br />
mulher, interditos de to<strong>do</strong>s os tipos. A totalidade da reflexão aqui proposta<br />
é a da recusa da redução (de <strong>um</strong> <strong>com</strong>plexo a <strong>um</strong> de seus elementos), da<br />
disjunção (que separa ideias aparentemente antagônicas e, no entanto,<br />
<strong>com</strong>plementares).<br />
qual poderia ser a contribuição <strong>do</strong> mediterrâneo para a elaboração de<br />
<strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>com</strong>o esse? Existe a herança cultural mais antiga que, sem<br />
dúvida, é a de <strong>um</strong>a divindade universal, que o faraó Akenáton quis reconhecer<br />
e a<strong>do</strong>rar por meio <strong>do</strong> sol. O deus universal reapareceu na Bíblia e<br />
nos Evangelhos. Ele repele os deuses múltiplos das religiões politeístas. Em<br />
minha opinião, <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul conciliaria o senti<strong>do</strong> da diversidade<br />
concreta da natureza expressa pelos deuses <strong>do</strong>s politeísmos antigos, principalmente<br />
o grego e o latino, assim <strong>com</strong>o o senti<strong>do</strong> da unidade <strong>do</strong> universo<br />
que o Deus único exprime.
A partir de Paulo de Tarso surgiu <strong>um</strong>a religião dirigida a to<strong>do</strong>s os seres<br />
h<strong>um</strong>anos em que "não há mais judeus nem gentios". Ela contém <strong>um</strong>a fonte<br />
de universalidade concreta que se dirige à multiplicidade h<strong>um</strong>ana em suas<br />
diferentes etnias e que se reencontrará no Islã e, depois, sob forma laicizada,<br />
no h<strong>um</strong>anismo europeu.<br />
Encontramos outra fonte de universalidade na herança cultural helênica:<br />
qualquer ser h<strong>um</strong>ano é <strong>do</strong>ta<strong>do</strong> de razão, o que lhe permite exercer<br />
sua <strong>com</strong>petência na política da Pólis. A deusa Atena não dirige a cidade<br />
de Atenas, ela a protege. quem dirige é a Assembleia <strong>do</strong>s cidadãos. E na<br />
democracia, <strong>com</strong>o na filosofia ateniense, o debate desempenha <strong>um</strong> papel<br />
central: é o caminho para a verdade. Além disso, a filosofia se define não<br />
somente <strong>com</strong>o <strong>um</strong>a busca de sabe<strong>do</strong>ria mas, ainda mais, <strong>com</strong>o <strong>um</strong>a vontade<br />
de reflexão acerca de todas as coisas.<br />
Precisamos também ass<strong>um</strong>ir a herança universalista <strong>do</strong> Império Romano<br />
expressa no edito de Caracala, que reconheceu os direitos de<br />
cidadão romano a qualquer habitante <strong>do</strong> Império, independentemente<br />
de sua origem étnica.<br />
é necessário, igualmente, ass<strong>um</strong>ir a mensagem <strong>do</strong> Renascimento — outra<br />
mensagem <strong>do</strong> Sul — e é essa mensagem que precisamos ass<strong>um</strong>ir e retomar<br />
expressa no termo "problematizar". O Renascimento é <strong>um</strong> movimento <strong>do</strong><br />
espírito no qual se problematiza o mun<strong>do</strong>: "O que é o mun<strong>do</strong>?" Problematiza-se<br />
o homem: "O que é o homem?" Problematiza-se a natureza: "O que<br />
é a natureza?" Problematiza-se Deus: "De qual Deus falamos? Ele existe?"<br />
<strong>um</strong> h<strong>um</strong>anismo nasceu a partir dessa problematização. A palavra "h<strong>um</strong>anismo"<br />
tem duas faces. há <strong>um</strong>a face que precisamos aban<strong>do</strong>nar. é a <strong>do</strong> homem<br />
<strong>do</strong>mina<strong>do</strong>r, destina<strong>do</strong> a se tornar senhor e mestre da natureza, segun<strong>do</strong><br />
a formulação de Descartes. Devemos rejeitar esse h<strong>um</strong>anismo arrogante,<br />
porque sabemos, de agora em diante, que qualquer vontade de <strong>do</strong>minar a<br />
natureza degrada, não apenas essa natureza, mas também nossa h<strong>um</strong>anidade,<br />
inseparavelmente ligada a ela, que depende dela ainda mais <strong>do</strong> que ela<br />
de nós. A outra face <strong>do</strong> h<strong>um</strong>anismo é a <strong>do</strong> valor e da dignidade de to<strong>do</strong> ser<br />
h<strong>um</strong>ano, qualquer que seja ele, venha de onde vier. é esse h<strong>um</strong>anismo que<br />
devemos não apenas ass<strong>um</strong>ir, mas também propagar nesta era planetária,<br />
em que toda a h<strong>um</strong>anidade vive <strong>um</strong>a <strong>com</strong>unidade de destino.<br />
Temos que ass<strong>um</strong>ir também a herança cultural <strong>do</strong> Renascimento, porque<br />
hoje, de novo, devemos problematizar o mun<strong>do</strong>. Nosso universo não é<br />
mais o de Copérnico e o de galileu, no qual o sol se tornara central. é <strong>um</strong><br />
universo absolutamente gigantesco, onde não há mais centro, onde a Terra<br />
é o minúsculo planeta de <strong>um</strong> minúsculo sol, astro menor de <strong>um</strong>a pequena<br />
11
12<br />
galáxia periférica. Devemos problematizar o real: onde está a "verdadeira"<br />
realidade? Nas partículas e nos átomos? Nos objetos de nossa percepção?<br />
Na nossa mente? O que significa a realidade hoje em dia?<br />
Devemos reproblematizar nossa relação <strong>com</strong> a natureza, que temos<br />
considera<strong>do</strong> <strong>com</strong>o feita de objetos a serem manipula<strong>do</strong>s, <strong>do</strong>mestica<strong>do</strong>s<br />
ou destruí<strong>do</strong>s, quan<strong>do</strong> somos inseparavelmente e vitalmente liga<strong>do</strong>s a ela.<br />
Devemos reproblematizar nossas crenças e cre<strong>do</strong>s, a <strong>com</strong>eçar pela nossa<br />
crença n<strong>um</strong> progresso irreversível da h<strong>um</strong>anidade.<br />
Precisamos, enfim, problematizar o próprio instr<strong>um</strong>ento da problematização<br />
que é a razão. Devemos <strong>com</strong>eçar a entender que a razão não é<br />
única, monolítica, simples. Existe <strong>um</strong>a racionalidade aberta que reconhece<br />
os limites de sua capacidade de apreensão e que não se pode senão reconhecer<br />
o mistério <strong>do</strong> universo.<br />
Existe a racionalidade teórica, que elabora sistemas de ideias. Existe<br />
a racionalidade crítica, que ataca as crenças infundadas. Existe a racionalidade<br />
autocrítica, que examina racionalmente sua própria cultura e<br />
sua própria pessoa. Existe a razão fechada, incapaz de acolher os arg<strong>um</strong>entos<br />
e os fatos que a contradizem. Existe a racionalidade quente, estimulada<br />
por <strong>um</strong>a paixão. E existe a racionalidade glacial <strong>do</strong> cálculo. Existe<br />
<strong>um</strong>a racionalidade degenerada, que é a racionalização, fundada n<strong>um</strong>a<br />
lógica implacável e limitada. Existe a racionalidade instr<strong>um</strong>ental, que<br />
está a serviço <strong>do</strong>s delírios e crueldades h<strong>um</strong>anas. Temos, evidentemente,<br />
que regenerar o que a virtude da racionalidade contém: a capacidade<br />
teórica, a capacidade crítica, a denúncia <strong>do</strong>s <strong>do</strong>gmas, a resistência ao<br />
anátema e, sobretu<strong>do</strong>, também a capacidade autocrítica, que ainda é<br />
muito subdesenvolvida.<br />
Precisamos misturar essas heranças culturais mediterrâneas <strong>com</strong> as<br />
heranças culturais africanas e <strong>sul</strong>-americanas. Por mais diferentes que sejam,<br />
todas elas <strong>com</strong>portam mo<strong>do</strong>s míticos ou religiosos de integração no<br />
cosmo e na natureza, <strong>do</strong>s quais devemos extrair a verdade profunda e<br />
ligá-la à nossa nova consciência ecológica, que reconhece nossa integração<br />
na biosfera, algo que o devir da mundialização continua a degradar,<br />
impulsiona<strong>do</strong> pelo norte. Existe a herança das tradições de solidariedade,<br />
que implica integrar e não destruir. Existem múltiplos conhecimentos, saberes<br />
sobre o mun<strong>do</strong> mineral, vegetal e animal que temos que incorporar.<br />
Existem artes de viver muito diversas e ricas, inclusive nas pequenas sociedades<br />
indígenas da América <strong>do</strong> Sul e da áfrica.<br />
Deste mo<strong>do</strong>, ao reunir e conjugar todas essas heranças culturais, <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong><br />
<strong>do</strong> Sul é capaz de realizar <strong>um</strong>a nova e grande problematização.
Comecemos por problematizar a mundialização. Inicia<strong>do</strong> no fim <strong>do</strong> sé-<br />
culo xv <strong>com</strong> a conquista das Américas e a navegação ao re<strong>do</strong>r <strong>do</strong> globo,<br />
esse processo se desenvolveu na e por meio da colonização e da escravi-<br />
dão e, a partir <strong>do</strong>s anos 1990, se des<strong>do</strong>brou sob a forma da globalização.<br />
Esse processo prossegue de maneira desenfreada. A ciência, a técnica, a<br />
economia, o lucro são os motores desse dinamismo que propulsa a nave espacial<br />
Terra. Este dinamismo científico-técnico-econômico produziu novos<br />
perigos para toda a h<strong>um</strong>anidade, <strong>com</strong> a proliferação das armas nucleares,<br />
<strong>com</strong> a degradação da biosfera, <strong>com</strong> as policrises planetárias e, também,<br />
<strong>com</strong> os novos conflitos étnico-religiosos que dilaceram nosso planeta e podem<br />
provocar a utilização das armas de aniquilamento.<br />
Somos testemunhas e vítimas atuais de <strong>um</strong>a crise econômica decorrente<br />
da ausência de regulação de <strong>um</strong>a economia mundial corrompida pela<br />
especulação financeira. Essa crise se inscreve n<strong>um</strong> conjunto de crises. Crise<br />
da relação entre os seres h<strong>um</strong>anos e a natureza, <strong>com</strong>o o provam as<br />
múltiplas degradações da biosfera. Crise das sociedades tradicionais, que<br />
tendem a se desintegrar sob o dinamismo dessa mundialização, que, na<br />
verdade, é <strong>um</strong>a ocidentalização. Crise da própria modernidade, já que não<br />
só a modernidade alcançada nos países da Europa ocidental e nos Esta<strong>do</strong>s<br />
uni<strong>do</strong>s não c<strong>um</strong>priu as promessas de <strong>um</strong>a vida melhor, de <strong>um</strong>a vida<br />
emancipada, de <strong>um</strong>a vida harmoniosa, mas, ao contrário disso, criou <strong>um</strong><br />
novo mal-estar na civilização. Crise da modernidade também, no senti<strong>do</strong><br />
em que o que justificava seu devir era a ideia transformada em <strong>do</strong>gma universal<br />
no século xx de que o progresso era <strong>um</strong>a lei implacável da história<br />
h<strong>um</strong>ana. Acontece que, progressivamente, descobrimos que motores <strong>do</strong><br />
progresso eram profundamente ambivalentes, <strong>com</strong>o a ciência, a técnica,<br />
o desenvolvimento. Descobrimos também que a promessa morreu, que o<br />
futuro é incerto, que o amanhã é desconheci<strong>do</strong>. A autodestruição da ideia<br />
de progresso nos levou a <strong>um</strong>a crise <strong>do</strong> futuro. E diante da crise <strong>do</strong> futuro,<br />
da angústia <strong>do</strong> presente, o que sobra a não ser à volta às raízes, isto é, ao<br />
passa<strong>do</strong>? O filósofo tcheco Jan Patocka formulou a visão mais correta acerca<br />
desse tema: "O devir é problematiza<strong>do</strong> e ele o será para sempre". Isso<br />
quer dizer que a aventura h<strong>um</strong>ana é <strong>um</strong>a aventura desconhecida.<br />
Assim, todas essas crises desembocam na crise <strong>do</strong> desenvolvimento.<br />
é certo que o desenvolvimento trouxe bem-estar, autonomias individuais,<br />
emancipações por meio da criação de novas classes médias. Mas o desenvolvimento<br />
trouxe também a destruição das solidariedades tradicionais,<br />
novas corrupções, crescimento das desigualdades por toda parte <strong>do</strong><br />
globo, enormes misérias. Presenciamos esse conjunto de fatos na ásia, na<br />
América Latina, na áfrica, em megalópoles <strong>com</strong> imensos subúrbios ou peri-<br />
13
14<br />
ferias empobrecidas. Como afirmou <strong>com</strong> muito acerto o pensa<strong>do</strong>r iraniano<br />
Majid Rahnema, foi a miséria que trouxe consigo a pobreza. Certamente<br />
<strong>um</strong>a parte da pobreza foi dissipada pela prosperidade das novas classes<br />
médias, mas a pobreza que permitia <strong>um</strong> mínimo de vida digna foi superada<br />
em grande parte pela miséria que implica dependência, h<strong>um</strong>ilhação.<br />
vivemos, então, a crise <strong>do</strong> desenvolvimento, que é, ao mesmo tempo, a<br />
crise da ocidentalização e a crise da mundialização. São três faces da mesma<br />
crise. A crise da mundialização é, também, a crise da unificação tecnoeconômica<br />
<strong>do</strong> globo. Essa crise ocorreu após o colapso das economias ditas<br />
socialistas na união Soviética, na China, no vietnã, na e pela mundialização<br />
<strong>do</strong> capitalismo e das tele<strong>com</strong>unicações, que permitem que to<strong>do</strong>s os pontos<br />
<strong>do</strong> planeta estejam em conexão imediata (telefone, fax, internet). Presenciamos<br />
<strong>um</strong>a fantástica unificação <strong>do</strong> planeta. No entanto, essa unificação<br />
coincide <strong>com</strong> de<strong>com</strong>posições de todas as modalidades: a união Soviética<br />
se desagrega em nações novas e, por vezes, antagônicas, <strong>com</strong>o o Azerbaijão<br />
e a Armênia e, recentemente, a geórgia e a própria Rússia; logo depois<br />
de 1990, a ofensiva <strong>do</strong>s nacionalismos croata e sérvio desagrega <strong>um</strong>a nação<br />
aparentemente integrada <strong>com</strong>o a Iugoslávia e produz <strong>um</strong>a guerra atroz<br />
contra a qual a Europa se mostrou impotente. Depois a Tchecoslováquia se<br />
dividiu em duas regiões e, a partir de 1989, constitui a chamada República<br />
Eslovaca. <strong>um</strong> pouco por toda parte, forças centrífugas estão em ação no<br />
seio das nações e das etnias que reivindicam sua transformação em nações.<br />
Essa coincidência pode ser <strong>com</strong>preendida porque a unificação tecno-<br />
-econômica produziu a desarticulação sociocultural: essa unificação traz<br />
consigo <strong>um</strong>a homogeneização civilizacional que, em inúmeros casos, ameaça<br />
as originalidades e as singularidades culturais, étnicas, nacionais. Daí<br />
decorre <strong>um</strong>a reação de retorno à nação, à etnia e, até mesmo, à religião.<br />
Cada vez mais, o processo de unificação provoca ainda mais desagregação,<br />
<strong>do</strong> mesmo mo<strong>do</strong> que a incerteza histórica trouxe simultaneamente a<br />
perda da fé no progresso, a perda da esperança n<strong>um</strong> mun<strong>do</strong> novo, a angústia<br />
<strong>do</strong> presente, o que contribuiu para o fechamento das nações e das<br />
mentes, para o retorno ao passa<strong>do</strong> religioso, étnico e/ou nacional.<br />
Assistimos ao desencadeamento <strong>com</strong>bina<strong>do</strong> de duas pragas para a<br />
h<strong>um</strong>anidade. A primeira praga é a unificação abstrata e homogeneizante<br />
que destrói as diversidades. A segunda é o fechamento das singularidades<br />
em si mesmas que, desse mo<strong>do</strong>, se tornam abstratas, porque se<br />
isolam <strong>do</strong> resto da h<strong>um</strong>anidade. vivenciamos o processo de duas abstrações<br />
de natureza diferente.<br />
é preciso entender aqui o vínculo entre a unidade e a diversidade h<strong>um</strong>ana.<br />
é evidente que existe <strong>um</strong>a unidade anatômica, genética, fisiológica,<br />
cerebral, afetiva de to<strong>do</strong>s os seres h<strong>um</strong>anos, mas essa unidade se expressa
de <strong>um</strong>a maneira extremamente diferenciada. Não há <strong>do</strong>is indivíduos que<br />
se assemelhem: mesmo gêmeos homozigotos se diferenciam <strong>um</strong> <strong>do</strong> outro.<br />
Acontece o mesmo <strong>com</strong> a cultura (isto é, tu<strong>do</strong> o que é aprendi<strong>do</strong>: saberes,<br />
fazeres, crenças, mitos etc.), marca universal na h<strong>um</strong>anidade que só existe<br />
por intermédio das culturas singulares — a música só existe por meio das<br />
músicas etc. — o que faz <strong>com</strong> que o tesouro da unidade h<strong>um</strong>ana seja a diversidade<br />
e o da diversidade h<strong>um</strong>ana, a unidade. Leibniz afirmava: "O uno<br />
conserva e salva o múltiplo". Essa re<strong>com</strong>endação fundamental poderia nos<br />
indicar <strong>um</strong> caminho para sair <strong>do</strong> antagonismo entre a diversidade fechada<br />
em si mesma e a unidade abstrata, <strong>um</strong> caminho que <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> <strong>sul</strong><br />
deveria conceber.<br />
Estamos confronta<strong>do</strong>s <strong>com</strong> a crise da h<strong>um</strong>anidade que não consegue<br />
atingir a h<strong>um</strong>anidade. Estamos confronta<strong>do</strong>s <strong>com</strong> <strong>um</strong> planeta que ao mesmo<br />
tempo em que dá continuidade ao dinamismo triunfante da técnica, da<br />
ciência e da economia coloca-se em situação perigosa. Com <strong>um</strong>a grande<br />
lucidez, heidegger afirmava que apesar de acreditarmos estar n<strong>um</strong>a nova<br />
era <strong>do</strong> Il<strong>um</strong>inismo, entramos na noite e na escuridão.<br />
O que é hegemônico no Norte produz agora a cegueira a respeito<br />
da globalização e da crise da h<strong>um</strong>anidade. é a cegueira <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong><br />
funda<strong>do</strong> essencialmente no cálculo, cego para a existência, a alegria, o<br />
sofrimento, a infelicidade, a consciência, cego para o la<strong>do</strong> h<strong>um</strong>ano da<br />
h<strong>um</strong>anidade.<br />
A visão produtivista/quantitativista <strong>do</strong> Norte ignora as qualidades e,<br />
portanto, a qualidade de vida. Por isso, <strong>um</strong>a das mensagens <strong>do</strong> <strong>sul</strong> deveria<br />
ser: "Antes melhor <strong>do</strong> que mais" e por vezes até mesmo "menos, porém<br />
melhor!" Claramente, quan<strong>do</strong> se trata <strong>do</strong>s despossuí<strong>do</strong>s, o mais deve caminhar<br />
<strong>com</strong> o melhor. Mas quan<strong>do</strong> se observa o processo mundial de produção<br />
e cons<strong>um</strong>o de objetos, uns <strong>com</strong> qualidades ilusórias, que se tornam<br />
rapidamente outros, fican<strong>do</strong> obsoletos, a maioria deles descartáveis e não<br />
reparáveis; modas superficiais, desperdícios de energias, tempos, bens, devemos<br />
nos conscientizar de que nossa civilização suscita e sofre de inúmeras<br />
intoxicações cons<strong>um</strong>istas.<br />
O <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong>minante <strong>do</strong> Norte é basea<strong>do</strong> na redução <strong>do</strong> <strong>com</strong>plexo<br />
ao simples e na disjunção, ou seja, na separação <strong>do</strong> que, na verdade, é inseparável.<br />
O espírito de redução permitiu isolar a célula, a molécula, o átomo,<br />
a partícula. O espírito de disjunção possibilitou os desenvolvimentos das<br />
disciplinas produtoras <strong>do</strong>s conhecimentos que nos levaram a rever inteiramente<br />
nossa visão <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> e da vida. A especialização das disciplinas<br />
fechadas, estranhas <strong>um</strong>as às outras, desemboca, porém, no prima<strong>do</strong> de <strong>um</strong><br />
<strong>pensamento</strong> que se torna míope, que isola os objetos de seus contextos e<br />
15
16<br />
de seus laços naturais. Esse <strong>pensamento</strong> é cego ao que é global e funda-<br />
mental, porque os conhecimentos separa<strong>do</strong>s não permitem apreender a<br />
<strong>com</strong>plexidade <strong>do</strong>s fenômenos globais e o caráter fundamental de nossos<br />
problemas vitais.<br />
O <strong>pensamento</strong> funda<strong>do</strong> na noção de homo economicus, determina<strong>do</strong><br />
unicamente pelo interesse pessoal, é cego a tu<strong>do</strong> o que escapa desse interesse:<br />
o amor, a dádiva, a <strong>com</strong>unhão, a brincadeira. Podemos mesmo dizer<br />
que as conquistas <strong>do</strong> Norte, tão importantes no plano <strong>do</strong> individualismo, ao<br />
permitirem a autonomia da vida, produziram, ao mesmo tempo, desenvolvimentos<br />
egoístas e egocêntricos liga<strong>do</strong>s à degradação das solidariedades<br />
tradicionais e <strong>do</strong> sentimento de responsabilidade em relação ao to<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />
qual somos partes.<br />
Nos tempos atuais existem <strong>do</strong>is princípios na ética que são vitais<br />
para os indivíduos e para as sociedades h<strong>um</strong>anas: a solidariedade e a<br />
responsabilidade.<br />
Na visão hegemônica <strong>do</strong> norte, a expertise de <strong>um</strong> especialista <strong>com</strong>petente<br />
n<strong>um</strong>a área substitui o <strong>pensamento</strong> que religa áreas diferentes. A<br />
expertise é parcelar, o <strong>pensamento</strong> religa. quem é que triunfa diante da<br />
perda <strong>do</strong> que é fundamental e <strong>do</strong> que é global? O que triunfa são as ideias<br />
parcelares. Ao mesmo tempo, o que triunfa são ideias globais ocas, que ignoram<br />
principalmente os laços entre unidade e diversidade. O que <strong>do</strong>mina<br />
é a causalidade mecânica, a causalidade determinista que é a das máquinas<br />
artificiais que produzimos nos grandes <strong>com</strong>plexos industriais. Aplicamos<br />
cada vez mais essa causalidade determinista cronometrada, linear,<br />
aos indivíduos e às sociedades.<br />
No entanto, é preciso considerar que nem o indivíduo h<strong>um</strong>ano nem a<br />
sociedade h<strong>um</strong>ana são máquinas triviais. <strong>um</strong>a máquina trivial é <strong>um</strong>a máquina<br />
totalmente determinista, cujos outputs são conheci<strong>do</strong>s quan<strong>do</strong> os<br />
inputs são também conheci<strong>do</strong>s; se conhecemos as informações e os programas<br />
que a integram, conhecemos os <strong>com</strong>portamentos e os re<strong>sul</strong>ta<strong>do</strong>s<br />
dela decorrentes. Ocorre que tu<strong>do</strong> o que aconteceu à h<strong>um</strong>anidade decorre<br />
<strong>do</strong> fato de que não somos máquinas triviais. Podemos também considerar<br />
que os grandes profetas — Jesus, Maomé —, que os grandes filósofos, os<br />
grandes cientistas, os grandes músicos — Mozart, Beethoven —, os grandes<br />
estadistas não eram máquinas triviais, já que levaram em consideração o<br />
inespera<strong>do</strong> e o cria<strong>do</strong>r. Cada <strong>um</strong> de nós também, mesmo subjuga<strong>do</strong>s a<br />
lógicas triviais, escapa, porém, da trivialidade por intermédio de nossas<br />
aspirações, nossos sonhos, nas nossas súbitas manifestações amorosas,<br />
estéticas, transgressoras.
Cronometrada e hiperespecializada, a lógica da eficácia, da previsibili-<br />
dade, da "calculabilidade" cronometrada e hiperespecializada se espalhou<br />
em inúmeros setores de nossa vida. A <strong>com</strong>eçar pelas administrações públicas,<br />
nas quais a burocracia gangrena a atividade gestionária. Ela ass<strong>um</strong>e<br />
os <strong>com</strong>an<strong>do</strong>s <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> urbano e até mesmo <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> rural, <strong>com</strong> a industrialização<br />
da agricultura e da criação de ga<strong>do</strong>. Invade também a educação,<br />
para voltá-la à formação de profissionais eficientes e rentáveis. Invade<br />
a vida cotidiana. Invade o cons<strong>um</strong>o, as regras, os lazeres, os serviços. há o<br />
que Ritzler chama de "a mac<strong>do</strong>naldização da sociedade". Em outras palavras,<br />
<strong>um</strong>a forma fechada de racionalização está se espalhan<strong>do</strong> por to<strong>do</strong> o<br />
planeta e essa racionalização produz <strong>um</strong>a irracionalidade total.<br />
Fala-se <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong> único na política. Mas o <strong>pensamento</strong> único na<br />
política não é senão <strong>um</strong> <strong>do</strong>s ramos de <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong>, ao mesmo tempo<br />
redutor e disjuntivo, que reina em todas as áreas e <strong>com</strong>anda, igualmente,<br />
os opositores <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong> único, que fazem denúncias justas, mas são<br />
incapazes de traçar qualquer arg<strong>um</strong>ento que possa nos conduzir a <strong>um</strong><br />
caminho novo.<br />
A lógica <strong>do</strong> Norte, enfim, é cega às realidades <strong>do</strong> Sul, consideradas por<br />
ela <strong>com</strong>o atraso, arcaísmo, preguiça. O <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Norte é feito para<br />
tratar os problemas de organização técnicos, práticos e quantificáveis, ou<br />
seja, a prosa da vida. Acontece que a vida h<strong>um</strong>ana não <strong>com</strong>porta apenas<br />
a prosa. A prosa é o que fazemos por obrigação, por imposição, para<br />
ganhar nossa vida. E ganhamos nossa vida, muitas vezes perden<strong>do</strong>-a. A<br />
prosa nos faz sobreviver. viver significa, entretanto, viver poeticamente,<br />
isto é, no amor, na <strong>com</strong>unhão, na realização de si, na alegria e, no limite,<br />
no êxtase. Retomo aqui a expressão de hölderlin: "Poeticamente o homem<br />
habita a Terra". Na realidade, habitamos a Terra prosaica e poeticamente.<br />
A prosa tende, porém, a invadir nossa vida. Será que o <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul<br />
teria <strong>com</strong>o missão relembrar unicamente o caráter essencial da poesia <strong>do</strong><br />
viver? Ainda mais pelo fato de que no Sul existem as artes de viver, arte de<br />
viver em praça pública, arte de viver de maneira extrovertida, arte de viver<br />
na <strong>com</strong>unicação, arte de viver que <strong>com</strong>porta a hospitalidade, arte de viver<br />
que preserva as qualidades poéticas da vida.<br />
Não digo isso para rejeitar em bloco a lógica <strong>do</strong> Norte. Penso que precisamos<br />
aclimatar o que vem <strong>do</strong> Norte. é necessário que nos beneficiemos<br />
das contribuições <strong>do</strong> Norte. é preciso fazer isso principalmente no que concerne<br />
aos direitos da mulher, frequentemente muito subestima<strong>do</strong>s no Sul,<br />
à emancipação <strong>do</strong>s a<strong>do</strong>lescentes e da juventude, que é <strong>um</strong>a contribuição<br />
positiva às ideias de autonomia individual, desde que <strong>com</strong>binadas ao sentimento<br />
das solidariedades que frequentemente existe no Sul. Creio que é<br />
17
18<br />
preciso integrar as contribuições benéficas <strong>do</strong> Norte, recusar seus aspec-<br />
tos perversos e nocivos e, sobretu<strong>do</strong>, recusar sua hegemonia. Em consequên-<br />
cia disso, é necessário ser capaz de mostrar <strong>um</strong> caminho.<br />
De fato, o <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul deveria estar apto para enfrentar as <strong>com</strong>-<br />
plexidades de nossa vida, a <strong>com</strong>plexidade das realidades h<strong>um</strong>anas e da<br />
"insustentável <strong>com</strong>plexidade <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>". O <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul só pode<br />
ser <strong>com</strong>plexo, e isso pelo fato de que, de acor<strong>do</strong> <strong>com</strong> o senti<strong>do</strong> original<br />
da palavra <strong>com</strong>plexus em latim, "o que é teci<strong>do</strong> em conjunto", o <strong>pensamento</strong><br />
<strong>com</strong>plexo é aquele que religa o que foi artificialmente separa<strong>do</strong>.<br />
A missão desse <strong>pensamento</strong> se fixa no adágio latino "sparsa colligo", que<br />
quer dizer "religo o que está disperso". Nesse senti<strong>do</strong>, o <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong><br />
Sul seria <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> que religa e, por isso mesmo, estaria apto a ressuscitar<br />
os problemas globais e fundamentais. Trata-se de <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong><br />
que reconheceria, defenderia e promoveria as qualidades e a poesia da<br />
vida, ainda mais porque o Sul ainda permanece depositário dessa poesia<br />
que, frequentemente, é considerada pelo Norte <strong>com</strong>o atraso, ou <strong>com</strong>o algo<br />
reserva<strong>do</strong> simplesmente aos perío<strong>do</strong>s de férias, <strong>um</strong> folclore que se pode<br />
desfrutar gozan<strong>do</strong> <strong>do</strong> sol e <strong>do</strong> mar.<br />
Aliás, vocês sabiam que vieram <strong>do</strong> Norte — até mesmo antes da era<br />
industrial — as grandes nostalgias pelo <strong>sul</strong>? goethe afirmava isso por intermédio<br />
das palavras de Mignon: "você conhece o país onde floresce o limoeiro?"<br />
Maravilha<strong>do</strong> e desl<strong>um</strong>bra<strong>do</strong>, hölderlin refere-se à grécia de Patmos.<br />
Durrell se delicia <strong>com</strong> Alexandria. O Norte também precisa <strong>do</strong> Sul. O que<br />
ele vai buscar nas férias significa algo mais profun<strong>do</strong> <strong>do</strong> que <strong>um</strong>a necessidade<br />
superficial de relaxamento. Fique bem entendi<strong>do</strong> que a visão quantitativa<br />
ignora o problema essencial: a qualidade da vida. Reanima<strong>do</strong> pelo<br />
<strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul, pode-se, porém, retornar às ocupações, ao business, à<br />
técnica, ao poder.<br />
O <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul é solicita<strong>do</strong> a reproblematizar a sabe<strong>do</strong>ria. vocês<br />
sabem que <strong>um</strong>a das grandes heranças culturais da Antiguidade grega e<br />
romana é a busca da sabe<strong>do</strong>ria. Ocorre que a ideia de sabe<strong>do</strong>ria identificada<br />
a <strong>um</strong>a vida <strong>do</strong>tada de razão, <strong>um</strong>a vida regrada oposta a <strong>um</strong>a vida<br />
feita de paixão, não é satisfatória, na medida em que sabemos, principalmente<br />
a partir <strong>do</strong>s trabalhos de Antonio Damasio e Jean-Didier vincent,<br />
que a razão pura não existe. Mesmo o matemático volta<strong>do</strong> para o cálculo<br />
demasiadamente racional tem paixão pela matemática. Não existe razão<br />
sem paixão. Em contrapartida, a paixão sem essa lanterna que é a razão<br />
se perverte em delírio. A nova sabe<strong>do</strong>ria precisa, então, procurar a "dialógica",<br />
diálogo permanente, <strong>com</strong>plementaridade no antagonismo, entre a<br />
razão e a paixão. Não há paixão sem razão, não há razão sem paixão. Não
se trata de <strong>um</strong>a sabe<strong>do</strong>ria que pode ser programada, mas sim <strong>um</strong>a espé-<br />
cie de momento que deve se regenerar incessantemente para nos guiar na<br />
vida. Essa nova sabe<strong>do</strong>ria reconhece, portanto, as virtudes da poesia, isto<br />
é, as virtudes <strong>do</strong> amor e <strong>do</strong> senti<strong>do</strong> de <strong>com</strong>unidade.<br />
A missão <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul seria, então, restaurar o concreto, a<br />
existência, o que existe de afetivo na nossa vida. Restaurar o singular, não<br />
dissolvê-lo n<strong>um</strong> universal abstrato, mas integrá-lo no universal concreto que<br />
liga a unidade à diversidade. Restaurar o contexto e o global. é <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong><br />
que deveria empenhar-se em restaurar as solidariedades concretas<br />
e não apenas as solidariedades que se degradaram nas nossas civilizações<br />
ocidentalizadas ou nortificadas, mas também a nova solidariedade planetária,<br />
cuja necessidade é vital para nós. queremos <strong>um</strong>a mundialização de<br />
solidariedade e de <strong>com</strong>preensão, <strong>um</strong>a religião da fraternidade h<strong>um</strong>ana no<br />
senti<strong>do</strong> cunha<strong>do</strong> por mim de Terra-pátria.<br />
O <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul deveria restaurar valores que nele permanecem<br />
fortes, <strong>com</strong>o o sentimento da honra e da hospitalidade. Deveria promover<br />
a regeneração ética a fim de poder regenerar as solidariedades e<br />
as responsabilidades, ao mesmo tempo em que defenderia a autonomia<br />
moral e intelectual. Dupla e una, essa autonomia <strong>com</strong>porta a busca da<br />
verdade e a abertura estética que nos fazem estar plenamente conscientes<br />
das imensas emoções propiciadas pelas artes, pela literatura,<br />
pelo espetáculo da natureza.<br />
Saibamos que quan<strong>do</strong> essa autonomia individual se degrada, <strong>um</strong> niilismo<br />
e <strong>um</strong> estetismo frívolo se instalam em nós. Seu caráter intolerável<br />
aposta n<strong>um</strong> retorno às crenças absolutas e estreitas que acreditávamos<br />
ultrapassadas e em <strong>um</strong> retorno <strong>do</strong>s fanatismos e das intolerâncias. Saibamos,<br />
finalmente, que para <strong>do</strong>minar as angústias de to<strong>do</strong> tipo, impostas<br />
pela crise da h<strong>um</strong>anidade, as únicas respostas às angústias, inclusive às<br />
angústias de morte, se encontram na <strong>com</strong>unidade, no amor, na <strong>do</strong>ação<br />
de si. São esses os problemas da h<strong>um</strong>anidade neste terceiro milênio. São<br />
esses os caminhos salutares. Já que o Norte não pode fazê-lo, cabe ao Sul<br />
ass<strong>um</strong>ir a condição h<strong>um</strong>ana.<br />
A nave espacial Terra encontra-se na noite e na neblina. Ela segue provavelmente<br />
r<strong>um</strong>o às catástrofes, r<strong>um</strong>o ao abismo...<br />
Muito felizmente, porém, na história h<strong>um</strong>ana o improvável às vezes<br />
aconteceu, e ainda bem que tenha si<strong>do</strong> assim. E talvez <strong>um</strong> <strong>do</strong>s improváveis<br />
mais admiráveis da história se encontre no Sul, no <strong>sul</strong> da Europa, na<br />
grécia, cinco séculos antes da nossa era. Depois disso, <strong>um</strong> gigantesco império,<br />
o império persa, que já havia absorvi<strong>do</strong> todas as cidades gregas da<br />
19
20<br />
ásia Menor, para realizar <strong>um</strong>a última absorção, lançou-se à conquista da<br />
pequena cidade de Atenas. Apesar de todas as probabilidades em contrá-<br />
rio, o pequeno exército ateniense, <strong>com</strong> a ajuda <strong>do</strong>s esparciatas, consegue<br />
resistir em Maratona e repelir o enorme exército <strong>do</strong>s persas. O império<br />
persa atacou Atenas <strong>um</strong>a segunda vez e, dessa vez, conquista, incendeia<br />
e saqueia toda a cidade: tu<strong>do</strong> parece perdi<strong>do</strong>. Mas a frota grega preparou<br />
<strong>um</strong>a armadilha no golfo de Salamina para a enorme frota persa, que viu<br />
seus navios destruí<strong>do</strong>s, <strong>um</strong> após outro, ao passar pelo estreito. Depois de<br />
Salamina, Atenas não sofreu mais o perigo persa e alg<strong>um</strong>as décadas mais<br />
tarde nasciam a democracia e a filosofia. Esse triunfo <strong>do</strong> improvável deu,<br />
portanto, lugar à nossa cultura.<br />
Podemos hoje restaurar <strong>um</strong>a esperança no improvável. Essa esperança<br />
não tem nenh<strong>um</strong>a certeza científica, porque a dita certeza científica<br />
<strong>do</strong> progresso foi atualmente abolida. Trata-se de <strong>um</strong>a esperança que não<br />
obedece a nenh<strong>um</strong>a promessa histórica, depois <strong>do</strong> colapso de todas as<br />
promessas de <strong>um</strong> futuro melhor, entre eles o radiante futuro soviético. Estamos<br />
falan<strong>do</strong> de <strong>um</strong>a esperança que não é <strong>um</strong>a esperança qualquer, mas<br />
a esperança. Podemos fundá-la? Em primeiro lugar, podemos fundá-la na<br />
ideia da crise, porque o que é característico de <strong>um</strong>a crise, é que ela contém<br />
perigos enormes de regressão e destruição, mas também encerra chances<br />
de imaginação criativa, de diagnóstico pertinente, de elaboração de <strong>um</strong><br />
caminho para a saída. Por que haveria <strong>um</strong> despertar criativo? Porque em<br />
todas as sociedades, <strong>com</strong>o em to<strong>do</strong>s os seres h<strong>um</strong>anos, existem capacidades<br />
criativas a<strong>do</strong>rmecidas. <strong>Para</strong> explicitar meu arg<strong>um</strong>ento, uso o exemplo<br />
das células-tronco que <strong>do</strong>rmem no adulto, em nossa coluna vertebral, em<br />
nosso cérebro. Como são polivalentes, são porta<strong>do</strong>ras de capacidades regenerativas<br />
inéditas que permitem fabricar o fíga<strong>do</strong>, o baço, o cérebro, a<br />
pele. Mais ce<strong>do</strong> ou mais tarde, a biologia e a medicina vão despertá-las...<br />
Tomo o exemplo das células-tronco <strong>com</strong>o metáfora para dizer que capacidades<br />
gera<strong>do</strong>ras <strong>do</strong>rmem nas sociedades e despertam em épocas de crise.<br />
Além <strong>do</strong> mais, em toda sociedade rígida, normalizada, em que as mentes são<br />
quase todas <strong>do</strong>mesticadas, elas existem e podem despertar nos indivíduos<br />
desviantes: poetas, escritores, músicos, descobri<strong>do</strong>res, bricoleurs. 1 Essas capacidades<br />
criativas podem, então, despertar <strong>com</strong> a crise e <strong>com</strong> o perigo.<br />
Existe, igualmente, a aspiração à harmonia, que permeia toda a história<br />
da h<strong>um</strong>anidade. Submeti<strong>do</strong>s, porém, à organização social, às <strong>com</strong>partimentalizações,<br />
às hierarquias, salvamos cantinhos, pedacinhos de har-<br />
1. Termo utiliza<strong>do</strong> para definir cria<strong>do</strong>res que não têm <strong>um</strong> projeto defini<strong>do</strong> para a produção de objetos em geral, fazen<strong>do</strong><br />
uso de resíduos culturais acaba<strong>do</strong>s. (N.T.)
monia na nossa vida cotidiana na medida <strong>do</strong> possível: em festas, em<br />
refeições <strong>com</strong>partilhadas <strong>com</strong> amigos, em jogos de futebol, nos nossos<br />
amores. A aspiração à harmonia foi expressa nos paraísos cristão e muçulmano.<br />
Foi expressa nas ideias libertárias socialistas, <strong>com</strong>unistas, mas<br />
o destino histórico decepcionou ou enganou até hoje essa aspiração. Ela<br />
se manifestou nas revoltas juvenis de maio de 1968, e voltará a se manifestar<br />
de qualquer mo<strong>do</strong>. Em minha opinião, essa aspiração ainda vai<br />
suscitar outras regenerações.<br />
quan<strong>do</strong> <strong>um</strong> sistema não é capaz de tratar seus problemas vitais e fundamentais,<br />
ele se desintegra, ou então é capaz de se metamorfosear, ou<br />
seja, de engendrar <strong>um</strong> metassistema mais rico que possa tratar esses problemas.<br />
O sistema Terra não consegue hoje tratar seus problemas vitais:<br />
o retorno da fome; a morte da h<strong>um</strong>anidade representada pela utilização<br />
das armas nucleares; a degradação da natureza; a violência da economia.<br />
Nosso sistema encontra-se, portanto, condena<strong>do</strong> à morte ou à metamorfose.<br />
Claro, a metamorfose não se decreta. A metamorfose não se programa.<br />
Não se pode, talvez, até mesmo prever a forma que essa nova sociedade<br />
ass<strong>um</strong>iria na escala <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, algo que certamente não negaria as pátrias,<br />
mas criaria <strong>um</strong>a verdadeira Terra-pátria. Então busquemos, busquemos os<br />
caminhos, caminhos improváveis, é verdade, mas possíveis, que permitirão<br />
caminhar na direção da metamorfose. Seria essa a missão grandiosa e universal<br />
<strong>do</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul.<br />
21
22<br />
ADAO, ANtONIetA<br />
CAppARellI<br />
Pedagoga pela PUC-Rio, pós-graduanda no curso "Sabe-<br />
res e práticas da educação básica em educação de jovens<br />
e adultos", da Universidade Federal <strong>do</strong> Rio de Janeiro;<br />
assessora-técnica da Gerência de Educação e Ação Social <strong>do</strong><br />
SESC Departamento Nacional, atua no núcleo das atividades<br />
Educação de Jovens e Adultos, Cursos de Valorização Social,<br />
Ensino Médio e Educação Complementar. Apresentou <strong>com</strong>unicação<br />
sobre material didático no I Seminário em Educação<br />
de Jovens e Adultos (SEEJA), na PUC-Rio, em 2010. Realizou<br />
intercâmbio na Universidade Autônoma de Madrid, Espanha,<br />
em 2005. Participou <strong>do</strong> grupo de pesquisa "Educação,<br />
cotidianos e culturas" (GECEC); bolsista pelo CNPq, sob a<br />
coordenação de Vera Maria Candau, de 2003 a 2005.
a<br />
esperança<br />
vem <strong>do</strong><br />
Sul<br />
Norte e Sul. Relativizar essas duas posições geográficas não é simplesmente<br />
dividir o planeta em hemisférios Sul e Norte. é, também, apresentar<br />
<strong>pensamento</strong>s e formas de ver e estar em <strong>um</strong> mun<strong>do</strong> no qual <strong>um</strong> determina<strong>do</strong><br />
<strong>pensamento</strong> hegemônico, <strong>do</strong> Norte, sobrepôs seus valores, crenças e<br />
cost<strong>um</strong>es a outras culturas, difundin<strong>do</strong> pelo planeta, nos aspectos econômicos,<br />
sociais, técnicos, políticos e culturais, <strong>um</strong>a lógica perversa de eficácia,<br />
cons<strong>um</strong>o, lucros e <strong>um</strong> progresso que vem colocan<strong>do</strong> em xeque a nossa<br />
própria existência na Terra.<br />
Sem desprezar as heranças culturais vindas <strong>do</strong> Norte, e valen<strong>do</strong>-se das<br />
devidas contribuições, emerge a necessidade de <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> que problematize<br />
o mun<strong>do</strong>, as relações que o homem estabelece <strong>com</strong> a natureza,<br />
respeitan<strong>do</strong> a diversidade presente na unidade, de forma que o exercício<br />
da cidadania não se limite pela origem étnica de <strong>um</strong> ser h<strong>um</strong>ano. <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong><br />
que confronte o instinto devora<strong>do</strong>r hegemônico.<br />
Norte e Sul. Prosa e poesia. hemisférios direito e esquer<strong>do</strong> <strong>do</strong> cérebro.<br />
O que corresponde a cada <strong>um</strong>? Ao Norte, a prosa e o hemisfério esquer<strong>do</strong>,<br />
lógica, racionalidade; ao Sul, poesia e hemisfério direito, criatividade e<br />
sensibilidade? Nada precisa ser tão preto no branco. Ao sugerir a mistura<br />
23
24<br />
das heranças culturais e reintegrá-las, <strong>Morin</strong> aponta que ao Sul cabe não<br />
reduzir a <strong>com</strong>plexidade <strong>do</strong>s fenômenos, pois a qualidade de vida depende<br />
de suscitar as questões fundamentais que angustiam o ser h<strong>um</strong>ano. E,<br />
nesse senti<strong>do</strong>, há que se reproblematizar a sabe<strong>do</strong>ria, a razão, sem que a<br />
centralidade <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong> no lucro e no poder embote nossa generosidade<br />
e dignidade <strong>com</strong> a vida.<br />
Ao Sul — ou melhor, aos "suis" — não cabe somente o romantismo e a<br />
poesia <strong>do</strong>s seus belos cenários, que paira no imaginário <strong>do</strong> Norte <strong>com</strong>o o<br />
destino de relaxamento para seus estresses, oriun<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s negócios. Como<br />
diz <strong>Morin</strong>: "reanima<strong>do</strong> pelo <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul pode voltar às ocupações,<br />
ao business, à técnica, ao poder". O Sul também é prosa, é sobrevivência.<br />
Diante <strong>do</strong>s impasses, das vulnerabilidades decorrentes das crises "entre<br />
os seres h<strong>um</strong>anos e a natureza, das sociedades tradicionais que tendem a<br />
se desintegrar sob o dinamismo dessa mundialização que, na verdade, é<br />
<strong>um</strong>a ocidentalização", a esperança e a harmonia são alimentadas em momentos<br />
curtos de lazer e em celebrações <strong>com</strong> amigos e familiares. As promessas<br />
de <strong>um</strong>a vida melhor na modernidade decepcionaram, assim <strong>com</strong>o<br />
a harmonia nos ideais socialistas e <strong>com</strong>unistas.<br />
<strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul, que restaure a ética, a esperança, a harmonia,<br />
a solidariedade, "o contexto e o global", o senti<strong>do</strong> <strong>do</strong> amor e de <strong>com</strong>unidade,<br />
diante desse caos planetário, talvez seja o caminho para solucionar<br />
essas questões. é claro que para não chegarmos a <strong>um</strong> destino fatalista, o<br />
caminho são os processos de metamorfose.
26<br />
AGuIRRe, julIO<br />
leONIDAs<br />
Licenciatura en Ciencias Políticas y Administración Pública<br />
por la Universidad Nacional de Cuyo (UNCuyo). Doctoran<strong>do</strong><br />
en Ciencias Políticas por la Universidad Nacional de San<br />
Martín (UNSAM). Investiga<strong>do</strong>r del Centro Interdisciplinario<br />
para el Estudio de Políticas Públicas (CIEPP). Investiga<strong>do</strong>r de<br />
la Comunidad de Pensamiento Complejo (CPC). Líneas de<br />
investigación: pensamiento <strong>com</strong>plejo, teoría de los sistemas<br />
<strong>com</strong>plejos, ciencias de la <strong>com</strong>plejidad, epistemología de las<br />
ciencias sociales, meto<strong>do</strong>logía para la investigación de las<br />
ciencias sociales, teorías y méto<strong>do</strong>s de las políticas públicas y<br />
sociales, regímenes de bienestar.
Pensamiento<br />
del Sur<br />
El pensamiento del Sur debe constituirse contra hegemónico al menos<br />
en <strong>do</strong>s senti<strong>do</strong>s: a) dar cuenta de una alternativa para pensar/hacer al<br />
mun<strong>do</strong> distinto de lo impuesto por el pensamiento moderno occidental. b)<br />
Debe oponerse a las acciones concretas que configuran la hegemonía del<br />
pensamiento reduccionista moderno occidental: la actual configuración de<br />
los procesos de globalización, la actual estructura de la economía mundial,<br />
el criterio actual de desarrollo y su depredación de la biodiversidad natural,<br />
el sistema de ideas mediante el cual se legitiman acciones militares<br />
desde el Norte hegemónico hacia el resto del planeta y la particular configuración<br />
que han a<strong>do</strong>pta<strong>do</strong> las sociedades postindustriales modernas que<br />
llevan a la polarización de las sociedades y la falta de cohesión social.<br />
<strong>Para</strong> poder constituirse en contra-hegemónico, el pensamiento del Sur<br />
debe, en palabras de <strong>Morin</strong>, problematizar el mun<strong>do</strong> (en su actual configuración<br />
civilizatoria) y problematizar el propio instr<strong>um</strong>ento de la problematización,<br />
la razón. <strong>Para</strong> ello, no solo debe dar cuenta de nuevas formas de<br />
conocer sino que, además, debe orientarse en torno a un <strong>com</strong>promiso ético<br />
político en pos del cambio civilizatorio. Esta difícil tarea debe, indefectiblemente,<br />
involucrar no solo al ámbito científico/académico sino también a la<br />
ciudadanía en su conjunto, el arte, la política, la economía, la cultura.<br />
27
28<br />
Es por esta cualidad multidimensional que el pensamiento del Sur debe<br />
a<strong>do</strong>ptar sus pautas de reproducción y romper los altos muros de la aca-<br />
demia para insertarse de lleno en la sociedad a través de un <strong>com</strong>promiso<br />
militante. <strong>Para</strong> esto, debe a<strong>do</strong>ptar un lenguaje cotidiano (que se aleje del<br />
lenguaje, por momentos abstruso e impenetrable de la ciencia) que genere<br />
pautas normativas para orientar la conducta (individual y social) hacia una<br />
nueva forma de ver y hacer la vida.<br />
Es por esto último que considero que el punto de partida de pensamiento<br />
del Sur sea reencontrarse con su herencia cultural originaria. <strong>Para</strong> lograr<br />
integrarse en un mun<strong>do</strong> cada vez más multicultural, el pensamiento del Sur<br />
debe dar cuenta de aquellos simples conceptos que le "hablan" al espíritu<br />
h<strong>um</strong>ano. En este senti<strong>do</strong>, el texto de <strong>Morin</strong> llama a una recuperación de <strong>do</strong>s<br />
principios éticos vitales: la solidaridad y la responsabilidad. En mi opinión,<br />
estos principios se encuentran enraiza<strong>do</strong>s en la idea del s<strong>um</strong>ak kawsay, el<br />
"buen vivir".<br />
La idea del s<strong>um</strong>ak kawsay (incorporada en el Art. 14 de la nueva constitución<br />
de Ecua<strong>do</strong>r) es una concepción indígena ancestral y herencia cultural<br />
fundamental del los pueblos originarios de América Latina. Deviene<br />
de la mitología kichwa y considera que el buen vivir se conquista a partir<br />
del reconocimiento del derecho universal de las personas a vivir en un ambiente<br />
sano y ecológicamente equilibra<strong>do</strong> que garantice la sostenibilidad.<br />
La armonía con el medio ambiente (social y natural) involucra a las ideas<br />
de responsabilidad (cuida<strong>do</strong> sustentable del medio vital) y solidaridad (armonización<br />
con los otros).<br />
El buen vivir así entendi<strong>do</strong>, se podría transformar en el nuevo horizonte<br />
a seguir, dejan<strong>do</strong> de la<strong>do</strong> las nociones lineales de desarrollo <strong>com</strong>o crecimiento<br />
económico que han marca<strong>do</strong> las agendas gubernamentales desde<br />
hace ya <strong>do</strong>s siglos. Poner en valor la calidad de vida y la armonía con el<br />
medio ambiente por sobre la ac<strong>um</strong>ulación (que se vehiculiza en las clases<br />
<strong>do</strong>minantes a través de la búsqueda de riquezas y poder, y en las clases<br />
<strong>do</strong>minadas aparece configurada bajo la lógica del cons<strong>um</strong>ismo exacerba<strong>do</strong><br />
con su falso senti<strong>do</strong> de pertenencia) llevaría a recorrer nuevos caminos<br />
que, construi<strong>do</strong>s desde el pensamiento del sur, nos permitirán a<strong>com</strong>pañar<br />
el cambio social.<br />
Por eso, el s<strong>um</strong>ak kawsay, al incorporarse <strong>com</strong>o un concepto central del<br />
pensamiento del Sur, asistiría en los <strong>do</strong>s principios contra hegemónicos<br />
menciona<strong>do</strong>s previamente.<br />
Las nuevas constituciones de Ecua<strong>do</strong>r y Bolivia incorporan en sus textos<br />
menciones explícitas de conceptos centrales de la herencia cultural del Sur
(<strong>com</strong>o el s<strong>um</strong>ak kawsay, la armonía del hombre con la naturaleza y la con-<br />
vivencia que demanda nuestra diversidad étnico/cultural).<br />
Caben destacar los importantes aportes que a lo largo de la historia<br />
reciente de nuestros países han lleva<strong>do</strong> adelante grandes pensa<strong>do</strong>res con<br />
el objeto de construir un camino alternativo: Simón Bolívar, José Martí, José<br />
Carlos Mariátegui, víctor Raúl haya de la Torre, Octavio Paz y otros. A estos,<br />
debemos s<strong>um</strong>ar <strong>com</strong>unidades académicas que sistemáticamente buscaron<br />
teorías alternativas para mirar el mun<strong>do</strong> desde el Sur: La CEPAL y la<br />
Teoría de la Dependencia (Andre gunder Frank, Raul Prebisch, Theotonio<br />
Dos Santos, Enrique Car<strong>do</strong>so, Edelberto Torres-Rivas) o el Pensamiento Decolonial<br />
y la nueva Filosofía Latinoamericanista (Dussel, Roig, Boaventura<br />
de Sousa Santos y otros).<br />
El proyecto del libro colectivo La emergencia de los enfoques de la<br />
<strong>com</strong>plejidad en América Latina. Desafíos, contribuciones y <strong>com</strong>promisos<br />
para abordar los problemas <strong>com</strong>plejos del siglo XXI, impulsa<strong>do</strong> por la Comunidad<br />
de Pensamiento Complejo, se inserta, claramente, en un nuevo<br />
intento por ayudar a la búsqueda para construir de forma participativa un<br />
nuevo pensamiento del Sur.<br />
Los movimientos contra autoritarios que hilvanan la historia latinoamericana,<br />
si bien provinieron de distintas corrientes ideológicas y tenían <strong>com</strong>o<br />
objetivo diversas reivindicaciones sociales, son un ejemplo del <strong>com</strong>promiso<br />
militante de nuestros pueblos en contra de aquello que les viene impuesto.<br />
La integración de grupos artísticos, políticos, sociales, organizaciones económicas<br />
etc., en torno a estos movimientos, son un ejemplo de lucha que<br />
debe ser siempre recupera<strong>do</strong> <strong>com</strong>o reivindicación histórica de las luchas<br />
por un mun<strong>do</strong> distinto. Asimismo, estos movimientos contra autoritarios<br />
operaron <strong>com</strong>o configura<strong>do</strong>res de identidades (individuales y colectivas)<br />
alternativas a las imperantes. Estas experiencias históricas son ricas en<br />
lecciones que debemos tomar al momento de buscar construir una nueva<br />
identidad para un nuevo pensamiento del Sur.<br />
La construcción colectiva de un pensamiento del Sur involucra un <strong>com</strong>promiso<br />
institucional central. <strong>Para</strong> que este sea posible, deben profundizarse<br />
los intentos por integrar a los pensa<strong>do</strong>res críticos de la región construyen<strong>do</strong><br />
cátedras itinerantes que, eventualmente, hagan escuela en toda<br />
la región, incluso, profundizan<strong>do</strong> la idea de una universidad Latinoamericana<br />
cuyo objetivo central sea la construcción, crítica y desarrollo de un<br />
pensamiento del Sur.<br />
<strong>Para</strong> esto debemos centrarnos, primariamente, en <strong>do</strong>s críticas: a) una<br />
crítica epistemológica que permita dar cuenta de los límites y las caren-<br />
29
30<br />
cias de los paradigmas <strong>do</strong>minantes y, ante ellos, oponga un paradigma<br />
alternativo basa<strong>do</strong> en un pensamiento del Sur. b) una crítica institucional<br />
que ponga en tela de juicio la actual estructuración de la ciencia y los saberes<br />
en espacios estables cuyas esporádicas integraciones suelan perseguir<br />
criterios de rentabilidad (orientadas por los merca<strong>do</strong>s tanto económicos<br />
<strong>com</strong>o académicos).<br />
El pensamiento del Sur debe estar aboca<strong>do</strong> a dar respuesta a los problemas<br />
centrales de nuestros países (<strong>com</strong>o la pobreza, la desigualdad,<br />
la falta de cohesión social, entre otros) así <strong>com</strong>o también, debe tomar la<br />
posta de aquellos problemas que se vuelven globales (el problema medioambiental,<br />
la guerra y las nuevas modalidades de violencia y crimen<br />
organiza<strong>do</strong>, entre otros).<br />
Por último, el pensamiento del Sur debe ser capaz de armonizar las distintas<br />
formas de conocimiento, las artes y la cultura con el objetivo de constituirse<br />
en una estrategia civilizatoria integral que recupere la herencia de<br />
nuestros pueblos originarios y su ancestral sabiduría de vida.
32<br />
AlMeIDA, MARIA DA<br />
Professora titular <strong>do</strong> Departamento de Educação da UFRN.<br />
Doutora em Ciências Sociais pela PUC de São Paulo. Professora<br />
<strong>do</strong>s Programas de Pós-Graduação em Ciências Sociais e<br />
em Educação da UFRN. Coordena<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> Grupo de Estu<strong>do</strong>s<br />
da Complexidade (Gre<strong>com</strong>) — primeiro ponto brasileiro da<br />
Cátedra Itinerante <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong> para o Pensamento Complexo<br />
(Unesco). Membro da Association Pour La Pensée Complexe,<br />
Paris, França, e <strong>do</strong> Conselho Científico Internacional da<br />
Multiversidad Mun<strong>do</strong> Real <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong>, México. Principais<br />
publicações: Complexidade, saberes científicos e saberes da<br />
tradição, 2010; Cultura e <strong>pensamento</strong> <strong>com</strong>plexo (coautoria<br />
<strong>com</strong> E. de A. Carvalho), 2009; <strong>Para</strong> <strong>com</strong>prender la <strong>com</strong>plejidad,<br />
2008; Lagoa <strong>do</strong> Piató: fragmentos de <strong>um</strong>a história<br />
(coautoria <strong>com</strong> W. F. Pereira), 2006.
Pensamento<br />
<strong>do</strong> Sul <strong>com</strong>o<br />
reserva<br />
antropológica<br />
Marcadas por incertezas, apostas e esperanças, as ideias de <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong><br />
no texto "<strong>Para</strong> <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul" expressam resistência ao cenário<br />
da globalização, que tem oscila<strong>do</strong> entre a norte-americanização e a ocidentalização<br />
das culturas. Destituídas <strong>do</strong> senti<strong>do</strong> unicamente territorial e<br />
geográfico, as noções de Norte e Sul passam a significar mo<strong>do</strong>s de pensar<br />
e viver que se organizam por princípios, valores e práticas distintas. O Sul,<br />
a ser concebi<strong>do</strong> no plural, "suis", diz respeito a reservas antropológicas da<br />
condição h<strong>um</strong>ana; capacidades criativas de regeneração da diversidade<br />
cultural; estilos de viver mais próximos da dinâmica da natureza estendida;<br />
cultivo de valores capazes de problematizar a homogeneização tecnoeconômica<br />
<strong>do</strong> planeta; potenciais de emergências e ruí<strong>do</strong>s no interior de <strong>um</strong>a<br />
mundialização imersa em crises de várias ordens; opera<strong>do</strong>r cognitivo que<br />
poderia restaurar o singular, o concreto, a dialógica local-global; expressão<br />
de valores <strong>com</strong>o solidariedade, honra, hospitalidade, esperança no improvável<br />
e aspiração à harmonia; recusa a <strong>um</strong> universal abstrato e aos mitos<br />
<strong>do</strong> desenvolvimento e <strong>do</strong> progresso sem limites.<br />
Distante das posições teórico-acadêmicas que se encarceram nas utopias<br />
irrealizáveis, no me<strong>do</strong> <strong>do</strong> desvio, no imobilismo, na vitimização e no<br />
ressentimento, as reflexões de <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong> sublinham a necessidade de<br />
33
34<br />
"integrar as contribuições benéficas <strong>do</strong> Norte", suas conquistas demo-<br />
cráticas, seus avanços emancipatórios. Trata-se, no entanto, de "recusar<br />
seus aspectos perversos e nocivos e, sobretu<strong>do</strong>, recusar sua hegemonia".<br />
O <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul diz respeito a <strong>um</strong>a ecologia das ideias e a práticas<br />
socioculturais que favorecem as forças da criatividade, da diversidade noológica<br />
e de formas de viver tão necessárias a <strong>um</strong>a metamorfose da vida<br />
no planeta Terra — o que inclui a vida h<strong>um</strong>ana, mas não se reduz a ela. Ao<br />
reconhecer o <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul <strong>com</strong>o <strong>pensamento</strong> <strong>com</strong>plexo, <strong>Morin</strong> demonstra,<br />
mais <strong>um</strong>a vez, a expansão das matrizes epistemológicas por ele<br />
construídas e permanentemente reorganizadas.<br />
A simpatia, o apoio e a adesão a <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul decorrem, de<br />
minha parte, de <strong>um</strong>a experiência de pesquisa e intercâmbio de ideias <strong>com</strong><br />
populações de origem rural desde os anos de 1970. A sistematização ampliada<br />
dessa experiência, que inclui a concepção de "intelectuais da tradição",<br />
encontra-se em Complexidade, saberes científicos, saberes da tradição<br />
(Livraria da Física, 2010).<br />
EXPERIÊNCIAS INOVADORAS: UM CARDÁPIO ABERTO<br />
Mesmo <strong>um</strong>a observação superficial <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> atual permite visualizar<br />
focos de criatividade e resistência à monocultura da mente, à colonização<br />
<strong>do</strong> imaginário, à ocidentalização <strong>do</strong> planeta, à civilização da beterraba,<br />
à "mac<strong>do</strong>nização" <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, conforme expressões de vandana<br />
Shiva, Serge Latouche, <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong>, Claude Lévi-Strauss, Maurice holt. é<br />
possível identificar já agora ca<strong>sul</strong>os de <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul. <strong>um</strong> cardápio<br />
aberto de proposições e experiências inova<strong>do</strong>ras já se encontra<br />
exposto e requer problematização, reorganização, disseminação. Cito<br />
quatro dessas experiências:<br />
a) No que diz respeito à velocidade <strong>do</strong> tempo <strong>com</strong>o <strong>um</strong> valor hegemônico,<br />
o movimento Slow Food (decorrente de <strong>um</strong>a piada <strong>do</strong> jornalista<br />
Carlo Petrini, em 1986, diante de <strong>um</strong>a loja <strong>do</strong> Mc Donald’s em Roma) expande-se<br />
por congressos internacionais, universidades e escolas norteamericanas.<br />
Ao la<strong>do</strong> <strong>do</strong> padrão fast food, temos hoje a revalorização da<br />
culinária tradicional e <strong>do</strong> cultivo e <strong>com</strong>ercialização de produtos orgânicos.<br />
Na Itália e em outros países europeus, as chamadas "cidades desaceleradas"<br />
criam regras para reduzir o trânsito de automóveis e criar<br />
espaços verdes para encontros e caminhadas. A redução da velocidade<br />
serve também de modelo educacional. A slow school é <strong>um</strong>a alternativa à<br />
fast school. Nas palavras de Maurice holt, ela "trata de filosofia, tradição,<br />
<strong>com</strong>unidade e escolhas morais". O movimento Slow Food tem por meta<br />
valores <strong>com</strong>o dignidade e herança cultural e se opõe a "<strong>um</strong> mo<strong>do</strong> de vida<br />
basea<strong>do</strong> unicamente na pressa e na conveniência". Tais experiências são
apresentadas em Alfabetização ecológica, por Fritjof Capra, David W.<br />
Orr, Maurice holt et al. (Cultrix, 2006).<br />
b) quanto ao fortalecimento da cultura local e a manutenção das popu-<br />
lações em seus lugares de origem, faço referência ao Centro de Estudios<br />
universitários Arkos, em Puerto vallarta, México. O Arkos direciona seus<br />
cursos para a formação de profissionais que respondam às demandas da<br />
própria cidade, <strong>com</strong> vistas a reduzir a emigração e reforçar o <strong>com</strong>promisso<br />
<strong>do</strong> cidadão <strong>com</strong> seu lugar. A inserção da Arkos na <strong>com</strong>unidade local é<br />
visível e a população da cidade participa ativamente nos debates da universidade.<br />
c) Reconhecimento de saberes indígenas. O Instituto Indígena Brasileiro<br />
para a Propriedade Intelectual (Inbrapi), dirigi<strong>do</strong> pelo educa<strong>do</strong>r indígena<br />
Daniel Munduruku, tem incentiva<strong>do</strong> homens e mulheres de etnias diversas<br />
a construírem <strong>um</strong>a formação universitária que não suprima, mas amplie<br />
as experiências culturais originárias. O projeto Encontros <strong>com</strong> a Literatura<br />
Indígena, entre outros, responde por estratégias de valorização de experiências<br />
e saberes indígenas.<br />
d) Projeto de Extensão Estaleiro de Saberes. Coordena<strong>do</strong> pelo gre<strong>com</strong><br />
(uFRN), é <strong>um</strong>a atividade para atualização de professores da rede pública<br />
<strong>do</strong> ensino básico. Existe há três anos e procura sensibilizar os educa<strong>do</strong>res<br />
para a importância e o reconhecimento de saberes técnicos e especulativos<br />
de intelectuais da tradição; construir estratégias de méto<strong>do</strong> que<br />
tornem tais saberes <strong>com</strong>plementares aos da cultura científica escolar;<br />
dar a conhecer a publicação de livros paradidáticos que registram os conhecimentos<br />
sistematiza<strong>do</strong>s pelos intelectuais da tradição, <strong>com</strong> o apoio<br />
<strong>do</strong>s pesquisa<strong>do</strong>res <strong>do</strong> gre<strong>com</strong> (coleção Metamorfose, publicada pela<br />
Editora Flecha <strong>do</strong> Tempo, <strong>com</strong> seis vol<strong>um</strong>es sobre ecossistema, previsão<br />
climática, histórias de Trancoso etc.). Os encontros se circunscrevem às<br />
seguintes temáticas: Ecologia e Ciências da Saúde; Saberes da tradição,<br />
Música e cosmologia; Paisagens sonoras e cultura da criança; Cosmologia<br />
e matemática da tradição; Patrimônio, história oral e literatura. A matriz<br />
de referência para o Estaleiro associa <strong>do</strong>is livros de <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong> (A<br />
cabeça bem-feita e Os sete saberes necessários à educação <strong>do</strong> futuro),<br />
<strong>um</strong> livro sobre cosmologia indígena (O céu <strong>do</strong>s Tembé), fragmentos de<br />
teses de <strong>do</strong>utora<strong>do</strong>, dissertações de mestra<strong>do</strong> e monografias, frutos das<br />
pesquisas na região, além de saberes sistematiza<strong>do</strong>s pelos intelectuais<br />
da tradição, sites da internet e vídeos.<br />
QUESTÕES PRIORITÁRIAS<br />
Como proceder a <strong>um</strong>a crítica <strong>do</strong> processo civilizatório sem nos deixar<br />
contaminar pelos sentimentos de revanche, vitimização ou de ilusão de<br />
35
36<br />
volta ao passa<strong>do</strong>? Como ass<strong>um</strong>ir para nós (no lugar que cada <strong>um</strong> ocupa)<br />
os ideários de <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul, sem nos instituirmos <strong>com</strong>o legítimos<br />
representantes das n<strong>um</strong>erosas populações e da diversidade de saberes<br />
excluí<strong>do</strong>s da rede de <strong>com</strong>unicação da tecnociência? Como fazer para identificar,<br />
escolher e potencializar as reservas criativas e regenerativas <strong>do</strong>s<br />
saberes da tradição, pon<strong>do</strong>-as à disposição de <strong>um</strong>a ecologia das ideias?<br />
Como incentivar e apoiar iniciativas minoritárias, de mo<strong>do</strong> que elas se<br />
transformem em ca<strong>sul</strong>os de experiências mais alargadas e mesmo mais<br />
institucionalizadas?
38<br />
AlMeIDA, ROsIleNe<br />
sOusA<br />
Pedagoga, mestre em Educação pela Universidade <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong><br />
<strong>do</strong> Rio de Janeiro (UERJ). Assessora-técnica <strong>do</strong> Serviço Social<br />
<strong>do</strong> Comércio (SESC/Administração Nacional), atuan<strong>do</strong> na<br />
Coordenação Nacional <strong>do</strong> Projeto SESC LER <strong>com</strong> foco na alfabetização<br />
e escolarização de jovens e adultos. Já atuou <strong>com</strong>o<br />
professora <strong>do</strong> curso de Pós-Graduação em EJA, na Universidade<br />
Estácio de Sá e na Universidade Federal Fl<strong>um</strong>inense<br />
(UFF). Realiza assessoria pedagógica em diversas Secretarias<br />
Municipais de Educação. Desde 1999 é membro <strong>do</strong> Fór<strong>um</strong> de<br />
Educação de Jovens e Adultos no Esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Rio de Janeiro.<br />
Faz parte da Comissão Estadual da Agenda Territorial de<br />
Desenvolvimento Integra<strong>do</strong> da Alfabetização e da Educação<br />
de Jovens e Adultos.
a cegueira:<br />
o movimento<br />
<strong>do</strong> mun<strong>do</strong> e<br />
a reforma das<br />
instituições e<br />
mentes<br />
"há <strong>um</strong>a inadequação cada vez mais ampla, profunda e grave<br />
entre os saberes separa<strong>do</strong>s, fragmenta<strong>do</strong>s, <strong>com</strong>partimenta-<br />
<strong>do</strong>s entre disciplinas e, por outro la<strong>do</strong>, realidades e problemas<br />
cada vez mais polidisciplinares, transversais, multidimensionais,<br />
transnacionais, globais, planetários."<br />
(MORIN, 2000)<br />
Entenden<strong>do</strong> a atual realidade, no campo <strong>do</strong> saber institucionaliza<strong>do</strong>, <strong>Morin</strong><br />
toca no verdadeiro esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> processo em mutação no mun<strong>do</strong>: a urgência<br />
de <strong>um</strong>a reforma <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong> que sintonize <strong>com</strong> <strong>um</strong>a nova perspectiva<br />
de <strong>um</strong> mun<strong>do</strong> em constante redescoberta. Dentre a gama de fenômenos<br />
e temas estuda<strong>do</strong>s por esse filósofo, destacamos o confronto entre o mun<strong>do</strong><br />
das certezas, herda<strong>do</strong> da tradição, funda<strong>do</strong> na concepção da racionalidade<br />
explicável por leis naturais, simples e imutáveis, e o mun<strong>do</strong> das incertezas,<br />
gera<strong>do</strong> pelo nosso tempo de transformações; o mun<strong>do</strong> <strong>com</strong>plexo.<br />
A partir dessa visão, entendemos que há <strong>um</strong>a correspondência entre o<br />
<strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Norte e <strong>do</strong> Sul. Apesar das óticas e focos diferencia<strong>do</strong>s,<br />
percebe-se que em alg<strong>um</strong> momento esses <strong>pensamento</strong>s se <strong>com</strong>plementam<br />
e interagem, passan<strong>do</strong> por transformações, frutos dessas conexões.<br />
39
40<br />
Por outro la<strong>do</strong>, <strong>com</strong>o nos alerta <strong>Morin</strong>, essas transformações vão de-<br />
pender da crescente conscientização <strong>do</strong>s homens em relação a elas e ao<br />
novo lugar que cabe a cada <strong>um</strong> de nós nesse novo universo. Nos rastros<br />
<strong>do</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>com</strong>plexo, o que nos importa ressaltar aqui é o fato de<br />
que, no lugar <strong>do</strong> sujeito seguro, basea<strong>do</strong> em certezas absolutas, funda<strong>do</strong><br />
no <strong>pensamento</strong> tradicional, está hoje <strong>um</strong> sujeito interrogante, <strong>do</strong> diálogo,<br />
das incertezas. <strong>um</strong> sujeito que, diante desse mun<strong>do</strong> em acelerada transformação,<br />
busca encontrar <strong>um</strong> novo centro ou novo ponto de apoio, para<br />
<strong>um</strong>a nova ordem, em meio ao oceano de dúvidas e incertezas. Por isso,<br />
não há <strong>com</strong>o dizer que <strong>um</strong> determina<strong>do</strong> <strong>pensamento</strong> é certo, erra<strong>do</strong> ou<br />
superior, inferior ao outro.<br />
Percebemos que <strong>um</strong>a das áreas em que o <strong>pensamento</strong> <strong>com</strong>plexo vem<br />
causan<strong>do</strong> maior impacto é a da Educação. área que, por natureza, deve<br />
ser o centro ou a síntese da sociedade, cujos valores e conhecimentos<br />
de base tem a tarefa de disseminar às novas gerações. Concordamos,<br />
assim, <strong>com</strong> o <strong>pensamento</strong> de Brandão (1981), de que "quan<strong>do</strong> o educa<strong>do</strong>r<br />
pensa a educação, ele acredita que, entre homens, ela é o que dá a<br />
forma e o polimento. Mas ao fazer isso na prática, tanto pode ser a mão<br />
<strong>do</strong> artista que guia e a juda o barro a que se transforme, quanto à forma<br />
que iguala e deforma". Por isso, nesses tempos de mudanças estruturais,<br />
a Educação se vê diante desses impasses na relação sociedadeescola,<br />
trazen<strong>do</strong> à tona a necessidade de mudanças de paradigmas e,<br />
consequentemente, de tentativas de reforma, conforme sinaliza <strong>Morin</strong><br />
(2000): "não se pode reformar <strong>um</strong>a instituição, sem <strong>um</strong>a prévia reforma<br />
das mentes, mas não se pode reformar as mentes, sem <strong>um</strong>a prévia<br />
reforma das instituições".<br />
As divergências e contradições entre o <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Norte e <strong>do</strong> Sul<br />
revelam a busca de superação em face às mudanças estruturais da sociedade.<br />
Isso acontecerá, <strong>com</strong>o destacou <strong>Morin</strong>, <strong>com</strong> a reforma das instituições<br />
e das mentes, e pelo entendimento de que esses são processos<br />
indissociáveis.<br />
Partin<strong>do</strong> da busca de <strong>um</strong>a nova forma — pois o que está hoje no mun<strong>do</strong><br />
pode tanto nos levar a <strong>um</strong>a nova e esplen<strong>do</strong>rosa civilização, quanto lançarnos<br />
em <strong>um</strong>a nova barbárie —, <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong> nos convida a pensar no fato<br />
de que tu<strong>do</strong> depende de nós; e a <strong>com</strong>plexidade é o caminho para o novo<br />
conhecimento. Cabe, portanto, a nós escolher entre ficar à margem ou mergulhar<br />
nessa <strong>com</strong>plexidade.<br />
No romance Ensaio sobre a cegueira, o escritor português José Saramago<br />
conta a história ocorrida em <strong>um</strong>a grande cidade onde as pessoas
<strong>com</strong>eçam a ficar súbita e inexplicavelmente cegas. O problema se torna<br />
contagioso e a propagação <strong>do</strong> surto retrata o início de <strong>um</strong>a gama de terríveis<br />
acontecimentos, centra<strong>do</strong>s n<strong>um</strong>a só realidade: as desventuras de <strong>um</strong>a<br />
sociedade que, acost<strong>um</strong>ada à unidimensionalidade, a <strong>um</strong> mo<strong>do</strong> quase único<br />
de perceber o mun<strong>do</strong>, é de repente levada a depender por inteiro <strong>do</strong>s<br />
demais senti<strong>do</strong>s, que sempre havia manti<strong>do</strong> em plano secundário.<br />
A história revelada nesse livro nos traduz <strong>um</strong>a metáfora das desventuras<br />
de <strong>um</strong>a sociedade cujo principal mo<strong>do</strong> de perceber o mun<strong>do</strong> foi<br />
suspenso. A isso se adiciona o fato de que esse mo<strong>do</strong> de percepção,<br />
por sua própria natureza, impede as pessoas de buscar referenciais<br />
externos, <strong>com</strong> o re<strong>sul</strong>tante apagamento progressivo da vida interior,<br />
levan<strong>do</strong>-as a partir para a busca de <strong>um</strong>a solidariedade perdida e a perceber<br />
o quanto estão mais prepara<strong>do</strong>s para a <strong>com</strong>petição <strong>do</strong> que para<br />
a parceria. Esse romance de Saramago pode ser interpreta<strong>do</strong> <strong>com</strong>o <strong>um</strong><br />
questionamento ao <strong>pensamento</strong> único, apropria<strong>do</strong> pelo poder de <strong>um</strong>a<br />
cultura em que o homem perdeu o senti<strong>do</strong> da globalidade e o de si<br />
mesmo, retoman<strong>do</strong> nossa forma de ver e entender o mun<strong>do</strong>, traduzida<br />
em <strong>um</strong> saber que questiona a cegueira <strong>do</strong> modelo mental <strong>do</strong>minante.<br />
Modelo esse que pode ser traduzi<strong>do</strong> pelas diferentes formas de pensar<br />
<strong>do</strong> Norte e <strong>do</strong> Sul, entenden<strong>do</strong> que não há <strong>com</strong>o <strong>com</strong>preender <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong><br />
superior ou inferior ao outro, pois vivemos em <strong>um</strong>a sociedade<br />
plural e diversa, <strong>com</strong> culturas infinitas, e que nos fazem seres individuais,<br />
unos, porém frutos, de interações em constante transformação.<br />
No entanto, essas relações também nos levam à <strong>com</strong>petição, ao preconceito,<br />
à superioridade, e precisamos urgentemente criar meios de lidar<br />
<strong>com</strong> isso. O resgate da solidariedade perdida é <strong>um</strong>a das possibilidades,<br />
<strong>com</strong>o abor<strong>do</strong>u Saramago.<br />
A reflexão aqui apresentada traduz <strong>um</strong>a tentativa de <strong>com</strong>preender as<br />
divergências <strong>do</strong>s <strong>pensamento</strong>s <strong>do</strong> Norte e <strong>do</strong> Sul, revelan<strong>do</strong> que a interação<br />
entre os homens é condição sine qua non para enfrentar as mudanças estruturais<br />
pelas quais a sociedade vem passan<strong>do</strong>, sen<strong>do</strong> a Educação <strong>um</strong> <strong>do</strong>s<br />
caminhos possíveis para esse enfrentamento.<br />
E isso se desenvolverá em sua plenitude quan<strong>do</strong> tivermos em conta o<br />
importante papel que a Educação tem na formação de sujeitos interrogantes,<br />
nesse diálogo <strong>com</strong> a reforma necessária tanto da instituição <strong>com</strong>o das<br />
mentes, <strong>com</strong>o nos alerta <strong>Morin</strong>. E não precisamos ficar cegos, <strong>com</strong>o na história<br />
de Saramago, para percebermos que a parceria e a solidariedade são<br />
condições para nos sentirmos pertencentes a esse mun<strong>do</strong> global, <strong>com</strong>plexo,<br />
transdisciplinar, multidimensional, transversal...<br />
41
42<br />
REFERÊNCIAS<br />
BRANDãO, Carlos Rodrigues. O que é educação. São Paulo: Brasiliense, 1981.<br />
MORIN, <strong>Edgar</strong>. A cabeça bem-feita: repensar a reforma, reformar o <strong>pensamento</strong>. 8.<br />
ed. Tradução: Eloá Jacobina. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003.<br />
MORIN, <strong>Edgar</strong>. A inteligência da <strong>com</strong>plexidade. São Paulo: Peirópolis, 2000.<br />
MORIN, <strong>Edgar</strong>. Introdução ao <strong>pensamento</strong> <strong>com</strong>plexo. Lisboa: Instituto Piaget, 1991.<br />
SARAMAgO, José. Ensaio sobre a cegueira. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.
44<br />
BARROs, luIz FeRNANDO<br />
De MORAes *<br />
CHARRet, HelOIze<br />
DA CuNHA **<br />
MellO, eDIR FIGueIReDO<br />
De O. teIxeIRA De ***<br />
*Doutor em Letras Vernáculas pela Universidade Federal <strong>do</strong><br />
Rio de Janeiro, atualmente é professor da Escola SESC de Ensino<br />
Médio, onde coordena a Área de Códigos e Linguagens.<br />
**Doutoranda em Educação pela Pontifícia Universidade<br />
Católica, atualmente é professora da Escola SESC de Ensino<br />
Médio, onde coordena a Área de Ciências da Natureza e suas<br />
Tecnologias.<br />
***Doutora em Ciências Sociais pela Universidade <strong>do</strong> Rio<br />
de Janeiro, atualmente realiza pesquisa no Observatório <strong>do</strong><br />
Ensino Médio, equipe da UERJ, financiada pela Faperj, e é professora<br />
da Escola SESC de Ensino Médio, onde coordena a Área<br />
de Ciências H<strong>um</strong>anas e Sociais.
Pensamento<br />
<strong>do</strong> Sul: <strong>um</strong>a<br />
bússola para<br />
<strong>um</strong> novo<br />
mun<strong>do</strong>?<br />
Por que esse título? Ora, em primeira instância, <strong>um</strong>a bússola pode ser<br />
definida apenas <strong>com</strong>o <strong>um</strong> instr<strong>um</strong>ento científico destina<strong>do</strong> à orientação.<br />
Sabemos que ela aponta <strong>um</strong>a direção, o Norte, o qual serve de referência,<br />
<strong>um</strong> guia que nos possibilita o deslocamento, <strong>com</strong> certa precisão e<br />
segurança, enfim, apontar caminhos e elaborar mapas. Cabe destacar,<br />
entretanto, que o Norte só é Norte em relação ao Sul. Dessa forma, podemos<br />
observar, tal qual brilhantemente o fez <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong>, que nessa polarização<br />
o que está em jogo não é apenas a representação de posições<br />
espaciais diametralmente opostas e, sim, as relações aí constituídas.<br />
Nesse senti<strong>do</strong>, vale a pena resgatar, privilegian<strong>do</strong> as reflexões desse<br />
pensa<strong>do</strong>r, o que as relações entre Norte e Sul representam no contexto<br />
da modernidade ou, <strong>com</strong>o sugerem alguns autores, da pós-modernidade.<br />
2 Seguin<strong>do</strong> as pistas de <strong>Morin</strong>, para além <strong>do</strong>s preceitos técnicos e<br />
científicos, concebeu-se sócio-historicamente <strong>um</strong>a noção de Norte arraigada<br />
no conceito de progresso, <strong>do</strong> <strong>do</strong>mínio da técnica, da fragmentação<br />
2. Sobre o conceito de pós-modernidade, indicamos as seguintes obras de referência: ANDERSON, Perry. Origens da pós-modernidade.<br />
Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1999; BAUMAN, Zygmunt. A modernidade líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001; e<br />
LYOTARD, Jean-François. A condição pós-moderna. Rio de Janeiro: José Olympio, 2008.<br />
45
46<br />
<strong>do</strong> saber, da hegemonia e da homogeneização cultural e política. Em<br />
contrapartida, ao Sul, visto <strong>com</strong>o lugar subdesenvolvi<strong>do</strong>, atrasa<strong>do</strong>, onde<br />
proliferam a pobreza e a ausência, entre outras mazelas, atrelou-se a visão<br />
<strong>do</strong> terceiro <strong>do</strong>s mun<strong>do</strong>s. Contu<strong>do</strong>, se o delineamento desses contrastes<br />
pareceu demarcar fronteiras bastante rígidas, contemporaneamente,<br />
assistimos à emergência de <strong>um</strong>a corrente de <strong>pensamento</strong> que advoga<br />
a necessidade de questionarmos esse modelo reducionista, a saber: o<br />
<strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul.<br />
Como paradigma alternativo ao <strong>do</strong> Norte hegemônico, o <strong>pensamento</strong><br />
<strong>do</strong> Sul propõe a relativização dessa dicotomia. Não se trata, entretanto,<br />
de demonizar o Norte ou santificar o Sul, mas, sim, de construir <strong>um</strong>a<br />
reflexão que traduza <strong>um</strong>a lógica menos hierarquizante. quais contribuições<br />
<strong>um</strong> e outro podem agregar para erigir dimensões mais satisfatórias<br />
entre os indivíduos e desses <strong>com</strong> o planeta? Como diminuir distâncias<br />
aparentemente indissolúveis? Como construir a unidade na diversidade,<br />
valorizan<strong>do</strong> a alteridade <strong>com</strong>o fonte de conhecimento e possibilidade de<br />
superação das desigualdades?<br />
Sem dúvida alg<strong>um</strong>a, essa perspectiva não nega as peculiaridades <strong>do</strong><br />
Norte e <strong>do</strong> Sul, tampouco aquilo que se construiu ou destruiu no encontro<br />
entre esses <strong>do</strong>is mun<strong>do</strong>s. Entretanto, é preciso reconhecer que é nessas<br />
mesmas peculiaridades que subjaz a riqueza <strong>do</strong> diálogo. Precisamente<br />
por essa lógica é possível <strong>com</strong>binar a objetividade técnico-científica<br />
trazida pelo Norte e os saberes ancestrais acerca da relação <strong>do</strong> homem<br />
<strong>com</strong> a natureza, oriun<strong>do</strong>s da cultura <strong>do</strong> Sul. Na mesma direção, podemos<br />
pensar nas possibilidades h<strong>um</strong>anitárias, culturais, estéticas e afetivas<br />
que o progresso tecnológico no campo das <strong>com</strong>unicações oferece<br />
ao dissipar distâncias espaciais e temporais. é inegável, por exemplo, a<br />
difusão crescente de expressões artísticas, culturais e mesmo científicas<br />
advindas <strong>do</strong> Sul no cenário mundial. Outro aspecto igualmente relevante<br />
é a constituição de patrimônios multiculturais em nível global produzi<strong>do</strong>s<br />
pela <strong>com</strong>binação de diversas manifestações étnicas e religiosas.<br />
Dentro <strong>do</strong>s limites dessa proposta, sem ambição de esgotar os temas<br />
sugeri<strong>do</strong>s nesta reflexão, cabe elencar alg<strong>um</strong>as experiências que ilustram<br />
o caráter objetivo que o <strong>pensamento</strong> ou as identidades <strong>do</strong> Sul vêm<br />
ass<strong>um</strong>in<strong>do</strong> no cenário mundial contemporâneo.<br />
Em <strong>um</strong>a observação preliminar, podemos destacar a valorização crescente<br />
que os países da América Latina vêm atribuin<strong>do</strong> à educação em todas<br />
as suas dimensões e, prioritariamente, em seu aspecto formal. Não obstante,<br />
isso se faz notar na drástica redução <strong>do</strong>s níveis de analfabetismo, <strong>com</strong>provada<br />
pelos índices de desenvolvimento h<strong>um</strong>ano nesses territórios.
Merece destaque a produção de políticas públicas voltadas para a<br />
inclusão social de minorias sociológicas e o reconhecimento da plura-<br />
lidade cultural e étnica. Por esse caminho, chama atenção também a<br />
configuração progressiva de <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> que insta o trabalho <strong>com</strong>o<br />
princípio pedagógico e a pesquisa <strong>com</strong>o princípio educativo. Tal <strong>pensamento</strong><br />
sugere o desenvolvimento <strong>do</strong> ato criativo e inventivo no processo<br />
de ensino aprendizagem, além da inegável promoção <strong>do</strong>s ambientes<br />
formais de educação ao posto de produtores de conhecimento e não<br />
somente de transmissores de saberes.<br />
Não podemos deixar de mencionar o conceito de democracia <strong>com</strong>o<br />
valor unânime dentro <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul; única maneira de garantir<br />
a reforma da ética em busca de <strong>um</strong>a verdade para a existência h<strong>um</strong>ana,<br />
<strong>com</strong>o nos ensina <strong>Morin</strong>.<br />
A despeito <strong>do</strong>s avanços menciona<strong>do</strong>s, há, contu<strong>do</strong>, questões que precisam<br />
ser problematizadas pelo olhar <strong>do</strong> Sul. Está claro que, historicamente,<br />
o Norte dedicou <strong>um</strong>a quase cegueira às dinâmicas sociais e culturais<br />
<strong>do</strong> Sul, que, por sua vez, aceitou essa condição marginalizada ao<br />
longo de vários séculos. Sen<strong>do</strong> assim, volta<strong>do</strong>s agora para <strong>um</strong>a nova lógica,<br />
que valoriza o <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul, poderíamos dizer que a grande<br />
missão de tal olhar seria religar os indivíduos em torno <strong>do</strong>s desafios que<br />
são de fato coletivos: a má distribuição de renda, a preservação ambiental,<br />
a escassez de recursos naturais não renováveis, o preconceito. Enfim,<br />
cabe ao espírito h<strong>um</strong>ano lançar <strong>um</strong> novo olhar para o Sul, destituí<strong>do</strong> da<br />
cegueira histórica, <strong>com</strong>o forma de religar esses <strong>do</strong>is lugares, antes antagônicos,<br />
crian<strong>do</strong> a harmonia necessária para a vida. Transforman<strong>do</strong>-a<br />
em poesia para a existência na Terra.<br />
O <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul, por tu<strong>do</strong> isso, reforça a urgência da conciliação<br />
entre polos que, no fun<strong>do</strong>, são <strong>com</strong>plementares e não excludentes. Essa é<br />
a essência da troca: o objeto troca<strong>do</strong> é talvez menos importante <strong>do</strong> que<br />
o próprio contrato h<strong>um</strong>ano estabeleci<strong>do</strong> em parceria. Não são os bens<br />
intercambia<strong>do</strong>s que importam; o ato recíproco é que reforça laços de<br />
h<strong>um</strong>anidade. Como nos diz Marcel Mauss em seu sensível Ensaio sobre a<br />
dádiva: "No fun<strong>do</strong>, são misturas. Misturam-se as almas nas coisas; misturam-se<br />
as coisas nas almas. Misturam-se as vidas e eis <strong>com</strong>o as pessoas<br />
e as coisas misturadas saem, cada <strong>um</strong>a, das suas esferas e se misturam:<br />
o que é precisamente o contrato e a troca". 3<br />
3. MAUSS, Marcel. "Ensaio sobre a dádiva — Forma e razão da troca nas sociedades arcaicas". In : _____. Sociologia e Antropologia.<br />
v. II. São Paulo: Edusp, 1974.<br />
47
48<br />
CARRIzO, luIs<br />
Mag. Luis Carrizo CLAEH/Centro Latinoamericano de Economía<br />
H<strong>um</strong>ana (Uruguay) é psicólogo, especializa<strong>do</strong> en <strong>Psi</strong>cología<br />
Social y Maestro en Desarrollo Regional y Local. Doctoran<strong>do</strong> en<br />
Ciencias Sociales en la Universidad de Buenos Aires. Ha si<strong>do</strong> Vicerrector<br />
Académico del Centro Latinoamericano de Economía<br />
H<strong>um</strong>ana (CLAEH, 2006-2010) y actualmente es responsable<br />
de su Unidad de Investigación y Política. Coordina<strong>do</strong>r Académico<br />
de la Cátedra de Condición H<strong>um</strong>ana y Complejidad en la<br />
misma institución. Director ejecutivo de la Fundación Economía<br />
y H<strong>um</strong>anismo. Con<strong>sul</strong>tor y asesor de diversos organismos<br />
internacionales (Unesco, UNFPA, OEA, OEI, BID). Integra el<br />
Consejo Con<strong>sul</strong>tivo de la Escuela Nacional de Administración<br />
Pública y el Consejo Con<strong>sul</strong>tivo de Educación Terciaria Privada<br />
(Ministerio de Educación y Cultura). Es miembro del Comité<br />
Científico del Institut International de Recherche Politique de<br />
Civilisation. Integra la Coordinación del ORUS (Observatorio Internacional<br />
de Reformas Universitarias). Es miembro del Grupo<br />
de Expertos en Educación en Valores y Ciudadanía, asesor del<br />
Secretario General de la Organización de Esta<strong>do</strong>s Iberoamericanos<br />
para la Educación, la Ciencia y la Cultura (OEI).
temas<br />
centrales que<br />
inspiran el<br />
pensamiento<br />
del Sur<br />
De acuer<strong>do</strong> a lo plantea<strong>do</strong> por <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong> en su <strong>do</strong>c<strong>um</strong>ento de base<br />
para este Encuentro, la noción de pensamiento del Sur se constituye a<br />
partir de una reflexión dialógica que integra visiones que son — a la vez<br />
— contradictorias, <strong>com</strong>plementarias y concurrentes. Se trata, la dialógica,<br />
de un concepto llave en la obra moriniana, sobre el que se funda una<br />
propuesta epistemológica y política que quiere conducir a una reforma<br />
del pensamiento y de la acción.<br />
Desde esta perspectiva, <strong>Morin</strong> se enfoca en concebir un pensamiento<br />
del Sur cuya vocación sea la de integrar creativamente visiones culturales<br />
que aparecen a primera vista <strong>com</strong>o excluyentes entre sí, tales <strong>com</strong>o<br />
la racionalidad del paradigma dicho del norte y la espiritualidad del paradigma<br />
dicho del Sur. El autor aclara, con justa razón, que no se trata de<br />
posiciones geográficas; estas representan más bien posiciones ideológicas<br />
y políticas, que se instalan en el eje de la <strong>do</strong>minación y la búsqueda<br />
de hegemonía.<br />
El vira je propuesto por este "pensamiento del Sur" moriniano se<br />
constituye a partir de la integración dialógica, tanto a nivel local <strong>com</strong>o<br />
global, de las virtudes y valores de ambos paradigmas, en el marco de<br />
49
50<br />
una política de civilización que conjugue y recree los "opuestos" a fa-<br />
vor de una nueva visión del mun<strong>do</strong>. A partir de esta nueva formulación<br />
(que en la obra moriniana deriva en múltiples aplicaciones y, en especial<br />
para lo que nos <strong>com</strong>pete en este traba jo, en la caracterización<br />
del homo sapiens/demens), se problematizan las nociones de desarrollo,<br />
h<strong>um</strong>anismo, racionalidad, espiritualidad, realidad, mundialización, producción,<br />
autonomía, unidad y diversidad. El camino de esta reflexión<br />
lleva a identificar <strong>com</strong>ponentes que son sistemáticamente exclui<strong>do</strong>s de<br />
uno y otro <strong>com</strong>ponente del binomio Norte-Sur: así tenemos la solidaridad<br />
en la racionalidad productiva; la responsabilidad en el desarrollo<br />
científico-tecnológico; la lógica técnica en las economías tradicionales;<br />
y finalmente la autonomía en sociedades <strong>com</strong>unitarias, con impacto en<br />
la concepción de derechos.<br />
Desde esta perspectiva, es posible explorar con visión crítica la riqueza<br />
del binomio Norte-Sur, identificar sus necesarias <strong>com</strong>plementariedades<br />
y denunciar los reduccionismos que llevan a las miserias de una y<br />
otra cultura. <strong>Morin</strong>, apasiona<strong>do</strong> h<strong>um</strong>anista, convoca al sur para promover<br />
un camino que conduzca a un nuevo paradigma. Como lo ha hecho ya<br />
desarrollan<strong>do</strong> un Méto<strong>do</strong>, describien<strong>do</strong> los fundamentos del Pensamiento<br />
Complejo, establecien<strong>do</strong> las bases para una Educación del futuro, en<br />
camino hacia una Política de Civilización, en fin, proponien<strong>do</strong> una visión<br />
única y diversa, local y global, para concebir y vivir la Tierra-patria. El<br />
pensamiento del sur deberá ser, según el pensa<strong>do</strong>r francés, quien as<strong>um</strong>a<br />
la condición h<strong>um</strong>ana en este tercer milenio.<br />
EXPERIENCIAS INNOVADORAS<br />
<strong>Para</strong> este aparta<strong>do</strong>, me permito hacer referencia a algunas experiencias<br />
en las que participo directamente y que pueden contribuir a ilustrar<br />
lo que el autor del <strong>do</strong>c<strong>um</strong>ento base describe <strong>com</strong>o pensamiento del Sur.<br />
Se trata de experiencias en proceso, que han mostra<strong>do</strong> cualidades de<br />
impacto en sus respectivos universos de participación, y que se están<br />
aplican<strong>do</strong> actualmente en tres ámbitos diferentes: administración pública,<br />
formación científica y desarrollo local.<br />
ADMINISTRACIÓN PÚBLICA<br />
Formación de directores públicos en la Escuela Nacional de Administración<br />
Pública, uruguay (Coordina<strong>do</strong>r Académico). La experiencia se viene<br />
implementan<strong>do</strong> desde 2007 y constituye un espacio de diálogo entre<br />
realidad, teoría y meto<strong>do</strong>logía de análisis y resolución de problemas, con
ase en una mirada a la vez técnica y cultural de la dirección pública. Sus<br />
características fundamentales son:<br />
a) la transversalidad disciplinaria de su proceso y conteni<strong>do</strong>s;<br />
b) la cualidad aplicada del aprendizaje;<br />
c) el entrenamiento de los participantes en el análisis de situaciones y<br />
en la toma de decisiones en ámbitos <strong>com</strong>plejos con énfasis en la corresponsabilidad;<br />
d) la participación activa de los estudiantes en el proceso de aprendizaje;<br />
e) la visión del Esta<strong>do</strong> y la Democracia <strong>com</strong>o bien <strong>com</strong>ún, asocia<strong>do</strong> a la<br />
eficiencia de la gestión.<br />
FORMACIÓN CIENTÍFICA<br />
Escuelas Regionales de verano para América Latina y el Caribe del Programa<br />
MOST de unesco para jóvenes investiga<strong>do</strong>res (Coordina<strong>do</strong>r general).<br />
Se trata de fomentar la responsabilidad del investiga<strong>do</strong>r de ciencias<br />
sociales para contribuir a su mayor implicación en los asuntos públicos, a<br />
través del enlace entre investigación y políticas.<br />
Programa de Interdisciplinariedad de la Pontificia universidad Católica<br />
del Perú (PuCP), (Con<strong>sul</strong>tor). Se trata de superar la visión fragmentada<br />
de las disciplinas, para diseñar abordajes transdisciplinarios sobre asuntos<br />
<strong>com</strong>plejos de interés público, con énfasis en la responsabilidad científica y<br />
la ética del conocimiento.<br />
DESARROLLO LOCAL<br />
Intermunicipalidad para la cohesión social y territorial en América Latina,<br />
Programa uRB-AL III (Evalua<strong>do</strong>r). La experiencia local en la región huista<br />
en guatemala, articula la arraigada (aunque históricamente jaqueada)<br />
cultura maya de la solidaridad y el respeto a la naturaleza, con los preceptos<br />
de la integración entre municipios y la sociedad civil, para el desarrollo<br />
sustentable de la región.<br />
CUESTIONES PRIORITARIAS<br />
a) La superación de los dualismos (Norte/Sur, izquierda/derecha, desarrollo/subdesarrollo,<br />
técnica/h<strong>um</strong>anismo, local/global, entre tantos otros).<br />
b) La formación de educa<strong>do</strong>res, científicos, sociedad civil y políticos<br />
hacia nuevas formas de conocimiento y gobierno.<br />
c) El empoderamiento de las organizaciones de la sociedad civil y las<br />
<strong>com</strong>unidades, para el conocimiento de sus derechos y las formas de hacerlos<br />
efectivos.<br />
51
52<br />
CARVAlHO, eDGARD De<br />
AssIs<br />
Professor-titular de Antropologia, coordena<strong>do</strong>r <strong>do</strong> Núcleo de<br />
Estu<strong>do</strong>s da Complexidade (Complexus). Coordena<strong>do</strong>r <strong>do</strong> Comitê<br />
de Ética em Pesquisa da PUC-SP. Coordena<strong>do</strong>r brasileiro da<br />
Cátedra Itinerante Unesco <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong> (Ciuem).
contribuições<br />
"<strong>Para</strong> <strong>um</strong><br />
<strong>pensamento</strong> <strong>do</strong><br />
Sul"<br />
Patrimônio e expressão da práxis e das práticas, a cultura é instr<strong>um</strong>ento<br />
de cidadania democrática. As dualidades entre erudito e popular,<br />
erudito e massifica<strong>do</strong>, h<strong>um</strong>anista e científico não possuem qualquer valor<br />
ontológico; o que criam são expertises parcelares e fragmentadas.<br />
Cultura é conjunto sócio-histórico universal <strong>do</strong>s saberes e fazeres gera<strong>do</strong>s<br />
pelos h<strong>um</strong>anos de to<strong>do</strong>s os tempos, realidade econômica, social, ideológica,<br />
articulada ao sistema social global. O código constitutivo desse<br />
conjunto de saberes, afirma <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong>, "é de natureza simultaneamente<br />
cognitiva e estética" (2002, p. 188).<br />
Na modernidade líquida <strong>do</strong> capitalismo globaliza<strong>do</strong>, a cultura se debate<br />
entre pressões locais e injunções universais, e a lógica da eficácia se expande<br />
por toda parte. As primeiras dizem respeito a <strong>um</strong> estilo próprio de sociedades<br />
históricas, as segundas obedecem à pressão da uniformização estéril da<br />
imitação e da prescrição <strong>do</strong>s padrões da ac<strong>um</strong>ulação e da reprodução.<br />
<strong>um</strong>a distinção entre <strong>do</strong>is níveis da universalidade pode ser precisada<br />
ten<strong>do</strong> <strong>com</strong>o base as ideias de François Jullien em O diálogo entre as<br />
culturas. Do universal ao multiculturalismo. 4 <strong>um</strong>a universalidade fraca e<br />
4. O ensaio de François Jullien, filósofo e sinólogo que viveu na China vários anos, traz reflexões importantes para o diálogo<br />
e a transmissão <strong>do</strong>s saberes.<br />
53
54<br />
in<strong>do</strong>lente, limitada à experiência concreta, e outra forte e rigorosa, cuja legi-<br />
timação se efetiva por meio da <strong>do</strong>minação de determinadas culturas sobre<br />
outras. <strong>um</strong>a universalidade forte é fundada na necessidade de princípio de<br />
algo que possa ser aplicável a to<strong>do</strong>s. Ela é importante para o estabelecimento<br />
de princípios éticos <strong>com</strong>uns formula<strong>do</strong>s desde kant. A ação de qualquer<br />
ser h<strong>um</strong>ano, independentemente de cor, sexo, idade, nação só adquire senti<strong>do</strong><br />
ao se tornar lei universal. To<strong>do</strong> sujeito h<strong>um</strong>ano "não se perguntará senão<br />
isto: posso universalizar a máxima desse ato?" (JuLLIEN, 2009, p. 23).<br />
O uniforme "é o duplo perverti<strong>do</strong> <strong>do</strong> universal <strong>do</strong>ravante dissemina<strong>do</strong><br />
pela globalização" (JuLLIEN, 2009, p. 14). Diferenças de diferenças,<br />
diversidades de diversidades são reações às pressões e regulações sociopolíticas<br />
mundializadas. Por isso, as reivindicações identitárias ass<strong>um</strong>em<br />
valor de lei, regra, intolerância. Sob o disfarce da extensão a to<strong>do</strong>s<br />
das conquistas da uniformização, exercita-se <strong>um</strong>a ditadura de <strong>do</strong>minação,<br />
valores, padrões de cons<strong>um</strong>o ditos globais. Os reflexos <strong>do</strong> uniforme<br />
podem ser identifica<strong>do</strong>s por toda parte. "Fecha<strong>do</strong> finalmente sobre si<br />
mesmo, o to<strong>do</strong> (planetário) só faz refletir-se: autorreflexo que constitui<br />
<strong>do</strong>ravante fantasisticamente o mun<strong>do</strong> sob a aparência da similitude (e<br />
da superficialidade)" (JuLLIEN, 2009, p. 33).<br />
Sem ser lógico <strong>com</strong>o o universal ou deriva<strong>do</strong> da produção <strong>com</strong>o o uniforme,<br />
o <strong>com</strong><strong>um</strong> investe em <strong>um</strong>a política de vida cuja base é a partilha, a<br />
coparticipação, a equidade. Envolve planilhas de reconhecimento mútuo,<br />
enraíza-se na experiência. O <strong>com</strong><strong>um</strong> nos leva a refletir sobre ações e decisões<br />
ass<strong>um</strong>idas no dia a dia que, apenas no nível das aparências, parecem<br />
restritas à repetição monótona de padrões, ritmos, códigos, números.<br />
Muitas vezes revoltas são imperiosas. é verdade que podem paralisar<br />
sujeitos e coletividades, mas também impulsioná-los para reorganizações<br />
cognitivas, psíquicas, amorosas. O que existe no plano <strong>do</strong> mun<strong>do</strong><br />
real é <strong>um</strong>a arborescência universal de acontecimentos interliga<strong>do</strong>s, Sul<br />
e Norte, Oriente e Ocidente. Responsável por extinções, bifurcações e<br />
emergências, a física da terra religa e "dialogiza" causas locais e efeitos<br />
universais, causas físicas e efeitos biológicos, causas naturais e efeitos<br />
culturais. Daí decorre a dupla face <strong>do</strong> <strong>com</strong><strong>um</strong>: ele "é ao mesmo tempo<br />
inclusivo-exclusivo, pode abrir e fechar, opor-se ao próprio e identificarse<br />
<strong>com</strong> ele" (JuLLIEN, 2009, p. 42).<br />
O <strong>com</strong><strong>um</strong> exige que o reconhecimento se volte à construção de sujeitos<br />
plenos, empenha<strong>do</strong>s na consolidação da Terra-pátria; implica transcender<br />
o âmbito sacraliza<strong>do</strong> da pólis, <strong>com</strong> seus mitos de fundação e consolidação.<br />
O pertencimento fecha<strong>do</strong> engendra intolerâncias. é preciso<br />
abri-lo, bifurcá-lo para que a <strong>com</strong>unidade não se feche. "A <strong>com</strong>unidade
tem <strong>com</strong>o vocação não se cerrar, mas se descerrar. A própria história <strong>do</strong><br />
<strong>com</strong><strong>um</strong>, no seio da transformação política da grécia antiga, já ia nesse<br />
senti<strong>do</strong>" (JuLLIEN, 2009, p. 43).<br />
A colaboração intercultural e interpolítica entre Norte e Sul é fundamental<br />
para a democracia universal de povos e nações. Sul e Norte não<br />
são noções meramente geográficas, <strong>com</strong>o enfatiza <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong>. São estilos<br />
de vida, cognições, experiências que requerem problematização<br />
permanente. Retornar à origem, ao primordial, ao arquetípico é tarefa de<br />
to<strong>do</strong>s para que a lógica da disjunção seja superada. Acredito ser essa a<br />
tarefa primordial <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul: restaurar a arte de viver, refundar<br />
a democracia planetária, instaurar a ética da condição h<strong>um</strong>ana.<br />
O que nos diferencia na qualidade de primatas h<strong>um</strong>anos é que somos<br />
porta<strong>do</strong>res de <strong>um</strong> polienraizamento antropológico cerebral-espiritualcultural-social<br />
que, por sua vez, exige <strong>um</strong> polienraizamento físico-biológico-zoológico.<br />
Submeti<strong>do</strong>s ao espírito <strong>do</strong> tempo, é a partir deles que<br />
somos capazes de diagnosticar, propor, teorizar, imaginar a <strong>com</strong>plexidade<br />
<strong>do</strong> real e o real da <strong>com</strong>plexidade e colocá-los na contramão da idade<br />
de ferro planetária que marca a hipermodernidade.<br />
Nossas sociedades precisam de mitologias que deem conta das potencialidades<br />
<strong>do</strong> sapiens-demens e permitam contextualizar a emergência<br />
das <strong>com</strong>plexidades individuais, das qualidades de alma, das instabilidades<br />
<strong>do</strong>s afetos.<br />
é preciso retornar ao homem genérico. Construída por Marx, a noção<br />
é desprovida de subjetividade, emoção, amor, loucura, poesia, pois o<br />
homo faber, fabrica<strong>do</strong>r das técnicas e inventor da <strong>do</strong>minação incontrolada<br />
da natureza, ainda permanece <strong>com</strong>o <strong>um</strong> indômito desbrava<strong>do</strong>r <strong>do</strong>s<br />
ecossistemas naturais, responsável pela construção racional de <strong>um</strong>a segunda<br />
natureza. A natureza é sempre primeira, primordial. Marx precisa<br />
ser inseri<strong>do</strong> nos circuitos da modernidade líquida para que as emoções,<br />
o imaginário, a "desrazão" penetrem na mente de to<strong>do</strong>s. Isso requer o<br />
fim <strong>do</strong> antropocentrismo. Requer também a superação das fronteiras<br />
natureza-cultura, local-universal, Sul-Norte. é preciso "dialogizar" essas<br />
oposições e entendê-las <strong>com</strong>o pares simultaneamente <strong>com</strong>plementares,<br />
concorrentes, antagônicos. No lugar de <strong>um</strong>a monocultura da mente, <strong>um</strong>a<br />
policultura da vida.<br />
Respostas às questões para onde vamos e para onde queremos ir deixam<br />
de ser especulações filosóficas adjetivas, isso porque traduzem anseios,<br />
desejos, pulsões <strong>com</strong>uns a to<strong>do</strong>s. Por isso, os pensa<strong>do</strong>res imbuí<strong>do</strong>s<br />
<strong>do</strong> senti<strong>do</strong> dessa utopia realizável — artistas, cientistas, filósofos — continuam<br />
a imaginar, inventar, propor, projetar. Suas narrativas atravessam<br />
55
56<br />
a flecha <strong>do</strong> tempo, formatam a biblioteca universal da vida, instauram<br />
novas formas de sociabilidade, restauram a esperança, reencantam o conhecimento,<br />
recuperam o tempo perdi<strong>do</strong> que não pode se perder mais,<br />
minoram o mal-estar instala<strong>do</strong> na civilização.<br />
Nossa Terra-pátria requer <strong>um</strong>a efetiva política de civilização. Requer<br />
também experiências pedagógicas que implementem a religação. <strong>Para</strong><br />
isso, as instituições voltadas à educação devem converter-se em <strong>com</strong>unidades<br />
de aprendizagem. Aprendiza<strong>do</strong>s e experiências caminham juntos.<br />
To<strong>do</strong>s são aprendentes: alunos, professores, gestores. Seu empenho prioritário<br />
é restaurar o senti<strong>do</strong> da totalidade das culturas, superar a fragmentação<br />
disciplinar, sepultar a banalidade <strong>do</strong> mal-estar instala<strong>do</strong> na cultura.<br />
Culturas não são apenas <strong>com</strong>postas de padrões regulariza<strong>do</strong>res nem se<br />
assemelham a fábricas da ordem. São plataformas de espaço-tempo empenhadas<br />
na preservação da memória cultural <strong>do</strong>s povos da Terra.<br />
A experimentação de novas formas de entendimento da vida, que religam<br />
o prosaico e o poético, pode propiciar <strong>um</strong> pouco mais de felicidade.<br />
Em <strong>um</strong> de seus últimos livros, ao ser pergunta<strong>do</strong> sobre o senti<strong>do</strong> da<br />
felicidade, <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong> afirmou o seguinte: "Sim, sou feliz, mas tenho <strong>um</strong><br />
la<strong>do</strong> melancólico, <strong>com</strong>o a face obscura da Lua" (MORIN, 2010).
REFERÊNCIAS<br />
JuLLIEN, François. O diálogo entre as culturas: <strong>do</strong> universal ao multiculturalismo.<br />
Tradução: André Telles. Rio de Janeiro: Zahar, 2009.<br />
MORIN, <strong>Edgar</strong>. Da culturanálise à política cultural. Tradução: <strong>Edgar</strong>d de Assis<br />
Carvalho; Mariza Perassi Bosco. São Paulo: EDuC, 2002. p. 188.<br />
MORIN, <strong>Edgar</strong>. Meu caminho. Entrevistas <strong>com</strong> Djénane Kareh Tager. Tradução: <strong>Edgar</strong>d<br />
de Assis Carvalho, Mariza Perassi Bosco. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2010.<br />
57
58<br />
Presidente da Câmara de Educação Básica <strong>do</strong> Conselho Na-<br />
cional de Educação. Con<strong>sul</strong>tor Educacional da Escola SESC de<br />
Ensino Médio. Diretor-presidente da Con<strong>sul</strong>toria Educacional<br />
Peabiru, Con<strong>sul</strong>tores Associa<strong>do</strong>s em Educação.
Quais os temas<br />
centrais que<br />
inspiram o<br />
<strong>pensamento</strong><br />
<strong>do</strong> Sul?<br />
a) <strong>Para</strong> o Sul, a hegemonia <strong>do</strong> Norte é percebida, essencialmente, <strong>com</strong>o<br />
a hegemonia da técnica, da economia, da racionalização, da rentabilidade,<br />
da eficiência e da eficácia. qualquer cultura ou civilização contempla<br />
qualidades, virtudes, ilusões e imperfeições. Evidentemente, a cultura <strong>do</strong><br />
Norte trouxe ganhos, <strong>com</strong>o a democracia representativa, a afirmação <strong>do</strong>s<br />
direitos h<strong>um</strong>anos e <strong>do</strong>s direitos da mulher, as autonomias individuais. Entretanto,<br />
também apresenta suas cegueiras e ilusões, expressas na concentração<br />
de poderes políticos e religiosos e na primazia <strong>do</strong> desenvolvimento<br />
material sobre o desenvolvimento h<strong>um</strong>ano.<br />
b) O <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul se expressa, por exemplo, na unidade de<br />
<strong>um</strong> universo cria<strong>do</strong> pelo Deus único; na mensagem das cartas paulinas,<br />
orientan<strong>do</strong> a religião cristã para to<strong>do</strong>s os seres h<strong>um</strong>anos; na herança da<br />
cultura helênica, segun<strong>do</strong> a qual o ser h<strong>um</strong>ano é <strong>do</strong>ta<strong>do</strong> de razão, o que<br />
lhe permite exercer <strong>um</strong>a ação política na sociedade; no entendimento <strong>do</strong><br />
objeto da filosofia <strong>com</strong>o sen<strong>do</strong> o da busca da verdade e <strong>com</strong>o vontade<br />
de reflexão sobre todas as coisas; bem <strong>com</strong>o na herança universalista<br />
romana, que reconhecia os direitos <strong>do</strong>s cidadãos romanos de forma independente<br />
de suas origens étnicas.<br />
59
60<br />
c) A mensagem <strong>do</strong> Renascimento europeu deve ser considerada <strong>com</strong>o<br />
<strong>um</strong>a mensagem <strong>do</strong> Sul, enquanto movimento <strong>do</strong> espírito que problematiza<br />
tu<strong>do</strong>: o mun<strong>do</strong>, o homem, a natureza e Deus. O h<strong>um</strong>anismo nasceu dessa<br />
problematização promovida pelo renascimento, apresentan<strong>do</strong> duas faces:<br />
<strong>um</strong>a arrogante, <strong>do</strong> homem <strong>do</strong>mina<strong>do</strong>r, senhor e mestre da natureza, e outra<br />
fundamentada no valor e na dignidade de to<strong>do</strong> ser h<strong>um</strong>ano, venha de onde<br />
vier, viven<strong>do</strong> n<strong>um</strong>a transitória <strong>com</strong>unidade de passageiros, em <strong>um</strong> planeta<br />
minúsculo, situa<strong>do</strong> em <strong>um</strong>a galáxia periférica.<br />
d) O <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul implica a problematização da própria razão,<br />
considerada enquanto instr<strong>um</strong>ento de problematização de tu<strong>do</strong> e de to<strong>do</strong>s,<br />
<strong>com</strong>o racionalidade estimulada por <strong>um</strong>a paixão, oposta à racionalidade<br />
glacial <strong>do</strong> cálculo e da aritmética.<br />
e) é urgente regenerar as virtudes da racionalidade, manifestas nas capacidades<br />
teóricas e críticas, na economia das coisas, na resistência aos<br />
anátemas de qualquer natureza e na capacidade de autocrítica.<br />
f) O desafio de <strong>um</strong>a reflexão centrada no <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul é o de promover<br />
a mistura entre as heranças culturais mediterrâneas e as heranças<br />
culturais africanas e <strong>sul</strong>-americanas, ligan<strong>do</strong>-as a <strong>um</strong>a nova consciência<br />
ecológica, que nos integra na biosfera.<br />
g) A herança das tradições de solidariedade e das artes <strong>do</strong> bem-viver,<br />
presente no <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul, orienta para integrar e não para destruir<br />
e desagregar.<br />
h) é urgente e essencial problematizar o processo de mundialização desenfreada<br />
movi<strong>do</strong> pelo desenvolvimento científico, tecnológico, econômico e<br />
cultural, centra<strong>do</strong> na prevalência da ac<strong>um</strong>ulação <strong>do</strong> lucro e da propriedade.<br />
Esse processo acabou acarretan<strong>do</strong> grandes perigos para a h<strong>um</strong>anidade, <strong>com</strong>o<br />
a proliferação das armas nucleares, a desagregação da biosfera, as policrises<br />
planetárias e os novos conflitos étnicos e religiosos.<br />
i) As sociedades tradicionais tendem a se desintegrar sob o <strong>com</strong>an<strong>do</strong> e<br />
o dinamismo de <strong>um</strong> processo de globalização movi<strong>do</strong> por <strong>um</strong>a crise econômica<br />
sem regulação e corrompida pela especulação financeira.<br />
j) Com o fracasso da modernidade científica, tecnológica e econômica<br />
no c<strong>um</strong>primento das promessas de <strong>um</strong> mun<strong>do</strong> melhor e mais justo para to<strong>do</strong>s,<br />
a aventura h<strong>um</strong>ana passou a ser <strong>um</strong>a aventura de risco desconheci<strong>do</strong>,<br />
que exige urgente retorno às raízes.<br />
k) A crise da unificação técnica, científica e econômica <strong>do</strong> globo terrestre<br />
é <strong>um</strong>a crise <strong>do</strong> processo de mundialização promovi<strong>do</strong> pelo ocidente<br />
que, se de <strong>um</strong> la<strong>do</strong>, trouxe a<strong>um</strong>ento <strong>do</strong> bem-estar, autonomias individuais<br />
e emancipação de novas classes médias, por outro la<strong>do</strong>, destruiu
as solidariedades tradicionais, gerou novas formas de corrupção e fez<br />
prosperar as desigualdades, promoven<strong>do</strong> pobrezas e misérias.<br />
l) Presenciamos <strong>um</strong>a fantástica unificação <strong>do</strong> planeta Terra, a transformação<br />
em <strong>um</strong>a verdadeira aldeia global, a qual coincide <strong>com</strong> <strong>um</strong> movimento<br />
de de<strong>com</strong>posição e de desagregação sociocultural, ameaçan<strong>do</strong> as<br />
originalidades e as singularidades culturais, étnicas e nacionais, promoven<strong>do</strong><br />
<strong>um</strong>a incerteza histórica que promove a perda de fé no progresso e a<br />
perda de esperança em <strong>um</strong> mun<strong>do</strong> melhor para to<strong>do</strong>s.<br />
m) Assistimos ao desencadeamento simultâneo de duas pragas para a<br />
h<strong>um</strong>anidade: de <strong>um</strong> la<strong>do</strong>, a unificação abstrata e homogeneizante que destrói<br />
as diversidades; de outro la<strong>do</strong>, o fechamento das singularidades em si<br />
mesmas, isolan<strong>do</strong>-as <strong>do</strong> resto da h<strong>um</strong>anidade. é preciso entender o vínculo<br />
entre a unidade e a diversidade, que faz <strong>com</strong> que o tesouro da unidade<br />
h<strong>um</strong>ana seja o da diversidade e este o da unidade, para que a cegueira<br />
promovida por <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> funda<strong>do</strong> essencialmente no cálculo e cego<br />
para a existência da alegria, <strong>do</strong> sofrimento e da felicidade e infelicidade<br />
não acabe cegan<strong>do</strong> as nossas consciências para o la<strong>do</strong> h<strong>um</strong>ano da h<strong>um</strong>anidade,<br />
ignoran<strong>do</strong> as qualidades da vida.<br />
n) <strong>um</strong>a das promessas <strong>do</strong> Sul deveria ser "antes melhor <strong>do</strong> que<br />
mais", ou seja, "menos, porém melhor". <strong>Para</strong> tanto, precisamos nos livrar<br />
das intoxicações cons<strong>um</strong>istas promovidas pelo processo mundial<br />
de produção e cons<strong>um</strong>o de objetos <strong>com</strong> qualidades ilusórias e obsolescências<br />
programadas.<br />
o) O <strong>pensamento</strong> fundamenta<strong>do</strong> no homo economicus, determina<strong>do</strong><br />
unicamente pelo interesse pessoal, é cego a tu<strong>do</strong> o que escapa desse interesse:<br />
o amor, a dádiva, a <strong>com</strong>unhão, a solidariedade, a responsabilidade, a<br />
unidade, a diversidade, o lazer, a brincadeira, a cultura, a alegria, a poesia,<br />
a filosofia e a felicidade.<br />
p) Os indivíduos h<strong>um</strong>anos não são máquinas triviais, mesmo que<br />
subjuga<strong>do</strong>s a lógicas triviais, pois escapam das trivialidades por intermédio<br />
de suas aspirações, sonhos, súbitas manifestações amorosas,<br />
estéticas e transgressoras, <strong>com</strong> seu poder cria<strong>do</strong>r frente ao inespera<strong>do</strong><br />
e ao inusita<strong>do</strong>.<br />
q) As lógicas da eficiência e da eficácia, da previsibilidade, <strong>do</strong> cálculo<br />
cronometra<strong>do</strong> e hiper especializa<strong>do</strong>, geram <strong>um</strong>a burocracia que gangrena<br />
as atividades gestoras, crian<strong>do</strong> <strong>um</strong>a racionalização que promove total<br />
irracionalidade.<br />
r) A lógica <strong>do</strong> Norte considera as realidades <strong>do</strong> Sul <strong>com</strong>o a pura expressão<br />
<strong>do</strong> atraso, <strong>do</strong> arcaísmo e da preguiça, porque trata os problemas<br />
61
62<br />
organizacionais <strong>com</strong>o problemas técnicos, práticos e quantificáveis, isto é,<br />
<strong>com</strong>o a prosa da vida. Entretanto, a vida não se res<strong>um</strong>e à prosa feita por<br />
obrigação e por imposição para se ganhar a vida e sobreviver. A vida só<br />
vale a pena ser vivida de forma poética, no amor, na <strong>com</strong>unhão, na realização<br />
de si, na felicidade e no êxtase, o ápice da felicidade. O homem habita<br />
a terra de forma prosaica e poética.<br />
s) Como a prosa invade to<strong>do</strong>s os rincões de nossa vida, <strong>um</strong>a das missões<br />
essenciais <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul é a de relembrar à h<strong>um</strong>anidade o<br />
caráter primordial da poesia e da arte h<strong>um</strong>ana de viver, de maneira alegre<br />
e extrovertida, fundamentada na <strong>com</strong>unicação e na <strong>com</strong>unhão, na hospitalidade,<br />
na solidariedade e nas qualidades poéticas da vida, sem desprezar<br />
as contribuições benéficas <strong>do</strong> Norte, mas recusan<strong>do</strong> os seus aspectos perversos<br />
e nocivos, sobretu<strong>do</strong> a sua hegemonia.<br />
t) <strong>um</strong> <strong>do</strong>s grandes desafios <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul é o de enfrentar<br />
as <strong>com</strong>plexidades de nossa vida, da realidade h<strong>um</strong>ana e a insustentável<br />
<strong>com</strong>plexidade <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> no planeta Terra. O <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul,<br />
por sua própria natureza, só poder ser <strong>com</strong>plexo, no senti<strong>do</strong> latino <strong>do</strong><br />
termo, <strong>com</strong>o aquilo que é teci<strong>do</strong> em conjunto e <strong>com</strong>o aquele que religa<br />
o que foi artificialmente separa<strong>do</strong> e, portanto, está apto a ressuscitar<br />
os problemas globais fundamentais, promoven<strong>do</strong> as qualidades e a<br />
poesia da vida.<br />
u) O <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul é chama<strong>do</strong> a reproblematizar a sabe<strong>do</strong>ria, <strong>um</strong><br />
<strong>do</strong>s grandes avanços culturais da Antiguidade greco-romana, relativizan<strong>do</strong><br />
a sua identificação <strong>com</strong> <strong>um</strong>a vida <strong>do</strong>tada de razão e enfatizan<strong>do</strong> a sua vinculação<br />
<strong>com</strong> a paixão, reconhecen<strong>do</strong> as virtudes da poesia, <strong>do</strong> amor e <strong>do</strong><br />
senti<strong>do</strong> de <strong>com</strong>unidade e de solidariedade.<br />
v) A missão <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul é a de retomar o adjetivo em nossas<br />
vidas, retoman<strong>do</strong> o concreto, a existência, o singular, integran<strong>do</strong>-o no universal,<br />
ligan<strong>do</strong> a unidade à diversidade, restauran<strong>do</strong> solidariedades concretas<br />
e planetárias, cuja necessidade é vital para to<strong>do</strong>s nós, restauran<strong>do</strong><br />
valores <strong>com</strong>o o sentimento de honra e a hospitalidade, e promoven<strong>do</strong> a<br />
regeneração ética da solidariedade e da responsabilidade, <strong>com</strong> autonomia<br />
moral e intelectual.<br />
x) A nave espacial Terra encontra-se na noite e na neblina, provavelmente<br />
r<strong>um</strong>o a <strong>um</strong> futuro de catástrofe e ao abismo. Entretanto, <strong>com</strong>o na história<br />
h<strong>um</strong>ana o improvável sempre acontece, podemos hoje sonhar e restaurar<br />
a esperança no improvável, que não obedece a nenh<strong>um</strong>a promessa histórica,<br />
mas está fundada na ideia da crise e da imaginação criativa, de
fundamental importância para a elaboração de <strong>um</strong> diagnóstico pertinente<br />
e identificação de <strong>um</strong> caminho de saída a partir de <strong>um</strong> despertar criativo.<br />
y) A metáfora das células-tronco é <strong>um</strong>a boa demonstração de que as<br />
capacidades gera<strong>do</strong>ras <strong>do</strong>rmem nas sociedades e despertam em épocas<br />
de crise, nos indivíduos desviantes da média, nos poetas, nos escritores,<br />
nos músicos, nos descobri<strong>do</strong>res e inventores/cria<strong>do</strong>res.<br />
z) Sabemos que quan<strong>do</strong> <strong>um</strong> sistema não é mais capaz de tratar os seus<br />
problemas fundamentais, ou ele se desintegra ou se metamorfoseia, engendran<strong>do</strong><br />
<strong>um</strong> metassistema mais rico, para melhor tratar esses problemas.<br />
O sistema <strong>do</strong> planeta Terra, hoje, está em crise e não consegue mais<br />
tratar de seus problemas vitais, tais <strong>com</strong>o fome, morte representada pelas<br />
armas nucleares, degradação da natureza, violência generalizada, corrupção<br />
financeira desenfreada, falência <strong>do</strong> sistema econômico etc. Portanto,<br />
está condena<strong>do</strong> a morrer ou a se transformar. Essa metamorfose não se<br />
decreta e não se programa, mas é a única saída para se criar a verdadeira<br />
Terra-pátria-mãe. Então, só nos resta buscar caminhos novos, mesmo que<br />
improváveis, mas que sejam utopias que nos orientem para caminhar na<br />
direção da metamorfose. Essa é a missão grandiosa e universal <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong><br />
<strong>do</strong> Sul.<br />
QUAIS AS EXPERIÊNCIAS INOVADORAS IMPLEMENTADAS E/OU EM<br />
CURSO QUE ILUSTRAM O PENSAMENTO E/OU AS IDENTIDADES<br />
DO SUL?<br />
a) Escola SESC de Ensino Médio: em funcionamento na cidade <strong>do</strong> Rio<br />
de Janeiro, em perío<strong>do</strong> integral, <strong>com</strong>o escola residente, recebe alunos de<br />
todas as unidades da Federação Brasileira e promove <strong>com</strong> eles <strong>um</strong> ensino<br />
da melhor qualidade, desenvolve <strong>um</strong> currículo escolar integra<strong>do</strong>, interdisciplinar,<br />
diversifica<strong>do</strong> e contextualiza<strong>do</strong> à realidade de jovens oriun<strong>do</strong>s de<br />
ambientes socioculturais e econômicos heterogêneos. é <strong>um</strong>a escola organizada<br />
e orientada para o desenvolvimento da capacidade de aprendizagem<br />
permanente, para que seus alunos tenham condições de continuar<br />
aprenden<strong>do</strong> continuadamente, em condições de responder aos novos desafios<br />
da vida cidadã e profissional de forma original e criativa.<br />
b) Programa de Ensino Médio inova<strong>do</strong>r: em processo de implantação<br />
pelo governo Federal, em regime de colaboração <strong>com</strong> as diferentes unidades<br />
da Federação Brasileira, tem o apoio da Escola SESC de Ensino Médio,<br />
especialmente quanto ao treinamento e desenvolvimento de professores,<br />
para que o currículo escolar desenvolvi<strong>do</strong> articule as dimensões<br />
de educação científica, tecnológica, cultural e profissional. Objetiva-se<br />
implantar <strong>um</strong>a escola de ensino médio que atenda melhor aos interesses<br />
63
64<br />
<strong>do</strong>s jovens em processo de desenvolvimento, <strong>com</strong> oferta de <strong>um</strong> ensino que<br />
ass<strong>um</strong>a <strong>com</strong>o princípios educativos o trabalho, a prática social, a ciência,<br />
a cultura e a tecnologia, promoven<strong>do</strong> o desenvolvimento da capacidade<br />
de aprendizagem permanente, para que os jovens tenham condições de<br />
continuar aprenden<strong>do</strong> e adaptan<strong>do</strong>-se <strong>com</strong> flexibilidade e perspicácia às<br />
novas condições <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> <strong>do</strong> trabalho e da promoção <strong>do</strong> desenvolvimento<br />
sustentável e solidário da sociedade em que vivem.<br />
c) Desenvolvimento de programas de Educação Profissional e Tecnológica<br />
<strong>com</strong>prometi<strong>do</strong>s <strong>com</strong> o desenvolvimento de <strong>com</strong>petências profissionais<br />
que permitam ao cidadão-trabalha<strong>do</strong>r enfrentar e responder a desafios socioprofissionais<br />
espera<strong>do</strong>s e inespera<strong>do</strong>s, previsíveis e imprevisíveis, rotineiros<br />
e inusita<strong>do</strong>s, <strong>com</strong> criatividade, autonomia, ética e efetividade, qualifican<strong>do</strong>-se<br />
para <strong>um</strong> exercício profissional <strong>com</strong>petente. O <strong>com</strong>promisso ético<br />
das instituições de educação profissional e tecnológica em relação aos seus<br />
alunos, aos emprega<strong>do</strong>res de seus forman<strong>do</strong>s e à sociedade beneficiária<br />
<strong>do</strong>s trabalhos desses profissionais, de acor<strong>do</strong> <strong>com</strong> as atuais Diretrizes Curriculares<br />
Nacionais, definidas pelo Conselho Nacional de Educação, está diretamente<br />
relaciona<strong>do</strong> <strong>com</strong> o desenvolvimento da <strong>com</strong>petência profissional,<br />
<strong>com</strong>o sen<strong>do</strong> a capacidade de mobilizar, articular e colocar em ação Conhecimentos,<br />
habilidades, Atitudes, valores e Emoções (ChAvE), para responder,<br />
de forma criativa, aos desafios e requerimentos de cidadania e de vida<br />
profissional e pessoal <strong>do</strong> trabalha<strong>do</strong>r, <strong>com</strong> eficiência e eficácia diante <strong>do</strong><br />
inespera<strong>do</strong>, <strong>com</strong> <strong>um</strong>a atuação transforma<strong>do</strong>ra e cria<strong>do</strong>ra. O conhecimento<br />
é entendi<strong>do</strong> <strong>com</strong>o o que muitos denominam saber conhecer ou simplesmente<br />
saber. A habilidade refere-se ao saber fazer relaciona<strong>do</strong> <strong>com</strong> a prática<br />
no trabalho, transcenden<strong>do</strong> o mero treinamento operacional para a ação<br />
motora. Os valores, as atitudes e as emoções se expressam no saber ser e<br />
no saber conviver, intimamente relaciona<strong>do</strong>s <strong>com</strong> o julgamento da pertinência<br />
da ação, <strong>com</strong> a qualidade <strong>do</strong> trabalho, a ética <strong>do</strong> <strong>com</strong>portamento, a<br />
convivência participativa e solidária, entre outros atributos h<strong>um</strong>anos.<br />
QUAIS AS QUESTÕES PRIORITÁRIAS A SEREM TRATADAS PELO<br />
OLHAR DO SUL NA DIREÇÃO DE UMA POLÍTICA DE CIVILIZAÇÃO?<br />
a) Educação Básica das crianças e <strong>do</strong>s a<strong>do</strong>lescentes, desde a Educação<br />
Infantil e Ensino Fundamental até o Ensino Médio e Profissional, centrada<br />
no <strong>com</strong>promisso para <strong>com</strong> o desenvolvimento da capacidade de aprendizagem<br />
<strong>do</strong>s alunos, para que tenham condições de continuar aprenden<strong>do</strong><br />
e de enfrentar o choque <strong>do</strong> futuro <strong>com</strong> segurança, responsabilidade e<br />
criatividade; toman<strong>do</strong>-se <strong>com</strong>o meios básicos os conteú<strong>do</strong>s curriculares<br />
desenvolvi<strong>do</strong>s de forma integrada, interdisciplinar e contextualizada, para<br />
que façam senti<strong>do</strong> para os alunos em situação de aprendizagem.
) Formação de professores para a Educação Básica que sejam capazes<br />
de conduzir os seus alunos nas trilhas da aprendizagem, ensinan<strong>do</strong>-os a<br />
ver o mun<strong>do</strong> <strong>com</strong> perspicácia e nele atuar em condições de decidir, saben<strong>do</strong><br />
julgar, analisar, avaliar, observar, interpretar, correr riscos, corrigir<br />
fazeres, antecipar escolhas, resolver e responder desafios, conviver <strong>com</strong> o<br />
incerto e o inusita<strong>do</strong>.<br />
c) Ass<strong>um</strong>ir <strong>com</strong>o princípios educativos da juventude o trabalho, a<br />
ciência, a cultura, a tecnologia e o desenvolvimento sustentável e solidário,<br />
tratan<strong>do</strong>-os de forma integrada, interdisciplinar e contextualizada<br />
<strong>com</strong> o mun<strong>do</strong> <strong>do</strong> trabalho, o desenvolvimento cultural e a prática<br />
social <strong>do</strong> cidadão.<br />
65
66<br />
COutINHO, jAIRO<br />
Coordena<strong>do</strong>r <strong>do</strong> Espaço Criança Esperança <strong>do</strong> Rio de Janeiro,<br />
projeto nas favelas Cantagalo e Pavão/Pavãzinho. Médico <strong>com</strong><br />
formação em <strong>Psi</strong>quiatria. Dedica-se à gestão de projetos sociais<br />
e educacionais. Ativista social participante de n<strong>um</strong>erosos movimentos,<br />
ONGs e entidades <strong>com</strong>unitárias e sindicais.
contribuições<br />
"<strong>Para</strong> <strong>um</strong><br />
<strong>pensamento</strong><br />
<strong>do</strong> Sul"<br />
"viver é muito perigoso... Porque aprender a viver é que é o viver<br />
mesmo... Travessia perigosa, mas é a da vida."<br />
(guimarães Rosa, Grande Sertão: Veredas)<br />
A primeira e central questão que se coloca para a elaboração de <strong>um</strong><br />
<strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul, <strong>com</strong>o desenvolve <strong>Morin</strong>, é o reconhecimento de que<br />
existe <strong>um</strong> Sul, vários "suis". Não <strong>com</strong>o algo geográfico, mas <strong>com</strong>o fruto<br />
de <strong>um</strong>a relação <strong>com</strong> o Norte, surgi<strong>do</strong> <strong>com</strong> o fim da oposição Ocidente-<br />
Oriente, conceitos vigentes até o fim <strong>do</strong> Terceiro Mun<strong>do</strong>, que expressavam<br />
a geopolítica anterior à queda <strong>do</strong> muro de Berlim.<br />
Compreender que existe <strong>um</strong> Sul exige h<strong>um</strong>ildade e coragem. h<strong>um</strong>ildade<br />
para renunciar às "certezas" impostas pela hegemonia técnica, científica<br />
e econômica que se impõe, a partir <strong>do</strong> Norte, ao conjunto <strong>do</strong> planeta.<br />
Modelo que dissemina miséria, desemprego, violência, banditismo, a morte<br />
precoce <strong>do</strong>s jovens, o sofrimento, degradan<strong>do</strong> a vida social e cultural<br />
de milhões de pessoas e extenua a biosfera, caminhan<strong>do</strong> perigosamente<br />
para a extinção da própria vida no planeta.<br />
Coragem para reconhecer no Sul, nos "suis", <strong>um</strong>a vida inteligente, <strong>com</strong><br />
suas virtudes, <strong>com</strong> a beleza da diversidade, plena de fraternidade, de ale-<br />
67
68<br />
gria, de solidariedade. Mas também é preciso h<strong>um</strong>ildade para reconhecer<br />
e incorporar n<strong>um</strong> novo paradigma os benefícios <strong>do</strong> conhecimento técnico,<br />
científico e <strong>do</strong> desenvolvimento econômico, necessariamente vincula<strong>do</strong> à<br />
sustentabilidade ambiental e social.<br />
Coragem e h<strong>um</strong>ildade para admitir-se que <strong>do</strong> Sul é possível, e unicamente<br />
daí, <strong>um</strong> caminho civilizatório na paz e fraternidade. Caminho que<br />
empreende as bases de <strong>um</strong>a metamorfose que supere a antinomia Sul-<br />
Norte, religan<strong>do</strong> a to<strong>do</strong>s, n<strong>um</strong> "destino <strong>com</strong><strong>um</strong>", em harmonia na Terrapátria.<br />
Do Sul <strong>um</strong>a fênix, liberta<strong>do</strong>ra e salva<strong>do</strong>ra.<br />
No Sul, o "<strong>sul</strong> <strong>do</strong> <strong>sul</strong>". No Norte, o "<strong>sul</strong> no norte". As periferias, os bairros<br />
de migrantes, as favelas não cansam de exigir o fim da miséria, da<br />
desigualdade, que assola essas populações. Em seus movimentos, na<br />
sua música e poesia, clamam por justiça, pela igualdade de direitos, por<br />
oportunidades para conquistarem <strong>um</strong>a vida digna. São vozes que falam<br />
alto, diuturnamente. São vozes que, quan<strong>do</strong> não ouvidas, irrompem em<br />
explosões de violência, protagonizadas, sobretu<strong>do</strong>, pelos jovens. vítimas<br />
e algozes matam e morrem, reféns <strong>do</strong> cons<strong>um</strong>ismo, usurpa<strong>do</strong>s de<br />
sonhos. Nas cidades, em suas entranhas, a crise a clamar por <strong>um</strong>a saída.<br />
Saída para aqueles reféns da miséria, da tirania <strong>do</strong>s ban<strong>do</strong>s arma<strong>do</strong>s,<br />
saída para aqueles detentores de bens e oportunidades, também<br />
vitima<strong>do</strong>s pelo cons<strong>um</strong>ismo, pela angústia, que, assusta<strong>do</strong>s pela violência,<br />
ficam aprisiona<strong>do</strong>s pelos muros e grades <strong>do</strong>s con<strong>do</strong>mínios, pela<br />
"segurança" <strong>do</strong>s shoppings.<br />
Saída que não idealize o Sul, porque também contém suas imperfeições,<br />
tampouco satanize o Norte, não reconhecen<strong>do</strong> suas virtudes. Mas<br />
saída que necessariamente seja capaz de recusar a hegemonia "nortista",<br />
integran<strong>do</strong> suas virtudes às virtudes <strong>do</strong> Sul, na recuperação <strong>do</strong> h<strong>um</strong>ano<br />
na h<strong>um</strong>anidade.<br />
há muita esperança no ar. De <strong>um</strong> la<strong>do</strong>, pelos flagrantes sinais de esgotamento<br />
<strong>do</strong> modelo reducionista. Sinais bem evidentes inclusive, na recente<br />
crise econômica, de 2008, engendrada no centro <strong>do</strong> capitalismo norteamericano<br />
e europeu, que está exigin<strong>do</strong> para sua saída <strong>um</strong>a nova ordem<br />
mundial, onde países <strong>do</strong> Sul, emergentes, ass<strong>um</strong>em <strong>um</strong> protagonismo até<br />
há pouco rejeita<strong>do</strong> pelo Norte. Por outro la<strong>do</strong>, sinais são emiti<strong>do</strong>s em direção<br />
à construção de <strong>um</strong> "<strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul". Indicações de <strong>um</strong> empenho<br />
pelo desenvolvimento, ten<strong>do</strong> <strong>com</strong>o alg<strong>um</strong>as de suas condicionantes a<br />
superação da miséria, a construção de oportunidades para os excluí<strong>do</strong>s,<br />
<strong>um</strong>a, ainda que inicial, condicionalidade e incorporação <strong>do</strong>s valores de<br />
sustentabilidade ambiental e social. Cresce essa consciência.
Aqui não posso deixar de fazer <strong>um</strong> registro, sublinhan<strong>do</strong> meu olhar oti-<br />
mista. Diz-se que a paixão não é boa <strong>com</strong>panheira da razão, mas seria<br />
absurda a ideia de que a razão existe sem emoção, sem paixão. Prefiro<br />
extrair de minha indignação a energia que o otimismo alimenta. que possa,<br />
de maneira fundada, despertar a necessária mobilização criativa para<br />
enfrentar os desafios coloca<strong>do</strong>s, que impeça <strong>um</strong>a catástrofe anunciada,<br />
nuclear ou ambiental, e retome o caminho da felicidade.<br />
A metáfora, genialmente recuperada por Bergman em seu filme o Ovo<br />
da serpente, muito se aplica neste momento. O ovo da serpente, quan<strong>do</strong><br />
coloca<strong>do</strong> contra a luz, permite visualizar a serpente, o monstro, em seu<br />
crescimento, ainda que não se possa percebê-la n<strong>um</strong> olhar externo, desprovi<strong>do</strong><br />
da luz. O cineasta utilizou essa metáfora para mostrar <strong>com</strong>o, após<br />
a Primeira guerra Mundial, engendrava-se na Alemanha, de maneira não<br />
perceptível, o monstro <strong>do</strong> nazismo, capaz de <strong>com</strong>eter as atrocidades que<br />
to<strong>do</strong>s vieram a conhecer.<br />
é possível olharmos este momento "contra a luz" e enxergarmos a catástrofe<br />
se avol<strong>um</strong>an<strong>do</strong> <strong>com</strong>o <strong>um</strong>a tsunami, mas, ao mesmo tempo, cresce<br />
<strong>um</strong>a consciência <strong>do</strong>s riscos, <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> liberta<strong>do</strong>r dessa hegemonia,<br />
crian<strong>do</strong> as bases de <strong>um</strong>a metamorfose liberta<strong>do</strong>ra, <strong>com</strong>o tantas vezes se<br />
sucedeu na história <strong>do</strong> homem. é possível ver a crise <strong>com</strong> otimismo, <strong>com</strong>o<br />
condição de sua superação.<br />
No Brasil, <strong>um</strong> operário é eleito presidente da República e é sucedi<strong>do</strong><br />
por <strong>um</strong>a mulher, algo que tem o reconhecimento mundial, da<strong>do</strong> o lugar<br />
secundário em que é colocada a mulher nos países <strong>do</strong> Sul. Não bastasse, a<br />
mulher em questão é ainda <strong>um</strong>a ex-guerrilheira, sobrevivente das lutas democráticas.<br />
há a vitória de Mandela, o programa verdade e Reconciliação,<br />
a construção de <strong>um</strong> novo caminho, derrotan<strong>do</strong> o apartheid e inscreven<strong>do</strong><br />
seu ideário no imaginário da cena mundial. há o Merco<strong>sul</strong>, a adesão de<br />
mais países da América <strong>do</strong> Sul, as pontes diplomáticas, culturais, sociais e<br />
econômicas em construção <strong>com</strong> a áfrica.<br />
Como se diz que no Brasil tu<strong>do</strong> acaba em futebol e samba, por que<br />
não falar da sequência de Copas <strong>do</strong> Mun<strong>do</strong> no Sul, áfrica <strong>do</strong> Sul (2010),<br />
Brasil (2014), Rússia (2018) e qatar (2022)? Sinais de <strong>um</strong> novo diálogo<br />
civilizatório?<br />
O Fór<strong>um</strong> Social Mundial, a miríade de movimentos sociais, colocan<strong>do</strong><br />
em alto som a exigência de <strong>um</strong> novo caminho, que coloque a paz, a fraternidade,<br />
a solidariedade, a harmonia <strong>com</strong> a biosfera no centro <strong>do</strong> desenvolvimento.<br />
A mobilização da opinião pública mundial, que, até pelo menos<br />
este momento em que escrevo estas linhas, sustou a execução da morte<br />
69
70<br />
por apedrejamento da iraniana Sakineh. A internet, o fenômeno das redes<br />
sociais (o Facebook <strong>com</strong> seus 500 milhões de participantes, o youtube)<br />
permitem que milhões de pessoas exerçam suas identidades, dialoguem<br />
<strong>com</strong> to<strong>do</strong>s, produzin<strong>do</strong> <strong>um</strong> "borbulhar" horizontaliza<strong>do</strong>, liberto de <strong>um</strong>a hegemonia<br />
centraliza<strong>do</strong>ra.<br />
Pensar globalmente e agir localmente é <strong>um</strong>a exigência, mas também<br />
o é pensar localmente e agir globalmente. Recentemente <strong>um</strong>a região de<br />
favelas no Rio de Janeiro, o Complexo <strong>do</strong> Alemão, onde, contan<strong>do</strong> <strong>com</strong> arre<strong>do</strong>res,<br />
vivem cerca de 400 mil pessoas, foi libertada por forças policiais<br />
e militares <strong>do</strong> controle territorial arma<strong>do</strong> <strong>do</strong> narcotráfico. <strong>um</strong> <strong>do</strong>mínio de<br />
décadas, onde o crime organiza<strong>do</strong> se tornou senhor da vida e da morte<br />
<strong>do</strong>s mora<strong>do</strong>res e construiu <strong>um</strong> bunker inexpugnável, de onde também partiam<br />
para impor o me<strong>do</strong> no conjunto da cidade. A favela e a cidade aplaudem,<br />
se regozijam, festejam a retomada que, para além da vitória militar,<br />
está <strong>com</strong>prometida <strong>com</strong> a inclusão social, econômica e cultural. Bom para<br />
a favela, bom para to<strong>do</strong>s.<br />
Celebremos <strong>com</strong> o zeca Pagodinho, sambista carioca:<br />
Deixa a vida me levar<br />
(vida leva eu)<br />
Deixa a vida me levar<br />
Sou feliz e agradeço<br />
Por tu<strong>do</strong> que Deus me deu...
72<br />
estARQue, teRezA<br />
MeNDONCA<br />
<strong>Psi</strong>cóloga, psicanalista <strong>do</strong> Círculo de <strong>Psi</strong>canálise <strong>do</strong> Rio de<br />
Janeiro. Doutora em Ciências Sociais pela PUC-SP, <strong>com</strong> Pós-<br />
Doutora<strong>do</strong> em Ciências Políticas pelo Instituto Universitário<br />
de Pesquisas <strong>do</strong> Rio de Janeiro (Iuperj). Coordena<strong>do</strong>ra <strong>do</strong><br />
Instituto de Estu<strong>do</strong>s da Complexidade (IEC). Autora de Homo<br />
Creator: ética e <strong>com</strong>plexidade na reprogramação da vida<br />
(2007) e de diversos artigos na interface <strong>Psi</strong>canálise e Cultura.<br />
Organiza<strong>do</strong>ra, <strong>com</strong> <strong>Edgar</strong>d de Assis Carvalho, de Ensaios de<br />
Complexidade 2 (2004).
contribuições<br />
"<strong>Para</strong> <strong>um</strong><br />
<strong>pensamento</strong><br />
<strong>do</strong> Sul"<br />
O <strong>pensamento</strong> de <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong> é para to<strong>do</strong>s. <strong>Para</strong> além <strong>do</strong> hermetismo<br />
<strong>do</strong>s pequenos círculos intelectuais, consegue conjugar a riqueza e<br />
a abrangência das questões abordadas, <strong>com</strong> clareza e simplicidade no<br />
tratamento da escrita. Economiza, para nós, o esforço de mapeamento,<br />
exposição <strong>do</strong>s fatores causais e des<strong>do</strong>bramentos das muitas crises contemporâneas.<br />
Com impressionante capacidade de síntese, apresenta-<br />
-nos a vivacidade de <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> em ação. Com essa inspiração,<br />
parto de <strong>um</strong> momento axial de seu escrito, quan<strong>do</strong> problematiza as<br />
muitas crises da atualidade: "todas essas crises desembocam na crise<br />
<strong>do</strong> desenvolvimento."<br />
Inegavelmente, <strong>com</strong>o re<strong>sul</strong>ta<strong>do</strong> da revolução industrial e <strong>do</strong> desenvolvimento<br />
da economia de merca<strong>do</strong>, colocou-se em marcha <strong>um</strong>a ação devasta<strong>do</strong>ra<br />
para os vínculos sociais. verdadeiros "moinhos satânicos", para<br />
mencionar karl Polanyi e sua atualidade. Essa força des<strong>com</strong>unal desarticula<br />
o laço entre as pessoas e enfraquece a identidade <strong>do</strong> homem <strong>com</strong><br />
a natureza. Como erva daninha, passou a parasitar as vidas h<strong>um</strong>anas. A<br />
partir <strong>do</strong> cálculo utilitário, da razão instr<strong>um</strong>ental e <strong>do</strong> preceito da máxima<br />
eficiência, expandiu-se e disseminou-se planetariamente.<br />
73
74<br />
O modelo <strong>do</strong> homo economicus defende que a otimização <strong>do</strong>s interesses<br />
individuais produz o máximo de bem-estar coletivo. Adam Smith ilustrou<br />
bem seu <strong>pensamento</strong> ao afirmar: "não é da benevolência <strong>do</strong> padeiro, <strong>do</strong><br />
açougueiro ou <strong>do</strong> cervejeiro que eu espero que saia o meu jantar, mas sim<br />
<strong>do</strong> empenho deles em promover seu ‘autointeresse’". Desembocamos aqui<br />
em <strong>um</strong>a questão crucial: a crença no princípio <strong>do</strong> interesse individualista<br />
<strong>com</strong>o principal móbil para a ação h<strong>um</strong>ana e <strong>com</strong>o base para a construção<br />
societária. Antes dele, Bernard Mandeville chocou o mun<strong>do</strong> intelectual ao<br />
afirmar que os vícios priva<strong>do</strong>s promovem a riqueza das nações. A crença<br />
no individualismo instaurou, segun<strong>do</strong> J. goudbout, <strong>um</strong>a teoria que goza<br />
de <strong>um</strong> "privilégio paradigmático" sobre as demais, dificultan<strong>do</strong> as possibilidades<br />
de interpretação <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> a partir de outros pontos de vista.<br />
Alguns anos antes da emergência e propagação da concepção individualista,<br />
em seu Trata<strong>do</strong> sobre a natureza h<strong>um</strong>ana, h<strong>um</strong>e formulou a ideia<br />
de que a simpatia seria, por excelência, o sentimento responsável pelo<br />
vínculo entre as pessoas. Mesmo Smith, considera<strong>do</strong> o pai <strong>do</strong> liberalismo,<br />
havia já escrito <strong>um</strong>a grande obra, de menor sucesso, onde desenvolveu<br />
sua teoria <strong>do</strong>s sentimentos morais, postulan<strong>do</strong> <strong>um</strong>a tendência natural <strong>do</strong><br />
h<strong>um</strong>ano para a simpatia. Frans de Waal vai além, estenden<strong>do</strong> a simpatia<br />
aos primatas e fazen<strong>do</strong> a ponte <strong>do</strong> símeo em nós. São os movimentos <strong>do</strong><br />
<strong>pensamento</strong> em suas alternâncias e dialogias.<br />
<strong>um</strong>a teoria <strong>com</strong>plexa da ação h<strong>um</strong>ana precisaria trabalhar para ultrapassar<br />
as clássicas dicotomias sociológicas. Homo economicus, homo <strong>do</strong>nator,<br />
homo ludens, homo creator e muitos outros, <strong>com</strong>põem esse mosaico<br />
multifaceta<strong>do</strong>.<br />
O acha<strong>do</strong> antropológico de Mauss, a tríplice obrigação (dar-receberretribuir),<br />
re<strong>sul</strong>tou em diferente <strong>com</strong>preensão sobre as trocas h<strong>um</strong>anas e<br />
inspirou o Mouvement Anti-utilitariste en Sciences Sociales (Mauss), que<br />
surgiu nos anos 1970 <strong>com</strong>o crítica profunda ao utilitarismo em geral e ao<br />
liberalismo em particular. O <strong>do</strong>m é <strong>um</strong> paradigma relacional, que afirma<br />
<strong>um</strong> sistema de obrigações <strong>com</strong>o base para o laço social. A tríade tece o<br />
vínculo a partir de relações <strong>com</strong>plexas de amor e ódio, guerra e paz. Ao<br />
contrário, o projeto <strong>do</strong> liberalismo visa libertar o homem de qualquer relação<br />
pessoal <strong>com</strong> o outro, <strong>com</strong> quem estabelece suas trocas. Essa liberdade<br />
funda-se na liquidação imediata da dívida. Se não há perspectiva de futuro<br />
para as relações, não estamos inseri<strong>do</strong>s n<strong>um</strong> sistema de obrigações.<br />
visl<strong>um</strong>bramos, aqui e ali, movimentos de resistência aos assaltos <strong>do</strong>s<br />
"moinhos satânicos". Dentre os de natureza prática, destaco Muhamad yunus<br />
e seu sonho de transformar a miséria em objeto de museu. A economia<br />
de <strong>com</strong>unhão, de Chiara Lubich. Sugata Mitra e sua aposta no autodida-
tismo e na busca de inclusão digital para crianças pobres. Amartya Sen<br />
e Mahbub ul haq, cria<strong>do</strong>res <strong>do</strong> índice de Desenvolvimento h<strong>um</strong>ano (IDh),<br />
apenas para citar alg<strong>um</strong>as experiências inova<strong>do</strong>ras.<br />
Ares de renovação incidem também na produção intelectual, incluin<strong>do</strong><br />
a dimensão <strong>do</strong> afeto na constituição <strong>do</strong>s atores sociais. Fazen<strong>do</strong> suplência<br />
ao <strong>pensamento</strong> de habermas, Axel honneth introduz a questão <strong>do</strong> amor<br />
primário, vivi<strong>do</strong> na relação mãe-bebê <strong>com</strong>o imprescindível forma de reconhecimento.<br />
Sobre essa base serão edifica<strong>do</strong>s <strong>do</strong>is outros patamares<br />
sociais de reconhecimento: a justiça e a solidariedade.<br />
Se vivemos <strong>um</strong> momento de muitas crises, podemos escolher enfrentá-<br />
-lo <strong>com</strong>o infortúnio ou <strong>com</strong>o oportunidade. Inscrevo-me entre os que veem<br />
as crises <strong>com</strong>o incríveis oportunidades de mudança e renovação de tu<strong>do</strong><br />
aquilo que se cristalizou e pleiteou eternização. Partilho <strong>um</strong>a <strong>com</strong>preensão<br />
da vida <strong>com</strong>o processo sempre inacaba<strong>do</strong>, onde o novo emerge incita<strong>do</strong><br />
pelas angústias <strong>do</strong> presente, pelas projeções futuras, mas também, e sempre,<br />
a partir das sombras <strong>do</strong> passa<strong>do</strong>.<br />
é ingênuo pensar que as transformações sociais que testemunhamos<br />
através da história impliquem extinção <strong>do</strong>s valores da tradição. Ao contrário,<br />
servimo-nos deles para operar as mudanças necessárias ao enfrentamento<br />
<strong>do</strong>s desafios contemporâneos. Chamarei de "paradigma da queda<br />
generalizada" à prevalência da difusão da "crença no esvaziamento".<br />
Segun<strong>do</strong> esse ponto de vista, a ausência de marca<strong>do</strong>res socioculturais,<br />
claramente postos <strong>com</strong>o nortes para a ação <strong>do</strong> indivíduo em sociedade,<br />
evidencia e promove <strong>um</strong>a desarticulação entre os governos de si e da pólis.<br />
Prenuncia-se, assim, <strong>um</strong>a catástrofe de dimensões incalculáveis.<br />
A adequação desses discursos à realidade revela-se frágil e pouco resistente<br />
a <strong>um</strong>a investigação mais acurada. O que essa vertente de <strong>pensamento</strong><br />
percebe e descreve é, em minha opinião, apenas <strong>um</strong>a parte <strong>do</strong>s<br />
processos de mudança expressos em seus aspectos mais espetaculares e<br />
por isso mesmo mais visíveis.<br />
Esse olhar incorre, portanto, no equívoco de tomar o to<strong>do</strong> pela parte<br />
mais evidente de <strong>um</strong>a realidade que, em geral, é sempre mais <strong>com</strong>plexa<br />
<strong>do</strong> que parece. Reduzida por esse prisma, pode tornar-se sombria e assusta<strong>do</strong>ra,<br />
converten<strong>do</strong>-se em profecia pessimista projetada sobre os ombros<br />
das novas gerações.<br />
Existe <strong>um</strong> fervilhante mutirão de pequenas ações sociais que opõem<br />
resistência às forças <strong>do</strong>minantes. Agin<strong>do</strong> subcutaneamente na restauração<br />
<strong>do</strong> teci<strong>do</strong> social, essas ações são invisíveis. E o invisível confunde-se<br />
<strong>com</strong> o inexistente. Nesse senti<strong>do</strong>, não pode ser ofereci<strong>do</strong> <strong>com</strong>o referência.<br />
75
76<br />
Não entra na contabilidade das ações válidas para <strong>um</strong>a metamorfose nas<br />
relações entre as pessoas e entre elas e seu ambiente. Ainda que se multipliquem<br />
e se propaguem subterraneamente, permanecem não reconhecidas<br />
e precisam de proteção.<br />
Defen<strong>do</strong> a premissa de que os processos de mudança não são engendra<strong>do</strong>s<br />
somente por aquilo que salta aos olhos. Existem movimentos mais<br />
sutis e, nem por isso, de menor operatividade transforma<strong>do</strong>ra. <strong>um</strong>a metamorfose<br />
<strong>do</strong>s cost<strong>um</strong>es pode estar em gestação con<strong>com</strong>itantemente a<br />
todas as quedas acontecidas e anunciadas, impulsionan<strong>do</strong>-nos na direção<br />
de <strong>um</strong>a sociedade mais justa e solidária.<br />
é fundamental que se coloque em foco e que se tente dar estatuto de<br />
existência aos movimentos sociais subjacentes que preparam a metamorfose.<br />
Como fazer isso? Retomo <strong>um</strong>a frase inesquecível que ouvi de <strong>Edgar</strong><br />
<strong>Morin</strong> em 1998, momento que coincidiu <strong>com</strong> o nascimento <strong>do</strong> IEC: "nós<br />
não somos poucos, nós somos muitos, nós só precisamos nos religar n<strong>um</strong>a<br />
grande rede."<br />
Tão ocupa<strong>do</strong>s estamos no labor cotidiano de nossas práticas, tão<br />
ocupa<strong>do</strong>s de nós mesmos, que negligenciamos a grande tarefa, aquela<br />
mesma que pode nos fortalecer na direção da mudança: a religação. Ela é,<br />
talvez, a única forma de trazermos à luz esse grande organismo h<strong>um</strong>ano<br />
que trabalha, incessantemente, pela preservação da vida. unin<strong>do</strong> seus vários<br />
pontos, <strong>com</strong>o estrelas de <strong>um</strong>a imensa constelação, sua forma poderá<br />
então se revelar e fazer frente ao tamanho da tarefa posta pelo desafio<br />
de construção <strong>do</strong> futuro. No caminho r<strong>um</strong>o a esse futuro incerto, o homo<br />
creator deve ser convida<strong>do</strong> a inventar, reviver e conjugar as inúmeras rotas<br />
de desenvolvimento que nos permitem coabitar o planeta, atenden<strong>do</strong> às<br />
necessidades básicas de todas as formas de vida existentes.
78<br />
FAlCI,<br />
NuRIMAR MARIA<br />
Bacharel e licenciada em Ciências Sociais (PUC-SP). Mes-<br />
tre em Literatura da Língua Portuguesa (USP). Doutora<strong>do</strong><br />
concluí<strong>do</strong>, mas ainda não apresenta<strong>do</strong> (USP), <strong>com</strong> a proposta<br />
de <strong>um</strong>a pesquisa interdisciplinar em <strong>um</strong> diálogo entre a<br />
Literatura, a História e a Antropologia. Bolsa-sanduíche para<br />
pesquisa de <strong>do</strong>utora<strong>do</strong> pelo CNPq na École dês Hautes Études<br />
en Sciences Sociales (EHESS), Paris, França (2001). Colóquio<br />
Internacional: Usages culturels du passe et construction<br />
identitaire dans les pays méditerranéens du XVI siècle a nos<br />
jours. Apresentação da <strong>com</strong>unicação: "Fronteiras <strong>do</strong> Mediterrâneo:<br />
culturas, memórias e identidades". Tunis, Tunísia;<br />
EHESS, Paris, França e Centre des Recherches Economiques et<br />
Sociales (2009). No SESC São Paulo foi coordena<strong>do</strong>ra da Área de<br />
Literaturas e reativou as Bibliotecas (1997-2007). Assistente da<br />
Gerência de Estu<strong>do</strong>s e Desenvolvimento SESC-SP (2008-2010).<br />
Atua na área de elaboração de textos e pesquisa em educação<br />
não formal. Atualmente é con<strong>sul</strong>tora para a área de Educação<br />
e Cultura e pesquisa<strong>do</strong>ra universitária. Colabora<strong>do</strong>ra de <strong>Edgar</strong><br />
<strong>Morin</strong> desde 1996 e agente literária para livros não edita<strong>do</strong>s.
contribuições<br />
"<strong>Para</strong> <strong>um</strong><br />
<strong>pensamento</strong> <strong>do</strong><br />
Sul"<br />
A partir <strong>do</strong> texto "<strong>Para</strong> <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul", <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong> nos convida<br />
a <strong>um</strong>a reflexão sobre fatos e questões cruciais que nos são apresenta<strong>do</strong>s<br />
na contemporaneidade — no âmbito mundial, regional e local — e a<br />
identificarmos prováveis caminhos para novos paradigmas <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong><br />
e das relações h<strong>um</strong>anas. Este encontro deverá servir <strong>com</strong>o embrião de<br />
ideias e ações que possibilitem a elaboração e a estruturação da proposta<br />
para <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul.<br />
A que Sul se refere <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong>? Ao geográfico, ao geopolítico, ao cultural,<br />
ao simbólico? Desde o início, nos defrontamos <strong>com</strong> o desafio da definição<br />
da noção de Sul. Se o definirmos geograficamente <strong>com</strong> relação<br />
ao Norte, nos damos conta da ambiguidade e da <strong>com</strong>plexidade de que<br />
essa noção é porta<strong>do</strong>ra. Tomemos o exemplo <strong>do</strong> Magrebe, forma<strong>do</strong> pelo<br />
Marrocos, pela Argélia e pela Tunísia, que é <strong>um</strong> Sul em relação à Europa,<br />
mas, ao mesmo tempo, é <strong>um</strong> Norte, <strong>um</strong>a vez que se localiza no norte da<br />
áfrica. A Itália, por sua vez, que é <strong>um</strong> país <strong>do</strong> <strong>sul</strong> da Europa, tem seu norte<br />
na região da Lombardia, cuja capital é Milão. A França, país <strong>do</strong> norte europeu,<br />
também tem o seu <strong>sul</strong>, o Midi, <strong>com</strong>o é conheci<strong>do</strong>, constituí<strong>do</strong> pela<br />
Provença e pelo Langue<strong>do</strong>c, <strong>com</strong> suas especificidades histórico-culturais<br />
e linguísticas. No Brasil, São Paulo, metrópole <strong>do</strong> <strong>sul</strong>, é muito influenciada<br />
79
80<br />
pelo norte, <strong>um</strong>a vez que recebe <strong>um</strong> grande afluxo de migrantes <strong>do</strong> norte<br />
e <strong>do</strong> Nordeste <strong>do</strong> país, sem mencionarmos o fato de que se trata de <strong>um</strong>a<br />
metrópole cosmopolita.<br />
A noção de Sul é, portanto, relativa e não deve ser reificada, ou definida<br />
<strong>com</strong>o realidade objetiva, ou substantivada. À noção de Norte não podemos<br />
aludir o senti<strong>do</strong> geográfico devi<strong>do</strong> a sua heterogeneidade. há alg<strong>um</strong>as<br />
décadas, o Norte era denomina<strong>do</strong> de Ocidente em oposição ao Oriente e,<br />
posteriormente, quan<strong>do</strong> o termo Terceiro Mun<strong>do</strong> caiu em desuso, o Norte<br />
tornou-se oposição de Sul. Oriunda <strong>do</strong> ocidente europeu e desenvolvida<br />
no mun<strong>do</strong> anglo-saxão, à cultura <strong>do</strong> Norte é atribuída a hegemonia <strong>do</strong><br />
desenvolvimento material, da técnica, <strong>do</strong> progresso, da economia, <strong>do</strong> cons<strong>um</strong>ismo,<br />
da rentabilidade, da racionalização.<br />
O <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Norte supervaloriza o <strong>pensamento</strong> redutor, hiperespecializa<strong>do</strong>,<br />
quantitativo e disjuntivo, incentiva exageradamente o cons<strong>um</strong>ismo,<br />
a unificação tecnoeconômica, a mundialização, o <strong>com</strong>prometimento<br />
e a homogeneização de aspectos socioculturais e da própria condição<br />
natural <strong>do</strong> planeta.<br />
No entanto, <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul deve ser consciente e crítico no<br />
tocante a essas noções, <strong>um</strong>a vez que a hegemonia <strong>do</strong> Norte se expande<br />
pelo mun<strong>do</strong>, e que, <strong>com</strong> a mundialização, tenta devorar o Sul. Por outro<br />
la<strong>do</strong>, não podemos desconsiderar a visão de que a cultura <strong>do</strong> Norte trouxe<br />
a democracia, os direitos h<strong>um</strong>anos, os direitos das mulheres.<br />
Existem vários "suis", uns diferentes <strong>do</strong>s outros, e que ao olhar <strong>do</strong> Norte<br />
são concebi<strong>do</strong>s unicamente <strong>com</strong>o sinônimo de atraso, de subdesenvolvimento,<br />
sob vários aspectos da necessidade de seu desenvolvimento econômico,<br />
tecnológico e de modernização.<br />
Essa visão <strong>do</strong> Norte não consegue conceber nos "suis" suas qualidades,<br />
virtudes, a riqueza nas diversidades culturais e no mo<strong>do</strong> de viver, na poesia<br />
e na tradição, nos mitos seculares; sua maior possibilidade de abertura<br />
ao conhecimento n<strong>um</strong> contexto abrangente, à rearticulação <strong>do</strong>s saberes<br />
<strong>com</strong>partimenta<strong>do</strong>s, à relação entre o h<strong>um</strong>ano e o mun<strong>do</strong> natural, ao meio<br />
ambiente, ao contexto global.<br />
Mas as diferentes culturas <strong>do</strong>s "suis" também são responsáveis pela<br />
manutenção de poderes políticos e religiosos autoritários, ditatoriais, da<br />
<strong>do</strong>minação <strong>do</strong> homem sobre a mulher e <strong>do</strong>s vários tipos de censura. Exemplos<br />
que podem ser en<strong>um</strong>era<strong>do</strong>s <strong>com</strong> as ditaduras militares ocorridas na<br />
América <strong>do</strong> Sul e Central, e em países <strong>do</strong> norte da áfrica, <strong>com</strong>o Tunísia,<br />
Argélia, Egito, Líbia e outros países <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> árabe e da áfrica Negra, Sudão,<br />
República <strong>do</strong> Congo, Costa <strong>do</strong> Marfim, Camarões, países que foram
durante séculos coloniza<strong>do</strong>s pelos europeus, nomeadamente os franceses,<br />
os belgas, os portugueses, os espanhóis, os italianos, entre outros.<br />
Assim, <strong>com</strong>o nos sugere <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong>, não devemos desvalorizar nem o<br />
<strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Norte nem o <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul. Toda cultura, toda civilização<br />
possui suas qualidades, suas virtudes, suas ilusões, suas deficiências.<br />
O <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul tem sua origem na história e na cultura <strong>do</strong> Mediterrâneo.<br />
Na tentativa de elaborar e de estruturar o <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul,<br />
torna-se imprescindível fazer <strong>um</strong>a trajetória em direção às nossas origens<br />
histórico-culturais, a partir dessa região, desse mar matricial, levan<strong>do</strong>-se<br />
em conta a ligação <strong>com</strong> o passa<strong>do</strong> para melhor <strong>com</strong>preensão <strong>do</strong> presente.<br />
O Mediterrâneo foi <strong>um</strong> espaço por onde, durante séculos, se cruzaram<br />
diversas culturas, etnias, religiões. zona de pluralidades, de raízes de diversas<br />
civilizações, de antagonismos, de conflitos, de criação e, ao mesmo<br />
tempo, de destruição, o Mediterrâneo foi campo de batalha de povos,<br />
nações, e centro de três grandes religiões: o cristianismo, o judaísmo e o<br />
islamismo.<br />
Na história e na cultura <strong>do</strong> Mediterrâneo se juntam três continentes:<br />
a Europa, a ásia e a áfrica, que se unem, no seu extremo <strong>sul</strong>, ao Oceano<br />
Atlântico. A região <strong>do</strong> Mediterrâneo teve importância fundamental para<br />
a história e para a cultura <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, por sua economia e <strong>com</strong>ércio, pela<br />
diversidade de povos que por lá passaram; <strong>um</strong>a região que foi palco da<br />
ascensão e da queda <strong>do</strong>s vários impérios.<br />
<strong>um</strong>a das contribuições <strong>do</strong> Mediterrâneo ao <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul poderia<br />
ser a reflexão sobre o senti<strong>do</strong> de <strong>um</strong>a divindade universal, herança antiga<br />
propagada pelo faraó Akhenaton através <strong>do</strong> Rei Sol. O Deus universal reaparece<br />
posteriormente na Bíblia, <strong>um</strong> só Deus. E nos Evangelhos, na figura<br />
de Cristo. Mas há também a diversidade concreta da natureza, expressa<br />
pelos múltiplos deuses <strong>do</strong> politeísmo grego e latino.<br />
Outra contribuição <strong>do</strong> Mediterrâneo ao <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul é a herança<br />
helênica, raízes clássicas universais da grécia, da qual se originou o <strong>pensamento</strong><br />
ocidental, a democracia e a filosofia, e a herança universalista<br />
<strong>do</strong> Império Romano, <strong>com</strong> a criação <strong>do</strong> Edito de Caracala, que ofereceu o<br />
direito de cidadania romana aos estrangeiros. A herança <strong>do</strong> Renascimento,<br />
no século xv, quan<strong>do</strong> o espírito <strong>com</strong>eça a problematizar a natureza, o<br />
mun<strong>do</strong>, a Terra, o homem, Deus, e que reconhece os valores h<strong>um</strong>anos de<br />
quem quer que seja e de onde seja (direito à diversidade).<br />
Na Idade Média e no Renascimento, o Mediterrâneo teve de aceitar a<br />
convivência de diferentes religiões e culturas: cristã, hebraica, católica, bi-<br />
81
82<br />
zantina, islâmica. Na realidade, no mun<strong>do</strong> contemporâneo, o <strong>pensamento</strong><br />
<strong>do</strong> Sul também se defrontaria <strong>com</strong> a problemática <strong>do</strong>s conflitos religiosos<br />
e étnicos.<br />
Pensar o Mediterrâneo é, ao mesmo tempo, pensar a unidade, as diversidades,<br />
as oposições e as contradições. <strong>Para</strong> <strong>com</strong>preendê-lo é necessário<br />
<strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> que não seja linear, que considere, ao mesmo tempo, a<br />
<strong>com</strong>plementaridade e os antagonismos, as <strong>com</strong>plexidades nos diversos<br />
senti<strong>do</strong>s, que religue e contextualize. Portanto, esses elementos <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong><br />
mediterrâneo servem de exercício para reflexão sobre <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong><br />
<strong>do</strong> Sul.<br />
O <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul não se submete a <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> linear, quantitativo,<br />
especializa<strong>do</strong>, <strong>com</strong>o ocorre no mun<strong>do</strong> contemporâneo, mas à necessidade<br />
de encontrar novos caminhos para novos paradigmas <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong><br />
e das relações h<strong>um</strong>anas. várias regiões <strong>do</strong> Sul ainda não foram<br />
invadidas pela visão de mun<strong>do</strong> fundada no cálculo, na técnica, na rentabilidade.<br />
Na cultura <strong>do</strong> Sul existem relações mais próximas de solidariedade,<br />
hospitalidade, festas tradicionais, poesia da vida. é <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> que<br />
restaura o concreto, a subjetividade h<strong>um</strong>ana e a afetividade, a existência,<br />
a poesia da vida, a singularidade individual e cultural e, ao mesmo tempo,<br />
restaura o contexto global fundamental.<br />
<strong>Para</strong> a reflexão sobre o <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul a partir das noções relativas<br />
de Norte e Sul e da discussão <strong>do</strong> papel <strong>do</strong> Mediterrâneo na contemporaneidade,<br />
achamos pertinente tecer alg<strong>um</strong>as considerações no âmbito histórico-cultural.<br />
Em <strong>um</strong> momento, debates e discussões entre países que <strong>com</strong>põem<br />
o Mediterrâneo, dentre eles o Magrebe (Marrocos, Argélia e Tunísia),<br />
localiza<strong>do</strong> na região <strong>do</strong> norte da áfrica, entre o Mar Mediterrâneo, o Saara,<br />
o Oceano Atlântico e o Egito, tentam redefinir seu papel dentro <strong>do</strong> bloco<br />
mediterrâneo após a descolonização europeia. Essas discussões refletem a<br />
insustentável <strong>com</strong>plexidade <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> contemporâneo, das relações h<strong>um</strong>anas,<br />
<strong>um</strong>a vez que esses países <strong>do</strong> Magrebe sentem-se discrimina<strong>do</strong>s pelos<br />
países europeus que fazem parte <strong>do</strong> Mediterrâneo, levan<strong>do</strong>-se em conta a<br />
questão cultural e religiosa <strong>do</strong>s países árabes, <strong>do</strong>s berberes.<br />
Toman<strong>do</strong> a Itália <strong>com</strong>o outro exemplo de reflexão para o <strong>pensamento</strong><br />
<strong>do</strong> Sul, a região <strong>do</strong> <strong>sul</strong> <strong>do</strong> país, denominada o mezzogiorno, e que na antiguidade<br />
<strong>com</strong>punha a Magna Grécia, local onde surgiu a Escola Eleática, de<br />
Parmênides, zenão de Eleia e de tantos outros pensa<strong>do</strong>res que deram forma<br />
ao <strong>pensamento</strong>, que se tornaria o próprio destino <strong>do</strong> Ocidente, também<br />
sofre, na contemporaneidade, a discriminação <strong>do</strong> norte <strong>do</strong> próprio<br />
país, industrializa<strong>do</strong> e tecnologicamente mais desenvolvi<strong>do</strong>, economicamente<br />
mais rico.
Como último exemplo, tomemos São Paulo, considerada a maior me-<br />
trópole da América <strong>do</strong> Sul. é <strong>um</strong>a cidade formada por vários imigrantes e<br />
migrantes, de maioria nordestina, que ajudaram a construir esse gigante<br />
centro urbano e que sofrem discriminações e exclusões de diferentes aspectos,<br />
reflexo das ambiguidades e contradições da sociedade e <strong>do</strong> mun<strong>do</strong><br />
contemporâneo.<br />
O <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul está apto a afrontar os grandes desafios da vida,<br />
a insustentável <strong>com</strong>plexidade <strong>do</strong> nosso mun<strong>do</strong>, <strong>do</strong> planeta Terra, que não<br />
está conseguin<strong>do</strong> tratar <strong>do</strong>s seus problemas vitais. O <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul<br />
deve tentar restaurar a solidariedade, os princípios e as noções de hospitalidade,<br />
na atualidade <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> contemporâneo, na qual presenciamos<br />
grandes deslocamentos e os movimentos imigratórios e migratórios pelas<br />
diversas partes <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, <strong>com</strong> as violências e conflitos que deles advêm.<br />
é preciso tentar restaurar a fraternidade, no senti<strong>do</strong> da aceitação das diferenças<br />
religiosas e étnicas, que devem ser superadas e restauradas, é preciso,<br />
enfim, ter esperança e acreditar na probabilidade de transformar o<br />
mun<strong>do</strong> n<strong>um</strong> lugar que respeita as diversidades, denomina<strong>do</strong> Terra-pátria.<br />
Concluin<strong>do</strong>, o <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul deve propor <strong>um</strong>a nova política de<br />
civilização que esteja a serviço <strong>do</strong> bem-estar <strong>do</strong>s indivíduos, da sociedade<br />
e <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, e que não esteja apenas ligada aos valores materiais e ao<br />
cons<strong>um</strong>o desenfrea<strong>do</strong>.<br />
<strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong> afirma que a reforma da política, a reforma <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong>,<br />
a reforma da sociedade, a reforma da vida são necessidades interrelacionadas.<br />
O destino da h<strong>um</strong>anidade, o destino da biosfera, o destino<br />
da civilização estão liga<strong>do</strong>s e o planeta Terra está agonizan<strong>do</strong>. "Renunciar<br />
ao melhor <strong>do</strong>s mun<strong>do</strong>s não é renunciar a <strong>um</strong> mun<strong>do</strong> melhor."<br />
83
84<br />
GAlVANI, pAsCAl<br />
Después de una ruptura escolar y una autoformación intercul-<br />
tural cerca de las filosofías de oriente y de culturas indígenas<br />
de América, Galvani trabajó 15 años <strong>com</strong>o anima<strong>do</strong>r y forma<strong>do</strong>r<br />
en movimientos de formación permanente centra<strong>do</strong>s<br />
sobre una aproximación emancipa<strong>do</strong>ra. A partir de 1986 él<br />
colabora con Gaston Pineau y Georges Lerbet en la universidad<br />
de Tours (Francia) y desarrolla investigación sobre la autoformación<br />
en una perspectiva <strong>com</strong>pleja y reflexiva, inspirada de<br />
la obra de <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong>. Su experiencia de animación de varios<br />
programas de investigación-acción sobre temáticas <strong>com</strong>o pobreza,<br />
diálogo intercultural y de transdisciplinariedad, le permitió<br />
afinar un méto<strong>do</strong> dialógica, intercultural y transdisciplinar<br />
de cruzamiento de los saberes práctico-experienciales, de los<br />
saberes poético-existenciales y de los saberes teóricos. Desde<br />
2001 es profesor e investiga<strong>do</strong>r en la Universidad de Quebec.
eligar la<br />
experiencia del<br />
Sur y el Sur de la<br />
experiencia, un<br />
méto<strong>do</strong> alternativo<br />
de investigaciónacción-formación<br />
Como lo expresa fuertemente <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong>, el Sur no es una noción geo-<br />
gráfica sino una noción alternativa a la hegemonía de la mundialización<br />
del "Norte", que es "la hegemonía de la técnica, de la economía, del cálculo,<br />
de la racionalización, de la rentabilidad, de la eficacia" (MORIN, 2010).<br />
Así, en los países del "Sur", <strong>com</strong>o en los del "Norte", encontramos fuerzas<br />
de <strong>do</strong>minación hegemónica de la lógica de reducción de la realidad a lo<br />
cuantitativo. Recíprocamente, encontramos en los países del "Norte" <strong>com</strong>o<br />
en los del "Sur", experiencias creativas que exploran vías alternativas para<br />
una reforma de vida. Durante la conferencia de Fortaleza sobre los siete<br />
saberes, gaston Pineau proponía retener un octavo saber del h<strong>um</strong>or y de<br />
la alegría de vivir, bautiza<strong>do</strong> <strong>com</strong>o el "alegre saber" (PINEAu, 2010). Este<br />
"alegre saber" está en el corazón de lo cotidiano de nuestras experiencias<br />
creativas emergentes. yo llamo a estos momentos, los kaïros de la "vida viviente",<br />
palabras de Dostoïevski. Los kaïros son los instantes decisivos, los<br />
momentos oportunos, <strong>do</strong>nde las dimensiones teórica, práctica y poética de<br />
la vida entran en relación significante. <strong>Para</strong> vivir en este mun<strong>do</strong> to<strong>do</strong>s nosotros<br />
inventamos alternativas de senti<strong>do</strong> frente al no senti<strong>do</strong> de la carrera<br />
hegemónica hacia el abismo. ¿qué es lo que va bien? ¿qué es lo que se<br />
inventa en las experiencias del Sur y en el Sur de la experiencia?<br />
85
86<br />
Las experiencias alternativas son todavía embrionarias, germinan a escala<br />
local en las transformaciones de prácticas individuales y colectivas<br />
cotidianas. ¿Cómo explorar, concientizar, valorizar estas experiencias alternativas<br />
que se desarrollan al nivel local e inter-individual? ¿Cómo permitir<br />
a los actores formalizar los saberes teóricos, prácticos y poéticos que<br />
son produci<strong>do</strong>s en estas experiencias? Los méto<strong>do</strong>s tradicionales de formación<br />
e investigación, basa<strong>do</strong>s en la ruptura del sujeto y del objeto, y la<br />
exclusión de saberes naci<strong>do</strong>s de la experiencia vivida, tienden a hacer invisibles<br />
y mudas las experiencias de vías alternativas para una reforma de<br />
la vida. <strong>Para</strong> concientizar las experiencias embrionarias de vías alternativas,<br />
es fundamental transformar los méto<strong>do</strong>s de formación e investigación<br />
que están en todas partes (tanto en el Norte <strong>com</strong>o en el Sur) constituidas<br />
sobre el paradigma reduccionista de la disyunción de los saberes teóricos<br />
y de los saberes de experiencias vividas. Así, podemos decir que el "alegre<br />
saber" de la vida y de la experiencia está siempre en riesgo ser oculta<strong>do</strong><br />
por la hegemonía de los saberes disciplina<strong>do</strong>s, ya formaliza<strong>do</strong>s. Estos saberes<br />
de experiencia son el "Sur" del conocimiento, siempre oculta<strong>do</strong> por<br />
una visión reductora de la formación.<br />
querríamos presentar los elementos clave de un proceso reflexivo y<br />
dialógico de investigación-acción-formación, ampliamente inspira<strong>do</strong> por<br />
la obra de <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong> y experimenta<strong>do</strong> en diferentes programas realiza<strong>do</strong>s<br />
en Francia (gALvANI, 2006), en quebec en diálogo intercultural con las<br />
culturas amerindias (gALvANI, 2011), y en México con el centro universitario<br />
Arkos (ESPINOSA MARTíNEz, 2010; gALvANI, 2008).<br />
Los siete saberes necesarios para la educación propuestos por <strong>Edgar</strong><br />
<strong>Morin</strong> plantean un desafío fundamental a la formación de los forma<strong>do</strong>res<br />
y de los profesores. ¿Cómo operar el paso de una educación basada en la<br />
disyunción del saber y de la vida a una formación basada en la interdependencia<br />
<strong>com</strong>pleja entre el sujeto cognoscente y los diferentes saberes<br />
teóricos, prácticos y existenciales? Nos hace falta una "<strong>do</strong>ble revolución<br />
del aprendizaje" (MORIN; MOTTA; CIuRANA, 2003), "que se autonomiza<br />
de la enseñanza y que se religa al bucle autopoiético de los seres vivientes"<br />
(PINEAu, 2010). La reforma del pensamiento implica una reforma de la<br />
educación que implica una reforma del pensamiento. ¿Cómo formar a los<br />
forma<strong>do</strong>res y quién puede formarlos? hacemos la hipótesis de que este<br />
bucle <strong>com</strong>plejo puede ser trabaja<strong>do</strong> de manera reflexiva. una formación<br />
en la <strong>com</strong>plejidad debe ser en sí misma una experiencia de la <strong>com</strong>plejidad.<br />
El pensamiento <strong>com</strong>plejo implica la auto-referencia y la co-construcción<br />
sistémica de los saberes. Implica la reflexividad colaborativa de los que se<br />
forman para religar y transformar, dinámicamente, la práctica y la teoría.<br />
La revolución paradigmática propuesta por los siete saberes para la<br />
educación, supone una triple revolución:<br />
a) una revolución epistemológica del paradigma de las ciencias aplicadas<br />
al paradigma reflexivo de la <strong>com</strong>plejidad. Concebir el aprendizaje
<strong>com</strong>o una construction auto-eco-organiza<strong>do</strong>ra del sujeto en interacción<br />
con el medio físico y social.<br />
b) una revolución práctica: de la enseñanza al a<strong>com</strong>pañamiento del<br />
aprendizaje. Pasar de la transmisión de conteni<strong>do</strong>s al a<strong>com</strong>pañamiento de<br />
un proceso de aprendizaje por la producción de saber que articula investigación-acción-formación.<br />
c) una revolución ética de la educación a la reciprocidad en co-formación.<br />
Religar los saberes académicos con los saberes de la vida práctica y<br />
poética por la reflexión sobre la experiencia vivida.<br />
<strong>Para</strong> desarrollar esta cuestión podemos presentar las estrategias de un<br />
méto<strong>do</strong> <strong>com</strong>plejo, reflexivo y dialógico de investigación-acción-formación-transdisciplinar.<br />
El pensamiento <strong>com</strong>plejo no es una formulación cerrada, sino un camino.<br />
Es un méto<strong>do</strong> para aprender a reconocer que lo concreto mismo es lo<br />
<strong>com</strong>plejo. Lo <strong>com</strong>plejo, es decir, "lo que está teji<strong>do</strong>", es lo concreto de las interdependencias<br />
dialógicas en transformación permanente que constituyen<br />
la vida viviente. Toda vida es, desde su origen, <strong>com</strong>pleja y transdisciplinar.<br />
Formarse en la <strong>com</strong>plejidad es aprender a reconocer las interdependencias,<br />
las retroacciones y las recursividades que hacen la trama de nuestras vidas. Interdependencias<br />
generalizadas que nos tejen, de <strong>do</strong>nde emergemos en nuestros<br />
actos, nuestros <strong>diálogos</strong>, nuestros símbolos. Formarse en la <strong>com</strong>plejidad<br />
es sobrepasar los saberes que reducen la realidad a la materialidad concreta<br />
de objetos aisla<strong>do</strong>s en identidades excluyentes. Formarse en la <strong>com</strong>plejidad es<br />
aprender a reconocer, más allá de lo concreto material, este otro concreto de<br />
la interacción generalizada de los fenómenos. Formarse en la <strong>com</strong>plejidad es<br />
operar el reflejo de esta realidad dialógica concreta en nuestras vidas vividas.<br />
Nuestras vidas, nuestras experiencias, nuestras prácticas, son tejidas<br />
en esta realidad <strong>com</strong>pleja y transdisciplinaria. Formarse en la <strong>com</strong>plejidad<br />
podría ser primero desaprender y disolver el saber reductor de las identificaciones.<br />
Formarse en la transdisciplinariedad es aprender a reconocer<br />
los diferentes niveles de realidad prácticos y teóricos, pero también sutiles<br />
de la vida poética. Formarse en la <strong>com</strong>plejidad es aprender a reconocer<br />
lo concreto del principio dialógico de autonomía /dependencia en las interacciones<br />
entre el sí (autos), otro (socio) y el cosmos (eco).<br />
El pensamiento <strong>com</strong>plejo nos hace <strong>com</strong>prender el aprendizaje <strong>com</strong>o<br />
proceso de auto-co-eco-formación permanente. Debemos pues construir<br />
estrategias para a<strong>com</strong>pañar el co-aprendizaje ponien<strong>do</strong> en diálogo el saber<br />
disciplinario con el saber no disciplinario de la experiencia vivida. No<br />
podemos enseñar la <strong>com</strong>plejidad, pero podemos ayudarnos mutuamente<br />
a reconocerla en un co-aprendizaje permanente en diálogo con la vida vi-<br />
87
88<br />
vida. <strong>Para</strong> explorar las creaciones alternativas y desarrollar un pensamiento<br />
a partir del Sur nos hacen falta estrategias de exploración ternarias que<br />
abran el reconocimiento del tercero-inclui<strong>do</strong> y las mediaciones.<br />
A<strong>com</strong>pañar el auto-eco-formación es abrir espacios reflexivos y dialógicos<br />
de auto-co-eco-formación:<br />
a) Formarse (auto-formación);<br />
b) Por la investigación sobre la experiencia vivida (reflexión);<br />
c) En diálogo con los otros saberes (co-formación);<br />
d) Relacionan<strong>do</strong> los diferentes niveles de realidad: teórico, práctico,<br />
existencial, poético.<br />
<strong>Para</strong> esto, sugerimos una estrategia epistemológica ternaria de formación<br />
que relaciona la explicación, la <strong>com</strong>prensión y la acción. La explicación,<br />
es por supuesto disponer de herramientas intelectuales teóricas que<br />
permiten el análisis abstracto, a distancia. La <strong>com</strong>prensión es concientizar<br />
el punto de vista del sujeto. La acción es siempre volver a la experiencia<br />
vivida de los fenómenos en la interacción concreta.<br />
Aprender a contextualizar los saberes, es aprender a concientizar y criticar<br />
sus propias teorías implícitas por la producción de su propio saber en<br />
diálogo con los otros. una estrategia ternaria de méto<strong>do</strong> consiste en reemplazar:<br />
el pilotaje de la enseñanza por el cons<strong>um</strong>o de saber, por el pilotaje<br />
de la formación por la producción de saber (ChARTIER; LERBET, 1993). Se<br />
trata de religar la formación, la investigación y la acción construyen<strong>do</strong> formaciones<br />
por la investigación sobre la acción (DESROChE, 1990).<br />
En el taller de investigación-acción-transdisciplinar, la contextualización<br />
y la relación circular del to<strong>do</strong> y las partes es introducida por el mismo méto<strong>do</strong><br />
que se apoya sobre la reflexión dialogada, a propósito de problemáticas<br />
sociales y ecológicas vividas por los participantes.<br />
A<strong>com</strong>pañar el aprendizaje de la condición h<strong>um</strong>ana consiste en reintroducir<br />
el sujeto cognoscente en su conocimiento, por un proceso reflexivo y<br />
dialógico, inscrito en el triángulo de la vida (D’AMBROSIO, 2007). Construir<br />
el aprendizaje <strong>com</strong>o el diálogo entre el sí, los otros y el mun<strong>do</strong>, es relacionar<br />
la subjetivación, la socialización y la ecologización.<br />
Frente a las fuerzas destructoras del cuatrimotor de la mundialización<br />
económica, las prácticas individuales de reforma de la vida parecen a<br />
menu<strong>do</strong> muy débiles. Las alternativas se multiplican fuera de los caminos<br />
trilla<strong>do</strong>s, fuera de las universidades y centros de formación. Aquí la práctica,<br />
<strong>com</strong>o a menu<strong>do</strong> sucede, adelanta la teoría. <strong>Para</strong> reforzar las estrategias<br />
para la vida y las condiciones de la emergencia de una sociedad-mun<strong>do</strong><br />
(MORIN; MOTTA; CIuRANA, 2003), la educación y la formación deben sostener<br />
las experiencias alternativas, permitién<strong>do</strong>les reflejarse, nombrarse y<br />
teorizarse. una ingeniería reflexiva y dialógica de exploración de las experiencias<br />
alternativas puede permitir concientizar los saberes emergentes.
REFERÊNCIAS<br />
ChARTIER, D.; LERBET, g. La formation par production de savoir. Paris: L’Harmattan,<br />
1993.<br />
D’AMBROSIO, u. Concimiento y valores h<strong>um</strong>anos. Visión Docente Con-Ciencia,<br />
Puerto Vallarta, v. 7, n. 35, p. 6-18, marzo/abr. 2007.<br />
DESROChE, h. Apprentissage 3 entreprendre d’apprendre: d’une autobiographie<br />
raisonnée aux projets d’une recherche-action. Paris: Éditions Ouvrières, 1990.<br />
DOSTOÏEvSkI. L’A<strong>do</strong>lescent. Paris: Gallimard, 1956.<br />
ESPINOSA MARTINEz, A. C. Estrategias meto<strong>do</strong>lógicas para operacionalizar la<br />
práctica educativa transdisciplinaria, en conjunto con los actores universitarios,<br />
en las licenciaturas del Centro de Estudios Universitarios Arkos de Puerto Vallarta.<br />
San Jose Costa Rica: universidad Estatal a Distancia, 2010.<br />
ESPINOSA MARTINEz, A. C. Transdisciplinariedad, <strong>com</strong>plejidad, currículo e innovaciones<br />
: el caso del Centro de Estudios universitarios Arkos de México. Académica<br />
Gaudeamus, Costa Rica, v. 2, n. 1, p. 19-39, 2010.<br />
gALvANI, P. Autoformation mondialogante et exploration de l’écoformation. Éducation<br />
Permanente: ingenierie de la rencontre interculturelle: dispositifs et médiations<br />
en formation et autoformation, 2011.<br />
gALvANI, P. L’Exploration des moments d’autoformation: prise de conscience et<br />
<strong>com</strong>préhension dialogique. Éducation Permanente: autoformation actualité et<br />
perspectives, n. 168, p. 59-73, 2006.<br />
gALvANI, P. Transdisciplinarité et écologisation d’une formation universitaire: une<br />
pratique critique à partir du paradigme de la <strong>com</strong>plexité. Éducation Relative à<br />
l’Environnement, n. 7, p. 133-158, 2008.<br />
MORIN, E. Pour une pensée du sud. 2010. Mimeografa<strong>do</strong>.<br />
MORIN, E. ; MOTTA, R. ; CIuRANA, E. Éduquer pour l’ère planétaire: la pensée <strong>com</strong>plexe<br />
<strong>com</strong>me méthode d’apprentissage dans l’erreur et l’incertitude h<strong>um</strong>aine.<br />
Paris: Balland, 2003.<br />
PINEAu, g. Experiencias de vida y formación enseñante: religar los saberes. Trabalho<br />
apresenta<strong>do</strong> na Conferencia Internacional sobre Los siete saberes para una<br />
educacion del presente, Fortaleza, 2010.<br />
89
90<br />
GAMeRO, teResA<br />
sAlINAs<br />
Directora ejecutiva del Instituto Peruano de Pensamiento<br />
Complejo <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong> y del Centro Regional de Competencias<br />
en Educación para el Desarrollo Sostenible (CRC) Lima-Callao,<br />
asocia<strong>do</strong> a la Universidad de las Naciones Unidas.
temas<br />
centrales que<br />
inspiran el<br />
pensamiento<br />
del Sur<br />
Desde mi perspectiva, el pensamiento del Sur plantea<strong>do</strong> por <strong>Morin</strong> se<br />
inspira principalmente en los siguientes temas centrales:<br />
a) La acción depreda<strong>do</strong>ra del hombre sobre la naturaleza que pone en<br />
peligro las posibilidades de vida en el planeta;<br />
b) El fracaso, la ceguera cognitiva y las ilusiones de la ideología del progreso<br />
de la civilización occidental;<br />
c) El Proyecto Occidental que pretende, <strong>com</strong>o afirma <strong>Morin</strong>, "la unificación<br />
abstracta que homogeniza y destruye las diversidades", pauperizan<strong>do</strong><br />
la vida en el planeta;<br />
d) El sufrimiento de la h<strong>um</strong>anidad en los diversos "sures" y el hecho contundente<br />
de que "nuestro sistema Tierra está condena<strong>do</strong> a la muerte o a la<br />
metamorfosis". Por eso nos insta a buscar las vías para la metamorfosis del<br />
Norte y del Sur. "Esta sería la misión grandiosa y universal del pensamiento<br />
del Sur", sentencia <strong>Morin</strong>.<br />
EXPERIENCIAS INNOVADORAS QUE SE EJECUTARON O ESTÁN EN<br />
CURSO E ILUSTRAN EL PENSAMIENTO O LAS IDENTIDADES DEL SUR<br />
En el Perú, desde el plano teórico y epistemológico, José Carlos Mariátegui<br />
es considera<strong>do</strong> el pensa<strong>do</strong>r que mejor supo abordar la realidad del<br />
91
92<br />
Perú y América Latina, tal <strong>com</strong>o lo hizo Marx en su época, con una visión y<br />
originalidad sorprendentes, aún vigentes.<br />
Según Aníbal quijano, el lega<strong>do</strong> principal de Mariátegui consiste en su<br />
esfuerzo por construir una racionalidad alternativa a la racionalidad occidental.<br />
En tal senti<strong>do</strong>, esta propuesta epistemológica y teórica vuelve<br />
ahora al primer plano del debate, abierto, con la crisis de la modernidad.<br />
Mariátegui, descubre la originalidad histórica de Latinoamérica, la que no<br />
puede entenderse solamente en función de la experiencia europea, ni de la<br />
perspectiva eurocéntrica <strong>do</strong>minante en el marxismo de la época.<br />
él tratará de elaborar una racionalidad integra<strong>do</strong>ra de fuentes heterogéneas<br />
dentro de su historicidad. De allí podemos entender que uno de los<br />
problemas básicos que confronta la crítica revolucionaria de la sociedad es<br />
el problema del indio y, vincula<strong>do</strong> con este, el problema de nación.<br />
Es pertinente mencionar aquí su decisiva influencia en la superación de<br />
la visión reduccionista que tuvo el movimiento indigenista peruano en un<br />
primer momento, para pasar a una visión más armoniza<strong>do</strong>ra, constructiva<br />
y libera<strong>do</strong>ra, <strong>com</strong>o se verifica en la obra del escritor José María Arguedas,<br />
quien reconoce que fue leyen<strong>do</strong> a Mariátegui <strong>com</strong>o encontró una <strong>com</strong>prensión<br />
de las cosas, pero sin matar en él "lo mágico". Arguedas reivindicó las<br />
manifestaciones espirituales y culturales del mun<strong>do</strong> andino, este año se<br />
celebra el centenario de su nacimiento.<br />
Otro de los aportes originales al pensamiento desde el Sur es el del sociólogo<br />
Aníbal quijano, quien abre el debate sobre la crisis de América Latina<br />
con su propuesta referida a la colonialidad del poder que la modernidad<br />
establece desde el siglo xvI. Desde entonces, América y la modernidad son<br />
partes de una misma historia. Mientras que la modernidad se desarrolla en<br />
Europa, en América se establece un patrón de poder colonial que ejercerá<br />
la explotación y <strong>do</strong>minación en todas las esferas de la existencia social: el<br />
trabajo, el sexo, la autoridad pública, la intersubjetividad y la naturaleza.<br />
Por otro la<strong>do</strong>, a partir de media<strong>do</strong>s del siglo xx se acelera la migración<br />
masiva del campo a la ciudad y al proceso intercultural, producién<strong>do</strong>se<br />
al mismo tiempo estudios sobre el rol de la cultura andina realiza<strong>do</strong>s por:<br />
Alberto Flores galin<strong>do</strong>, José Matos Mar, hugo Neira, Manuel Burga, Juan Ossio,<br />
Wilfre<strong>do</strong> kapsoli, Rodrigo Montoya, Antonio Peña, hugo Pereyra, Carlos<br />
Milla, Javier Lajo, entre otros.<br />
En el ámbito de la recuperación de las cosmovisiones y prácticas andino-amazónicas,<br />
gerar<strong>do</strong> Ramos, en su obra Una visión alternativa del Perú,<br />
estableció factores claves que diferencian la cultura occidental y la cultura<br />
andina; estas cruciales diferencias hacen inviable en el mun<strong>do</strong> andino el<br />
Proyecto Occidental, solo que la ceguera cognitiva y los intereses de poder<br />
persisten en homogeneizarlos. Ramos sostiene: "En Europa los ecosistemas<br />
son muy homogéneos, su geomorfología de grandes planicies, climas defi-
ni<strong>do</strong>s (poco varia<strong>do</strong>s). En el mun<strong>do</strong> andino, los ecosistemas son heterogéneos<br />
la geomorfología de altas montañas muy accidentada, el clima muy<br />
varia<strong>do</strong> (80% de los climas del mun<strong>do</strong>)". Estos factores, entre otros, habrían<br />
determina<strong>do</strong> una cosmovisión diferente en la cultura andina.<br />
Asimismo, cabe destacar la labor que realiza Jorge Ishizawa, investiga<strong>do</strong>r<br />
del Proyecto Andino de Tecnologías Campesinas (Pratec) y del Instituto<br />
Peruano de Pensamiento Complejo <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong> (IPCEM), quien convive con<br />
la población de las <strong>com</strong>unidades andino-amazónicas a fin de conocer y<br />
aprehender las prácticas cotidianas del buen vivir. El Pratec ha produci<strong>do</strong><br />
cerca de 3.000 cuadernillos con sus experiencias de recuperación de las<br />
prácticas de la cultura Andino/Amazónica.<br />
En el ámbito de la organización social, tenemos las <strong>com</strong>unidades andinas<br />
y amazónicas que luchan por la defensa de sus identidades y derechos<br />
colectivos, tales <strong>com</strong>o: la Asociación Interétnica de Desarrollo de la Selva<br />
Peruana (Aidesep), la Comisión Nacional de Comunidades Afectadas por<br />
la Minería (Conacami), la Coordina<strong>do</strong>ra de Organizaciones Indígenas de la<br />
Cuenca Amazónica, entre otras. y en los últimos años se ha incentiva<strong>do</strong> y<br />
está emergien<strong>do</strong> la necesidad de afirmar las identidades locales y el rescate<br />
de la relación armónica y afectiva con la naturaleza, tradición milenaria<br />
de los habitantes de estas tierras.<br />
En junio de 2003, en el sur del Perú, el pueblo arequipeño se opuso masivamente<br />
a la venta del agua a las transnacionales. En junio de 2009, las<br />
<strong>com</strong>unidades amazónicas de Bagua lograron que el gobierno derogue los<br />
Decretos Ley que favorecían la venta del territorio amazónico. También se<br />
suscitaron conflictos en Tambogrande, yanacocha, Cerro verde, entre muchos<br />
otros lugares del territorio peruano. A pesar de to<strong>do</strong> ello, en el Perú no<br />
hay una acción política clara y transparente de apoyo y revaloración de las<br />
<strong>com</strong>unidades andino-amazónicas, <strong>com</strong>o se están dan<strong>do</strong> en Bolivia y Ecua<strong>do</strong>r.<br />
La época de cambios que vivimos ha origina<strong>do</strong> una revolución en la<br />
cosmovisión del mun<strong>do</strong> y la construcción de conocimientos y saberes. Estos,<br />
requieren de la articulación de la filosofía, la ciencia, la tecnología y la<br />
sociedad. Contribuyen en este proceso la práctica del pensamiento <strong>com</strong>plejo,<br />
las ciencias de la <strong>com</strong>plejidad, la bioética global y la transdisciplinaridad,<br />
entre otras.<br />
El Instituto Peruano de Pensamiento Complejo <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong> se fundó con<br />
la finalidad de contribuir a crear espacios democráticos <strong>do</strong>nde puedan participar<br />
la ciudadanía y tome consciencia del pensamiento positivista, reductor<br />
y disyuntivo que destruye la vida en el planeta. <strong>Para</strong> tal fin, hemos<br />
defini<strong>do</strong>s tres ejes estratégicos: socialización, investigación y formación<br />
para promover el desarrollo h<strong>um</strong>ano sostenible desde el sur.<br />
93
94<br />
Nos hemos constitui<strong>do</strong> recientemente en el Centro Regional de Competencias<br />
en Educación para el Desarrollo Sostenible de Lima-Callao, asocia<strong>do</strong><br />
a la universidad de las Naciones unidas, con el objetivo de impulsar<br />
un movimiento por un pensamiento <strong>com</strong>plejo del Sur desde las prácticas<br />
sociales. También estamos asocia<strong>do</strong>s a proyectos del Ministerio de Educación,<br />
para la inclusión del pensamiento <strong>com</strong>plejo en las prácticas educativas,<br />
al Comité de Medicina Tradicional y Transdisciplinaria del Colegio<br />
Médico del Perú, quienes se encuentran trabajan<strong>do</strong> para lograr el reconocimiento<br />
de la medicina ancestral de las diversas culturas del mun<strong>do</strong>, a la<br />
Red de Proyectos Alfa de la unión Europea a través del proyecto Mejora<br />
de la pertinencia de la educación de las Ingenierías en las Universidades de<br />
Latinoamérica, <strong>do</strong>nde estamos proponien<strong>do</strong> un enfoque holístico, no lineal<br />
y trandisciplinar que incluya a los saberes ancestrales. Estamos pues, tratan<strong>do</strong><br />
de participar en las Redes locales y globales que estén interesadas<br />
en los enfoques de la <strong>com</strong>plejidad y la transdisciplinariedad. En estas redes<br />
se encuentran involucradas instituciones pares en Brasil, Bolivia, Cuba, España,<br />
México, Francia, Canadá, Colombia y Argentina.<br />
HACIA UNA POLÍTICA DE CIVILIZACIÓN DESDE UNA MIRADA DEL SUR<br />
Podemos concluir con lo siguiente: se hace necesario desarrollar una racionalidad<br />
alternativa a la racionalidad instr<strong>um</strong>ental en crisis de la modernidad<br />
capitalista, asimilan<strong>do</strong> los aportes del Pensamiento Complejo y las<br />
Ciencias de la Complejidad, para lograr una nueva visión y <strong>com</strong>prensión del<br />
mun<strong>do</strong>; asimismo propiciar un dialogo entre civilizaciones, en la dimensión<br />
política, ética, educativa, social, económica que permita construir un escenario<br />
viable para el planeta. Este objetivo propiciaría conocer las diversas<br />
racionalidades que existen en las diferentes culturas del Sur y del Norte, a<br />
fin de valorar y recobectar todas aquellas que están <strong>com</strong>prometidas con<br />
la defensa y sostenibilidad de la vida. En el mismo senti<strong>do</strong> debemos construir<br />
una agenda que permita el encuentro y el debate entre los diferentes<br />
Sures, para levantar una plataforma para su discusión y ejecución a nivel<br />
global. Crear y/o consolidar un movimiento que sea sostenible y articule<br />
instituciones, personalidades del mun<strong>do</strong> académico, así <strong>com</strong>o ciudadanos<br />
<strong>com</strong>prometi<strong>do</strong>s con las reformas que propone <strong>Morin</strong> para propiciar la metamorfosis<br />
de la h<strong>um</strong>anidad. Finalmente, la necesidad de impulsar el desarrollo<br />
de un pensamiento ético global <strong>com</strong>o requisito para la superación<br />
de la pobreza espiritual, cultural y material que hace inviable la vida en el<br />
planeta. En la misma línea es importante construir una educación integral,<br />
no-lineal y transdisciplinaria en la población, especialmente en la juventud,<br />
que permita la emergencia de una nueva civilización descolonizada, <strong>do</strong>nde<br />
la reciprocidad, la solidaridad y el amor hagan posible un mun<strong>do</strong> mejor.
96<br />
IRVING, MARtA De<br />
AzeVeDO<br />
Professora e pesquisa<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> Programa Eicos, INCT/PPED/UFRJ<br />
e Instituto Nacional da Ciência e Tecnologia em Políticas Públicas<br />
e Estratégias de Desenvolvimento. Áreas de atuação: Desenvolvimento,<br />
Governança e Conservação da Biodiversidade.
inspirações<br />
<strong>do</strong> Sul para<br />
<strong>um</strong>a nova<br />
política de<br />
civilização<br />
QUAIS OS TEMAS CENTRAIS QUE INSPIRAM O PENSAMENTO DO SUL?<br />
O <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul reflete identidades e especificidades de diversos<br />
"suis", construí<strong>do</strong>s e ressignifica<strong>do</strong>s a partir de suas origens, histórias, cosmologias,<br />
saberes ancestrais e interações <strong>com</strong> os diversos "nortes" e "ocidentes",<br />
relativiza<strong>do</strong>s a partir de referenciais inexatos e ideologicamente<br />
estabeleci<strong>do</strong>s.<br />
O <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong>s "suis" re<strong>sul</strong>ta, assim, de <strong>um</strong>a construção histórica,<br />
fundamentada em valores endógenos, transmuta<strong>do</strong>s e retransforma<strong>do</strong>s a<br />
partir de valores e lógicas exógenos, mas subjetividades que não perderam<br />
as impressões digitais e que, talvez, por essa razão, constituam-se, na<br />
atual crise civilizacional, em potencialidades de inovação e metamorfose.<br />
<strong>Para</strong> <strong>Morin</strong>, o que não se transforma tende a se degradar. E o Sul, representa<strong>do</strong><br />
pelos seus inúmeros significa<strong>do</strong>s, transforma-se pelo exercício de<br />
confronto permanente <strong>com</strong> as incertezas, em contraposição às certezas<br />
da modernidade; <strong>com</strong> a naturalidade das crises, em resistência à ilusão da<br />
arrogância <strong>do</strong> <strong>do</strong>mínio <strong>do</strong> homem sobre o próprio homem e sobre a natureza,<br />
re<strong>sul</strong>tante da glorificação da racionalidade científica, da ciência e<br />
da técnica; e <strong>com</strong> a solidariedade, <strong>com</strong>o alternativa possível para a sobrevivência<br />
e consolidação <strong>do</strong>s laços sociais, em antagonismo à apologia <strong>do</strong><br />
97
98<br />
individualismo <strong>com</strong>o sinônimo de liberdade. Assim, o Sul, em suas inúmeras<br />
representações, busca caminhos para <strong>um</strong>a reforma de civilização que<br />
transcenda os seus próprios limites para alcançar o passa<strong>do</strong> no presente,<br />
o presente no futuro. <strong>um</strong> futuro que se constrói em novas bases éticas, na<br />
relação entre indivíduos, destes, em sociedade, e das sociedades, <strong>com</strong> a<br />
noção de <strong>com</strong>unidade de destino, em escala planetária.<br />
vivemos a insistência vazia e reducionista <strong>do</strong> que parece ter resta<strong>do</strong><br />
de <strong>um</strong> confronto histórico e perverso entre o "Norte" e o "Sul" e<br />
reproduzimos, incessantemente, em nossas reflexões, <strong>pensamento</strong>s e<br />
ações que nos ancoram no passa<strong>do</strong> e nos dificultam avançar r<strong>um</strong>o ao<br />
futuro, na busca de <strong>um</strong>a nova política de civilização, baseada em novos<br />
valores de cidadania global. Nesse percurso, a ciência e a técnica permitiram<br />
avanços e mo<strong>do</strong>s de funcionamento das sociedades h<strong>um</strong>anas<br />
nunca antes imagina<strong>do</strong>s. Com a modernidade e os saltos de conhecimento<br />
proporciona<strong>do</strong>s pela ciência, o ser h<strong>um</strong>ano passou a visl<strong>um</strong>brar<br />
outra escala para o universo e para sua própria existência e mergulhou<br />
também na crença de que tu<strong>do</strong> estava sob controle. <strong>um</strong>a sociedade<br />
de controle, de conhecimento sofistica<strong>do</strong> e altamente especializa<strong>do</strong>,<br />
de velocidade supersônica. Mas, talvez, nessa "viagem" da arrogância<br />
<strong>do</strong> h<strong>um</strong>anismo "des<strong>um</strong>aniza<strong>do</strong>", que transformou a vida em códigos e<br />
corridas cegas, o ser h<strong>um</strong>ano tenha também se afasta<strong>do</strong> de sua própria<br />
essência, de outras formas de existir e entender o mun<strong>do</strong>. E talvez, exatamente<br />
por não ter pretendi<strong>do</strong> ou alcança<strong>do</strong> os padrões e os mo<strong>do</strong>s de<br />
existência <strong>do</strong> Norte, o Sul (ou os "suis") vem resistin<strong>do</strong> em suas peculiaridades,<br />
identidades e valores, hoje ressignifica<strong>do</strong>s em possibilidades<br />
reais de transformação, de inovação, de metamorfose.<br />
O Sul materializa essa possibilidade real de transformação, a partir<br />
de novas formas de diálogo e interação <strong>com</strong> os valores ocidentaliza<strong>do</strong>s<br />
e cristaliza<strong>do</strong>s de <strong>um</strong> Norte em crise profunda. Isto porque,<br />
na hegemonia histórica e nas certezas viscerais <strong>do</strong> Norte, nos "suis"<br />
se construiu <strong>um</strong>a visão de mun<strong>do</strong> alimentada de incertezas, de crises<br />
permanentes, que, por sua vez, exigiram novas soluções e percursos<br />
e a construção de <strong>um</strong>a perspectiva "identitária" de integração entre<br />
o Norte e o Sul, em <strong>um</strong> "cal<strong>do</strong> de cultura" desconheci<strong>do</strong> e, também<br />
por essa razão, promissor. é nessa "matriz" de incertezas e inovação<br />
que tendem a se configurar os <strong>pensamento</strong>s <strong>do</strong> Sul e é também nesse<br />
contexto de autoafirmação para o futuro que o Sul busca dialogar <strong>com</strong><br />
o planeta. E, dessa forma, to<strong>do</strong>s os temas da contemporaneidade se<br />
transmutam em novos significa<strong>do</strong>s, em reflexões de contracultura, em<br />
"transgressões" criativas. Nas incertezas, na desconstrução de mitos<br />
historicamente consolida<strong>do</strong>s pelos valores ocidentaliza<strong>do</strong>s <strong>do</strong> Norte e<br />
nas transformações criativas se constrói, assim, o <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul,<br />
entre a prosa e a poesia.
QUAIS AS EXPERIÊNCIAS INOVADORAS IMPLEMENTADAS, E/OU EM<br />
CURSO, QUE ILUSTRAM O PENSAMENTO E/OU AS IDENTIDADES DO<br />
SUL?<br />
São inúmeros os caminhos da inovação e da ruptura <strong>do</strong>s paradigmas<br />
convencionais <strong>do</strong> desenvolvimento nos "suis" <strong>do</strong> Norte, no Mediterrâneo, na<br />
áfrica e na América Latina. Evidentemente que não se pretende esgotar<br />
<strong>um</strong> tema tão vasto em <strong>um</strong> ensaio circunscrito a alg<strong>um</strong>as páginas. Mas alguns<br />
caminhos ilustram possibilidades reais de transformação.<br />
A Rio-92 trouxe para o Sul o convite a se repensar, criticamente, a noção<br />
de desenvolvimento. E, no Sul, as inúmeras "tribos globais", criativamente<br />
e genuinamente, se manifestaram e impuseram <strong>um</strong>a nova forma<br />
de se "negociar" o futuro <strong>do</strong> planeta, pensan<strong>do</strong> a natureza em sua relação<br />
direta <strong>com</strong> a sociedade.<br />
O Fór<strong>um</strong> Social Mundial surgiu e se consoli<strong>do</strong>u no Sul e pelo Sul, <strong>com</strong><br />
a parceria <strong>do</strong> resto <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>. Essa rede global, pulsante e eticamente<br />
conectada, trouxe à cena principal <strong>um</strong>a nova espécie de vibração e<br />
crítica aos valores hegemônicos de <strong>um</strong> Norte que também quer despertar<br />
para <strong>um</strong> novo re<strong>com</strong>eço. O Fór<strong>um</strong> Social Mundial e seus des<strong>do</strong>bramentos<br />
ilustraram de maneira exemplar <strong>um</strong>a nova forma de articulação<br />
global para além <strong>do</strong>s pressupostos convencionais da mundialização ou<br />
da globalização. E, nesse processo, a sociedade civil buscou alianças,<br />
quebrou barreiras antes intransponíveis e partiu para <strong>um</strong>a perspectiva<br />
inova<strong>do</strong>ra, não mais da crítica pela crítica, mas da crítica pela ação<br />
transforma<strong>do</strong>ra.<br />
Como re<strong>sul</strong>ta<strong>do</strong> de Esta<strong>do</strong>s enfraqueci<strong>do</strong>s, a sociedade passou, assim,<br />
a ass<strong>um</strong>ir o protagonismo da história nos países <strong>do</strong> Sul e, nessa<br />
dinâmica, importantes experiências se afirmam no processo de transformação<br />
de valores e construção de cidadania. Assim, são n<strong>um</strong>erosas<br />
as experiências de projetos sociais inova<strong>do</strong>res na América Latina e em<br />
to<strong>do</strong>s os países da região.<br />
No Brasil, de norte a <strong>sul</strong>, a partir <strong>do</strong> resgate <strong>do</strong>s valores tradicionais e<br />
das "identidades perdidas ou subjugadas", se afirma <strong>um</strong> novo país. Em<br />
muitas cidades, vários projetos envolven<strong>do</strong> parcerias das mais diversas,<br />
transformam localidades aban<strong>do</strong>nadas e massacradas pela miséria e degradação<br />
social em "territórios de cidadania", nos quais o resgate da<br />
autoestima alimenta <strong>um</strong> novo cotidiano e a esperança de futuro. No meio<br />
rural, novas lideranças enfrentam <strong>um</strong> passa<strong>do</strong> de poder consolida<strong>do</strong> e<br />
inventam formas criativas de organização, geração de emprego e renda<br />
e inserção social e mudam, efetivamente, suas histórias de vida.<br />
As identidades culturais e a história são ressignificadas e revalorizadas<br />
também pelo olhar das minorias excluídas, <strong>com</strong> naturalidade, <strong>com</strong>o ilustra<strong>do</strong><br />
pelo resgate e afirmação <strong>do</strong>s valores ancestrais pelas populações tra-<br />
99
100<br />
dicionais, antes marginalizadas em toda a América Latina. E isso se traduz<br />
também em poder. As primeiras mulheres são eleitas democraticamente<br />
presidentes em países que, historicamente, se construíram <strong>com</strong> base em<br />
valores masculinos.<br />
A academia, gradativamente, passa a internalizar o seu papel social e a<br />
valorizar os saberes tradicionais na geração de conhecimento. Rompe-se<br />
também, progressivamente, o mito da disciplinaridade incrustada <strong>com</strong>o<br />
afirmação de poder e, nas fraturas <strong>do</strong> sistema, a inovação tecnológica é<br />
construída <strong>com</strong> base na interdisciplinaridade e na ousadia <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong><br />
<strong>com</strong>plexo. E, de maneira inédita, avalia-se o desempenho acadêmico <strong>com</strong><br />
base em critérios de contribuição social e solidariedade.<br />
Na gestão pública, inicia-se o percurso ainda tími<strong>do</strong> da transversalidade<br />
na ação governamental e os pactos sociais passam a orientar o processo<br />
de decisão política, em <strong>um</strong> confronto corajoso e democrático, <strong>com</strong><br />
inúmeros conflitos de interesse, progressivamente explicita<strong>do</strong>s e apoia<strong>do</strong>s<br />
por <strong>um</strong>a mídia que se afirma na construção de informação qualificada.<br />
E, na perspectiva de desenvolvimento <strong>do</strong>s países <strong>do</strong> Sul, há o resgate na<br />
crença <strong>do</strong> elo perdi<strong>do</strong> pela modernidade, entre a natureza h<strong>um</strong>ana e a h<strong>um</strong>anidade<br />
naturalizada. Resgata-se a percepção da noção de Terra-pátria,<br />
na perspectiva de <strong>com</strong>unidade de destino.<br />
Evidentemente que não se pode romancear a realidade <strong>do</strong> Sul, submetida<br />
à memória de regimes ditatoriais des<strong>um</strong>anos, "eficiências questionáveis<br />
e atrasos" pelos parâmetros <strong>do</strong> Norte, contextos corrompi<strong>do</strong>s e nem sempre<br />
politicamente sãos, e passivos sociais ainda ilimita<strong>do</strong>s. Mas não é mais possível<br />
duvidar que é nesse cenário pulsante de crises permanentes e incertezas<br />
que poderão emergir reflexões para <strong>um</strong>a nova política de civilização.<br />
QUAIS AS QUESTÕES PRIORITÁRIAS A SEREM TRATADAS PELO OLHAR<br />
DO SUL NA DIREÇÃO DE UMA POLÍTICA DE CIVILIZAÇÃO?<br />
a) A reforma da Educação: não se pode mais insistir em <strong>um</strong>a visão <strong>com</strong>partimentada<br />
<strong>do</strong> mun<strong>do</strong> nem imaginar <strong>um</strong> processo educacional apenas<br />
centra<strong>do</strong> em <strong>um</strong> <strong>com</strong>promisso de qualidade técnica e operacional, desvincula<strong>do</strong><br />
de <strong>um</strong>a perspectiva crítica e de <strong>um</strong>a discussão ética profunda. A<br />
proposta <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>com</strong>plexo e a educação para a cidadania global<br />
e planetária constituem pressupostos fundamentais a ser incorpora<strong>do</strong>s.<br />
Mas o processo educativo precisa também avançar em <strong>um</strong>a perspectiva<br />
crítica, baseada na reflexão filosófica e na formação dirigida à solidariedade<br />
e à cidadania planetária.<br />
b) O <strong>com</strong>bate permanente à pobreza e às desigualdades sociais: <strong>um</strong>a das<br />
metas <strong>do</strong> milênio propostas pela ONu, o <strong>com</strong>bate à pobreza, associa<strong>do</strong> ao<br />
<strong>com</strong>promisso de vida digna para as populações h<strong>um</strong>anas, deveria se constituir<br />
em proposta prioritária para essa nova política de civilização. Mas, para
isso, seria fundamental entender que o <strong>com</strong>bate à pobreza não se efetiva a<br />
partir de medidas assistencialistas e de curto prazo, mas que implica também<br />
<strong>um</strong>a reforma <strong>do</strong> mo<strong>do</strong> de vida das sociedades contemporâneas, basea<strong>do</strong><br />
na produção permanente de desejos que não podem ser satisfeitos e na<br />
substituição da noção de ser h<strong>um</strong>ano pelo senti<strong>do</strong> <strong>do</strong> "ter h<strong>um</strong>ano". As sociedades<br />
contemporâneas tornaram-se reféns de si mesmas, ao acreditar na<br />
arrogância <strong>do</strong> h<strong>um</strong>anismo e na ilusão de que os abismos entre ricos e pobres<br />
não teriam consequências.<br />
c) A reforma <strong>do</strong> mo<strong>do</strong> de vida: não se pode mais imaginar <strong>um</strong>a sociedade<br />
planetária cujos padrões de vida e cons<strong>um</strong>o não são capazes de admitir os limites<br />
<strong>do</strong> próprio planeta. O excesso <strong>do</strong> cons<strong>um</strong>o e as escolhas individuais de<br />
alguns re<strong>sul</strong>tam, obrigatoriamente, na escassez e na deterioração <strong>do</strong>s mo<strong>do</strong>s<br />
de existir de outros. é possível tecnologicamente gerar e consolidar padrões<br />
mais sustentáveis e solidários de vida, em harmonia <strong>com</strong> os limites <strong>do</strong> próprio<br />
planeta e <strong>com</strong> as exigências de vida digna para a sociedade. Esse é <strong>um</strong><br />
pressuposto central de <strong>um</strong>a nova civilização.<br />
d) A revisão <strong>do</strong>s padrões de governança global: em <strong>um</strong> mun<strong>do</strong> globaliza<strong>do</strong><br />
e conecta<strong>do</strong> em que to<strong>do</strong>s influenciam to<strong>do</strong>s, em tempo real, e novas lideranças<br />
e valores se impõem em contraste às hegemonias historicamente<br />
consolidadas no Norte, não se admite mais a insistência desse mo<strong>do</strong> de<br />
governabilidade centra<strong>do</strong> nos mesmos poderes, <strong>com</strong>o se o mun<strong>do</strong> permanecesse<br />
o mesmo e novas configurações globais fossem inexistentes. é<br />
fundamental que novas formas de governança global sejam inventadas e<br />
construídas, <strong>com</strong> base na perspectiva de <strong>com</strong>unidade de destino. Como é<br />
fundamental o resgate e a valorização das bases culturais, cosmologias e<br />
ancestralidades que delineiam as identidades múltiplas <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> globaliza<strong>do</strong>,<br />
não apenas <strong>com</strong>o forma de resistência e afirmação, mas <strong>com</strong>o <strong>um</strong>a<br />
via possível para o resgate da própria existência h<strong>um</strong>ana e a geração de<br />
<strong>um</strong> conhecimento centra<strong>do</strong> não apenas na racionalidade científica linear,<br />
mas em <strong>um</strong>a <strong>com</strong>preensão integrada e integral <strong>do</strong> ser h<strong>um</strong>ano no universo.<br />
A ressignificação da natureza <strong>com</strong>o valor intrínseco, essencial ao equilíbrio<br />
planetário, ao bem-estar da sociedade h<strong>um</strong>ana e ao resgate de seus<br />
valores essenciais, desqualifica<strong>do</strong>s pela ditadura da racionalidade científica,<br />
frequentemente des<strong>um</strong>anizante. é fundamental também a busca por<br />
propostas de desenvolvimento que privilegiem a economia solidária, a valorização<br />
da proximidade, a agregação de valor aos mo<strong>do</strong>s de vida locais<br />
e às formas de produção sustentáveis, baseadas em energia limpa, nos<br />
princípios de ecoeficiência e na geração de produtos e serviços capazes<br />
de gerar <strong>um</strong>a nova forma de funcionamento da sociedade e não apenas a<br />
mercantilização da natureza para atender a voracidade <strong>do</strong> merca<strong>do</strong>.<br />
Enfim, <strong>com</strong>o discute <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong>, é necessária a integração da prosa<br />
e da poesia, da razão e da emoção, em <strong>um</strong> mun<strong>do</strong> em processo permanente<br />
de criação e recriação e, portanto, em metamorfose.<br />
101
102<br />
Gerente de Cultura <strong>do</strong> Departamento Nacional <strong>do</strong> SESC DN,<br />
professora da Universidade Cândi<strong>do</strong> Mendes e membro da<br />
diretoria da Escola Oga Mitá-RJ. Mestre em Educação (UERJ),<br />
Arquiteta (UFRJ), Pedagoga (INSTB), Arte-Educa<strong>do</strong>ra e <strong>Psi</strong>copedagoga<br />
(CEPERJ). Foi diretora de Tecnologia Educacional da<br />
TV Educativa, Rede Brasil (1995/ 98), coordena<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> projeto<br />
Salto para o Futuro, TV Escola ( 1991/94) e diretora da Escola<br />
de Professores - RJ (1995/98).
alg<strong>um</strong>as<br />
reflexões<br />
sobre o<br />
<strong>pensamento</strong><br />
<strong>do</strong> Sul<br />
QUAIS OS TEMAS CENTRAIS QUE INSPIRAM O PENSAMENTO DO SUL?<br />
O <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul ocupa o lugar simbólico <strong>do</strong>s povos coloniza<strong>do</strong>s,<br />
dependentes, considera<strong>do</strong>s de segunda categoria, substituin<strong>do</strong> conceitos<br />
<strong>com</strong>o Terceiro Mun<strong>do</strong> ou países subdesenvolvi<strong>do</strong>s. O Sul não se define<br />
em <strong>um</strong> espaço estritamente geográfico, não pode ser reifica<strong>do</strong>, até<br />
porque nele existem lugares mais Sul <strong>do</strong> que outros, em função de suas<br />
diferenças em relação às sociedades <strong>do</strong> Norte, capitalistas, urbanas, ocidentais<br />
e prioritariamente brancas.<br />
Ao longo da história oficial, o Norte sempre é quem define o que é<br />
melhor para o Sul, <strong>com</strong> sua hegemonia política e econômica, impon<strong>do</strong><br />
modelos culturais e referências sociais, independentemente da diversidade<br />
<strong>do</strong>s povos e nações <strong>do</strong> planeta.<br />
Falar em globalização é tratar dessas relações de <strong>do</strong>minação, <strong>do</strong> processo<br />
de colonização, que não são somente nem exclusivamente geográficas,<br />
agravadas especialmente no século xx, <strong>com</strong> o desenvolvimento das novas<br />
tecnologias nos campos da produção, cons<strong>um</strong>o e <strong>com</strong>unicação h<strong>um</strong>anos.<br />
Dessa forma, o <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul precisa ser construí<strong>do</strong> pelo próprio Sul,<br />
por mais que sejam bem intenciona<strong>do</strong>s intelectuais e filósofos <strong>do</strong> Norte.<br />
103
104<br />
Claro que é preciso haver diálogo constante, <strong>um</strong>a relação dialógica<br />
entre os <strong>do</strong>is polos, e ainda procurar o <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Leste, <strong>do</strong> Oes-<br />
te, <strong>do</strong> Sudeste, <strong>do</strong> Su<strong>do</strong>este, manten<strong>do</strong> a metáfora <strong>do</strong>s pontos cardeais.<br />
Com isso, ultrapassamos as dicotomias que acabam polarizan<strong>do</strong> e empobrecen<strong>do</strong><br />
a <strong>com</strong>plexidade <strong>do</strong>s diversos mo<strong>do</strong>s de pensar, de fazer e<br />
de ser, a partir de olhares superiores, superficiais e hegemônicos, por<br />
melhores que sejam as intenções.<br />
Boaventura de Souza Santos, em A crítica da razão in<strong>do</strong>lente: contra<br />
o desperdício da experiência (2000), propõe a construção de <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong><br />
de fronteira e de <strong>um</strong>a política da tradução, no senti<strong>do</strong> de que<br />
nunca seremos o Outro. No máximo, para que o diálogo seja realmente<br />
possível, entre iguais, é preciso construir <strong>um</strong>a linguagem <strong>com</strong><strong>um</strong>, entenden<strong>do</strong><br />
que estaremos em <strong>um</strong> território que não é o nosso, e por isso<br />
a h<strong>um</strong>ildade e o estranhamento tornam-se condições necessárias para<br />
<strong>um</strong>a <strong>com</strong>unicação respeitosa.<br />
No texto "<strong>Para</strong> <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul", <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong> sugere que "temos<br />
que ass<strong>um</strong>ir a herança cultural <strong>do</strong> Renascimento, porque hoje devemos<br />
problematizar o mun<strong>do</strong>". Outra proposição importante para <strong>um</strong> (e<br />
não o) <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul: questionar conceitos <strong>do</strong>minantes, valores e<br />
mesmo objetos construí<strong>do</strong>s; questionar a própria forma de questionar, a<br />
própria hegemonia da razão, os processos epistemológicos da modernidade,<br />
já que sabemos hoje existirem várias racionalidades, vários mo<strong>do</strong>s<br />
"certos" de agir e pensar; várias realidades.<br />
O autor propõe "misturar essas heranças culturais mediterrâneas <strong>com</strong><br />
as heranças culturais africanas e <strong>sul</strong>-americanas". Consideramos, entretanto,<br />
que o desafio ainda é maior <strong>do</strong> que fazer a mistura, até porque<br />
ela já existe. Somos frutos de <strong>um</strong>a miscelânea cultural e o que importa é<br />
descobrirmo-nos <strong>com</strong>o tal, para respeitarmos todas as origens, a nossa<br />
relação <strong>com</strong> a natureza e <strong>com</strong> o cosmo.<br />
Resta-nos ultrapassar a dicotomia <strong>do</strong> bem e <strong>do</strong> mal, <strong>do</strong> certo e <strong>do</strong><br />
erra<strong>do</strong>, entender que a razão il<strong>um</strong>inista trouxe luz, ciência, tecnologia,<br />
mas também trouxe a escuridão, as guerras, o <strong>pensamento</strong> unificante,<br />
homogeneizante, que destrói as singularidades.<br />
Por fim, <strong>Morin</strong> afirma que o "<strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul deveria estar apto<br />
para enfrentar as <strong>com</strong>plexidades de nossa vida, a <strong>com</strong>plexidade das realidades<br />
h<strong>um</strong>anas e da ‘insustentável <strong>com</strong>plexidade <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>'." Sem<br />
dúvida, esse é o grande desafio, mas não só <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul, acredito<br />
que também <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Norte, e, assim, pode ser possível<br />
restaurar a esperança no improvável, sempre possível.
QUAIS AS EXPERIÊNCIAS INOVADORAS IMPLEMENTADAS E/OU<br />
EM CURSO QUE ILUSTRAM O PENSAMENTO E/OU AS IDENTIDADES<br />
DO SUL?<br />
<strong>um</strong> exemplo paradigmático: as edições <strong>do</strong> Fór<strong>um</strong> Mundial Social vêm<br />
se consolidan<strong>do</strong> <strong>com</strong>o espaços/tempos privilegia<strong>do</strong>s para a construção<br />
e troca de experiências inova<strong>do</strong>ras, nos quais novos <strong>pensamento</strong>s são<br />
elabora<strong>do</strong>s por muitos diferentes; consegue-se pensar em <strong>um</strong> outro mun<strong>do</strong><br />
possível, onde a justiça, a qualidade de vida e a felicidade de to<strong>do</strong>s<br />
sejam prioridade; e onde as diferenças sejam condição de existência.<br />
O Norte passou a ouvir as vozes <strong>do</strong>s povos das florestas, das populações<br />
indígenas, das mulheres. vários países conseguem se destacar por<br />
suas práticas e experiências inova<strong>do</strong>ras, derruban<strong>do</strong> velhos preconceitos<br />
e impon<strong>do</strong> novas formas de fazer. Desde ações pontuais, que acontecem<br />
em pequenas cidades, em escolas, projetos <strong>com</strong>unitários, até eleições<br />
presidenciais surpreendentes. Do <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul, exemplificamos<br />
<strong>com</strong> o Brasil, que conseguiu eleger <strong>um</strong> metalúrgico, <strong>com</strong> sucesso absoluto<br />
de público após oito anos de poder, e, depois, <strong>um</strong>a mulher, que foi<br />
torturada nos anos de ch<strong>um</strong>bo da ditadura. Do Norte, o melhor exemplo<br />
é <strong>um</strong> negro <strong>com</strong>o presidente de <strong>um</strong> país poderoso, que carrega na sua<br />
história marcas des<strong>um</strong>anas de preconceito étnico.<br />
QUAIS AS QUESTÕES PRIORITÁRIAS A SEREM TRATADAS PELO OLHAR<br />
DO SUL NA DIREÇÃO DE UMA POLÍTICA DE CIVILIZAÇÃO?<br />
As questões prioritárias a serem tratadas pelo olhar <strong>do</strong> Sul na direção<br />
de <strong>um</strong>a política de civilização precisam ser construídas pelo Sul e não<br />
traçadas a priori.<br />
Considerar que "os suis" têm <strong>um</strong> poder e <strong>um</strong> saber próprios é a condição<br />
primeira para que o diálogo entre iguais possa ser estabeleci<strong>do</strong>.<br />
Iguais que são sempre muito diferentes. Segunda condição para <strong>um</strong>a<br />
política de civilização: é preciso querer a diferença mais <strong>do</strong> que apenas<br />
tolerá-la ou identificá-la.<br />
Por último, é preciso questionar e relativizar o conceito de "civilização".<br />
O processo civilizatório precisa garantir condições de desenvolvimento,<br />
mas essas condições devem ser contextualizadas. São conceitos<br />
que se organizam de diferentes formas, objetivas e subjetivas, em função<br />
<strong>do</strong> jeito de ser e de viver de cada <strong>com</strong>unidade h<strong>um</strong>ana.<br />
105
106<br />
MAlDONAtO,<br />
MAuRO<br />
Médico e psiquiatra italiano. Professor-associa<strong>do</strong> de <strong>Psi</strong>cologia<br />
Geral da Universidade da Basilicata. Estu<strong>do</strong>u nas Universidades<br />
La Sapienza (Roma), Federico II (Nápoles), Lon<strong>do</strong>n School<br />
of Economics (Londres), École des Hautes Études (Paris). Foi<br />
professor visitante de diversas instituições, entre as quais<br />
destacamos a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo<br />
(PUC-SP), a Universidade de São Paulo (USP) e a Duke University<br />
(EUA). Atualmente sua pesquisa está voltada para o estu<strong>do</strong><br />
da Consciência, da Picologia da Decisão, sobre a pesquisa e as<br />
esferas cognitivas da inovação. É diretor <strong>do</strong> Cognitive Sciences<br />
Studies for the Research on Research Group, da Duke University<br />
(Durham, Carolina <strong>do</strong> Norte). Como autor e organiza<strong>do</strong>r<br />
de livros, produziu vol<strong>um</strong>es e artigos científicos traduzi<strong>do</strong>s em<br />
inglês, francês, português e espanhol.
<strong>um</strong>o<br />
ao Sul<br />
Fecha-se a cortina sobre a belle époque da globalização, em meio a<br />
<strong>um</strong> clima de inquietudes, contradições, conflitos. <strong>um</strong>a époque, na realidade,<br />
bastante breve. De fato, durou apenas <strong>um</strong>a temporada a ilusão de<br />
<strong>um</strong>a via técnico-administrativa para o bem-estar universal, de <strong>um</strong>a mobilização<br />
geral de indivíduos e culturas r<strong>um</strong>o às "venturas" <strong>do</strong> modelo de<br />
vida <strong>do</strong> Ocidente. Em breve ato, assistimos à queda <strong>do</strong> socialismo real,<br />
ao estilhaçamento <strong>do</strong>s providencialismos seculariza<strong>do</strong>s, às ebriedades<br />
ideológicas sobre o ocaso da política, até sobre o "fim da história".<br />
Mas era realmente imaginável que o mun<strong>do</strong> seria conquista<strong>do</strong>, sem<br />
que <strong>um</strong> único golpe fosse desferi<strong>do</strong>, por <strong>um</strong> poder "desterritorializa<strong>do</strong>",<br />
por <strong>um</strong>a supersociedade que <strong>do</strong>mina to<strong>do</strong>s os recursos financeiros e os<br />
meios de informação, por lideranças políticas nacionais cada vez mais<br />
dependentes daquele poder? Era imaginável <strong>um</strong>a globalização dessa espécie,<br />
que desarraiga diferenças de lugar e de cultura, ou, quan<strong>do</strong> muito,<br />
as tolera? Não teria si<strong>do</strong> ilusório imaginar que a globalização pudesse<br />
ser realizada sem dilacerações e fragmentações, cancelan<strong>do</strong> as polaridades<br />
concretas, as individualidades históricas e culturais, os grandes<br />
espaços que se reconhecem e se identificam em <strong>um</strong>a memória e <strong>um</strong><br />
destino <strong>com</strong>uns?<br />
107
108<br />
A globalização em andamento exige <strong>um</strong> espaço-tempo único e indiferente.<br />
O "lugar", o "local", nada mais são <strong>do</strong> que o ponto no qual interesses<br />
e investimentos baixam, investimentos e interesses que são contingentes<br />
e aleatórios: em <strong>um</strong>a homologação abstrata e universal, eles<br />
não têm a menor possibilidade de "salvação". Na realidade, a própria<br />
metáfora <strong>do</strong> global é altamente problemática. Com efeito, ela mitifica o<br />
fato de que o "local" está se transforman<strong>do</strong> em mero produto <strong>do</strong> global,<br />
ao passo que a individualidade <strong>do</strong> "lugar" só tem senti<strong>do</strong> em grandes<br />
espaços concretos, historicamente defini<strong>do</strong>s. Nenh<strong>um</strong> lugar pode viver<br />
sem poliarquia. Nenh<strong>um</strong> nomos da terra, que não seja <strong>um</strong>a lex mercatoria<br />
universal defendida pelo poderio militar e prega<strong>do</strong> em nome de direitos<br />
que nenh<strong>um</strong>a jurisdição internacional sanciona e defende, poderá<br />
existir. <strong>um</strong>a globalização poliárquica e policêntrica parece ser, hoje, o<br />
único horizonte político capaz de dar <strong>um</strong>a alma à ordem mundial que<br />
se encontra no aperto <strong>do</strong> duplo movimento da despolitização universal<br />
e da expansão de <strong>um</strong> direito internacional a serviço de toda ingerência<br />
ou intervenção militar, que hoje já parece ter toma<strong>do</strong> o lugar <strong>do</strong> antigo<br />
direito fundamenta<strong>do</strong> em pactos interestaduais.<br />
<strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> renova<strong>do</strong> e livre pode dar a si próprio outra missão<br />
— talvez a mais elevada — indican<strong>do</strong> a viabilidade e a necessidade política,<br />
em escala planetária, de <strong>um</strong>a coexistência, de <strong>um</strong> foedus entre grandes<br />
espaços culturais autônomos? A tarefa teórica mais alta e urgente é<br />
hoje <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> federativo capaz de se medir <strong>com</strong> os processos de<br />
globalização, em to<strong>do</strong>s os seus aspectos. Não alg<strong>um</strong> vago dever ser, mas<br />
aquele dever ser que vive nos momentos reais. A exigência de justiça não<br />
é <strong>um</strong> sonho, mas <strong>um</strong>a realidade histórica, e não reconhecer esse fato é,<br />
antes de tu<strong>do</strong>, <strong>um</strong> erro político. Nunca existiu e nunca existirá <strong>um</strong>a ética<br />
da responsabilidade sem a defesa da reciprocidade e da possibilidade<br />
de troca das convicções. Reduzir tu<strong>do</strong>, <strong>com</strong>o se faz, para além da retórica<br />
habitual, a choque de civilizações, a relações de força, é irrealismo<br />
puro. Mais <strong>um</strong>a vez, são anos cruciais, e <strong>um</strong>a decisão entre a desmedida<br />
universalista e a medida federalista se faz urgente.<br />
O ARQUIPÉLAGO<br />
A ideia de poliarquia não é <strong>um</strong>a globalização <strong>com</strong>o ocidentalização,<br />
porque nenh<strong>um</strong>a Nova Ordem da Terra nascerá espontaneamente da<br />
ocidentalização planetária das forças e <strong>do</strong>s sistemas econômicos; tampouco<br />
<strong>um</strong>a ideologia, oposta e <strong>com</strong>plementar a essa, que poderíamos<br />
definir da dissolução da soberania, porque nenh<strong>um</strong> poder militar consegue<br />
hoje estar sozinho no cenário internacional. A ideia da poliarquia<br />
está perfeitamente presente na metáfora <strong>do</strong> arquipélago, e precisamente<br />
na ideia da coexistência <strong>do</strong>s diferentes (nómoi, lógoi etc.), que também é
espaço simbólico, pois contém em si o próprio princípio da conexão, na<br />
ausência de <strong>um</strong> princípio unifica<strong>do</strong>r.<br />
A disposição a ser somente e totalmente uno, indistinto, indiferencia<strong>do</strong>,<br />
consiste na recusa de qualquer conexão. Arquipélago, ao contrário, é inteligência<br />
que divide e separa. O problema filosófico e político da relação <strong>do</strong><br />
uno e <strong>do</strong>s muitos se constrói, precisamente, a partir dessa tensão para a<br />
<strong>com</strong>preensão <strong>do</strong> múltiplo, das diferenças. O <strong>pensamento</strong> ocidental educa<br />
e objetiva, a partir <strong>do</strong> pressuposto que o fim é a harmonização <strong>do</strong>s conflitos<br />
dentro de <strong>um</strong> "logos unitário" que contenha os distintos na unidade. A<br />
estratégia, em que ele mantém uni<strong>do</strong>s os distintos, passa por <strong>um</strong>a análise<br />
que os determina e define, <strong>com</strong> precisão, <strong>com</strong>o procedimentos racionais,<br />
colocan<strong>do</strong>-os uns contra os outros, dividin<strong>do</strong>-os e construin<strong>do</strong>, por meio<br />
dessa passagem de <strong>com</strong>preensão separada e de sujeição, precisamente<br />
aquelas modalidades de logos unitário.<br />
hoje nada deixa prever se esse pluralismo poliárquico poderá encontrar<br />
<strong>um</strong> espaço próprio. O sistema econômico-político <strong>do</strong>minante é articula<strong>do</strong><br />
em seu interior, fala <strong>um</strong>a linguagem <strong>com</strong>plexa e está exposto a<br />
conflitos enormes. De resto, as funções de contenção <strong>do</strong> sistema podem<br />
se chocar <strong>com</strong> as <strong>do</strong> desenvolvimento. Além disso, os interesses da <strong>com</strong>unidade<br />
empresarial em ampliar os merca<strong>do</strong>s e restringir a concorrência<br />
exigem intervenções de regulação que não conseguem representá-los<br />
de imediato. Por fim, as inovações no âmbito da pesquisa vivem em <strong>um</strong><br />
hiperespaço da liberdade de informação que não coincide minimamente<br />
<strong>com</strong> os interesses oligárquicos <strong>do</strong>minantes. Tu<strong>do</strong> isso deve ser considera<strong>do</strong><br />
atentamente e contra toda apologia (quer positiva, quer negativa)<br />
<strong>do</strong> "paradigma único".<br />
Resta o fato, incontestável, de que a ordem desses fatores diferentes<br />
(isto é, a hierarquia desses diferentes fatores), que age conforme <strong>um</strong><br />
senti<strong>do</strong> e <strong>um</strong>a vocação — que afinal é a tendência da época à unidade<br />
global — nunca se expressará em <strong>um</strong>a reductio ad un<strong>um</strong>: é muito mais<br />
provável, aliás, que dê lugar a <strong>um</strong> holismo caótico, pois a unidade global<br />
se fundamenta na reprodução constante de diferenças e desequilíbrios.<br />
PENSAR O SUL<br />
Mas, se <strong>um</strong>a reductio ad un<strong>um</strong> é impossível, se torna ainda mais necessário<br />
<strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> capaz de restituir ao <strong>sul</strong> sua antiga dignidade<br />
de sujeito, rompen<strong>do</strong> assim a longa sequência que o viu <strong>com</strong>o objeto <strong>do</strong><br />
<strong>pensamento</strong> alheio. Pensar o Sul — isto é, o <strong>sul</strong> pensan<strong>do</strong> o Sul — significa<br />
ganhar o máximo de autonomia dessa gigantesca mutação, identificar<br />
outros critérios de julgamento <strong>com</strong> relação àqueles que hoje <strong>do</strong>minam a<br />
cena, pensar outra gramática da pobreza e da riqueza, pensar a dignidade<br />
de outras formas de vida.<br />
109
110<br />
Começamos a pensar o Sul ali onde <strong>com</strong>eça o mar; quan<strong>do</strong> o litoral<br />
quebra a organicidade e a dura disciplina da terra; quan<strong>do</strong> descobrimos<br />
que a fronteira não é <strong>um</strong> lugar onde o mun<strong>do</strong> termina, mas aquele onde<br />
os diferentes se tocam e a partida da relação <strong>com</strong> o outro se torna difícil,<br />
arriscada, autêntica. Onde, ao contrário, a terra reina absoluta, impõe-se<br />
o fechamento nas próprias raízes, o imperialismo agressivo, o fundamentalismo.<br />
O Mediterrâneo, lugar <strong>do</strong> Sul por excelência, não é apenas <strong>um</strong> mar <strong>do</strong><br />
passa<strong>do</strong>. Naquele encontro de mar e terra, que decerto não representa<br />
<strong>um</strong> idílio (os irreconstituíveis e sangrentos conflitos religiosos, geopolíticos<br />
e geoeconômicos são prova disso), residem recursos preciosos, úteis<br />
para contrastar <strong>um</strong>a modernidade desmedida. Trata-se de <strong>um</strong>a volta às<br />
origens, sobretu<strong>do</strong> mental, que possibilita apreciar <strong>com</strong> mais força o calor<br />
daquele mar entre as terras, tão central na história <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>.<br />
Em conclusão, nosso <strong>pensamento</strong> recorda os médicos de A peste, de<br />
Camus, os quais, em <strong>um</strong> mun<strong>do</strong> ensandeci<strong>do</strong>, <strong>um</strong> mun<strong>do</strong> em que Deus se<br />
retirou em <strong>um</strong> enigmático e dilacerante silêncio, continuam em sua luta e<br />
a testemunhar sua solidariedade para <strong>com</strong> o próximo. Aqueles médicos<br />
são os melhores <strong>do</strong>s homens, os que transformam o sentimento de nossa<br />
fragilidade em <strong>um</strong>a batalha <strong>com</strong><strong>um</strong>, os que não projetam o ódio nos outros<br />
homens, mas sabem transformá-lo em solidariedade.
REFERÊNCIAS<br />
CACCIARI, M. Geofilosofia dell’Europa. Milano: Adelphi, 1994.<br />
CAMuS, A. La peste. Milano: Bompiani, 2000.<br />
CASSANO, F. Il pensiero meridiano. Roma: Laterza, 2007.<br />
MALDONATO, M. Raizes errantes. Introdução de <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong>. São Paulo: Ed. 34,<br />
2004.<br />
MORIN, E.; kERN, A. B. Terra patria. Milano: Cortina, 1994.<br />
SChMITT, C. Il nomos della terra nel diritto internazionale dello "Jus public<strong>um</strong> europae<strong>um</strong>".<br />
Milano: Adelphi, 1991.<br />
111
112<br />
espINOsA<br />
Doctora en Educación por la Universidad Nacional Estatal a<br />
Distancia de Costa Rica. Maestra en Ciencias de la Educación<br />
con especialidad en investigación y <strong>do</strong>cencia, por la Universidad<br />
del Valle de México y Licenciada en Contaduría por el<br />
Centro de Estudios Universitarios Arkos de Puerto Vallarta, Jal,<br />
México, <strong>do</strong>nde es Directora Académica y dirige el proyecto de<br />
Investigación-Acción Transdisciplinar Arkos. Creó y dirige en la<br />
actualidad la Gaceta Universitaria Visión Docente Con-Ciencia<br />
que difunde trabajo sobre transdisciplinariedad y educación.<br />
Tiene artículos publica<strong>do</strong>s sobre transdisciplinariedad y <strong>com</strong>plejidad<br />
para la educación superior.
Una experiencia<br />
transdisciplinar<br />
de auto-ecoorganización<br />
de<br />
una universidad<br />
del Sur<br />
Toman<strong>do</strong> <strong>com</strong>o base la propuesta por <strong>Morin</strong> (2010) "<strong>Para</strong> un pensa-<br />
miento del Sur" y de identificarla <strong>com</strong>o una noción abierta también a las<br />
aportaciones plurales, culturales de la civilización que no han si<strong>do</strong> acreditadas<br />
por la cultura hegemónica "del Norte" — que as<strong>um</strong>e la vida <strong>com</strong>o<br />
centrada en el cuatrimotor ciencia-tecnología-producción-ganancia, en<br />
el contexto de la mundialización —, considero clave abordar la pregunta:<br />
¿qué experiencias innova<strong>do</strong>ras que se implementaron y/o están en curso<br />
ilustran el pensamiento y/o las identidades del Sur? Puesto que a partir<br />
de ella podemos identificar temas centrales que inspiran el pensamiento<br />
del Sur y derivar cuestiones prioritarias a tratarse por la mirada del Sur<br />
hacia una política de civilización. De allí que <strong>com</strong>parta en este encuentro<br />
una experiencia concreta de uno de los sures que abriga la búsqueda de<br />
una formación que ponga en equilibrio los vértices del triángulo de la<br />
vida de D’Ambrosio (2007): individuosociedad naturaleza y abone<br />
a la construcción un mun<strong>do</strong> mejor (MORIN, 2010).<br />
El texto plantea la experiencia del CEuArkos para implementar<br />
la transdisciplinariedad en la universidad así <strong>com</strong>o algunas de las vivencias<br />
y aprendiza jes logra<strong>do</strong>s con dicha experiencia a partir de cuatro<br />
grandes estrategias universitarias para la transdisciplinariedad y la<br />
113
114<br />
<strong>com</strong>plejidad. El aporte al encuentro "<strong>Para</strong> un pensamiento del Sur" está<br />
da<strong>do</strong> por la presentación de una experiencia transdisciplinaria real en<br />
una universidad concreta y a nivel de la escala global en una institución:<br />
el CEuArkos, que por espacio de cinco años ha veni<strong>do</strong> exploran<strong>do</strong><br />
y experimentan<strong>do</strong> con los miembros de su <strong>com</strong>unidad (<strong>do</strong>centes, estudiantes<br />
y directivos) las formas de orientar el paso de una formación<br />
universitaria disciplinaria a una transdisciplinaria en to<strong>do</strong>s sus programas<br />
educativos.<br />
CONTEXTO DE LA INVESTIGACIÓN<br />
El CEuArkos, ubica<strong>do</strong> en Puerto vallarta, Jalisco, México, nace en 1990<br />
<strong>com</strong>o la primera institución de educación superior de la ciudad y su zona<br />
de influencia. Fue fundada por educa<strong>do</strong>res con muchos años de experiencia<br />
en la formación de jóvenes y adultos en el ámbito de la educación<br />
pública popular. Se trata de una institución de carácter priva<strong>do</strong>, con<br />
reconocimiento oficial de la Secretaría de Educación Pública que ofrece<br />
programas de licenciatura en las siguientes áreas: Administración de<br />
Empresas Turísticas, Contaduría, Derecho, Ciencias de la Comunicación,<br />
y Merca<strong>do</strong>tecnia. De 300 a 400 al<strong>um</strong>nos estudian allí, la mayoría son<br />
personas que traba jan. La plana <strong>do</strong>cente cuenta con 50 profesores que<br />
se distinguen por ser además, profesionales en ejercicio en las diversas<br />
áreas del conocimiento. La universidad posee una filosofía relacionada<br />
con una perspectiva social y desarrolla una práctica educativa h<strong>um</strong>anista,<br />
evidenciada en su interés por una formación integral del individuo y<br />
su filosofía "Educar es formar hombres libres". Animada por esa visión,<br />
la dirección del centro se interesó muy temprano por la aproximación<br />
transdisciplinaria.<br />
ESTRATEGIAS PARA UNA FORMACIÓN TRANSDISCIPLINARIA EN LA<br />
UNIVERSIDAD<br />
Durante los Talleres de Investigación-Acción creamos cuatro grandes<br />
estrategias construidas con los actores de la <strong>com</strong>unidad universitaria para<br />
orientar el paso paradigmático hacia la transdisciplinariedad, a saber:<br />
ESTRATEGIA 1: TALLERES DE INVESTIGACIÓN-ACCIÓN-FORMACIÓN<br />
TRANSDISCIPLINARIA<br />
La necesidad de superar la fragmentación del conocimiento y la formación<br />
en el CEuArkos a escala institucional, nos llevó a considerar que<br />
era la concepción de las prácticas educativas y la forma en que éstas son<br />
llevadas a cabo lo que estaba en el centro (prácticas a las que subya-
ce una visión de mun<strong>do</strong> y realidad), por lo que construir caminos sobre<br />
cómo operacionalizar la transdisciplinariedad y la <strong>com</strong>plejidad debía<br />
darse a través de una indagación conjunta con los actores universitarios.<br />
<strong>Para</strong> ello era básico iniciar con la propia formación de dichos actores. Es<br />
así que uno de los principales propósitos fue formar a los profesores y<br />
directivos en estas perspectivas, mejoran<strong>do</strong> su <strong>com</strong>petencia pedagógica<br />
y profesional. Con ellos y con los estudiantes hemos busca<strong>do</strong> crear y<br />
experimentar, las prácticas y estrategias transdisciplinarias para la formación<br />
universitaria. Esta tarea la realizamos a partir de talleres de I-A<br />
centra<strong>do</strong>s en identificar y experimentar los procesos para una formación<br />
más integral a partir de la visión transdisciplinar. Es allí que abordamos<br />
cómo traducir a pasos meto<strong>do</strong>lógicos la transdisciplinariedad y la <strong>com</strong>plejidad<br />
para adaptarlos a las prácticas formativas del CEuArkos, intentan<strong>do</strong><br />
liberarlas de la fragmentación.<br />
El objetivo es también encarnar las nuevas corrientes por los actores<br />
a partir de prácticas de I-A reflexivas <strong>do</strong>nde cada uno contribuya<br />
a la concepción, construcción y evaluación de los caminos explora<strong>do</strong>s<br />
(NICOLESCu, 1998), pues una evolución tan importante <strong>com</strong>o ir de una<br />
lógica disciplinaria a una transdisciplinaria en la universidad no puede<br />
desarrollarse brusca y totalmente, sin la participación de los actores y<br />
ba jo un esquema de sólo transmisión y no de acción-investigación pues<br />
querer <strong>com</strong>prender las nuevas perspectivas sin experimentarlas es una<br />
contradicción epistemológica.<br />
Los talleres están inspira<strong>do</strong>s en las propuestas CIRET-uNESCO, en los<br />
pilares de la transdisciplinariedad, principios de la <strong>com</strong>plejidad, trabajos<br />
de galvani (2007b) y Pineau (2007b), así <strong>com</strong>o nuestra propia propuesta<br />
(ESPINOSA; TAMARIz, 2001), nacida en una investigación anterior. Los talleres<br />
se han da<strong>do</strong> desde el año 2007, están <strong>com</strong>puestos de directivos, profesores<br />
y estudiantes voluntarios de las diferentes esferas del CEuArkos.<br />
a) Orientaciones pedagógicas para una formación basada en tres niveles<br />
de realidad. Los talleres están orienta<strong>do</strong>s a que los participantes desarrollen<br />
tres tipos de aprendizaje liga<strong>do</strong>s a tres grandes dimensiones o<br />
niveles de realidad del sujeto (gALvANI, 2007b): vincula<strong>do</strong> al Nivel Teórico-<br />
Epistémico, se busca aprender a pensar, mediante la investigación y a través<br />
de los tres pilares de la transdisciplinariedad (NICOLESCu, 1998) y los<br />
siete principios de la <strong>com</strong>plejidad (MORIN, 2005), intentan<strong>do</strong> generar un<br />
pensamiento <strong>com</strong>plejo; relaciona<strong>do</strong> al Nivel Práctico se enfatiza aprender<br />
a dialogar, distinguir y reconectar las disciplinas, as<strong>um</strong>ir sus límites y <strong>com</strong>plementos,<br />
buscar su interacción a través del diálogo (abierto versus la<br />
discusión o la persuasión) y la exploración colectiva; Liga<strong>do</strong> al Nivel ético<br />
115
116<br />
o Existencial (Reintroducción de las dimensiones sensible y ética), se tra-<br />
baja con la perspectiva de aprender a aprender sobre el conocimiento de<br />
sí mismo, de los propios prejuicios, condicionamientos sociales, históricos<br />
y personales de nuestras creencias y certezas, nuestra inspiración y vocación,<br />
afinidades, límites y posibilidades, pero también generar reflexiones<br />
sobre el conocimiento y el conocimiento del conocimiento. Estos tres tipos<br />
de aprendizaje, inter-relaciona<strong>do</strong>s a su vez a tres niveles de realidad del<br />
actuar del sujeto, constituyen lo que podemos denominar los aprendizajes<br />
y formas de construcción del conocimiento transdisciplinar para la formación<br />
universitaria que exploramos en el Proyecto Arkos.<br />
b) Procesos de los Talleres de I-A-Formación Transdisciplinar: En nuestra<br />
experiencia, una serie de procesos han facilita<strong>do</strong> el trabajo en los talleres: a)<br />
Procesos de sensibilización y familiarización hacia la transdisciplinariedad y<br />
la <strong>com</strong>plejidad; b) Procesos de identificación de las preguntas de interés de<br />
los participantes; c) Consolidación del grupo, por procesos de auto-formación<br />
y co-formación a partir de una problemática <strong>com</strong>ún que atañe a to<strong>do</strong>s<br />
y es co-construida (DESROChE, 1998); d) Procesos de diálogo intersubjetivo<br />
para la apertura y religación de los saberes y las personas; e) Procesos de<br />
exploración, apropiación y profundización en los pilares transdisciplinares<br />
y principios <strong>com</strong>plejos — para aproximarse a problemáticas vividas por<br />
los actores y ejercitarse en el manejo de las herramientas del pensamiento<br />
<strong>com</strong>plejo, pues se volvieron conscientes de que no estaban habitua<strong>do</strong>s a<br />
pensar <strong>com</strong>plejamente; f) Procesos de auto-reflexión y reflexión sobre la<br />
inter-experiencia; g) Procesos de producción colectiva de saber, <strong>com</strong>o la<br />
creación de diversas estrategias y cursos transdisciplinarios para todas las<br />
licenciaturas reconoci<strong>do</strong>s por el Ministerio de Educación Mexicano que representan<br />
el diezmo transdisciplinario plantea<strong>do</strong> por <strong>Morin</strong> (2002).<br />
ESTRATEGIA 2: MESAS REDONDAS TRANSDISCIPLINARIAS<br />
Estas mesas re<strong>do</strong>ndas constituyen una oportunidad para la praxis<br />
transdisciplinaria al devenir en una experiencia para el diálogo intersubjetivo<br />
y la reconexión de saberes da<strong>do</strong> que retoman <strong>com</strong>o eje problemáticas<br />
que nos atañen <strong>com</strong>o seres h<strong>um</strong>anos, parte de una sociedad y un<br />
medio, que son dialogadas en grupos transdisciplinarios. Se trata de un<br />
espacio abierto y libera<strong>do</strong> para <strong>com</strong>partir, reflexionar y reflejar de manera<br />
lúdica los problemas sociales. Las mesas re<strong>do</strong>ndas están dirigidas a<br />
toda la <strong>com</strong>unidad Arkos y son abiertas a la ciudadanía. Son un punto de<br />
encuentro para individuos, colectivos, organizaciones e instituciones que<br />
buscamos incidir en los problemas de nuestra <strong>com</strong>unidad y anhelamos<br />
fortalecer los lazos para la vida colectiva. Se trata también de abrir el<br />
diálogo al arte y los saberes no disciplinarios <strong>com</strong>o los de la experiencia,
de lo vivi<strong>do</strong> fenomenológicamente, de la <strong>com</strong>prensión intersubjetiva e<br />
intercultural (gALvANI, 2009b).<br />
ESTRATEGIA 3: SEMINARIOS DE TESIS TRANSDISCIPLINARIOS<br />
Los seminarios se traba jan con grupos mixtos de estudiantes de las<br />
diferentes carreras y son a<strong>com</strong>paña<strong>do</strong>s por un equipo <strong>do</strong>cente transdisciplinar<br />
(conforma<strong>do</strong> por miembros de los talleres de I-A) que sustenta<strong>do</strong><br />
en la transdisciplinariedad, apoya a los estudiantes para ejercitarse en<br />
una nueva forma de pensamiento (<strong>com</strong>plejo) para abordar el traba jo de<br />
investigación y hacer sus tesis de licenciatura. La dinámica de traba jo<br />
está basada en la dialógica, en la intersubjetividad y el cruce de saberes.<br />
Es una visión que permite apreciar y respetar las aportaciones de to<strong>do</strong>s,<br />
a partir de un diálogo entre los participantes (de diferentes disciplinas)<br />
para abordar problemáticas (sociales, ambientales y h<strong>um</strong>anas) en sus<br />
tesis que emergen de su relación con la <strong>com</strong>unidad y el medio en que<br />
están inscritos y para producir un saber individual y colectivo sobre las<br />
mismas que se gestan en la colaboración y la co-participación. Con esta<br />
experiencia transdisciplinaria, vemos a los universitarios aproximarse<br />
mediante el estudio, la reflexión y la investigación, a problemáticas que<br />
salen del <strong>do</strong>minio de los campos técnicos de las licenciaturas, que reconocen<br />
la riqueza y <strong>com</strong>plejidad de la realidad. Las investigaciones se<br />
arraigan en las problemáticas sociales, ambientales cotidianas que conocen<br />
los estudiantes y que los tocan personalmente o familiarmente.<br />
No se trata ya, de problemas teóricos abstractos o especializa<strong>do</strong>s que<br />
levantan la lógica interna de la disciplina sino de problemas arraiga<strong>do</strong>s<br />
en la vida que demandan la vinculación y reconexión de los saberes<br />
disciplinarios para abordar, elucidar, <strong>com</strong>prender y tratar las realidades<br />
<strong>com</strong>plejas. La cualidad de la implicación y la utilización de pasos dialoga<strong>do</strong>s<br />
experimenta<strong>do</strong>s en el seminario transdisciplinar otorga un matiz<br />
muy particular a estos traba jos de tesis. La dimensión medioambiental<br />
aparece con mucho más frecuencia y sobre to<strong>do</strong>, la encontramos en<br />
todas las disciplinas.<br />
ESTRATEGIA 4: EJERCICIOS TRANSDISCIPLINARIOS EN LAS AULAS<br />
UNIVERSITARIAS<br />
Buscan<strong>do</strong> despertar tempranamente una actitud transdisciplinaria en<br />
las aulas a través de ejercicios vivenciales y crítico reflexivos sobre diversos<br />
campos de interés transdisciplinar y <strong>com</strong>plejo, los participantes<br />
construyeron los Ejercicios Transdisciplinarios, que se apoyan en el uso<br />
de saberes populares, <strong>com</strong>o el círculo de la palabra (CLASTRES, 1971),<br />
dinámicas de diálogo (BOhM, 2004) y saberes artísticos (<strong>com</strong>o teatro,<br />
117
118<br />
poesía, fotografía, literatura, música), pues fungen <strong>com</strong>o sensibiliza<strong>do</strong>res<br />
previos al aborda je de temáticas transdisciplinarias que son reflexionadas<br />
en grupos pequeños.<br />
HACIA UNA ECOLOGIZACIÓN DE LOS SABERES UNIVERSITARIOS<br />
Aunque hay un largo camino por recorrer y construir en el propósito<br />
de transitar hacia una formación transdisciplinaria en el CEuArkos, con<br />
esta experiencia nos toca advertir que disciplinas aparentemente extranjeras<br />
a la educación sobre el medio ambiente <strong>com</strong>o el derecho, la<br />
contabilidad, la administración, o la <strong>com</strong>unicación, son ecologizantes<br />
a partir de una postura transdisciplinaria que pone en diálogo el conocimiento<br />
académico con los saberes del medio social, los artísticos,<br />
populares, políticos e introduce la preocupación medioambiental <strong>com</strong>o<br />
una dimensión ética en la producción de los saberes universitarios. La<br />
visión transdisciplinaria tiende así a ecologizar los saberes: "Es decir,<br />
pone los saberes en diálogo con aquellos del medio ambiente, a la vez<br />
que introduce el medio ambiente <strong>com</strong>o la preocupación mayor de los<br />
conocimientos y los aprendiza jes produci<strong>do</strong>s." (gALvANI, 2008b, p. 4).<br />
En otras palabras, el paso de un paradigma disciplinario (técnico reductor-simplificante)<br />
a un paradigma <strong>com</strong>plejo y transdisciplinario implica<br />
un cuestionamiento crítico y autocrítico de las diferentes disciplinas<br />
sobre los desequilibrios ambientales.
REFERENCIAS<br />
BOhM, D. On dialogue. Lon<strong>do</strong>n: Routledge, 2004, p. 136.<br />
CLASTRES, P. La société contre l’état. Paris : Ediciones de Minuit, 1971.<br />
D’AMBROSIO, u. Concimiento y valores h<strong>um</strong>ana. Visión Docente Con-Ciencia, Puerto<br />
Vallarta, v. 7, n. 35, pp. 6-18, marzo/abr. 2007.<br />
DESROChE, h. Les auteurs et les acteurs: la recherche coopérative <strong>com</strong>me recherche-action.<br />
Communautés: archives de sciences sociales et de la coopération et<br />
du développement, n. 59, pp. 36-94, 1982.<br />
ESPINOSA MARTíNEz, A. C.; TAMARIz, C. Un modelo transdisciplinario de educación<br />
para la universidad. 506 f. Tese (Mestra<strong>do</strong>) -- universidad de Valle de México,<br />
Santiago de Querétaro, México, 2001.<br />
gALvANI, P. Meto<strong>do</strong>logy. In: FOuRTH WORLD uNIVERSITY RESEARCH GROuP. The<br />
merging of knowledge: people in poverty and academics thinking together. [S.l.]:<br />
university Press of America, 2007b, p. 9-30.<br />
gALvANI, P. La transdisciplinariedad y la <strong>com</strong>plejidad: una mirada que religa los<br />
saberes y la experiencia vivida. Puerto Vallarta, 2009b. Conferencia dictada en el<br />
Centro de Estudios universitarios Arkos para los Seminarios de Tesis Transdisciplinarios.<br />
gALvANI, P. Transdisciplinariedad y ecologización de los saberes: 1 a parte. Visión<br />
Docente Con-Ciencia, Puerto Vallarta, n. 40, 2008b, p. 4-13.<br />
MORIN, E. La cabeza bien puesta: repensar la reforma, reformar el pensamiento.<br />
Buenos Aires: Nueva Visión, 2002. 143 p.<br />
MORIN, E. Introducción al pensamiento <strong>com</strong>plejo. Madrid: Editorial Gedisa, 2005,<br />
167 p.<br />
MORIN, E. <strong>Para</strong> <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul. 2010. Mimeografa<strong>do</strong>.<br />
NICOLESCu, B. La transdisciplinariedad, una nueva visión del mun<strong>do</strong>: manifesto.<br />
Paris: Ediciones Du Rocher, 1998. 125 p.<br />
PINEAu, g. Knowledge: freeing knowledge!: life, school and action. In: FOuRTH<br />
WORLD uNIVERSITY RESEARCH GROuP. The merging of knowledge: people in poverty<br />
and academics thinking together. [S.l.]: university Press of America, 2007b,<br />
p. 215-306.<br />
119
120<br />
MARtINs, pAulO<br />
HeNRIQue<br />
Professor-titular de Sociologia da Universidade Federal de<br />
Pernambuco (UFPE), membro da Associação Mauss (Moviment<br />
Anti-Utilitariste dans les Sciences Sociales), <strong>com</strong> sede<br />
na França. Vice-presidente da Associação Latino-Americana<br />
de Sociologia (Alas) e presidente <strong>do</strong> Comitê Brasileiro da Alas<br />
Recife 2011.
contribuição <strong>do</strong>s<br />
estu<strong>do</strong>s "descoloniais"<br />
para os desafios<br />
propostos por<br />
<strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong> para<br />
a organização <strong>do</strong><br />
<strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul<br />
As reflexões de <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong> relativas à organização de <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong><br />
<strong>do</strong> Sul enfatizam a necessidade de se recusar a redução <strong>do</strong> <strong>com</strong>plexo<br />
a <strong>um</strong> <strong>do</strong>s seus elementos e a disjunção que separa ideias aparentemente<br />
antagônicas, mas que são, de fato, <strong>com</strong>plementares. Tais<br />
<strong>com</strong>entários colocam várias possibilidades de exploração teórica para<br />
que avancemos na construção <strong>do</strong> diálogo entre Sul e Norte, que, no fun<strong>do</strong>,<br />
é o diálogo entre várias modernidades e campos diferencia<strong>do</strong>s de<br />
<strong>pensamento</strong> e ação.<br />
Consideran<strong>do</strong> que o texto de <strong>Morin</strong> abre <strong>um</strong> vasto leque de reflexões,<br />
decidimos explorar <strong>um</strong> foco particular sugeri<strong>do</strong> pelo autor, a saber,<br />
que o <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul deveria conciliar "o senti<strong>do</strong> da diversidade<br />
concreta da natureza expressa pelos deuses <strong>do</strong>s politeísmos antigos,<br />
principalmente o grego e o latino, assim <strong>com</strong>o o senti<strong>do</strong> da unidade<br />
<strong>do</strong> universo que o Deus único exprime". No nosso entender, os estu<strong>do</strong>s<br />
pós-coloniais, surgi<strong>do</strong>s nas sociedades que se libertaram parcialmente<br />
da colonização planetária e, sobretu<strong>do</strong>, os estu<strong>do</strong>s "descoloniais", que<br />
radicalizam a crítica ao progresso econômico <strong>com</strong> vistas ao resgate<br />
<strong>do</strong> diverso e <strong>do</strong> ausente, podem ser de muito valor para se aprofundar<br />
121
122<br />
este debate de integração da diversidade na unidade que impede a<br />
fragmentação cultural.<br />
Assim, me parece interessante <strong>com</strong>eçar nossa reflexão <strong>com</strong> <strong>um</strong>a<br />
pergunta: que grau de interação existe entre os chama<strong>do</strong>s estu<strong>do</strong>s póscoloniais,<br />
que questionam a modernidade eurocêntrica e que buscam<br />
organizar <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul, e a crítica antiutilitarista <strong>com</strong>plexa<br />
formulada por <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong>, que permite avançar na crítica da modernidade<br />
desde o Norte?<br />
<strong>um</strong>a primeira resposta a essa pergunta é a constatação de que o reconhecimento<br />
de lugares diversos de produção da crítica teórica — crítica<br />
desde o Norte e desde o Sul — já constitui, em si mesmo, o reflexo<br />
<strong>do</strong>s deslocamentos das fronteiras nacionais modernas. Se estas, anteriormente,<br />
eram fundadas na ideia <strong>do</strong> universalismo <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> nacional,<br />
agora, tais fronteiras se abrem para a diversidade e para o surgimento<br />
de territórios transnacionais, que contribuem para tornar os territórios<br />
nacionais mais <strong>com</strong>plexos <strong>do</strong> ponto de vista linguístico, cultural, social,<br />
econômico, político e jurídico. Nessa perspectiva, a busca de novos nexos<br />
entre Norte e Sul não significa que as antigas fronteiras nacionais<br />
estejam borradas, mas que elas agora são atravessadas, no <strong>pensamento</strong><br />
e na prática, por zonas de contato intermediárias que favorecem o<br />
surgimento de entendimentos plurais da realidade, desenhan<strong>do</strong> <strong>um</strong>a<br />
configuração de poder plural e diversificada.<br />
Assim, não é mais problema o reconhecimento das diversidades de<br />
experiências intelectuais em cada la<strong>do</strong> das fronteiras, pois tais diversidades<br />
estão condicionadas por experiências cognitivas e práticas que<br />
revelam diferentes experiências culturais, históricas e políticas. Assim,<br />
se no Sul o <strong>pensamento</strong> "descolonial" interroga as teorias pós-coloniais<br />
tradicionais, prisioneiras da ideologia <strong>do</strong> desenvolvimento, <strong>com</strong>o a teoria<br />
estruturalista cepalina e a teoria da dependência, no Norte há outros<br />
marcos interpretativos a interrogar <strong>com</strong>o, por exemplo, as críticas às<br />
teses reducionistas e utilitaristas que inspiraram o desenvolvimento <strong>do</strong><br />
capitalismo e das ideologias mercantilistas <strong>com</strong>o o neoliberalismo.<br />
Nossa reflexão neste texto se baseia, então, em duas teses <strong>com</strong>plementares:<br />
<strong>um</strong>a epistemológica e outra epistêmica. A epistemológica<br />
propõe fazer <strong>um</strong>a conexão estreita entre os estu<strong>do</strong>s pós-coloniais e<br />
"descoloniais" — que objetivam revalorizar as tradições, lutas e possibilidades<br />
sócio-históricas das sociedades <strong>do</strong> Sul —, e os estu<strong>do</strong>s antiutilitaristas<br />
e da <strong>com</strong>plexidade <strong>do</strong> Norte, que criticam os reducionismos teóricos,<br />
os moralismos travesti<strong>do</strong>s de universalismos éticos, assim <strong>com</strong>o as ações<br />
depreda<strong>do</strong>ras voltadas para a mercantilização <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>. Assim, não se
pode falar de crítica "descolonial" na América Latina sem referência a<br />
<strong>um</strong>a série de esforços de renovação teórica que apontam para a diversidade<br />
de saberes propostos por <strong>Morin</strong>, <strong>com</strong>o aqueles <strong>do</strong>s postcolonials<br />
studies, <strong>do</strong>s subalterns studies, <strong>do</strong>s gender studies, ou sem revisar Marx.<br />
Ou seja, o avanço da teoria crítica n<strong>um</strong> la<strong>do</strong>, o <strong>do</strong> Sul, se faz em paralelo<br />
às mudanças da teoria no outro la<strong>do</strong>, no Norte.<br />
Segun<strong>do</strong> nossa hipótese, os giros epistemológicos em curso têm<br />
origens diversas definidas pela colonização, mas articuladas por <strong>um</strong>a<br />
globalização que é produzida nos espaços da política e da tradução<br />
cultural e linguística que se formatam desde as origens da modernidade<br />
europeia. No Sul, o giro é conduzi<strong>do</strong> desde a práxis anticolonial e<br />
desde a crítica pós-colonial, que nasceu da reação contra a subalternidade<br />
hierárquica colonial; no Norte, o giro é produzi<strong>do</strong> desde o avanço<br />
da crítica antiutilitarista e antirreducionista, sobretu<strong>do</strong> sociológica, que<br />
passa a interrogar a subalternidade não somente a partir da exploração<br />
econômica, mas também a partir <strong>do</strong>s fatores culturais e morais, <strong>com</strong>o o<br />
provam as teorias da <strong>com</strong>plexidade, <strong>do</strong> <strong>do</strong>m e <strong>do</strong> reconhecimento, nos<br />
últimos anos.<br />
A tese epistêmica, por sua vez, sugere que o avanço simultâneo da<br />
crítica teórica nas três últimas décadas, no Sul e no Norte, é produzi<strong>do</strong><br />
por deslocamentos progressivos e cada vez mais acelera<strong>do</strong>s <strong>do</strong><br />
imaginário da modernidade, passan<strong>do</strong>-se gradualmente de <strong>um</strong> olhar<br />
eurocêntrico para outro, "mundialocêntrico". A tese epistêmica propõe<br />
que a modernidade é <strong>um</strong> discurso que se gera, desde suas origens,<br />
por rupturas e deslocamentos entre as representações <strong>do</strong> passa<strong>do</strong> e<br />
<strong>do</strong> futuro, desde o Leste e o Oeste, e entre imaginários diversos da<br />
colonização, que constituem importantes zonas linguísticas de contato<br />
no momento presente. Cada imaginário aponta para <strong>um</strong>a equação<br />
híbrida, <strong>com</strong>o são os casos de latinização, indianização, ocidentalização,<br />
orientalização, modernização, entre outros. Eles apontam sempre<br />
para deslocamentos epistêmicos que permitem se entender Norte e Sul<br />
<strong>com</strong>o metáforas de <strong>um</strong>a mesma coisa, que envolve as duas regiões de<br />
construção da colonialidade na modernidade. Isso significa que há <strong>um</strong>a<br />
articulação permanente entre os produtores <strong>do</strong> conhecimento das duas<br />
regiões, articulação que se expande progressivamente na conjuntura<br />
global <strong>com</strong> a ampliação de interioridades e exterioridades, permitin<strong>do</strong><br />
novas visibilidades teóricas nos espaços de produção da liberdade entre<br />
os ex-coloniza<strong>do</strong>s.<br />
A produção teórica pós-colonial e "descolonial" na Europa (Fanon,<br />
Memmi etc.), na América Latina (quijano, Escobar, Dussel, Lander etc.)<br />
123
124<br />
na ásia (Spivak, Chaterjee, Chakrabarty etc.) contribuem para provar<br />
que as duas regiões <strong>do</strong> conhecimento e <strong>do</strong> poder das modernidades<br />
planetárias conhecem ontologias diversas, mas articuladas por traduções<br />
e tradutores, por meio das várias fronteiras históricas, políticas,<br />
simbólicas e epistemológicas, inter e transculturais. Nesse senti<strong>do</strong>, é<br />
necessário esclarecer que Norte e Sul não são somente pontos geográficos,<br />
administrativos, jurídicos e políticos, mas também, lugares de<br />
produção <strong>do</strong> conhecimento e de imaginários sociais e culturais diversos<br />
que se movem em paralelo. Suas cartografias de poder e de saber<br />
são redimensionadas desde as tensões e conflitos que nascem nas fronteiras<br />
<strong>com</strong>partilhadas <strong>do</strong> imaginário eurocêntrico <strong>com</strong> os imaginários<br />
próprios da Asia, da Africa e da América Latina.<br />
A valorização <strong>do</strong>s espaços de conhecimento transnacionais que envolvem<br />
os <strong>do</strong>is campos imaginários, ou melhor, os <strong>do</strong>is la<strong>do</strong>s das fronteiras<br />
<strong>do</strong> imaginário da mundialização, aqueles situa<strong>do</strong>s desde dentro e<br />
desde fora, desloca a relação tradicional espaço-tempo que inspirou a<br />
cartografia da colonização e <strong>do</strong>s territórios <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s nacionais. Essa<br />
antiga cartografia da colonização foi produzida por <strong>um</strong> saber coloniza<strong>do</strong>r<br />
organiza<strong>do</strong> a partir das forças da burguesia e <strong>do</strong> cristianismo e<br />
que valorizou a ideologia <strong>do</strong> progresso, da mercantilização e da expropriação.<br />
Com a crítica "descolonial" produzida desde as exterioridades<br />
esse marco tradicional é interroga<strong>do</strong>, o que provoca o nascimento de<br />
outro marco espacial-temporal que se impõe sem eliminar o antigo.<br />
Consequentemente, são cria<strong>do</strong>s novos territórios transnacionais de organização<br />
das experiências da vida cotidiana e novas modalidades de<br />
ação coletiva e da política.<br />
A superação dessas fronteiras nacionais modernas está contribuin<strong>do</strong><br />
para mudar as noções de espaço e tempo, permitin<strong>do</strong> integrar novos<br />
horizontes cognitivos e emocionais na produção das experiências<br />
individuais e coletivas, de gênero, de etnias, de sexualidade, entre outras.<br />
Assim, é interessante observar que, a partir <strong>do</strong> olhar europeu, ser<br />
homem e branco implica enorme diferença na constituição das hierarquias<br />
de respeitabilidade a nível mundial. Mas, hoje, ser negro, mulher<br />
ou Aimara deixa de ser símbolo de arcaísmo ou inferioridade cultural<br />
para significar o valor das distinções, da revalorização <strong>do</strong> diferente, o<br />
que é fundamental para a expansão de <strong>um</strong> novo h<strong>um</strong>anismo que, <strong>com</strong>o<br />
sugere <strong>Morin</strong>, se afirme pela consciência <strong>do</strong> pertencimento a <strong>um</strong>a mesma<br />
<strong>com</strong>unidade de destino. Ou seja, as manifestações de exterioridades<br />
mudam as representações <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> desde fora e desde dentro.
Por consequência, a sombra <strong>do</strong> "bárbaro" passa a questionar dire-<br />
tamente a <strong>do</strong>minação colonial, simultaneamente desde o Sul e desde<br />
o Norte. Pois se, por <strong>um</strong> la<strong>do</strong>, temos a emergência <strong>do</strong>s movimentos indígenas,<br />
por exemplo, <strong>com</strong>o prova da afirmação <strong>do</strong>s novos territórios<br />
de produção de movimentos sociais e culturais inéditos no Sul, temos<br />
também que reconhecer que no Norte há em curso mudanças importantes<br />
sobre a vida política, social e cultural, <strong>com</strong>o demonstram as reações<br />
<strong>do</strong>s imigrantes e das grandes mobilizações coletivas urbanas nas<br />
grandes cidades.<br />
<strong>Para</strong> concluir, gostaríamos de dizer que se o <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul é<br />
"solicita<strong>do</strong> a reproblematizar a sabe<strong>do</strong>ria" <strong>com</strong>o propõe <strong>Morin</strong>, então<br />
é importante que essa reproblematização não se faça de costas para o<br />
Norte, mas em diálogo <strong>com</strong>preensivo e <strong>com</strong>plexo que respeite as diversidades<br />
e promova as dignidades.<br />
125
126<br />
MeDeIROs,<br />
ClAuDIA sANtOs De<br />
Mestre em Educação Brasileira pela PUC-Rio, <strong>com</strong> a disser-<br />
tação Profissionais de Saúde, Lazer, Cultura e Educação que<br />
trabalham <strong>com</strong> a Educação Infantil: práticas e concepções de<br />
infância (2009). Especialista em Educação Infantil, também<br />
pela PUC-Rio, pedagoga, atualmente é assessora-técnica da<br />
Gerência de Educação e Ação Social (GEA) <strong>do</strong> SESC, Administração<br />
Nacional, atuan<strong>do</strong> principalmente na formação de<br />
professores de Educação Infantil das escolas <strong>do</strong> SESC em quase<br />
to<strong>do</strong>s os esta<strong>do</strong>s <strong>do</strong> Brasil.
leonar<strong>do</strong> e<br />
anderson:<br />
encontro entre<br />
os alpes suíços<br />
e a floresta<br />
amazônica<br />
Foi Leonar<strong>do</strong> Da vinci que, em 1510, subiu os Alpes Suíços e encontrou<br />
fósseis de seres <strong>do</strong> mar. <strong>um</strong>a das explicações disponíveis para tal<br />
fenômeno, na época, dada pela Igreja, é que Noé jogara-os de sua arca,<br />
durante o grande Dilúvio. hoje, estudiosos afirmam que os Alpes foram<br />
o fun<strong>do</strong> de <strong>um</strong> mar, cujo nome não me lembro agora, mas que subiu por<br />
causa de <strong>um</strong> choque da áfrica <strong>com</strong> a Europa. E dividiu-se o continente<br />
europeu em Norte e Sul. "Culpa" <strong>do</strong>s Alpes.<br />
Desde Leonar<strong>do</strong>, homem <strong>do</strong> Sul (da Europa), os mistérios <strong>do</strong> mun<strong>do</strong><br />
também habitam os la<strong>do</strong>s de baixo. E há gente <strong>do</strong> Sul que acende<br />
a centelha <strong>do</strong> saber, que habita as fronteiras. há temas que inspiram o<br />
<strong>pensamento</strong> e a ação <strong>do</strong> homem, de qualquer la<strong>do</strong> <strong>do</strong> planeta. E, <strong>com</strong>o<br />
<strong>Morin</strong> nos lembra que os la<strong>do</strong>s mudam de direção, eu, daqui de outro Sul,<br />
o Brasil, não posso deixar de encontrar em Da Matta (outro homem <strong>do</strong><br />
Sul) <strong>um</strong>a explicação singela para tanta "fronteirice": espaço e tempo são<br />
construções sociais. E não se pode falar de espaço sem falar de tempo.<br />
houve tempo em que o homem esteve mais em moda, potente, másculo,<br />
racional, ocupan<strong>do</strong> os espaços <strong>com</strong> sua "lógica cultural" (Da Matta,<br />
1985). Walter Benjamin (1996) já nos dizia que nos identificamos <strong>com</strong><br />
127
128<br />
os vence<strong>do</strong>res, mas a história empilha os cadáveres <strong>do</strong>s nossos, <strong>do</strong>s<br />
venci<strong>do</strong>s. quem somos nós, os <strong>do</strong> Sul, mas que se vêem pelos olhos <strong>do</strong><br />
Norte? hoje, parece que tanta potência está re<strong>sul</strong>tan<strong>do</strong> em problemas,<br />
<strong>com</strong> os quais se torna difícil reconhecermo-nos nesse homem, e nossos<br />
caminhos parecem por vezes sem direção.<br />
<strong>Morin</strong>, de certa forma, nos convida a subir aos Alpes <strong>com</strong> Leonar<strong>do</strong>,<br />
trazen<strong>do</strong> alg<strong>um</strong>as coisas que nos permitam ver além <strong>do</strong>s fósseis "lança<strong>do</strong>s<br />
por Noé". E o que seria subir aos Alpes? quiçá visl<strong>um</strong>brar o mun<strong>do</strong><br />
de cima, <strong>do</strong> Norte, ou juntar a luz <strong>do</strong> Sul <strong>com</strong> a <strong>do</strong> Norte? Fico <strong>com</strong> a<br />
segunda opção, tentan<strong>do</strong> manchar as fronteiras. Mas, <strong>com</strong>o concretizar<br />
tempo e espaço sem contrastes? Como falar de ecologia se abraçamos<br />
árvores que ficam lá longe, enquanto o sistema de esgoto não existe<br />
para to<strong>do</strong>s, e quem dirá <strong>um</strong>a educação para to<strong>do</strong>s os homens?<br />
Presente em to<strong>do</strong>s os esta<strong>do</strong>s <strong>do</strong> Brasil, a instituição Serviço Social<br />
<strong>do</strong> Comércio (SESC), na qual trabalho, poderia contar ações que ilustram<br />
o <strong>pensamento</strong> de outro Sul, o Brasil, apesar de essa instituição ser<br />
"Norte" enquanto <strong>pensamento</strong> e ação em muitos lugares no país (ah!<br />
esse Norte que nos persegue <strong>com</strong>o se, não tentan<strong>do</strong> sê-lo, só nos restasse<br />
ser Sul). Mas foi no Pará (região Norte <strong>do</strong> Brasil, Sul <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> ocidental)<br />
que conheci <strong>um</strong> bombeiro militar, Anderson, que vive na cidade<br />
de Inhangapi (Pará). Esse homem participava de <strong>um</strong>a semana de estu<strong>do</strong>s<br />
pedagógicos <strong>do</strong> SESC, junto <strong>com</strong> professores de Educação Infantil,<br />
Ensino Fundamental, Educação de Jovens e Adultos, enfim, atividades<br />
desenvolvidas por aquela instituição. Ele faz parte de <strong>um</strong> projeto chama<strong>do</strong><br />
Criança Cidadã, <strong>um</strong>a parceria entre a prefeitura local e o SESC,<br />
na tentativa de recolocar crianças em situação de risco, forman<strong>do</strong>-as<br />
guardas ambientais mirins, cuja ação é mais ecológica: "Nossa sorte é<br />
que temos a floresta e o rio", ele diz, lembran<strong>do</strong> que to<strong>do</strong>s na cidade<br />
vivem nessa fronteira. E o bombeiro me conta, <strong>com</strong> aquele jeito manso<br />
e sábio, que eles vão para a floresta <strong>com</strong> os meninos, acampam, removem<br />
obstáculos (árvores grandes caídas), trabalham juntos e contam<br />
histórias ao re<strong>do</strong>r de fogueiras. E os outros meninos da cidade, que não<br />
fazem parte <strong>do</strong> projeto, ao passarem por ele, dizem <strong>com</strong> intimidade:<br />
"Ei, professor Anderson!". "que coisa mais Sul", talvez dirá <strong>Morin</strong>, buscan<strong>do</strong><br />
esse homem por aqui mais h<strong>um</strong>ano. Mas, eu penso, "que coisa<br />
mais bacana é trabalhar junto durante o dia e ouvir histórias à noite.<br />
Eis que a narrativa não morreu, Benjamin!". Ainda podemos ser homens<br />
que <strong>com</strong>partilham histórias, sonhos, desejos e me<strong>do</strong>s. E vivermos <strong>um</strong>a<br />
experiência coletiva, que faz de <strong>um</strong> bombeiro militar <strong>um</strong> professor de<br />
meninos que ainda não são seus alunos.
Tal <strong>com</strong>o o bombeiro que vem estudar vygotsky <strong>com</strong>igo, e anda na<br />
mata <strong>com</strong> os meninos, e me leva <strong>com</strong> ele, os Alpes não são mais os mes-<br />
mos. Já podem ser notadas mudanças ocorridas em pelo menos trinta<br />
milhões de anos, dizem os cientistas. Estão mais baixos, menores, o gelo<br />
lima as pedras, cria <strong>um</strong>a nova paisagem. Será que precisaremos de mais<br />
trinta milhões de anos para que outro continente se choque <strong>com</strong> a Europa<br />
e mova novamente a Terra, mudan<strong>do</strong> de lugar a parte antiga, que fica<br />
por cima, e a nova, que fica por baixo, n<strong>um</strong>a situação que parece magia?<br />
Ou será melhor seguir <strong>com</strong> Leonar<strong>do</strong> e <strong>com</strong> o bombeiro Anderson, curiosos<br />
e encanta<strong>do</strong>s <strong>com</strong> <strong>um</strong>a arca de Noé, que deixa cair os seres <strong>do</strong> mar<br />
por sobre as montanhas geladas da Suíça, e <strong>com</strong> <strong>um</strong>a floresta e <strong>um</strong> rio,<br />
para podermos estar mais próximos e <strong>com</strong>partilhar histórias?<br />
REFERÊNCIAS<br />
BENJAMIN, Walter. Obras escolhidas I: Magia e técnica, arte e política: ensaios<br />
sobre literatura e história da cultura. 7. ed. São Paulo: Brasiliense, 1996.<br />
BENJAMIN, Walter. Obras escolhidas II: Rua de mão única. 5. ed. São Paulo:<br />
Brasiliense, 2000.<br />
DAMATTA, Roberto. A casa e a rua: espaço, cidadania, mulher e norte no Brasil. São<br />
Paulo: Brasiliense, 1985.<br />
MORIN, <strong>Edgar</strong>. <strong>Para</strong> <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul. 2010. Mimeografa<strong>do</strong>.<br />
129
130<br />
MIRANDA,<br />
DANIlO sANtOs De<br />
Diretor <strong>do</strong> Serviço Social <strong>do</strong> Comércio (SESC) em São Paulo.<br />
Especialista em Ação Cultural, forma<strong>do</strong> em Filosofia e Ciências<br />
Sociais, realizou estu<strong>do</strong>s <strong>com</strong>plementares de especialização<br />
na Pontifícia Universidade Católica, na Fundação Getúlio<br />
Vargas de São Paulo e no Management Development Institute<br />
(Imede), de Lausanne, Suíça. Foi presidente <strong>do</strong> Comitê Diretor<br />
<strong>do</strong> Fór<strong>um</strong> Cultural Mundial, em 2004. Atua <strong>com</strong>o Conselheiro<br />
em diversas entidades, entre as quais: Fundação Itaú Cultural,<br />
Museu de Arte Moderna de São Paulo e Movimento Nossa<br />
São Paulo. É membro da Art for the World, <strong>com</strong> sede na<br />
Suíça. Atualmente é vice-presidente continental da Federação<br />
Internacional de Esportes para to<strong>do</strong>s (FISPT), vice-presidente<br />
da Associação Latino-Americana de Lazer e Tempo Livre. Foi<br />
presidente <strong>do</strong> <strong>com</strong>issaria<strong>do</strong> brasileiro <strong>do</strong> Ano da França no<br />
Brasil em 2009 e presidente regional (América Latina e Caribe)<br />
<strong>do</strong> Conselho Internacional de Bem-Estar Social (ICSW),<br />
2008-2010. Nos últimos anos tem participa<strong>do</strong> ativamente<br />
<strong>com</strong>o conferencista em eventos nacionais e internacionais e<br />
foi agracia<strong>do</strong> <strong>com</strong> homenagens de reconhecimento ao seu<br />
desempenho em favor da cultura.
considerações<br />
sobre <strong>Edgar</strong><br />
<strong>Morin</strong> e a<br />
defesa de <strong>um</strong><br />
<strong>pensamento</strong><br />
<strong>do</strong> Sul<br />
A modernidade tem si<strong>do</strong> <strong>um</strong> problema para diferentes filósofos e pensa<strong>do</strong>res<br />
sociais. De hegel a Max Weber, diferentes interpretações trataram<br />
da interrelação entre a razão ocidental e a modernidade, consideran<strong>do</strong><br />
sua extensão nos núcleos organiza<strong>do</strong>res da empresa capitalista<br />
e <strong>do</strong> aparelho burocrático de Esta<strong>do</strong>; elaboran<strong>do</strong> e reelaboran<strong>do</strong> seus<br />
vínculos na atualidade até o limite das teses contrárias, que puderam<br />
forjar novas concepções <strong>com</strong>o a de pós-modernidade. As teorias da modernização,<br />
<strong>com</strong> abordagem econômica, política e sociocultural, buscaram<br />
identificar na ordenação <strong>do</strong>s países industrializa<strong>do</strong>s os fatores sociais<br />
e institucionais que teriam si<strong>do</strong> responsáveis pelo desenvolvimento<br />
para que, <strong>com</strong>o teoria ou conhecimento instr<strong>um</strong>entaliza<strong>do</strong>, pudessem,<br />
inclusive, ser aplica<strong>do</strong>s em países ditos subdesenvolvi<strong>do</strong>s ou <strong>do</strong> terceiro<br />
mun<strong>do</strong>. Com características referidas aos processos que se ac<strong>um</strong>ularam<br />
e internamente foram reforça<strong>do</strong>s a partir <strong>do</strong> desenvolvimento das forças<br />
produtivas, da formação de capital e mobilização de recursos, <strong>do</strong> a<strong>um</strong>ento<br />
da produtividade <strong>do</strong> trabalho, da formação de identidades nacionais,<br />
<strong>do</strong>s direitos de participação política e das formas de vida urbana e<br />
escolarização, as teorias da modernização conceberam, em sua maioria,<br />
as diferenças sociais <strong>com</strong>o estágios de <strong>um</strong> percurso histórico, cuja etapa<br />
131
132<br />
superior culminaria <strong>com</strong> o padrão ocidental da sociedade europeia, en-<br />
tão moderna e desenvolvida.<br />
Além dessas configurações estabelecidas e já diante de determinadas<br />
revisões sociológicas, a teoria da modernização também entende que,<br />
em da<strong>do</strong> momento histórico, a modernidade separa-se de suas origens<br />
europeias e das referências históricas <strong>do</strong> racionalismo ocidental para<br />
criar <strong>um</strong> padrão estiliza<strong>do</strong>, sem tempo e lugar, a ser apropria<strong>do</strong> <strong>com</strong>o<br />
parâmetro para os processos de desenvolvimento social em geral. vista<br />
desse ângulo, a modernização social alcançou <strong>um</strong>a existência autônoma,<br />
<strong>com</strong> processos que podem ser relativiza<strong>do</strong>s, tenden<strong>do</strong> a ser a<strong>do</strong>tada<br />
<strong>com</strong>o <strong>um</strong>a lógica, sobretu<strong>do</strong> em tempos de globalização, <strong>com</strong> assertivas<br />
e proposições, ou, ainda, <strong>com</strong>o ethos.<br />
Na direção da <strong>com</strong>preensão da modernidade e <strong>do</strong>s processos da dita<br />
modernização, <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong>, de acor<strong>do</strong> <strong>com</strong> sua trajetória intelectual, tem<br />
postula<strong>do</strong> a necessidade de <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>com</strong>plexo, visto que a fragmentação<br />
<strong>do</strong> conhecimento, <strong>com</strong>o des<strong>do</strong>bramento dessa dinâmica expansionista,<br />
que cresce por meio da segmentação técnica, tem mina<strong>do</strong> o<br />
entendimento <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> e das coisas, sujeita<strong>do</strong> saberes e fazeres e, ainda,<br />
impedi<strong>do</strong> que a transdisciplinaridade se estabeleça <strong>com</strong>o racionalidade.<br />
De outro mo<strong>do</strong>, e diante da produção de saberes cada vez mais especializa<strong>do</strong>s<br />
e mais distantes <strong>do</strong>s grandes temas <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, da vida, <strong>do</strong> planeta<br />
e da h<strong>um</strong>anidade, o autor tem busca<strong>do</strong> unir a cultura das h<strong>um</strong>anidades<br />
à cultura científica, fazen<strong>do</strong> <strong>com</strong> que ambas dialoguem, reavivan<strong>do</strong> as<br />
conexões e virtudes cognitivas entre as artes, literatura, ciência e poesia.<br />
Mas o princípio de conjunção, defendi<strong>do</strong> por <strong>Morin</strong>, apresenta-se de<br />
forma sistematizada também nos estu<strong>do</strong>s <strong>do</strong> início da década de 1990<br />
denomina<strong>do</strong>s O méto<strong>do</strong>, em que o autor propõe não <strong>um</strong> manifesto de desconstrução<br />
<strong>do</strong> méto<strong>do</strong> científico, <strong>com</strong>o Paul Feyerabend e Imre Lakatos,<br />
mas novas formas de <strong>com</strong>preensão <strong>do</strong> h<strong>um</strong>ano em suas determinantes<br />
universais bio-psico-sócio-culturais; delinean<strong>do</strong> <strong>um</strong>a meto<strong>do</strong>logia libertária<br />
capaz de abrigar, entre outros aspectos ditos contraditórios, o senso<br />
<strong>com</strong><strong>um</strong> menospreza<strong>do</strong> e a norma culta. Mas a religação de sonhos, mitos,<br />
saberes e fazeres tradicionais na meto<strong>do</strong>logia <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>com</strong>plexo é<br />
apreensível em <strong>um</strong> terreno de flexibilidade e sem os rigores que marcam<br />
o méto<strong>do</strong> científico, propriamente.<br />
Nesse antiméto<strong>do</strong>, por assim dizer, pode-se perceber <strong>com</strong>o <strong>um</strong> "<strong>pensamento</strong><br />
<strong>do</strong> Sul" está esboça<strong>do</strong> e implica os pressupostos para a convergência<br />
de to<strong>do</strong>s os <strong>pensamento</strong>s e para <strong>um</strong>a "maneira radicalmente <strong>com</strong>plexa de<br />
pensar". No vol<strong>um</strong>e Iv de O méto<strong>do</strong> — As ideias (a organização das ideias —
noologia), <strong>Morin</strong> defende, por exemplo, a linguagem natural 5 de diferentes<br />
sociedades, em contraposição aos postula<strong>do</strong>s científicos que defendem a<br />
linguagem formalizada <strong>com</strong>o instr<strong>um</strong>ento mais <strong>com</strong>petente para o desenvolvimento<br />
<strong>do</strong> <strong>pensamento</strong>. Nesse exemplo, o autor refuta o formalismo, inclusive<br />
citan<strong>do</strong> Roman Jakobson e Blaise grize em suas ponderações sobre<br />
a inferioridade da linguagem formal e seus impedimentos à capacidade de<br />
invenção, imaginação e criação h<strong>um</strong>anas.<br />
Na sintonia de <strong>um</strong>a resistência e optan<strong>do</strong> por outras vias de transformação<br />
da fragmentação, da especialização e da "disciplinarização"<br />
<strong>do</strong> conhecimento, formas também presentes na educação fundamental<br />
e universitária, o autor tem reforça<strong>do</strong> a abordagem sobre <strong>pensamento</strong>s<br />
hegemônicos e sujeita<strong>do</strong>s, ilustra<strong>do</strong>s nessa oportunidade, <strong>com</strong>o os <strong>pensamento</strong>s<br />
<strong>do</strong> Norte e <strong>do</strong> Sul, geograficamente relativos.<br />
O <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul é <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> em potencial, a ser elabora<strong>do</strong> a<br />
partir de premissas extraídas <strong>do</strong>s diferentes "suis" <strong>do</strong> planeta, sem submetê-las,<br />
no entanto, a <strong>um</strong>a concepção única, <strong>com</strong>o pretende o <strong>pensamento</strong><br />
<strong>do</strong> Norte diante da necessidade de ordenar o que lhe parece fora da ordem<br />
e de onde parecem se destacar apenas o atraso e o subdesenvolvimento.<br />
Em sua progressão globalizante, o <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Norte avança na direção<br />
de "devorar", conforme <strong>Morin</strong>, os "suis". Diante disso, o potencial <strong>pensamento</strong><br />
<strong>do</strong> Sul deve ser fortaleci<strong>do</strong> por meio da proteção das culturas locais,<br />
suas "artes de viver, saber e fazer", para que possa, sem rejeitar certos ditames<br />
e virtudes <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Norte, criticá-los, na medida da necessidade<br />
de sua autoelaboração enquanto <strong>pensamento</strong> <strong>com</strong>plexo e de ligação.<br />
Por meio da proposta de elaboração de <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul, o autor<br />
recusa a abreviação de <strong>um</strong> <strong>com</strong>plexo a <strong>um</strong> de seus elementos, <strong>com</strong>o<br />
seria a diversidade rica em tradições culturais e aspectos da realidade<br />
de diferentes "suis" reduzida a <strong>um</strong>a de suas imperfeições sociais, <strong>com</strong>o a<br />
violência, a corrupção ou os conflitos gera<strong>do</strong>s no cotidiano.<br />
Nesse senti<strong>do</strong>, retrata as possíveis contribuições <strong>do</strong> Mediterrâneo para<br />
a elaboração de princípios capacita<strong>do</strong>s à conjunção, desde a Antiguidade.<br />
<strong>Para</strong> tanto, refere-se à diversidade politeísta <strong>do</strong>s faraós, no Egito, destacan<strong>do</strong><br />
a unidade dada pela supremacia divina <strong>do</strong> deus-sol, passan<strong>do</strong> pelo monoteísmo<br />
<strong>do</strong> cristianismo, <strong>do</strong> islamismo e <strong>do</strong> judaísmo, <strong>com</strong>o elemento que<br />
desponta na <strong>com</strong>preensão da unidade e universalidade h<strong>um</strong>anas, retomadas<br />
no Renascimento, que, a exemplo da democracia ateniense, oferece o debate<br />
<strong>com</strong>o meio para a sabe<strong>do</strong>ria, reaniman<strong>do</strong> a vontade de reflexão sobre o<br />
mun<strong>do</strong>, essa grande herança que nos permite, ainda hoje, problematizar a<br />
vida, o cosmos e a natureza.<br />
5. Linguagens naturais são as linguagens <strong>com</strong>uns aos membros de <strong>um</strong>a cultura e as linguagens correntes que servem aos<br />
diversos usos da vida cotidiana (MORIN, 2000, p. 214).<br />
133
134<br />
Do h<strong>um</strong>anismo, o autor critica a arrogante crença da supremacia h<strong>um</strong>a-<br />
na diante da natureza, enaltecen<strong>do</strong> sua outra face, que valoriza e dignifica<br />
o ser h<strong>um</strong>ano, hoje na condição de integrar a "<strong>com</strong>unidade de destino" na<br />
era planetária. Mas, diante <strong>do</strong> h<strong>um</strong>anismo que dignifica, é necessário problematizar<br />
a própria razão, entenden<strong>do</strong>-a não <strong>com</strong>o <strong>um</strong> bloco hegemônico<br />
de ideias e <strong>pensamento</strong>s fecha<strong>do</strong>s, mas <strong>com</strong>o racionalidade aberta, que<br />
reconhece seus limites no desvendamento <strong>do</strong>s mistérios <strong>do</strong> universo.<br />
Das críticas feitas à racionalidade especializada e dividida em muitos<br />
setores, destaca-se o imperativo da regeneração crítica, particularmente<br />
da autocrítica. Dito isso, o autor propõe a mistura das heranças culturais<br />
mediterrâneas <strong>com</strong> as <strong>sul</strong>-americanas e africanas, para delas extrair sua<br />
"verdade profunda", a que nos reunirá à "nova consciência ecológica" e<br />
à solidariedade, capazes de frear a degradação mundial estimulada pelo<br />
Norte, integran<strong>do</strong> os diversos conhecimentos sobre a vida e a natureza,<br />
sem sobrepujança e destruição.<br />
A civilização caminha, hoje, em meio à crise. Crise da razão, da ocidentalização<br />
e da mundialização. O projeto <strong>do</strong> progresso ilimita<strong>do</strong> diante da<br />
abundância de recursos e matérias-primas há décadas demonstra sua inviabilidade.<br />
São rechaça<strong>do</strong>s, sobretu<strong>do</strong> pelo Norte, os trata<strong>do</strong>s e acor<strong>do</strong>s<br />
globais para minimizar o impacto sobre a natureza e as condições climáticas<br />
nessa atual fase <strong>do</strong> modelo econômico de enriquecimento <strong>do</strong>s países.<br />
De outro la<strong>do</strong>, quanto mais se promove a unificação técnico-econômica<br />
<strong>do</strong> planeta, tanto mais se dão reações de desagregação socioculturais e<br />
étnicas. uniformidade prostran<strong>do</strong> a diversidade e isolamento defensivo<br />
são re<strong>sul</strong>ta<strong>do</strong>s in<strong>com</strong>patíveis <strong>com</strong> os desígnios que nos levariam à unidade<br />
na diversidade. unidade que não pode ser apenas econômica, pois, a<br />
unidade econômica não realizará a <strong>com</strong>plexa unidade h<strong>um</strong>ana na diversidade,<br />
assim <strong>com</strong>o o isolamento defensivo das etnias e culturas diversas<br />
não produzirão a solidariedade e a responsabilidade, vitais ao século xxI.<br />
Como o <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Norte não aceita e não entende a realidade<br />
e a sinergia <strong>do</strong> Sul, simplesmente os desconsidera. A lógica <strong>do</strong> Norte é a<br />
prosa que faz sobreviver <strong>com</strong> eficácia, ordem e coerência. "A prosa é o<br />
que fazemos por obrigação, por imposição, para ganhar nossa vida", diz<br />
<strong>Morin</strong> (2010). <strong>Para</strong> viver é preciso mais. é preciso poiesis. é preciso amor,<br />
poesia e sabe<strong>do</strong>ria, que são <strong>com</strong>plementares e faces <strong>do</strong> mesmo h<strong>um</strong>anismo.<br />
A sabe<strong>do</strong>ria, nesse senti<strong>do</strong>, precisa ser integrada sem ser imperativa,<br />
permitin<strong>do</strong> a "arte de viver" da hospitalidade, da <strong>com</strong>unicação,<br />
da alegria, <strong>do</strong>s afetos em sua manifestação lúdica e estética. Pois viver<br />
significa poder desfrutar <strong>do</strong> extraordinário entenden<strong>do</strong>, a importância<br />
da realização em si e por si.
Segun<strong>do</strong> <strong>Morin</strong>, ao recusarmos o <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Norte, recusamos<br />
suas vicissitudes, seu niilismo, suas sutilezas de controle e de aprisionamento.<br />
Nessa medida, dá-se poder (empowerment) ao <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong><br />
Sul para que possa resistir, fazen<strong>do</strong>-se lembrar <strong>do</strong> que é feita a vida, e<br />
<strong>com</strong>o o belo e o sonho estão sempre a povoá-la.<br />
Como <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> que potencialmente liga o que está cindi<strong>do</strong> e<br />
disperso, o <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul está mais propenso a problematizar as<br />
questões e o repto fundamental de nosso tempo, para os quais a ciência,<br />
a filosofia e a política estão em silêncio.<br />
Ao reconhecer e defender os valores pouco utilitários da vida, debaten<strong>do</strong><br />
e questionan<strong>do</strong> os excessos que são <strong>com</strong>eti<strong>do</strong>s contra a vida<br />
<strong>com</strong><strong>um</strong> no planeta, parece caber ao <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul a missão de legitimar,<br />
de fato, aspectos vitais, valores e ideais que desafiem e desconstruam<br />
a pre<strong>do</strong>minância <strong>do</strong> cons<strong>um</strong>o <strong>com</strong>o senti<strong>do</strong> imperativo da vida.<br />
A condição h<strong>um</strong>ana, nesse patamar civilizatório, depende de <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong><br />
reforma<strong>do</strong>r capaz de a judá-la a escapar das armadilhas criadas<br />
pelos processos descontrola<strong>do</strong>s origina<strong>do</strong>s pela busca de eficácia<br />
voltada a interesses parciais, pouco ou nada coletivos; capaz de propor<br />
alternativas para <strong>um</strong> projeto histórico de educação para a cidadania planetária,<br />
<strong>com</strong> poder de redimensionar o que é prioritário hoje e no futuro.<br />
Elegen<strong>do</strong> a educação <strong>com</strong>o princípio de unidade para as atuais e futuras<br />
gerações, redefine-se parte de seus propósitos não utilitários e as possibilidades<br />
de transformação para a vida coletiva na <strong>com</strong>plexidade. Mais<br />
educação, cujos saberes possam ser ministra<strong>do</strong>s de diferentes maneiras<br />
e por diversas instituições. Desse mo<strong>do</strong>, e ass<strong>um</strong>in<strong>do</strong> a responsabilidade<br />
por sociedades educativas, elaboraremos novos e possíveis caminhos<br />
para garantir o senti<strong>do</strong> da diversidade na unidade, <strong>com</strong>o propõe <strong>Morin</strong>.<br />
Assim, e nesse foro a ser promovi<strong>do</strong>, esperamos que as propostas<br />
para <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul permitam boas oportunidades de fortalecimento<br />
de <strong>um</strong> <strong>do</strong>s últimos territórios potencialmente subsistentes à uniformidade<br />
orientada pelos padrões técnico-eficientes <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong><br />
hegemônico. E que possa conduzir nossa criatividade <strong>com</strong>o <strong>um</strong> arquétipo<br />
à espera de sua realização e configuração.<br />
REFERÊNCIAS<br />
MORIN, E. Amor, poesia e sabe<strong>do</strong>ria. São Paulo: Bertrand Brasil, 1998.<br />
MORIN, E. <strong>Para</strong> <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul. 2010. Mimeografa<strong>do</strong>.<br />
MORIN, E. A re-ligação <strong>do</strong>s saberes. São Paulo: Bertrand Brasil, 2001.<br />
135
136<br />
Doutora em Educação pela PUC-SP e mestre pelo Instituto de<br />
Pesquisas Espaciais (INPE/CNPq). Atualmente é professora<br />
de Pós-Graduação em Educação da Universidade Católica<br />
de Brasília-DF. É também pesquisa<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> CNPq e <strong>do</strong> grupo<br />
Giad/DOE/UB; coordena<strong>do</strong>ra-adjunta da Rede Internacional<br />
de Ecologia <strong>do</strong>s Saberes, da Universidade de Barcelona. Foi<br />
professora <strong>do</strong> Programa de Pós-Graduação em Educação da<br />
PUC-SP, de 1997 a 2008. Con<strong>sul</strong>tora e conferencista nacional<br />
e internacional. Foi pesquisa<strong>do</strong>ra-visitante da OEA, em<br />
Washington, e con<strong>sul</strong>tora <strong>do</strong> Banco Mundial. Autora de vários<br />
livros, entre eles, O paradigma educacional emergente e<br />
Pensamento ecossistêmico, ambos <strong>com</strong> chancela da Unesco;<br />
Ecologia <strong>do</strong>s saberes: <strong>com</strong>plexidade, transdisciplinaridade e<br />
educação: novos fundamentos para reencantar a educação<br />
e Complexidade, transdisciplinaridade em educação: teoria<br />
e prática <strong>do</strong>cente. É Coordena<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> grupo de pesquisa<br />
Ecotransd/CNPq.
contribuições<br />
"<strong>Para</strong> <strong>um</strong><br />
<strong>pensamento</strong><br />
<strong>do</strong> Sul"<br />
vários são os temas emergentes que o texto "<strong>Para</strong> <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong><br />
Sul", de <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong> (2010), nos inspira. Entretanto, em função da solicitação<br />
feita, selecionaremos apenas alguns aspectos.<br />
<strong>Morin</strong>, ao finalizar seu texto, observa que "quan<strong>do</strong> <strong>um</strong> sistema não é<br />
capaz de tratar seus problemas vitais e fundamentais, ele se desintegra,<br />
ou então, é capaz de se metamorfosear, de engendrar <strong>um</strong> metassistema<br />
mais rico que possa tratar esses problemas" (MORIN, 2010, p. 15). Entendemos<br />
que a crise de obsolescência da educação brasileira requer<br />
a busca imediata de novos caminhos, de <strong>um</strong> novo metassistema, mais<br />
rico e <strong>com</strong>petente para tratar os problemas mais prementes. é <strong>um</strong>a crise<br />
pautada na baixa qualidade da educação oferecida, na falta de profissionalização<br />
<strong>do</strong>cente, associada a <strong>um</strong>a total desmotivação por parte<br />
de alunos e professores, ao desinteresse e des<strong>com</strong>promisso <strong>do</strong> aluna<strong>do</strong><br />
<strong>com</strong> a educação recebida, à falta de segurança e à violência nas escolas,<br />
aos problemas de ordem emocional que vem afetan<strong>do</strong> alunos e<br />
professores, tu<strong>do</strong> isso influencia<strong>do</strong> também pelas questões de natureza<br />
econômica e social.<br />
137
138<br />
Assim, acreditamos que é urgente e necessário ressignificar o paradig-<br />
ma educacional vigente a partir de <strong>um</strong> novo metassistema, mais rico e sig-<br />
nificativo, para tratar a problemática.<br />
Isso porque entendemos que a crise educacional atual é de natureza<br />
paradigmática, envolven<strong>do</strong>, portanto, aspectos ontológicos, epistemológicos<br />
e meto<strong>do</strong>lógicos <strong>do</strong> fazer em educação. é fruto de <strong>um</strong>a crise muito<br />
mais ampla, que envolve também outros aspectos, relaciona<strong>do</strong>s não<br />
apenas ao indivíduo, mas também à sociedade e ao planeta, <strong>com</strong>o <strong>um</strong><br />
to<strong>do</strong>. Assim, não podemos continuar oferecen<strong>do</strong> <strong>um</strong> conjunto de práticas<br />
formalistas e fragmenta<strong>do</strong>ras da realidade, das dimensões <strong>do</strong> ser, <strong>do</strong> conhecer<br />
e <strong>do</strong> fazer, que vem <strong>com</strong>prometen<strong>do</strong> a qualidade da educação e<br />
o desenvolvimento integral <strong>do</strong> aluno, dificultan<strong>do</strong>, assim, seu acoplamento<br />
estrutural <strong>com</strong> a realidade. é <strong>um</strong>a prática educacional arrogante e prepotente,<br />
de natureza positivista, que ignora a subjetividade h<strong>um</strong>ana, as<br />
emergências cognitivo-emocionais e auto-eco-organiza<strong>do</strong>ras ocorrentes<br />
em sala de aula, e que continua culpan<strong>do</strong> nossas crianças e jovens por não<br />
ass<strong>um</strong>irem suas próprias dificuldades e in<strong>com</strong>petências. Tais propostas<br />
vêm provocan<strong>do</strong> sofrimento no aluno, tanto o de educação básica, <strong>com</strong>o<br />
média, tecnológica ou superior, ao oferecer práticas contrárias às suas necessidades<br />
vitais, que negam sua maneira de pensar, sentir, conhecer, se<br />
expressar, ignoran<strong>do</strong> suas emoções, seus sentimentos e afetos. São práticas<br />
fundamentadas em belas teorias e planos pedagógicos aparentemente<br />
inova<strong>do</strong>res, mas ontológica e epistemologicamente equivocadas,<br />
ao separar mente e corpo, vida e educação, não ten<strong>do</strong> nada a ver <strong>com</strong> o<br />
que acontece na sala de aula.<br />
Ao separar aprendizagem e vida, vida e educação, além de dificultar o<br />
acoplamento estrutural <strong>do</strong> sujeito aprendente <strong>com</strong> sua realidade, tais práticas<br />
prejudicam o desenvolvimento <strong>do</strong>s processos de autoria e de autonomia<br />
<strong>do</strong>s alunos, bem <strong>com</strong>o a possibilidade de sua emancipação e inserção<br />
social, <strong>com</strong>prometen<strong>do</strong> a relação <strong>do</strong> indivíduo <strong>com</strong> o seu meio e <strong>com</strong> o triângulo<br />
da vida, representa<strong>do</strong> pelas relações indivíduo-natureza-sociedade.<br />
Mas, qual é o problema? Por que abordar essa questão neste espaço de<br />
interlocução tão privilegia<strong>do</strong>?<br />
é que tais inquietudes e dificuldades vêm provocan<strong>do</strong> <strong>do</strong>r e sofrimento<br />
nos alunos ao atingir o âmago <strong>do</strong> processo de construção <strong>do</strong> conhecimento<br />
e ao dificultar seus processos de desenvolvimento integral<br />
e sua inserção social. Sabemos que to<strong>do</strong> conhecer é inseparável <strong>do</strong> ser,<br />
<strong>do</strong> fazer e <strong>do</strong> viver/conviver. é, portanto, inseparável da ontogenia <strong>do</strong>s<br />
sujeitos aprendentes, inseparável de seus processos de desenvolvimento,<br />
em <strong>um</strong> senti<strong>do</strong> mais amplo.
Em realidade, e concordan<strong>do</strong> <strong>com</strong> Nize Pellanda (2008), estamos ofe-<br />
recen<strong>do</strong> <strong>um</strong>a prática educacional ontologicamente esquizofrênica 6 e epis-<br />
temologicamente, no mínimo, equivocada, sem senti<strong>do</strong> e significa<strong>do</strong> para<br />
o aluno. Nas escolas, o prazer e a alegria continuam fora da sala de aula,<br />
habitan<strong>do</strong> o recreio e outros espaços de convivência escolar. Por sua vez,<br />
o sofrimento e a insatisfação discente, entre outras causas, vêm também<br />
provocan<strong>do</strong>, <strong>com</strong>o nunca antes, o estresse e o sofrimento <strong>do</strong>cente, cujos<br />
da<strong>do</strong>s recentemente divulga<strong>do</strong>s são absolutamente alarmantes. 7 Tu<strong>do</strong> isso<br />
nos revela que estamos viven<strong>do</strong> <strong>um</strong>a situação de caos e obsolescência na<br />
educação brasileira. E mais, que os <strong>do</strong>centes também estão participan<strong>do</strong><br />
<strong>com</strong>o vítimas dessa tragédia nacional. Ora, o que leva <strong>um</strong> trabalho tão significativo<br />
e meritório a ser tão desgastante e sofri<strong>do</strong>? quais são os problemas<br />
de ordem emocional que vêm afetan<strong>do</strong> professores e alunos?<br />
<strong>um</strong> segun<strong>do</strong> aspecto importante a ser <strong>com</strong>enta<strong>do</strong> é a observação<br />
feita por <strong>Morin</strong> (2010, p. 8) de que "o <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong>minante <strong>do</strong> Norte é<br />
basea<strong>do</strong> na redução <strong>do</strong> <strong>com</strong>plexo ao simples e na disjunção, ou seja, na<br />
separação <strong>do</strong> que, na verdade, é inseparável. (...) As especializações das<br />
disciplinas fechadas, estranhas <strong>um</strong>as às outras, desemboca no prima<strong>do</strong><br />
de <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> que se torna míope, que isola os objetos de seus contextos<br />
e de seus laços naturais".<br />
O mesmo acontece <strong>com</strong> a nossa educação, que continua apoiada em<br />
<strong>um</strong>a visão reducionista, fragmentada e unidimensional da realidade, em<br />
<strong>um</strong>a cultura escolar que dificulta a aprendizagem, que exclui a subjetividade<br />
e fragmenta a multidimensionalidade h<strong>um</strong>ana, a intersubjetividade<br />
presente nos processos de construção <strong>do</strong> conhecimento, negan<strong>do</strong> a interferência<br />
de <strong>um</strong>a realidade social que precisa ser reconhecida e melhor trabalhada.<br />
Ela continua apoiada em <strong>um</strong>a visão de realidade falsamente objetiva<br />
e independente <strong>do</strong> aprendiz. Ora, ensina<strong>do</strong>s por <strong>Morin</strong> (1996), sabemos que<br />
"erros ontológicos levam a erros epistemológicos e meto<strong>do</strong>lógicos", inauguran<strong>do</strong><br />
e alimentan<strong>do</strong> <strong>um</strong> anel defeituoso, gera<strong>do</strong>r de <strong>um</strong> ensino também<br />
defeituoso e de <strong>um</strong>a prática pedagógica esquizofrênica que, além de não<br />
reconhecer a multidimensionalidade h<strong>um</strong>ana, deixa prevalecer a ausência<br />
de cuida<strong>do</strong>, de carinho e ternura, de sensibilidade em relação aos vínculos<br />
escolares, provocan<strong>do</strong> a emergência <strong>do</strong> individualismo, debilidade das relações,<br />
insegurança, me<strong>do</strong> e depressão.<br />
Toda essa problemática exige, portanto, <strong>um</strong> quadro ontológico, epistemológico<br />
e meto<strong>do</strong>lógico mais amplo e profun<strong>do</strong>, capaz de promover mu-<br />
6. Esquizo, em grego, significa corta<strong>do</strong>; frenus significa inteligência.<br />
7. Ver Folha de São Paulo de 17 de outubro de 2010.<br />
139
140<br />
danças paradigmáticas e também programáticas em educação. Não pode-<br />
mos continuar trabalhan<strong>do</strong> em educação <strong>com</strong> <strong>um</strong>a inteligência cega que<br />
fragmenta e disjunta, mas <strong>com</strong> <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> e <strong>um</strong>a inteligência ecológica,<br />
capaz de religar as diferentes dimensões da vida <strong>com</strong> as diferentes<br />
dimensões constitutivas <strong>do</strong> ser h<strong>um</strong>ano.<br />
Necessitamos, portanto, de <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>com</strong>plexo, transdisciplinar<br />
e ecologizante, capaz de religar o que precisa ser religa<strong>do</strong>, de valorizar<br />
outros mo<strong>do</strong>s de conhecer a realidade, de integrar diferentes saberes, de<br />
reconhecer e trabalhar a multidimensionalidade h<strong>um</strong>ana.<br />
Já não podemos continuar repetin<strong>do</strong> saberes origina<strong>do</strong>s em outros continentes,<br />
em outros circuitos acadêmicos, considera<strong>do</strong>s <strong>com</strong>o sen<strong>do</strong> únicos<br />
e oficiais. Precisamos construir <strong>um</strong>a ciência e <strong>um</strong>a prática educacional fundada<br />
na <strong>com</strong>plexidade e na transdisciplinaridade, que levem em conta os<br />
diferentes níveis de realidade presentes nas salas de aula, que reconheçam<br />
a importância <strong>do</strong> contexto, <strong>do</strong> saber local dialogan<strong>do</strong> <strong>com</strong> o saber global,<br />
que reconheçam a importância da intuição feminina e a presença de <strong>um</strong>a<br />
racionalidade sensível, amorosa, atenta e cuida<strong>do</strong>sa. <strong>um</strong>a ciência que nasça<br />
<strong>do</strong> continente <strong>sul</strong>-americano e que leve em conta nossas raízes mestiças,<br />
nossa sensibilidade, nossa poesia e nossa criatividade, que considere<br />
significativas nossas experiências cotidianas e o valor intrínseco de nossa<br />
espiritualidade. <strong>um</strong>a pedagogia que dê maior atenção àquilo que está nas<br />
fronteiras disciplinares, atenção aos saberes <strong>do</strong>s alunos, que os considere<br />
<strong>com</strong>o referências cognitivas importantes, prenhes de experiência, vida, sabe<strong>do</strong>ria<br />
e aprendizagem. <strong>um</strong>a pedagogia que utilize a lógica <strong>do</strong> sensível,<br />
da intuição, da imaginação e da espiritualidade <strong>com</strong>o opera<strong>do</strong>res de <strong>um</strong><br />
pensar <strong>com</strong>plexo e transdisciplinar.<br />
Entretanto, <strong>um</strong> <strong>do</strong>s maiores problemas observa<strong>do</strong>s para se efetivar<br />
<strong>um</strong>a mudança paradigmática mais profunda em educação é a insuficiência<br />
da formação <strong>do</strong>cente recebida pelos professores e a dificuldade que a<br />
maioria tem para lidar <strong>com</strong> questões ontológicas e epistemológicas mais<br />
profundas e afeitas aos processos de construção <strong>do</strong> conhecimento decorrentes<br />
das práticas pedagógicas desenvolvidas, condição essencial para<br />
que ocorra a verdadeira inclusão daqueles que chegam à escola carregan<strong>do</strong><br />
as marcas da exclusão.<br />
Não é somente a igualdade de acesso que importa, mas também a qualidade<br />
<strong>do</strong>s processos desenvolvi<strong>do</strong>s, ou seja, a igualdade de condições vivenciadas<br />
nos processo de construção <strong>do</strong> conhecimento, que necessariamente<br />
tem que ser ecológico, social, justo, fraterno e solidário, <strong>com</strong>o quer Batalloso<br />
(2011). O conhecimento já não pode continuar sen<strong>do</strong> trabalha<strong>do</strong> de maneira<br />
fragmentada, desconecta<strong>do</strong> da realidade, sem senti<strong>do</strong> e significa<strong>do</strong> para
o sujeito aprendiz, a partir de <strong>um</strong> viés positivista, pois em vez de a escola<br />
ajudá-lo a superar barreiras, esse tipo de educação acaba crian<strong>do</strong> outros<br />
impedimentos para o aprendiza<strong>do</strong> <strong>do</strong> aluno em seus processos de emancipação<br />
e inclusão social.<br />
A escola que, entre outros aspectos, coloca a aprendizagem e a inclusão<br />
no centro de suas preocupações pedagógicas precisa trabalhar,<br />
simultaneamente, as cegueiras <strong>do</strong> conhecimento, a condição h<strong>um</strong>ana, o<br />
desenvolvimento da <strong>com</strong>preensão (MORIN, 2000), a partir de novas pautas<br />
educacionais nutridas por práticas pedagógicas capazes de restaurar<br />
o concreto, a existência, o afetivo em nossa vida, <strong>com</strong>o proposto por <strong>Edgar</strong><br />
<strong>Morin</strong> (2010), em seu texto "<strong>Para</strong> <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul". <strong>Para</strong> tanto, é<br />
preciso trabalhar <strong>um</strong> novo metassistema, mais rico e <strong>com</strong>petente, apoia<strong>do</strong><br />
em novas concepções <strong>do</strong>s processos de construção <strong>do</strong> conhecimento e nos<br />
opera<strong>do</strong>res cognitivos para <strong>um</strong> pensar <strong>com</strong>plexo, para que o aprendiz possa<br />
verdadeiramente entender a "insustentável <strong>com</strong>plexidade <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>" e<br />
da vida, a <strong>com</strong>plexidade da realidade, a incerteza presente na aprendizagem<br />
e no conhecimento, bem <strong>com</strong>o nas demais dimensões constitutivas da<br />
dinâmica da vida. E, nesse senti<strong>do</strong>, concordamos <strong>com</strong> <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong> ao dizer<br />
que o des<strong>do</strong>bramento <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul, no que se refere às implicações<br />
na área educacional, somente poderá ser <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> de natureza<br />
<strong>com</strong>plexa, ou seja, teci<strong>do</strong> em conjunto no seio das organizações educacionais<br />
e nutri<strong>do</strong> por <strong>um</strong>a nova lógica, a dialógica, a<strong>com</strong>panhada pelos opera<strong>do</strong>res<br />
cognitivos para <strong>um</strong> pensar <strong>com</strong>plexo.<br />
<strong>Para</strong> tanto, é fundamental cuidar <strong>do</strong>s processos de formação <strong>do</strong>s educa<strong>do</strong>res,<br />
catalisar mudança de mentalidade e novas atitudes no professora<strong>do</strong>,<br />
colaborar para a reforma <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong> (MORIN, 2000), mas <strong>um</strong>a<br />
reforma nutrida por <strong>um</strong> coração amoroso, sensível e solidário, capaz de restaurar<br />
a <strong>com</strong>paixão, curar a alma <strong>do</strong>cente e discente, professar a religião<br />
da solidariedade e da fraternidade para que, <strong>com</strong>o civilização, possamos<br />
seguir adiante. é <strong>um</strong>a reforma <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong> enriquecida de solidariedade<br />
e <strong>com</strong>prometimento social. Sem isso não conseguiremos sair <strong>do</strong> caos e<br />
da obsolescência em que se encontra a educação brasileira e reinventar o<br />
sopro criativo gera<strong>do</strong>r de vida, fé e esperança.<br />
QUESTÕES PRIORITÁRIAS A SEREM TRATADAS PELO PENSAMENTO DO<br />
SUL EM DIREÇÃO A UMA POLÍTICA DE CIVILIZAÇÃO<br />
Entendemos que <strong>um</strong>a das questões prioritárias em direção a <strong>um</strong>a política<br />
de civilização é a necessidade de <strong>um</strong>a consciência coletiva capaz de<br />
reconhecer que a ecologia se converteu no contexto de grande parte <strong>do</strong>s<br />
problemas atuais: da educação, da política, <strong>do</strong> processo industrial, da ur-<br />
141
142<br />
banização, da economia, <strong>do</strong> direito, da saúde e da reflexão filosófica e re-<br />
ligiosa (BOFF, 2011). Nossa atual crise civilizatória, de natureza ecológica,<br />
social, econômica, política e educacional, <strong>com</strong> incalculáveis e imprevisíveis<br />
consequências, vêm colocan<strong>do</strong> em risco a sobrevivência h<strong>um</strong>ana e a preservação<br />
da vida no planeta.<br />
Sua superação exige <strong>um</strong> novo esta<strong>do</strong> de consciência da h<strong>um</strong>anidade,<br />
no qual pre<strong>do</strong>mine a responsabilidade, a cooperação, a sensibilidade, a ternura<br />
e a fraternidade. Aos poucos, a h<strong>um</strong>anidade vem toman<strong>do</strong> consciência<br />
de que somos constituí<strong>do</strong>s pelos mesmos elementos físico-químicos e<br />
pela mesma energia e campos vibracionais constitutivos da mãe Terra e<br />
da qual, em realidade, não estamos separa<strong>do</strong>s. Ela está presente dentro<br />
de cada <strong>um</strong> de nós. Aos poucos, a h<strong>um</strong>anidade está se conscientizan<strong>do</strong><br />
de que somente é possível <strong>com</strong>preender verdadeiramente o ser h<strong>um</strong>ano<br />
a partir de seus processos de interdependência, de sua conexão <strong>com</strong> o<br />
processo universal, <strong>com</strong> os elementos materiais e energéticos mais sutis,<br />
<strong>com</strong>o partes da Terra e <strong>do</strong> Cosmo.<br />
Dessa forma, entendemos que <strong>um</strong>a política de civilização deve estar voltada,<br />
simultaneamente, para o ser h<strong>um</strong>ano e para as questões ecológicas,<br />
em direção a <strong>um</strong>a política de civilização planetária, preocupada <strong>com</strong> o desenvolvimento<br />
de <strong>um</strong>a consciência de caráter multidimensional e abrangente.<br />
Isso exige <strong>um</strong>a tomada de consciência, em termos de responsabilidade<br />
planetária, capaz de garantir os mesmos direitos a to<strong>do</strong>s os seres vivos,<br />
incluin<strong>do</strong> a mãe Terra.<br />
Essa mudança de consciência implica <strong>um</strong>a reforma <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong><br />
<strong>com</strong>o deseja<strong>do</strong> por <strong>Morin</strong>, nutrida por maior abertura <strong>do</strong> coração. Implica<br />
também a construção de <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> ecológico capaz de restabelecer<br />
as relações de ligação, de conexão, os processos de interdependência, reconhecen<strong>do</strong><br />
a mestiçagem <strong>do</strong>s processos e que tu<strong>do</strong> está em <strong>com</strong>unhão, condição<br />
fundamental para que possamos apurar nossos canais perceptivos e<br />
retomar nossos <strong>diálogos</strong> <strong>com</strong> a vida e <strong>com</strong> a realidade.<br />
Dessa forma, a prioridade de <strong>um</strong>a política de civilização deve, sem dúvida,<br />
ser a mesma prioridade da agenda educacional brasileira, não apenas<br />
no que se refere às questões relacionadas à aprendizagem e aos processos<br />
de construção de conhecimento, mas, simultaneamente, às questões afeitas<br />
à sustentabilidade ecológica, à cidadania planetária e ao restabelecimento<br />
<strong>do</strong>s vínculos <strong>com</strong> a Terra e <strong>com</strong> a vida. Mas, <strong>um</strong>a vida autossustentável, o<br />
que implica a busca <strong>do</strong> equilíbrio <strong>do</strong> sujeito consigo mesmo, <strong>com</strong> o outro<br />
e <strong>com</strong> o planeta, condição essencial para o exercício de <strong>um</strong>a democracia<br />
fundada na <strong>com</strong>plexidade das interrelações entre unidade e diversidade e<br />
<strong>com</strong>preensão das novas identidades emergentes.
Como educa<strong>do</strong>res, precisamos enfatizar a tessitura social, ecológica<br />
e planetária e <strong>com</strong>preender as interrelações de natureza ecossistêmica<br />
existentes entre os diferentes <strong>do</strong>mínios da natureza, perceben<strong>do</strong> a interdependência<br />
entre ambiente, ser h<strong>um</strong>ano, <strong>pensamento</strong> e processos de desenvolvimento.<br />
Precisamos enfatizar a existência de <strong>um</strong>a cooperação global<br />
natural, não apenas em relação aos processos cognitivo-emocionais,<br />
mas também no que se refere às escalas social, ecológica e planetária,<br />
entenden<strong>do</strong> que nossas demandas educacionais não estão separadas das<br />
demandas globais relacionadas ao triângulo da vida, ou seja, às relações<br />
indivíduo/sociedade/natureza.<br />
Ao concluir, ratificamos a importância de se ter <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> ecologizante<br />
capaz de contextualizar, relacionar, religar as diferentes dimensões<br />
h<strong>um</strong>anas <strong>com</strong> as diferentes dimensões que tecem a trama da vida. Tal <strong>pensamento</strong><br />
exige o rompimento <strong>com</strong> o paradigma tradicional, reducionista e<br />
fragmenta<strong>do</strong>r da realidade, em busca de novas explicações sobre o real<br />
e a natureza <strong>do</strong> que é cognoscível. Isso exige, portanto, a construção de<br />
<strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> ecologiza<strong>do</strong> em educação, <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> ecossistêmico<br />
(MORAES, 2004), nutri<strong>do</strong> pela <strong>com</strong>plexidade que tece <strong>um</strong>a nova ecologia<br />
de saberes (MORAES, 2008), para que, <strong>com</strong>o educa<strong>do</strong>res, possamos aprender<br />
a religar o que precisa ser religa<strong>do</strong>, <strong>com</strong>preender e atuar sobre a realidade<br />
a partir <strong>do</strong> exercício de <strong>um</strong>a nova consciência planetária, apoiada em<br />
princípios éticos centra<strong>do</strong>s no respeito à vida, ao ser h<strong>um</strong>ano e à natureza.<br />
Essa é <strong>um</strong>a das condições necessárias para a preparação das futuras<br />
gerações para <strong>um</strong> novo diálogo <strong>do</strong> indivíduo <strong>com</strong> o outro, <strong>com</strong> a natureza.<br />
Enfim, para <strong>um</strong> novo diálogo <strong>com</strong> a vida. <strong>um</strong> diálogo mais amoroso, fraterno,<br />
criativo e solidário, capaz de restabelecer os preciosos vínculos que nos<br />
unem e criar novas relações e conexões, não apenas voltadas para a evolução<br />
da ciência e da tecnologia, mas, sobretu<strong>do</strong>, para o cultivo da paz, da<br />
harmonia e para a preservação da vida no planeta.<br />
EXPERIÊNCIAS IMPORTANTES<br />
<strong>um</strong>a das experiências em andamento é o trabalho desenvolvi<strong>do</strong> pela<br />
Escola vila, em Fortaleza, Ceará, desde 1981, volta<strong>do</strong> para a formação <strong>do</strong><br />
ser h<strong>um</strong>ano integral, basea<strong>do</strong> em <strong>um</strong>a proposta pedagógica de natureza<br />
transdisciplinar, preocupa<strong>do</strong> <strong>com</strong> a integração corpo e mente, teoria e prática,<br />
educa<strong>do</strong>r e educan<strong>do</strong>, buscan<strong>do</strong> romper disjunções, fragmentações<br />
e simplificações epistemológicas e meto<strong>do</strong>lógicas. Desde sua fundação, a<br />
Escola vila vem se destacan<strong>do</strong> por sua proposta inova<strong>do</strong>ra, voltada para<br />
a construção de <strong>um</strong>a educação diferenciada, a partir da descoberta das<br />
necessidades genuínas de cada aluno, da revelação de seus talentos e ha-<br />
143
144<br />
bilidades, <strong>do</strong> resgate de sua autoestima, <strong>do</strong> desenvolvimento de sua auto-<br />
nomia intelectual e moral, associada a <strong>um</strong>a profunda reflexão sobre valores,<br />
condutas éticas e padrões de <strong>com</strong>portamentos responsáveis.<br />
Outra experiência importante foi desenvolvida pela Escola Cidadã, promovida<br />
pela Secretaria Municipal de Educação de Porto Alegre, Rio grande<br />
<strong>do</strong> Sul, no perío<strong>do</strong> de 1989 a 2004. Caracterizou-se por oferecer <strong>um</strong>a educação<br />
<strong>com</strong>prometida <strong>com</strong> a formação para a cidadania, a democracia e a<br />
participação solidária na construção e execução de políticas públicas. vale<br />
a pena observar que nesse perío<strong>do</strong> houve <strong>um</strong> a<strong>um</strong>ento muito significativo<br />
de matrículas e <strong>um</strong>a grande redução da evasão, reprovação e analfabetismo.<br />
<strong>Para</strong> mais informações, ver o texto de Clovis de Azeve<strong>do</strong>, J., Contreiras<br />
Rodrigues, C., Fuchs Curço, S. (2010) "Escola Cidadã: políticas e práticas<br />
inclusivas". Arquivos analíticos de políticas educativas, 18 (2). Disponível em:<br />
.
REFERÊNCIAS<br />
AzEvEDO, José Clovis de; RODRIguES, Carolina Contreiras; CuRÇO, S<strong>um</strong>aia<br />
Fuchs. Escola cidadã: políticas e práticas inclusivas. Arquivos analíticos de políticas<br />
educativas, v. 18, n. 2, 2010. Disponível em: . Acesso em: jan. 2011.<br />
BATALLOSO NAvAS, Juan Miguel. Dimensões da psicopedagogia hoje: <strong>um</strong>a visão<br />
transdisciplinar. Brasília: ProLiber, 2011.<br />
BOFF, Leonar<strong>do</strong>. ¿Qué significa ser y sentirse tierra? Disponível em: . Acesso em: 5 jan. 2011.<br />
MORIN, <strong>Edgar</strong>. <strong>Para</strong> <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul. 2010. Mimeografa<strong>do</strong>.<br />
MORIN, <strong>Edgar</strong>. O problema epistemológico da <strong>com</strong>plexidade. Sintra, Portugal:<br />
Publicações Europa-América, 1996.<br />
MORIN, <strong>Edgar</strong>. Os sete saberes necessários à educação <strong>do</strong> futuro. Tradução: Catarina<br />
Eleonora F. da Silva e Jeanne Sawaya. São Paulo: Cortez; Brasília: unesco,<br />
2000b.<br />
PELLANDA, Nize M. C. Sofrimento escolar <strong>com</strong>o impedimento da construção de<br />
conhecimento/subjetividade. Educação & Sociedade, Campinas, v. 29, n. 129, p.<br />
1060-1088, set./dez. 2008.<br />
145
146<br />
Cirurgião-dentista gradua<strong>do</strong> pela Universidade Federal de<br />
Pernambuco, tem MBA em Gestão Estratégica pela FGV e<br />
especialização em Saúde Pública pela UFF. Participou da<br />
Coordenação <strong>do</strong> Fór<strong>um</strong> Regional de Organização da Sociedade<br />
Civil da América Latina e Caribe sobre o envelhecimento,<br />
edição de 2007, e é Gerente de Saúde <strong>do</strong> Departamento<br />
Nacional <strong>do</strong> SESC.
contribuições<br />
"<strong>Para</strong> <strong>um</strong><br />
<strong>pensamento</strong><br />
<strong>do</strong> Sul"<br />
Formular o <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul implica pensar fundamentalmente a<br />
América Latina e a áfrica colonizadas, exploradas e expurgadas de opor-<br />
tunidades desenvolvimentistas, em <strong>um</strong> longo perío<strong>do</strong> histórico. Enveredar<br />
pela rede de solidariedade entre os povos <strong>do</strong> Sul pode ser <strong>um</strong> equívoco<br />
perpassa<strong>do</strong> pelo provincianismo. A colaboração h<strong>um</strong>anizada entre os grupos,<br />
redes, tribos e culturas <strong>do</strong> Sul também pode ser interpretada <strong>com</strong>o <strong>um</strong><br />
alento na busca por caminhos e oportunidades no Sul.<br />
<strong>Para</strong> a formação <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong> da maior parte desse hemisfério, temos<br />
que pensar obrigatoriamente nos processos de educação, conhecimento,<br />
treinamento da mão de obra tão cultuada e exigida pelo Norte. O Sul encaminhou<br />
suas experiências, vivências e construções inova<strong>do</strong>ras em <strong>um</strong> imaginário<br />
coletivo, <strong>com</strong>o <strong>um</strong>a identidade de história oral, conforme concebe<br />
Paul Thompson. Assim se identifica o <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul.<br />
Por outro la<strong>do</strong>, ou paralelo a isso, construiu-se <strong>um</strong> <strong>com</strong>portamento, também<br />
coletivo, formula<strong>do</strong> entre esses povos em <strong>um</strong>a vivência de solidariedade,<br />
onde a necessidade imediata de sobrevivência leva as pessoas a<br />
<strong>com</strong>partilhar situações de miséria e catástrofes. <strong>um</strong>a colaboração de sobrevivência<br />
entre cidadãos por vezes sem cidadania. historicamente, fo-<br />
147
148<br />
ram sen<strong>do</strong> criadas articulações entre as pequenas redes socioculturais <strong>do</strong><br />
entorno imediato (em certos lugares na áfrica ainda estão presentes as<br />
disputas entre tribos, dada <strong>um</strong>a situação de miséria total), bem <strong>com</strong>o há<br />
manifestações de vivências criativas, praticamente espontâneas (<strong>com</strong>idas,<br />
danças, vestes, gestos, falas, <strong>com</strong>portamentos) <strong>com</strong>o formas de autointerpretação<br />
das suas culturas e experiências da vida cotidiana. A responsabilidade<br />
coletiva só é contagiante em segmentos já mais organiza<strong>do</strong>s em<br />
normas e objetivos cria<strong>do</strong>s pelos seus membros. há a presença da "<strong>com</strong>posição<br />
de poesias" a partir <strong>do</strong> sofrimento, no simples, e nos pequenos sonhos<br />
na maioria <strong>do</strong>s grupos por serem, também, mais simples.<br />
Portanto, podemos apontar para <strong>um</strong>a política de civilização <strong>com</strong> elucidação<br />
mais h<strong>um</strong>ana que técnica. Assim, entendemos que deve haver a recusa<br />
da redução h<strong>um</strong>ana, ou da condição de "raça inferior", <strong>um</strong>a vez que na<br />
mistura de raças, cores e cre<strong>do</strong>s estão presentes a prática da diversidade<br />
e da multiplicidade cultural politeísta. é <strong>com</strong>o se existisse <strong>um</strong> pragmatismo<br />
muito mais pela sobrevivência to<strong>do</strong>s os dias, <strong>do</strong> que a preocupação <strong>com</strong> a<br />
construção de <strong>um</strong>a identidade nacional. Isso pode justificar a forte herança<br />
cultural popular <strong>do</strong> Sul.<br />
Não podemos esquecer que nesse mesmo universo a capacidade de<br />
autocrítica apresenta-se subdesenvolvida. há o exercício da corrupção<br />
conviven<strong>do</strong> <strong>com</strong> a solidariedade de forma ambígua. A degradação ambiental,<br />
inconsequente, é naturalizada, decorrente das subcondições de<br />
exploração, diretamente, dada a carência de formação profissional rentável,<br />
ausente para <strong>um</strong> quadro político ideal visto nas nações mais <strong>com</strong>plexas.<br />
Superadas essas lacunas características <strong>do</strong> Sul, haverá condição<br />
para saída da subserviência.
149
150<br />
NAsCIMeNtO, elIMAR<br />
pINHeIRO DO<br />
Professor associa<strong>do</strong> e diretor <strong>do</strong> Centro de Desenvolvimento<br />
Sustentável / Universidade de Brasília. Áreas de atuação: Planejamento<br />
e Políticas Públicas, Sustentabilidade em destinos<br />
turísticos e Conflitos socioambientais.
contribuições<br />
"<strong>Para</strong> <strong>um</strong><br />
<strong>pensamento</strong><br />
<strong>do</strong> Sul"<br />
QUAIS OS TEMAS CENTRAIS QUE INSPIRAM O PENSAMENTO DO SUL?<br />
Digamos, inicialmente, <strong>com</strong>o entendemos a proposição de <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong><br />
<strong>do</strong> Sul de <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong>. Aparentemente, o <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul se sustenta<br />
em quatro pilares:<br />
a) O reconhecimento <strong>do</strong>s limites das características centrais <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong><br />
<strong>do</strong> Norte, particularmente o absolutismo, ou a tendência de totalização<br />
de alg<strong>um</strong>as de suas qualidades, <strong>com</strong>o a técnica, a razão instr<strong>um</strong>ental, a<br />
eficácia. O <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul reconhece que essas características são parte<br />
de <strong>um</strong> to<strong>do</strong> e não o to<strong>do</strong>, portanto não podem reinar de maneira ditatorial.<br />
Elas são úteis e interessantes quan<strong>do</strong> convivem, <strong>com</strong>plementarmente, <strong>com</strong><br />
outras características igualmente valorizadas.<br />
b) O reconhecimento das consequências nefastas desse absolutismo<br />
<strong>do</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Norte, pois ele não assegura a to<strong>do</strong>s o bem viver e, ao<br />
mesmo tempo, degrada a natureza e <strong>com</strong>promete a sobrevivência da espécie<br />
h<strong>um</strong>ana. Seus des<strong>do</strong>bramentos nos colocaram hoje em meio a <strong>um</strong>a<br />
crise global, a da civilização. Seu maior expoente é a crise ambiental, iceberg<br />
cuja ponta é a ameaça de aquecimento global. Com ela vem o risco<br />
de elevação <strong>do</strong> nível <strong>do</strong> mar, o afogamento de cidades e países, a queda<br />
151
152<br />
da produtividade agrícola, o a<strong>um</strong>ento <strong>do</strong> refúgio ambiental, das migrações<br />
transnacionais, <strong>do</strong>s conflitos socioambientais, das guerras e o desfazer-se<br />
da democracia.<br />
c) O terceiro pilar é a posição autocrítica em relação às posturas nocivas<br />
<strong>do</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul: a submissão da mulher, a violência <strong>do</strong>méstica,<br />
a malversação <strong>do</strong>s recursos públicos, o nepotismo, entre outros.<br />
d) O último pilar é a crença de que é possível construir <strong>um</strong>a via diferente<br />
para o bem viver de to<strong>do</strong>s: ser feliz <strong>com</strong> menos em muitas partes <strong>do</strong><br />
mun<strong>do</strong>; a<strong>um</strong>entar o cons<strong>um</strong>o diferentemente para outra parte da h<strong>um</strong>anidade.<br />
Enfim, a ideia de que é possível <strong>um</strong>a convivência harmoniosa, entre<br />
nós e <strong>com</strong> a natureza.<br />
Esses pilares conduzem à melhor valorização de aspectos <strong>do</strong> bem viver,<br />
que marcam a singularidade <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul.<br />
a) A confraternização <strong>com</strong> os amigos e <strong>com</strong> a natureza em ritos socioculturais,<br />
no dia a dia e em momentos especiais.<br />
b) A alegria, <strong>com</strong>o re<strong>sul</strong>ta<strong>do</strong> da valorização <strong>do</strong> bem viver, da crença<br />
de que o divertimento, o lazer, o prazer <strong>com</strong>partilha<strong>do</strong> <strong>com</strong> outros são<br />
importantes;<br />
c) A improvisação, <strong>com</strong>o reconhecimento de que os planos têm imperfeição,<br />
lacunas e erros, e que esses são supera<strong>do</strong>s pelo replanejamento,<br />
mas também pela capacidade de improvisar em face a situações não planejadas,<br />
à chegada de situações imprevistas.<br />
d) A solidariedade, <strong>com</strong>o sentimento de <strong>com</strong>partilhamento <strong>do</strong>s bens da<br />
vida <strong>com</strong> nossos semelhantes, <strong>com</strong>o apoio aos outros em horas difíceis, a<br />
que estamos to<strong>do</strong>s submeti<strong>do</strong>s em nossa imperfeição h<strong>um</strong>ana.<br />
e) O afeto, <strong>com</strong>o parte importante <strong>do</strong> bem viver, o carinho <strong>com</strong> aqueles<br />
que amamos e que deve ser permanentemente manifesta<strong>do</strong>, expresso em<br />
nosso cotidiano.<br />
f) Finalmente, o amor à diferença, <strong>com</strong>o reconhecimento de que o outro,<br />
em sua diferença, é essencial na construção de nossa identidade.<br />
QUAIS AS EXPERIÊNCIAS INOVADORAS IMPLEMENTADAS E/OU<br />
EM CURSO QUE ILUSTRAM O PENSAMENTO E/OU AS IDENTIDADES<br />
DO SUL?<br />
A cultura popular, no senti<strong>do</strong> <strong>do</strong> mo<strong>do</strong> de vida da população mais pobre,<br />
sobretu<strong>do</strong> nas médias e pequenas cidades, é repleta de elementos que<br />
<strong>com</strong>põem o <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul, em particular a solidariedade, a prática<br />
<strong>do</strong> mutirão, mas também as iniciativas no campo da economia solidária, as
cooperativas de trabalho e cons<strong>um</strong>o. Igualmente, a cultura brasileira, em<br />
seus traços mais gerais, é marcada pela capacidade de improvisação, pela<br />
criatividade no dia a dia, mas também pela alegria no cotidiano, nos relacionamentos,<br />
assim <strong>com</strong>o o afeto.<br />
QUAIS AS QUESTÕES PRIORITÁRIAS A SEREM TRATADAS PELO OLHAR<br />
DO SUL NA DIREÇÃO DE UMA POLÍTICA DE CIVILIZAÇÃO?<br />
a) A erradicação da miséria e da pobreza.<br />
b) A redução da profunda desigualdade social.<br />
c) A oferta de escolarização de qualidade para todas as crianças e<br />
a<strong>do</strong>lescentes.<br />
d) A criação de oportunidades de desenvolvimento para to<strong>do</strong>s.<br />
e) O <strong>com</strong>bate ao aquecimento global.<br />
f) A descarbonização da economia.<br />
g) A desmaterialização da produção de bens.<br />
h) A mudança <strong>do</strong> cons<strong>um</strong>ismo.<br />
i) A desmercantilização da economia.<br />
j) A democratização ao acesso <strong>do</strong>s bens culturais.<br />
153
154<br />
NeIRA, HuGO<br />
Sociólogo, historia<strong>do</strong>r, politicólogo. Peruano y ciudadano<br />
francés. Estudia historia en la Universidad Nacional Mayor de<br />
San Marcos, Lima, Perú. Recibe una formación en el Instituto<br />
de Ciencias Políticas, París (Sciences Po) <strong>do</strong>nde será investiga<strong>do</strong>r.<br />
Tesis de <strong>do</strong>ctora<strong>do</strong> en la École des Hautes Études en<br />
Sciences Sociales (EHESS). Ingresa en la enseñanza superior de<br />
Francia tras concurso público. Será profesor hasta su jubilación,<br />
en Tahití, Polinesia Francesa. Ha vivi<strong>do</strong>, por perio<strong>do</strong>s, entre<br />
Europa y su país de origen. Director de Difusión en el gobierno<br />
revolucionario del general Velasco Alvara<strong>do</strong> (1970-1976)<br />
Director del Instituto de Gobierno (2005-2006) de la Universidad<br />
San Martín de Porres, Lima. Director de la Biblioteca<br />
Nacional del Perú (2006-2009). Como escritor ha recibi<strong>do</strong><br />
diversas distinciones. Premio de Fomento a la Cultura,<br />
Perú, 1965, por Cuzco, tierra y muerte. Premio Casa de las<br />
Américas, Cuba, en 1975, por Huillca, habla un campesino<br />
peruano. En el concurso internacional de ensayo, ciudad de<br />
Weimar, 2000, en Alemania, finalista, considera<strong>do</strong> uno de<br />
los "seis mejores ensayistas de lengua castellana, en vida".<br />
Condecora<strong>do</strong>, por el gobierno francés en el 2010, Chevalier<br />
de l’Ordre des Arts et Lettres.
<strong>Para</strong> una<br />
lectura de<br />
<strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong><br />
Conviene reinscribir el texto que vamos a <strong>com</strong>entar en la totalidad<br />
de la obra de su autor. <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong>, años atrás, sostuvo que el cono-<br />
cimiento "que no conoce sus límites, se automutila, y por esto, lo que<br />
limita nuestro conocimiento es lo que lo posibilita" (El conocimiento del<br />
conocimiento, 1988). Ahora bien, en el texto que aquí se <strong>com</strong>enta, pone<br />
en cuestión una idea única del progreso venida del "Norte", es decir,<br />
la de una modernidad ba jo un solo patrón <strong>do</strong>minante. Pero <strong>Morin</strong> no<br />
viene a proponernos una idea opositora no menos única y salva<strong>do</strong>ra,<br />
"el Sur". Al contrario, con méto<strong>do</strong> que le es propio "el principio dialógico",<br />
opone al concepto <strong>do</strong>minante una serie de matices y alteraciones.<br />
Ahora, el <strong>com</strong>entario.<br />
"La idea del Sur re<strong>sul</strong>ta una noción falsamente clara". Lo primero que<br />
sorprende, desde las primeras líneas, son las precauciones que el propio<br />
<strong>Morin</strong> a<strong>do</strong>pta. "La noción del Sur es relativa". y no quiere decir sur, llanamente,<br />
un lugar geográfico, "el Magreb, el norte de áfrica, o las Metrópolis<br />
del Sur", y "Sao Paulo está muy impregnada de Norte". Además hay otra<br />
preocupación, evitar sustancializar. Si un concepto se sustancia, su conteni<strong>do</strong><br />
se propone <strong>com</strong>o permanente, fijo, durable. Ahora bien, atribuirle valor<br />
eterno a hechos culturales — raza, clase, nación — lleva a provocar un par<br />
155
156<br />
de cosas. De un la<strong>do</strong>, un uso sectario, del otro, aban<strong>do</strong>nar el terreno de las<br />
ciencias del hombre. No buscamos, en efecto, ni esencias sino situaciones,<br />
el concepto es de Sartre. Las ciencias h<strong>um</strong>anas desde su inicio, nacen para<br />
el pluralismo explicativo. hay una ética del trabajo intelectual habitan<strong>do</strong> en<br />
estos <strong>do</strong>s esclarecimientos previos.<br />
Prosiguien<strong>do</strong>, la otra gran idea del texto es que hay "varios sures". y<br />
aun así, la mirada del Norte (porque de eso se trata, de miradas) tiende<br />
a encerrarlos en "una concepción única, de atraso, de subdesarrollo".<br />
Esos "sures", observa <strong>Morin</strong>, son habita<strong>do</strong>s por "cualidades, virtudes, artes<br />
de vivir". Conviene señalar su uso del plural. Llega<strong>do</strong> a este punto, el<br />
autor vuelve a insistir que sien<strong>do</strong> nociones relativas Norte y Sur, no hay<br />
que ni idealizarlas ni desvalorizarlas. De nuevo "el principio dialógico"<br />
invoca<strong>do</strong> en los usos mentales de <strong>Morin</strong>. No to<strong>do</strong> es erróneo en esa idea<br />
proveniente del Norte, a quien también denomina occidente europeo y<br />
a veces mun<strong>do</strong> anglosa jón. Toma en cuenta un aporte de instituciones y<br />
conductas que no podemos desestimar: democracia representativa, derechos<br />
h<strong>um</strong>anos, derechos de la mujer, autonomías individuales. Pese a<br />
las "cegueras e ilusiones".<br />
ha llega<strong>do</strong> la hora de enunciar la problemática del texto. ¿qué es lo<br />
que está en juego? ¿qué es lo que cuestiona <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong>? Cuestiona la<br />
reducción de las múltiples culturas del mun<strong>do</strong> a una sola ley ineluctable<br />
de la historia h<strong>um</strong>ana, a una visión oriunda en el occidente europeo, pero<br />
que no abarca el planeta entero. Objeta la reducción, casi imposible en<br />
el esta<strong>do</strong> del mun<strong>do</strong> actual. A eso se añade uno de los errores mayores<br />
en términos de epistemología, según <strong>Morin</strong>, que es la disyunción. Se trataría<br />
también de salvar al occidente mismo de algunas de sus mayores<br />
ilusiones, sus dicotomías. Separación de lo natural y lo cultural, de<br />
emoción y pasión, de hombre y mujer, y la reducción de lo <strong>com</strong>plejo a<br />
lo extremadamente simple, cosa que <strong>Morin</strong> <strong>com</strong>bate desde hace años.<br />
En fin, atenderé, para concluir esta parte del <strong>com</strong>entario, el resto de la<br />
arg<strong>um</strong>entación de <strong>Morin</strong>. Recuerda las otras fuentes que precedieron<br />
al actual occidente y lo nutrieron: los dioses politeístas, el senti<strong>do</strong> de la<br />
diversidad, los griegos y los latinos, Pablo de Tarso dirigién<strong>do</strong>se a los no<br />
judíos, la asamblea de ciudadanos a la vez distintos e iguales en Atenas,<br />
la importancia del debate, el Renacimiento capaz de problematizar<br />
el mun<strong>do</strong>, la naturaleza, al hombre. Llegan<strong>do</strong> a los tiempos modernos,<br />
hay una cara del progreso que necesitamos aban<strong>do</strong>nar, la del hombre<br />
(occidental) señor y maestro de la naturaleza. Así, en unas cuantas líneas,<br />
<strong>Morin</strong> con los zancos de siete leguas, une al faraón Akenaton con la<br />
"patria-tierra" de los actuales ambientalistas.
<strong>Para</strong> contestar a qué experiencias innova<strong>do</strong>ras ilustran el pensa-<br />
miento del Sur, señalo que <strong>Morin</strong> me parece actuar en tres direcciones.<br />
En primer lugar, en los hechos, ante la coincidencia de culturas y civilizaciones<br />
diversas, en presencia y a la vez antagónicas, en esta hora del<br />
mun<strong>do</strong>. En segun<strong>do</strong> lugar, la insuficiencia de la racionalidad y la lógica<br />
convencionales. En tercer lugar, ante la ciencia y la técnica, su necesidad<br />
pero también el hecho de su ambivalencia. hay una última apuesta<br />
que remite a "los poderes que puede tener lo improbable", ante lo<br />
inespera<strong>do</strong> en el curso de la historia h<strong>um</strong>ana. Detrás de esta postura se<br />
halla la noción del caos crea<strong>do</strong>r, al que remite lo fundamental de <strong>Morin</strong><br />
y su modelo de la <strong>com</strong>plejidad.<br />
<strong>Morin</strong> es sociólogo, y nadie se asombra que se afiance en lo concreto<br />
e inmediato. Es cierto que una suerte de reloj mundial y mapa de husos<br />
horarios reúne a los aeropuertos del mun<strong>do</strong> entero, ¿pero, son los mismos<br />
mun<strong>do</strong>s? ¿Lo mismo a la salida de New york que de Abuja en Nigeria, de<br />
Bogotá que de Nairobi? Ante la unidad y la diversidad h<strong>um</strong>ana, ¿qué hacer?<br />
"El tesoro de la h<strong>um</strong>anidad", dice, "es diverso". y evoca el genio de<br />
Leibniz, "el uno conserva y salva el múltiplo". Diría, por mi parte, que lo<br />
contrario es también posible. <strong>Morin</strong> se inclina por la mezcla, por lo que<br />
llamaríamos la cultura del mestiza je, "que no hay que confundirlo con<br />
una cultura mestiza", advierte el antropólogo Laplantine. Es decir, literaturas,<br />
lenguas, religiones, música, to<strong>do</strong> aquello que va más allá de la<br />
reproducción, la imitación, la copia o el calco, y que ocurre en el encuentro<br />
con el otro, el mestiza<strong>do</strong> lo a<strong>do</strong>pta, pero para transformar, anexar,<br />
modificar. Su lealtad es la de transgresión, desde el tango a la saudade.<br />
Culturas híbridas, frutos inespera<strong>do</strong>s de la alteralidad. Ese mun<strong>do</strong> sin<br />
límites del afuera que se vuelve lo del adentro, es un mun<strong>do</strong> de la vida y<br />
por lo tanto de sus impurezas, y va desde el "caboclo" brasileño al achora<strong>do</strong><br />
peruano, poblan<strong>do</strong> el mun<strong>do</strong> de Megalópolis tan grandes <strong>com</strong>o las<br />
occidentales, pero pobres, periferia de periferias. Pero lugares de nuevos<br />
senti<strong>do</strong>s. Las ideas de <strong>Morin</strong> llaman a otra sociología y antropología, a<br />
otra filosofía e historia del mun<strong>do</strong>.<br />
En fin, la cuestión prioritaria re<strong>sul</strong>ta <strong>do</strong>ble. Por una parte, atender al<br />
mun<strong>do</strong> multipolar en el que vivimos, de economías emergentes. India, China,<br />
Brasil, y las <strong>do</strong>s primeras, no son muy el Sur pero tampoco el Norte.<br />
Entonces, Norte y Sur tienen un valor <strong>com</strong>binatorio en la interacción de<br />
economías y civilizaciones, en curso. Por otra parte, hay un valor epistemológico<br />
en el texto de <strong>Morin</strong> (y personalmente, a mi me ha si<strong>do</strong> útil, en<br />
mis libros, desde 1996). Así, el tema del sur conduce a una cuestión teórica<br />
y prioritaria. <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong> ha aboga<strong>do</strong> por una transversalidad de los<br />
157
158<br />
conocimientos. (ver Relier les connaissances, Paris: Seuil, 1999). hace 40<br />
años que <strong>Morin</strong> encabeza un gran viraje. hoy, otros también buscan otro<br />
paradigma científico. Desde lo que se ha llama<strong>do</strong> "la galaxia de Stanford".<br />
La idea de la auto-organización se encuentra en varios <strong>do</strong>minios del conocimiento<br />
y en varios pensa<strong>do</strong>res. El biólogo henri Atlan. El matemático<br />
René Thom y su topología. Ilya Prigogine. René girard. Las teorías del Caos<br />
autorganiza<strong>do</strong>r son aplicadas al sistema solar, la atmósfera terrestre, las<br />
fluctuaciones bursátiles. <strong>Para</strong> <strong>Morin</strong> las cosas ocurren pero no en el orden<br />
progresivo que se ha creí<strong>do</strong>. Su esquema dinámico de un anillo recursivorotativo,<br />
une la base y la c<strong>um</strong>bre, toma<strong>do</strong> de la cibernética en los años<br />
1960, la idea del feedback. y de la biología, la capacidad auto-repara<strong>do</strong>ra<br />
de la vida. Los anillos causales existen, pero no son simples sino <strong>com</strong>plejos,<br />
se pueden <strong>com</strong>prender si cambiamos nuestros hábitos de pensar. En<br />
s<strong>um</strong>a, el texto propone un reparto de naipes en ideas del Norte y aportes<br />
del Sur, y en las mismas relaciones internacionales.
159
160<br />
NuOVO, sANtO DI<br />
Born on June 3 rd , 1950, in Catania, Italy. PhD in Philosophy<br />
(Catania, 1972) and Psychology (Padua, 1976). Full Professor<br />
since 1990 in Metho<strong>do</strong>logy (University of Palermo) and Psychology<br />
(University of Catania). Dean of the Faculty of Education,<br />
University of Catania (2001-2006). Vice-rector, Free University<br />
of Central Sicily - "Kore" of Enna (2004-2007). Dean at the<br />
Faculty of Psychology, University of Catania. Chief of Counseling<br />
Service, University of Catania. Main fields of research<br />
interest: Experimental Psychology, Clinical-rehabilitative and<br />
Forensic Psychology, Psychological Counseling, Metho<strong>do</strong>logy<br />
and Assessment. Author or co-author of about 300 published<br />
books and papers.
Some core<br />
questions about<br />
the "a thinking<br />
of the South"<br />
For every North there is a South, as geographical entities occur.<br />
The qualification of North and South as sociological and psychological<br />
entities depends on history and culture. A rethinking of geographical<br />
distributions is needed in order to rebuild social relations and distributions<br />
of economic and political power. This also requires, as suggested<br />
by <strong>Morin</strong>, the conceptualization of a "new rationality" adapted to the<br />
context of a globalized world, but not exclusively centered on the economic<br />
global market.<br />
Could this new rationality <strong>com</strong>e from the several Souths of the world,<br />
starting from the sufferance and "unhappy conscience" that typically characterize<br />
the Southern countries?<br />
however, a ‘conscience’ for the South is neither a current nor an active<br />
reality. The new Southern "rationality" has to be acquired. Let us<br />
start from the Italian situation: A party established in the North of Italy<br />
(the "League" party) is trying to separate the two regions, contending<br />
that the richer and more productive North cannot live along with, and<br />
161
162<br />
in harmony with a South that is poor and "wealth-cons<strong>um</strong>ing". 8 This is a<br />
pathology of economics, influencing culture and politics.<br />
In symmetrical progression, the South tends to "separate" itself from<br />
the North, in an attempt to acquire an independence mainly grounded on<br />
patronage, and sometimes on the "mob mentality" pervasive in the society<br />
and shared also by non-affiliated persons, as a <strong>com</strong>mon mental attitude<br />
against the State which is perceived as an enemy. This is a pathology of<br />
values, another influence on culture and politics.<br />
The "thinking of the South" has to be<strong>com</strong>e the focal point for a meaningful<br />
reflection about the world and about the South itself in the globalized<br />
world, but not prejudiced by a reactive attitude against the North of the<br />
same State. E.g., in order for Sicily and the South of Italy to build a new<br />
mentality, they could look towards Mediterranean countries, rather than<br />
only towards the North of Italy itself, as the North of Italy now looks to Europe<br />
more than to its own South.<br />
A "<strong>do</strong>minant thinking" — typical of the North — is the thinking in a single<br />
<strong>do</strong>main, mostly an economic one. Pluralistic thinking refers to many<br />
<strong>do</strong>mains: it fosters an "open" mind contrasting with a "closed" one (i.e.,<br />
monistic, rigid, defensive, pre-judiced). The South, based on its cultural<br />
history, could very well speak this language of pluralism.<br />
An example <strong>com</strong>es from Sicily that is in the South of Italy, and in the<br />
South of Europe itself. Many <strong>do</strong>mains have <strong>com</strong>e and gone from this island:<br />
Sicani, Elymians, Phoenicians, greeks, Romans, Byzantine, Arabs, Normans,<br />
French, Spanish, Bourbons, Savoys… In other words, Sicily experienced a<br />
plurality of languages, architectures, economies, political systems, and lifestyles<br />
— a true "melting pot" of cultures. Sicilians have immigrated to<br />
many countries of the world; now, in turn, it hosts many people <strong>com</strong>ing<br />
from other regions (mainly from the area of the Mediterranean Sea, but<br />
also from Central Africa, South Asia, and China).<br />
The Mediterranean Sea (literally "the sea which lies between lands")<br />
may be seen as a central source of nourishment for civilization, as <strong>com</strong>mercial<br />
and cultural exchanges flourished for several centuries around<br />
this area. however, it has also been a source of conflicts and wars. The<br />
intermingling of various peoples may lead to the building of new inte-<br />
8. Criticism could be easily extended to the intelligence levels, stimulated by (pseu<strong>do</strong>)scientific statements: In a recent<br />
paper, Lynn (2010) argued that there are differences between the IQs of Northern and Southern Italians, and that these<br />
predict major differences in in<strong>com</strong>e, education, infant mortality, stature and literacy. Adult IQ levels were obtained by Lynn<br />
from the re<strong>sul</strong>ts of PISA (Programme for International Student Assessment) aimed at evaluating achievement in youth.<br />
Unfortunately, however, this program seems to ignore not only a century of definitions and psychometric research about<br />
Intelligence, but also the basic criteria that should be used in scientific research. Thus, beyond the author’s aims, this<br />
misconception of reality can foster prejudice.
grated thinking, but it may also stimulate new conflicts, especially if<br />
each nationality strictly maintains its particular values and prejudices.<br />
Therefore, a <strong>com</strong>mon culture is not needed — due to the risk of a new<br />
monistic, hegemonic and "<strong>do</strong>minant" imposition, that is, the culture of<br />
the strongest; instead, the need exists for a plural, open, shared, and<br />
subordinate way of thinking.<br />
What characteristics should this kind of thinking have? I think the icon<br />
of this form of reasoning could be Odysseus/ulysses, as his life was engaged<br />
in travelling, discovering, and over<strong>com</strong>ing obstacles. Cognitive, affective,<br />
and existential thinking is needed to participate in <strong>com</strong>mon enterprise.<br />
"you were not made to live like brute animals, but to live in pursuit of<br />
virtue and knowledge," said Dante Alighieri in his Comedy about ulysses,<br />
the typically "clever" Mediterranean hero. Such knowledge must be open<br />
to multiplicity, differences, and conflicts, challenging nature and history<br />
in a "clever" way, with a "well-made rather than a well-filled head," as per<br />
<strong>Morin</strong>’s words.<br />
how are the responses to these challenges implemented? how is the<br />
<strong>com</strong>plexity of thinking reaffirmed and developed while "reconnecting what<br />
was artificially separated"? Global thinking is at the same time <strong>com</strong>plex<br />
thinking. hegemonic power (North) is able to reach a globalized thinking<br />
at the <strong>do</strong>minant economic level, but appears to be unable to reach <strong>com</strong>plex<br />
thinking (that is exactly the opposite of "<strong>do</strong>minant", one-dimensional<br />
thinking). The South may be<strong>com</strong>e the leader of <strong>com</strong>plex thinking, i.e., more<br />
capable of non-<strong>do</strong>minant, non-rigid, but open and flexible thinking. how<br />
can this thinking be trained?<br />
INNOVATIVE EXPERIMENTS TO FOSTER A SPECIFIC SOUTHERN<br />
IDENTITY<br />
Some innovative pilot experiments have been implemented to create<br />
a different mentality, in contrast to the <strong>do</strong>minant one (based on openmindedness),<br />
from which new and original social-economic processes can<br />
present themselves. These experiments involved educational fields, like<br />
vocational counselling in educational settings established in a Southern<br />
identity, i.e., a less developed economy, high emigration rates, and low<br />
education. Differently from media-based, useless stereotypes that foster<br />
passivity and collectivization of the mind (e.g., regarding works suitable<br />
for genders and social classes), an open-mindedness based on self-transcending<br />
and cooperative values oriented by universalism and benevolence,<br />
driving towards solidarity, will modify attitudes toward the personal and<br />
collective future.<br />
163
164<br />
vocational counselling motivates people to change with the aim of<br />
constructing their own future, which can stimulate this orientation toward<br />
formation/work based on innovation. Details on the experiments performed<br />
in schools and colleges will be presented at the meeting.<br />
PRIORITY QUESTIONS AND MAIN ISSUES TO EXPLORE<br />
a) how could these pilot experiments be implemented and widespread<br />
amongst families and schools, as well as in less wealthy and educated<br />
contexts?<br />
b) how, i.e., by what cultural and technological means can innovative<br />
thinking about civilization develop, particularly in the several Souths of<br />
the world?<br />
c) how (surely involving old and new media, e.g., the World Wide Web)<br />
may this innovative thinking be extended and widespread to the Northern<br />
countries, and to the global world?
165
166<br />
OspINA, GustAVO<br />
lOpez<br />
Director de la Corporación Complexus en Colombia; Coordi-<br />
na<strong>do</strong>r del Comité Técnico del Programa Internacional "Cono-<br />
cimiento, Innovación, Políticas" (KIP) de las Naciones Unidas<br />
(UNOPS, OMS, UNIFEM, otras Agencias); Con<strong>sul</strong>tor Internacional<br />
en Desarrollo H<strong>um</strong>ano Sostenible. Ex director del Programa<br />
Internacional de la Unesco "Educar para un Mun<strong>do</strong> Viable"<br />
(1994 a diciembre del 2001. Programa desde el cual la Unesco<br />
con <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong> preparó la obra Los siete saberes necesarios a<br />
la educación del futuro); Director Regional para América Latina<br />
y el Caribe de la Oficina CI de Unesco y Representante para los<br />
países Andinos en Quito, 2002 a 2006. Autor de varios libros,<br />
centenas de artículos y cofunda<strong>do</strong>r de varias Instituciones y<br />
Espacios de Innovación. Más de tres décadas vinculadas a las<br />
Naciones Unidas.
Pensamiento<br />
del Sur<br />
<strong>Edgar</strong> Morín muestra en su texto la urgencia de impulsar un nuevo pen-<br />
samiento que propone llamar del Sur. Este permitiría <strong>com</strong>prender mejor el<br />
mun<strong>do</strong> de hoy con to<strong>do</strong>s sus peligros mortales y oportunidades; entender<br />
<strong>com</strong>o se ha llega<strong>do</strong> a estos tiempos de incertid<strong>um</strong>bre — caos y mie<strong>do</strong>s<br />
generaliza<strong>do</strong>s; imaginar los pasos apropia<strong>do</strong>s para la construcción de un<br />
nuevo futuro y explorar futuros posibles conservan<strong>do</strong> to<strong>do</strong> lo maravilloso<br />
que tengamos a disposición (pensamiento del Norte); dar espacios a la<br />
creatividad y la innovación, de manos dadas con la solidaridad-cooperación<br />
y consensos múltiples, en tanto que fuerzas motoras en la formulación<br />
progresiva de ideas, políticas, ética, propuestas y experiencias a ser <strong>com</strong>partidas<br />
por toda la h<strong>um</strong>anidad.<br />
TEMAS CENTRALES QUE PODRIAN INSPIRARLO<br />
a) ¿Bajo qué condiciones puede aceptarse que es el pensamiento de los<br />
h<strong>um</strong>anos es el que regula el mun<strong>do</strong>? ¿qué <strong>com</strong>plicidad existe entre pensamiento<br />
y mun<strong>do</strong>?<br />
167
168<br />
b) ¿Pensamiento radical, ilusión sobre el mun<strong>do</strong>, o discurso de lo real,<br />
que procura un mun<strong>do</strong> objetivo y <strong>com</strong>prensible? ¿Pensamiento seductor?<br />
¿Pensamiento <strong>com</strong>plejo?<br />
c) ¿El principio radical de incertid<strong>um</strong>bre en el universo, inclui<strong>do</strong> lo h<strong>um</strong>ano,<br />
moral, mental, social, económico, político, en qué esta<strong>do</strong> se encuentra?<br />
¿La incertid<strong>um</strong>bre del mun<strong>do</strong> aporta la incertid<strong>um</strong>bre del pensamiento?<br />
¿Cuán<strong>do</strong> el pensamiento no busca transformar realmente el mun<strong>do</strong> y<br />
toma parti<strong>do</strong> por la incertid<strong>um</strong>bre? Existe algo que no pueda ser proba<strong>do</strong><br />
o refuta<strong>do</strong>. ¿qué nos es permiti<strong>do</strong> esperar?<br />
d) ¿El ser h<strong>um</strong>ano con la tecnología procura crear, en la práctica, otros<br />
mun<strong>do</strong>s? ¿Tecnología, merca<strong>do</strong>, globalización financiera hacia dónde<br />
apuntan hoy en realidad?<br />
e) ¿Procurar el paraíso vía el llama<strong>do</strong> progreso, o abrir espacio a la<br />
creatividad y llegar a un hombre nuevo y calidad de vida, mediante una<br />
mirada más cualitativa y <strong>com</strong>pleja (nociones nuevas: riqueza, crecimiento,<br />
pobreza-pobres, invento del modelo vigente, otras)?<br />
f) ¿Si el territorio es sagra<strong>do</strong>, da senti<strong>do</strong> de pertenencia y finalidad a<br />
la vida, es el to<strong>do</strong> de un pensamiento de la <strong>com</strong>prensión, al re<strong>com</strong>poner y<br />
vincular la experiencia integral de vida, <strong>com</strong>o afirma Morín, <strong>com</strong>o convocar<br />
a partir de éste a la universalidad?<br />
g) ¿La ausencia de indica<strong>do</strong>res, códigos, fórmulas que transcriban, o<br />
hagan equivalente el esta<strong>do</strong> real de las cosas, vuelve conformistas a los<br />
seres h<strong>um</strong>anos? ¿<strong>Para</strong>liza los cambios?<br />
h) ¿qué pasos dar para reinventar la gobernabilidad mundial (ONu) en<br />
un mun<strong>do</strong> multi-polar, fragmenta<strong>do</strong> y global, sin arruinar las esperanzas<br />
universales multilaterales?<br />
EXPERIENCIAS INNOVADORAS QUE LE DAN SOPORTE Y<br />
PROYECCIÓN<br />
a) La Convención sobre el Patrimonio Mundial Natural y Cultural de la<br />
h<strong>um</strong>anidad, gerenciada por la unesco, que vincula hoy en día centenares<br />
de sitios de la mayor importancia para la conservación de la biodiversidad<br />
y la diversidad cultural, en un manejo integral del territorio.<br />
b) El Proyecto Andino de Tecnologías Campesinas (Pratec) ha trabaja<strong>do</strong><br />
en el Perú con apoyo del Fon<strong>do</strong> de Afirmación Cultural, en diez sitios, entre<br />
el 2002-2010, y el auspicio de la Fundación Suiza Tradiciones para el Mañana<br />
el vigorizar las tradiciones indígenas. Inicio de otras acciones volcadas<br />
al saber y los intereses indígena.
c) El Programa de Plantas Medicinales de la universidad Autónoma de<br />
Chapingo, Méjico, inició labores a <strong>com</strong>ienzos de los años 1980, con investi-<br />
gaciones en <strong>com</strong>unidades de los esta<strong>do</strong>s de Pueblo, hidalgo, Chiapas, gua-<br />
najuato, Morelos, guerrero, Colima y Nayarit. Líneas de investigación: a)<br />
Exploración etnobotánica); b) Agronómica en propagación y conservación;<br />
c) Farmacológica; d) Fitoquímica; e) Servicio universitario a la <strong>com</strong>unidad;<br />
f) Medicamentos herbolarios.<br />
d) universidad Intercultural S<strong>um</strong>ak yachaypi, Aprender en la Sabiduría y<br />
el Buen vivir, Ecua<strong>do</strong>r. Educación superior que al tiempo que da cuenta de<br />
la pluralidad y la diversidad, se sustenta sobre los pilares de su identidad,<br />
cosmovisión, ancestros, articulan<strong>do</strong> el antes con el ahora y lo que viene,<br />
enriquecien<strong>do</strong> así el proceso social intercultural y hacién<strong>do</strong>lo patrimonio<br />
de la h<strong>um</strong>anidad. Así mismo, la Capilla del hombre Oswal<strong>do</strong> guayazamin.<br />
e) Construir la Ciudad que se Sueña, Medellin (Colombia), transformación<br />
de una ciudad. Conocida desde los años 1980 <strong>com</strong>o ciudad de narcotráfico<br />
y violencia generalizada, ha logra<strong>do</strong> re<strong>sul</strong>ta<strong>do</strong>s impresionantes desde<br />
una propuesta global de cambio, sustentada en la arte y la cultura, más que<br />
en lo económico. Rompió el ciclo cultural de la violencia.<br />
f) Centros Regionales de Competencias para el Desarrollo Sostenible,<br />
iniciativa que desde el 2005 lidera la universidad de las Naciones unidas<br />
en Tokio.<br />
g) Programa de las Naciones unidas (uNOPS, uNDP, Agencias ONu)<br />
orienta<strong>do</strong> al apoyo a Redes Territoriales para el desarrollo h<strong>um</strong>ano sostenible,<br />
"Conocimiento, Innovación, Políticas (kIP)". Esfuerzo conjunto de<br />
actores locales, nacionales internacionales.<br />
CONSIDERACIONES A TENER EN CUENTA SOBRE UNA POLÍTICA DE<br />
CIVILIZACIÓN<br />
Los sistemas de <strong>com</strong>prensión del mun<strong>do</strong> llegaron y tomaron tanta autonomía<br />
y fuerza que moldearon a los h<strong>um</strong>anos. Sistemas que permiten<br />
alegrías, <strong>do</strong>lores y sinsabores. Sujeto a un pensamiento, ensueño, simbolización,<br />
rituales y acciones, el ser h<strong>um</strong>ano se convirtió en el ser vivo más<br />
<strong>com</strong>plejo; el no haber <strong>com</strong>prendi<strong>do</strong> hasta hoy esta realidad condujo a<br />
grandes desafíos y problemas con el arte, la educación, la ciencia, la tecnología,<br />
la economía y la misma política.<br />
a) Educación: evitar que el proceso de enseñanza y aprendiza je sea<br />
solamente un acto de entrega, reproducción, beneficio, y resignación<br />
volca<strong>do</strong>s a la rápida extinción de la intersubjetividad, motor y razón de<br />
ser de los h<strong>um</strong>anos. El modelo de crecimiento actual que se instala en<br />
169
170<br />
los usos de la vida misma, obliga a una revisión <strong>com</strong>pleta de los siste-<br />
mas educativos del mun<strong>do</strong>. vivir es crear valores, valorar es crear.<br />
b) Biodiversidad y amenazas: cambio climático, transformación y pér-<br />
dida de ecosistemas, sobrexplotación, invasión biológica y contaminación<br />
en general.<br />
c) Revolución biotecnológica, re<strong>sul</strong>ta<strong>do</strong> de una confluencia de fuerzas<br />
tecnológicas y sociales que han crea<strong>do</strong> una nueva matriz operativa (RI-<br />
FkIN, Jeremy. El siglo de la biotecnología, 1999) plantea un enorme salto<br />
cualitativo en el planeta Tierra.<br />
d) Interculturalidad: relación entre culturas para la búsqueda del Proyecto<br />
Común, recrear en permanencia el mun<strong>do</strong>. una política de civilización<br />
debe considerar los elementos étnico-culturales y bio-geográficos, interrelación<br />
entre <strong>com</strong>unidad h<strong>um</strong>ana y natural.<br />
e) Identidad: eje estructural de toda <strong>com</strong>unidad h<strong>um</strong>ana que de forma<br />
<strong>com</strong>plementaria converge para interactuar hacia otras identidades.<br />
f) Patrimonio cultural y natural: bienes esenciales a toda la h<strong>um</strong>anidad<br />
para su supervivencia futura. Políticas sobre los bienes y servicios públicos<br />
de la h<strong>um</strong>anidad.<br />
g) Estética: en la concepción andina, la estética surge del diálogo y reciprocidad<br />
con los dioses y la naturaleza, cuan<strong>do</strong> son esencialmente sentimiento,<br />
forma de crear y dejarse criar. El hacer con senti<strong>do</strong> a partir de un<br />
sentimiento armónico.<br />
h) Sostenibilidad: lo que permanece en el tiempo. Se transforma y<br />
no agota. Re<strong>sul</strong>ta<strong>do</strong> de un pensamiento que relaciona cosmovisión con<br />
cultura y se vuelve vivencia-sentimiento. Forma vivencial de ser y estar<br />
en el mun<strong>do</strong>.<br />
i) Investigación: que sea capaz de unir la innovación y las herencias, en<br />
una perspectiva histórica, y así contribuir a la integración de los seres h<strong>um</strong>anos,<br />
la sociedad y la especie en términos de solidaridad.
171
172<br />
petRAGlIA,<br />
IzABel<br />
Pós-<strong>do</strong>utora pelo Centro <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong>, antigo Centro de Estu<strong>do</strong>s<br />
Transdisciplinares, Sociologia, Antropologia e História (CET-<br />
SAH) da Escola de Altos Estu<strong>do</strong>s em Ciências Sociais (EHESS),<br />
de Paris, França. Doutora em Educação pela USP e mestre em<br />
Educação pela PUC-SP. <strong>Psi</strong>cóloga e pedagoga. Professora e<br />
pesquisa<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> Programa de Pós-Graduação em Educação da<br />
Universidade Nove de Julho (Uninove), São Paulo. Desenvolve<br />
projetos de investigação na linha de Educação e Complexidade.<br />
Coordena<strong>do</strong>ra e funda<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> Núcleo Interinstitucional de<br />
Investigação da Complexidade (NIIC), em São Paulo. Autora<br />
de diversos artigos, capítulos e livros, entre eles: <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong>:<br />
a educação e a <strong>com</strong>plexidade <strong>do</strong> ser e <strong>do</strong> saber (2010); Olhar<br />
sobre o olhar que olha: <strong>com</strong>plexidade, holística e educação<br />
(2001), e Interdisciplinaridade: o cultivo <strong>do</strong> professor (1993).
Um <strong>pensamento</strong><br />
<strong>do</strong> Sul e a<br />
esperança<br />
de <strong>um</strong>a nova<br />
política de<br />
civilização<br />
há <strong>um</strong>a relatividade geográfica entre Norte e Sul, Ocidente e Oriente,<br />
e <strong>um</strong>a heterogeneidade que deveria ser dialógica, consideran<strong>do</strong> as saudáveis<br />
especificidades locais. Cada sociedade, civilização, oferece possibilidades<br />
e dificuldades específicas e gerais, que é o que tem de melhor.<br />
Local e global, micro e macro, são <strong>com</strong>plementares e, simultaneamente,<br />
apresentam qualidades próprias, emergentes, singulares. A homogeneização<br />
coloca em risco autonomias individuais, originalidades culturais, étnicas,<br />
nacionais. <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>com</strong>plexo rejeita a redução, a disjunção, e<br />
considera os opera<strong>do</strong>res cerebrais hologramáticos, dialógicos e recursivos<br />
para a tessitura <strong>do</strong> <strong>com</strong>plexus. Tarefa fundamental da filosofia a de refletir<br />
sobre todas as coisas: problematizar, contextualizar, reproblematizar.<br />
há <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Norte que detém a hegemonia cultural, técnica,<br />
econômica <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>. A despeito desse <strong>pensamento</strong> especializa<strong>do</strong>, fragmenta<strong>do</strong>,<br />
redutor, <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul poderia propor a miscigenação<br />
e integração das diversas heranças culturais <strong>do</strong> planeta, de mo<strong>do</strong> a minimizar<br />
os efeitos devasta<strong>do</strong>res de <strong>um</strong>a policrise decorrente <strong>do</strong> desenvolvimento<br />
subdesenvolvi<strong>do</strong> e desenfrea<strong>do</strong> científico-técnico-econômico. Com<br />
isso, o <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul poderia revitalizar a ética, a solidariedade e a<br />
responsabilidade, empregan<strong>do</strong> a ideia da religação e restauran<strong>do</strong> o esta-<br />
173
174<br />
<strong>do</strong> poético da existência h<strong>um</strong>ana. é preciso buscar caminhos de transfor-<br />
mação e esperança.<br />
Na atualidade, muitos já perceberam que a educação é a alternativa<br />
possível e viável para as transformações pessoais, sociais e planetárias. A<br />
religação <strong>do</strong>s saberes que visa à superação da fragmentação pressupõe<br />
audácia, persistência e dedicação. <strong>Morin</strong> já propôs <strong>um</strong> conjunto de reflexões<br />
nortea<strong>do</strong>ras da educação deste século xxI, <strong>com</strong> a indicação de sete<br />
saberes necessários (2000b), cuja discussão na escola, ao la<strong>do</strong> da revisão<br />
constante das práticas pedagógicas, pode propiciar a tão necessária reforma<br />
<strong>do</strong> <strong>pensamento</strong>. Não se trata de tarefa simples, mas de estimular<br />
reflexões e ações que expressem os princípios <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>com</strong>plexo,<br />
na amplitude <strong>do</strong>s mo<strong>do</strong>s de conhecer o próprio conhecimento.<br />
O autor já anunciava <strong>um</strong> duplo desafio quan<strong>do</strong> afirmou: "A reforma<br />
<strong>do</strong> ensino deve levar à reforma <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong>, e a reforma <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong><br />
deve levar à reforma <strong>do</strong> ensino" (2000a, p. 20). Não se trata de<br />
estabelecer modelos ou de listar experiências bem-sucedidas, que devam<br />
ser copiadas, mas de buscar conhecer os próprios limites, possibilidades,<br />
e traçar estratégias a partir de problematizações em contextos<br />
específicos e singulares.<br />
há de se descobrir e fazer descortinar brechas de possibilidades de<br />
realização em cada escola, em cada grupo. <strong>Para</strong> se delinear <strong>um</strong> caminho,<br />
é preciso desenvolver estratégias, que não podem ser confundidas <strong>com</strong><br />
regras de <strong>um</strong> manual, mas devem conceber ações concretas que emergem<br />
da reflexão, ao passo que também as despertam. Compartilhamos da<br />
ideia de méto<strong>do</strong> <strong>com</strong>o caminho: "O méto<strong>do</strong> é o que ensina a aprender. é<br />
<strong>um</strong>a viagem que não se inicia <strong>com</strong> <strong>um</strong> méto<strong>do</strong>; inicia-se <strong>com</strong> a busca <strong>do</strong><br />
méto<strong>do</strong>" (MORIN et al. 2003, p. 29). Méto<strong>do</strong>, caminho, pressupõe estratégias<br />
articuladas que se nutrem, reciprocamente: "por <strong>um</strong> la<strong>do</strong>, facilita o<br />
desenvolvimento de estratégias para o conhecimento; por outro, facilita<br />
o desenvolvimento das estratégias para a ação" (idem, p. 32).<br />
Assim, para a concepção de <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul, <strong>com</strong> suas identidades<br />
e olhares próprios, é necessário que se busque <strong>um</strong> méto<strong>do</strong>. E, <strong>com</strong>o<br />
afirma <strong>Morin</strong>: "A missão desse méto<strong>do</strong> não é fornecer as fórmulas programáticas<br />
de <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> ‘são’, mas convidar a pensar-se a si mesmo na<br />
<strong>com</strong>plexidade" (1999, p. 41). E, assim, que seja possível a revitalização da<br />
ética, das ideias, das relações, das ações e das finalidades da educação.<br />
Se o termo "política" — <strong>do</strong> grego — indica procedimentos relativos à<br />
pólis, cidade, Esta<strong>do</strong>, para o bem estar individual e coletivo, que regula<br />
e orienta a vida em sociedade, o termo "política de civilização" indica o
emprego <strong>com</strong> o ressignifica<strong>do</strong> de valores da e para nossa civilização. Dar<br />
novo significa<strong>do</strong> ao termo política significa manter o que há de positivo<br />
nele e eliminar os seus efeitos negativos. <strong>Para</strong> <strong>Morin</strong>, "trata-se de refundar<br />
e renovar a política. A política de civilização visa a salvaguardar as antigas<br />
solidariedades, lá onde elas não foram destruídas, e/ou instaurar novas<br />
solidariedades" (2010, p. 262). O termo não pretende reduzir a política à<br />
política de civilização, mas integrar a política de civilização àquela. Não se<br />
trata de criar <strong>um</strong>a nova ética, mas de regressar à ética. "Pretende ser <strong>um</strong>a<br />
política multidimensional na qual to<strong>do</strong>s os problemas h<strong>um</strong>anos têm hoje<br />
<strong>um</strong>a dimensão política" (MORIN; NAIR, 1997, p. 149).<br />
<strong>Morin</strong> aponta imperativos de <strong>um</strong>a política de civilização (idem, pp. 151-<br />
159): solidarizar (contra a paralisia e a <strong>com</strong>partimentação); revitalizar as<br />
identidades culturais (contra a padronização); conviver (contra a degradação<br />
da qualidade de vida — material/existencial/ ambiental); moralizar<br />
(contra egocentrismo e irresponsabilidade).<br />
Conviver <strong>com</strong> a transitoriedade e <strong>com</strong> a incerteza é <strong>um</strong> desafio constante<br />
que o <strong>pensamento</strong> <strong>com</strong>plexo nos impõe. é preciso renovar a esperança<br />
nas aspirações e possibilidades criativas, libertárias e fraternais <strong>do</strong>s<br />
seres h<strong>um</strong>anos. O <strong>pensamento</strong> <strong>com</strong>plexo propõe a conjugação da ciência<br />
<strong>com</strong> as culturas, as artes e a filosofia para a construção de <strong>um</strong>a política<br />
planetária que contemple <strong>um</strong>a educação <strong>com</strong>prometida <strong>com</strong> a formação<br />
de cidadãos planetários, éticos e mais felizes. é nessa direção que <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong><br />
<strong>do</strong> Sul poderia se estabelecer, garantin<strong>do</strong> <strong>um</strong>a educação disposta<br />
e capaz de operar transformações.<br />
<strong>um</strong>a nova política de civilização será possível? Será <strong>um</strong>a uTOPIA? U =<br />
não; TOPOS = lugar: O que não tem lugar no presente! O que não significa<br />
que, em alg<strong>um</strong> dia possa ser possível ou viável. <strong>Morin</strong> nos convida ainda a<br />
distinguir duas utopias (idem, pp. 191-197): 1ª) O melhor <strong>do</strong>s mun<strong>do</strong>s — inviável,<br />
impossível e terrível; 2ª) <strong>um</strong> mun<strong>do</strong> melhor — possível, improvável?<br />
<strong>um</strong> mun<strong>do</strong> melhor se constrói <strong>com</strong> o fim das guerras; <strong>com</strong> a melhoria<br />
das relações <strong>com</strong> o meio ambiente; <strong>com</strong> a regulação <strong>do</strong>s conflitos; <strong>com</strong><br />
a possibilidade de remediar infelicidades h<strong>um</strong>anas a partir da melhoria<br />
das condições sociais e políticas; <strong>com</strong> a preservação <strong>do</strong> planeta. Isso tu<strong>do</strong><br />
pode ser possível, ainda que improvável. Por isso, é tão necessário quanto<br />
difícil. E, qualquer que seja a intensidade na melhoria <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, impõe<br />
às civilizações esperança e, ao mesmo tempo, coautoria. Trata-se de <strong>um</strong><br />
problema antropológico e histórico, pois os seres h<strong>um</strong>anos possuem as<br />
melhores e as piores potencialidades. Essa dialógica exige esperança na<br />
proporção da coautoria de <strong>um</strong> planeta civiliza<strong>do</strong>. Civilizar a Terra é urgente!<br />
E, para isso, a educação é fundamental!<br />
175
176<br />
REFERÊNCIAS<br />
MORIN, E. A cabeça bem-feita: repensar a reforma, reformar o <strong>pensamento</strong>. Tradução:<br />
Eloá Jacobina. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2000a.<br />
MORIN, E. Complexidade e transdisciplinaridade: a reforma da universidade e <strong>do</strong><br />
ensino fundamental. Tradução: <strong>Edgar</strong>d de Assis Carvalho. Natal: Ed. da uFRN, 1999.<br />
MORIN, E. Meu caminho. Entrevistas <strong>com</strong> Djénane Kareh Tager. Tradução: <strong>Edgar</strong>d<br />
de Assis Carvalho e Mariza Perassi Bosco. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2010.<br />
MORIN, E. Os sete saberes necessários à educação <strong>do</strong> futuro. Tradução: Catarina<br />
Eleonora F. da Silva e Jeanne Sawaya. São Paulo: Cortez; Brasília: unesco, 2000b.<br />
MORIN, E.; CIuRANA, E-R; MOTTA, R. D. Educar na era planetária: o <strong>pensamento</strong><br />
<strong>com</strong>plexo <strong>com</strong>o méto<strong>do</strong> de aprendizagem no erro e na incerteza h<strong>um</strong>ana. Tradução:<br />
Sandra T. Valenzuela. São Paulo: Cortez; Brasília: uNESCO, 2003.<br />
MORIN, E.; NAIR, S. Uma política de civilização. Tradução: Arman<strong>do</strong> Pereira da Silva.<br />
Lisboa: Instituto Piaget, 1997.
177
178<br />
RIeRA, elBA Del<br />
CARMeN<br />
Doctora en filosofía por la Universidad Católica de Santa Fe.<br />
Profesora Emérita del Consejo Superior y de la Universidad<br />
Nacional de Santiago del Estero. Dicta clases en Maestrías y<br />
Cursos de Postgra<strong>do</strong>. Consejera Docente del Consejo Directivo<br />
de la Facultad de H<strong>um</strong>anidades de la Universidad Nacional de<br />
Santiago del Estero (1998-2001). Coordina<strong>do</strong>ra de la Carrera de<br />
Licenciatura en Filosofía de la Facultad de H<strong>um</strong>anidades de la<br />
Universidad Nacional de Santiago del Estero (1990-2006). Presentación<br />
de trabajos y ponencias en Congresos Mundiales de<br />
Filosofía: Moscú, Rusia (1993) y Boston, EEUU (1998). Autora<br />
de n<strong>um</strong>erosos trabajos, artículos, ponencias y contribuciones<br />
para revistas, Jornadas, Congresos, Seminarios en el país y<br />
en el extranjero. Invitada para disertar en el Latin American<br />
Dominican Symposi<strong>um</strong> "Educational Leadership in a Globalized<br />
Word" (USA, 2004). Tuvo a su cargo una Jornada con el tema:<br />
"Pensamiento Complejo, Interdisciplinariedad y Educación".
temas<br />
centrales que<br />
inspiran el<br />
pensamiento<br />
del Sur<br />
A medida que se hace central el tema del pensamiento del Sur, creo que<br />
estamos obliga<strong>do</strong>s a repensar desde un punto de vista propio, alternativo<br />
al pensamiento hegemónico del Norte, que revele nuestra identidad, y<br />
que nos estimule a desarrollar to<strong>do</strong>s los aspectos h<strong>um</strong>anos, económicos,<br />
científicos, tecnológicos, políticos, organizacionales, éticos, que logre desterrar<br />
la imagen instalada de subdesarrollo, atraso, pobreza, incapacidad<br />
para resolver nuestros propios problemas, con que se nos ha margina<strong>do</strong><br />
durante mucho tiempo y que tenga en cuenta lo siguiente:<br />
a) la riqueza del mestizaje intercultural, de la diversidad cultural con sus<br />
milenarias y profundas sabidurías, propias de América Latina;<br />
b) la necesidad de recrear un pensamiento que corrija la racionalidad<br />
de la modernidad, instalada <strong>com</strong>o paradigma disyuntivo y reductivo,<br />
que tra jo <strong>com</strong>o consecuencias la separación, fragmentación e<br />
hiperespecialización de las disciplinas en el campo de las ciencias y de<br />
la educación;<br />
c) la reapropiación del concepto de condición h<strong>um</strong>ana, <strong>com</strong>o unitas multiplex,<br />
expresión acabada de la idea de hiper<strong>com</strong>plejidad, <strong>com</strong>o unidad de<br />
179
180<br />
racionalidad e irracionalidad entendida <strong>com</strong>o fiesta, goce, <strong>do</strong>n, solidaridad,<br />
afecto, poesía, que refleja la identidad de nuestros pueblos del Sur;<br />
d) la denuncia a la concepción moderna de la relación del hombre con<br />
la naturaleza que debía ser concebida <strong>com</strong>o al servicio incondicional del<br />
rey de la creación, con las deplorables consecuencias de la crisis ecológica<br />
que estamos padecien<strong>do</strong>;<br />
e) crítica al modelo occidental de la modernidad que enfatizó la individualización,<br />
eficacia, cuantificación, eficiencia, productividad, por sobre la<br />
solidaridad, afectividad, <strong>com</strong>unión, colaboración, <strong>com</strong>pasión, <strong>com</strong>unicación,<br />
<strong>com</strong>promiso, calidad, coordinación, construcción, confianza, consenso.<br />
EXPERIENCIAS INNOVADORAS IMPLEMENTADAS O EN CURSO QUE<br />
ILUSTRAN EL PENSAMIENTO DEL SUR<br />
A través de nuestra larga carrera en la <strong>do</strong>cencia universitaria, hemos<br />
logra<strong>do</strong> transmitir a grupos de discípulos la inquietud por esta nueva forma<br />
de pensar, conocer y actuar que propone el Pensamiento Complejo;<br />
esto se ha puesto de manifiesto en n<strong>um</strong>erosas contribuciones y presentaciones<br />
a congresos, jornadas y reuniones científicas y también una tesis<br />
<strong>do</strong>ctoral, de al<strong>um</strong>nos y egresa<strong>do</strong>s, que intentan profundizar y reflexionar,<br />
desde de los principios del P. C.<br />
A partir del 2009, hemos conforma<strong>do</strong> un grupo de Estudio, Trabajo e Investigación<br />
interdisciplinario en la Facultad de h<strong>um</strong>anidades, Ciencias Sociales<br />
y de la Salud, de la universidad Nacional de Santiago del Estero, que<br />
está integra<strong>do</strong> además por profesores de otras Facultades y universidades,<br />
y que a su vez depende y está aproba<strong>do</strong> por el "Programa de Reconocimiento<br />
Institucional de Investigación de la Facultad de Ciencias Sociales<br />
de la universidad de Buenos Aires." La conformación de este grupo de investigación<br />
interdisciplinario ha <strong>com</strong>enza<strong>do</strong> con éxito, por la aceptación y<br />
entusiasmo de sus integrantes y de la conducción de la universidad, que ha<br />
presta<strong>do</strong> un gran apoyo. Es la primera vez que se conforma, en nuestro ámbito<br />
universitario, un grupo interdisciplinario para investigar. Sabemos que<br />
requiere de una capacitación de los participantes, que llevará tiempo, pero<br />
confiamos en que saldremos adelante, gracias a la colaboración y apoyo de<br />
los distintos no<strong>do</strong>s que se van conforman<strong>do</strong> a lo largo de nuestra Argentina<br />
y de la conducción de nuestro Director, el Lic. Leonar<strong>do</strong> Rodriguez zoya.<br />
CUESTIONES PRIORITARIAS A TRATARSE POR LA MIRADA DEL SUR<br />
HACIA UNA POLÍTICA DE CIVILIZACIÓN<br />
a) Reforma de la educación e instituciones educativas: la organización<br />
disciplinaria tradicional de los conteni<strong>do</strong>s escolares no facilita el tratamien-
to de los problemas antropológicos, sociales ni ambientales; no se aprende<br />
a seleccionar y procesar la abr<strong>um</strong>a<strong>do</strong>ra cantidad de información disponible<br />
en nuestro entorno, ni se capacita para gestionar los problemas planetarios<br />
de nuestro mun<strong>do</strong>. Los educan<strong>do</strong>s no son capacita<strong>do</strong>s para resolver<br />
los problemas de la vida cotidiana, sólo estudian y analizan, en forma mecánica,<br />
problemas académicos convencionales, sin explicitar sus propias<br />
ideas, sin cruzar e intercambiar arg<strong>um</strong>entos. No se supera el pensamiento<br />
simplifica<strong>do</strong>r, disyuntivo, fragmentario, propio de la cultura de la superficialidad<br />
<strong>do</strong>minante y muy aleja<strong>do</strong> de un pensamiento científico <strong>com</strong>plejo.<br />
Re<strong>sul</strong>ta indispensable desarrollar la capacidad de contextualizar los saberes;<br />
se hace necesaria una reflexión epistemológica que ayude a relativizar<br />
el conocimiento y analizarlo críticamente, incorporan<strong>do</strong> el análisis<br />
histórico, que puede ayudar a entender el carácter de construcción social<br />
contextualizada que tiene el conocimiento.<br />
b) Democracia cognitiva: la democracia es un sistema <strong>com</strong>plejo que<br />
implica el derecho a la inclusión, a la libertad de pensamiento y al ejercicio<br />
de esa libertad que se da en el aprender. La democracia es un proceso<br />
inacaba<strong>do</strong>, no perfecto, pero perfectible; sufre permanentes contaminaciones<br />
y por ello requiere cambios y modificaciones. Se alimenta<br />
de diversidad y conflictividad, de intereses e ideas. Se hace necesaria la<br />
democratización del conocimiento, <strong>com</strong>o condición para la constitución<br />
de actores sociales que puedan opinar de manera no inducida por los<br />
medios de <strong>com</strong>unicación. La base de la democracia está en la diversidad<br />
de opiniones e ideas que interactúan en un mismo espacio y que producen<br />
nuevas identidades <strong>com</strong>plejas.<br />
A través de la educación hay que formar ciudadanos con autonomía<br />
personal; pensamiento autónomo y deliberativo; conciencia de sus derechos<br />
y responsabilidades; sentimiento del vínculo cívico que los ligan a sus<br />
conciudadanos; senti<strong>do</strong> de participación responsable en el desarrollo de<br />
proyectos que lleven a transformar positivamente nuestra <strong>com</strong>unidad y<br />
nuestra aldea global; que tomen conciencias de la necesidad de as<strong>um</strong>ir la<br />
"<strong>do</strong>ble ciudadanía", cosmopolita, nacional, regional y planetaria, vinculada<br />
a los miembros de su <strong>com</strong>unidad, pero también de identificación, en tanto<br />
que persona, con to<strong>do</strong>s aquellos que también son personas, aunque diversos<br />
en sus orígenes, lenguas, culturas.<br />
181
182<br />
seBIlIA,<br />
ANDRes sAlOMON<br />
COHeN<br />
Forma<strong>do</strong> em Ciências Biológicas pela Universidade Santa<br />
Úr<strong>sul</strong>a (1982); pós-gradua<strong>do</strong> em Ensino de Ciências, modalidade<br />
Física, pela Universidade Federal Fl<strong>um</strong>inense (1996). Tem<br />
trabalhos publica<strong>do</strong>s nas revistas Atlântica e Revista Brasileira<br />
de Zoologia e livro publica<strong>do</strong> pela Editora Nobel (1990). Desde<br />
1996, é assessor-técnico <strong>do</strong> Departamento Nacional <strong>do</strong> SESC<br />
(Divisão de Projetos Sociais, Gerência de Educação, Projeto<br />
SESCiência) e atualmente ocupa o cargo de Coordena<strong>do</strong>r <strong>do</strong><br />
Projeto Ação Comunitária SESC Cidade de Deus.
o <strong>pensamento</strong><br />
<strong>do</strong> Sul: <strong>um</strong>a<br />
visão crítica <strong>do</strong><br />
desenvolvimento<br />
destrutivo<br />
"Os povos <strong>do</strong>s países pobres são obriga<strong>do</strong>s a fazer <strong>um</strong>a troca explícita:<br />
aceitar a degradação ambiental (em longo prazo) e a h<strong>um</strong>ilhação para<br />
atender as suas necessidades imediatas de alimentos e habitação." Essa<br />
frase da ex-primeira-ministra da índia, Indira gandhi, proferida n<strong>um</strong> discurso<br />
na sede das Nações unidas em 1970, reflete, de certa forma, a opção<br />
que os povos <strong>do</strong> Sul tiveram que fazer para atender as exigências <strong>do</strong> norte,<br />
mais poderoso e decanta<strong>do</strong> <strong>com</strong>o <strong>um</strong> exemplo civilizatório.<br />
Precisamos misturar essas heranças culturais mediterrâneas<br />
<strong>com</strong> as heranças culturais africanas e <strong>sul</strong>-americanas. Por<br />
mais diferentes que sejam, todas elas <strong>com</strong>portam mo<strong>do</strong>s míticos<br />
ou religiosos de integração no cosmo e na natureza,<br />
<strong>do</strong>s quais devemos extrair a verdade profunda e ligá-la a<br />
nossa consciência ecológica, que reconhece nossa integração<br />
na biosfera, algo que o devir da mundialização continua<br />
a degradar impulsiona<strong>do</strong> pelo norte.<br />
(MORIN, 2010).<br />
As questões que se apresentam, em função <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong> de <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong>,<br />
expresso no parágrafo anterior, para nossa reflexão, são: que consciência<br />
ecológica é essa? Existe <strong>um</strong>a consciência ecológica no Sul, diferente daquela<br />
183
184<br />
<strong>do</strong> Norte? Os problemas ambientais que se apresentam no Sul são diferentes<br />
daqueles <strong>do</strong> Norte? Não foram os povos <strong>do</strong> Norte que capitanearam os movimentos<br />
em defesa <strong>do</strong> meio ambiente, nas décadas de 1960 e 1970?<br />
Ao longo da sua história, a h<strong>um</strong>anidade sempre foi além das suas próprias<br />
fronteiras em busca de matérias-primas essenciais, seja por meio<br />
<strong>do</strong> <strong>com</strong>ércio ou das guerras, para satisfazer as suas necessidades. hoje,<br />
devi<strong>do</strong> à expansão <strong>do</strong> <strong>com</strong>ércio internacional e da globalização da economia,<br />
esse fenômeno atingiu <strong>um</strong> estágio que ameaça seriamente to<strong>do</strong>s os<br />
ecossistemas <strong>do</strong> planeta. A busca de <strong>um</strong> desenvolvimento mais harmonioso<br />
<strong>com</strong> o meio ambiente está exigin<strong>do</strong> mudanças drásticas na economia<br />
e no mo<strong>do</strong> de vida das sociedades e das nações, seja daquelas que já<br />
atingiram a plena capacidade industrial (ditas <strong>do</strong> Norte ou desenvolvidas<br />
ou <strong>do</strong> Primeiro Mun<strong>do</strong>) <strong>com</strong>o daquelas que estão em vias de consegui-la<br />
(ditas <strong>do</strong> Sul ou subdesenvolvidas ou <strong>do</strong> Terceiro Mun<strong>do</strong>).<br />
Assim, <strong>um</strong> novo <strong>pensamento</strong> se apresenta ao mun<strong>do</strong> <strong>com</strong> pretensões<br />
de universalidade: o ecológico, questionan<strong>do</strong> o desenvolvimento e os modelos<br />
de sociedade. Esse desafio é apresenta<strong>do</strong> <strong>com</strong>o necessidade de se<br />
repensar o desenvolvimento na sua dimensão educacional, social, política,<br />
filosófica, econômica e cultural. Recoloca a crítica <strong>do</strong>s sistemas existentes,<br />
forçan<strong>do</strong> o capital a se confrontar <strong>com</strong> o meio ambiente, que pretendeu<br />
e ainda pretende subordinar em sua realização. O <strong>pensamento</strong> ecológico<br />
está dizen<strong>do</strong> ao capital que antes dele vem a relação <strong>com</strong> a natureza,<br />
diante da qual o capital é apenas "<strong>um</strong>a criança brincan<strong>do</strong> de Cria<strong>do</strong>r, sem<br />
ter idade e sabe<strong>do</strong>ria para isso" (ACSELRAD, 1992).<br />
O Cone Sul concentra <strong>um</strong>a grande parte da biodiversidade natural <strong>do</strong><br />
planeta. Podemos, quem sabe, estender essa biodiversidade ao <strong>pensamento</strong><br />
desses povos, re<strong>sul</strong>ta<strong>do</strong>s da miscigenação de "coloniza<strong>do</strong>res" <strong>do</strong><br />
Norte <strong>com</strong> os autóctones. Nossa cultura incorporou e fundiu, de ambos,<br />
aspectos das tradições, <strong>do</strong>s mitos, da alimentação, <strong>do</strong> vestuário, da língua,<br />
dentre outros, que culminaram no sincretismo que nos caracteriza. 9<br />
Segun<strong>do</strong> Darcy Ribeiro (1970), as profundas diferenças não só são decorrentes<br />
das matrizes culturais pre<strong>do</strong>minantemente latina e católica, indígena<br />
e africana, n<strong>um</strong> caso, anglo-saxônica e protestante, no outro, mas<br />
também decorrem <strong>do</strong> grau de desenvolvimento socioeconômico, nível de<br />
escolaridade, tradição histórica etc. <strong>Para</strong> esse mesmo autor, "falta ainda<br />
<strong>um</strong>a teoria da cultura, capaz de dar conta da nossa realidade, em que<br />
o saber erudito é tantas vezes espúrio e o não saber popular alcança,<br />
contrastantemente, atitudes críticas, mobilizan<strong>do</strong> consciências para movimentos<br />
profun<strong>do</strong>s de reordenação social. Como estabelecer a forma e<br />
9. "Sincretismo é a tentativa de fusão ou de conciliar crenças díspares e mesmo opostas e de fundir práticas de várias escolas<br />
de <strong>pensamento</strong>. Está associa<strong>do</strong> em especial à tentativa de fundir e criar analogias entre várias tradições originariamente discretas,<br />
particularmente na teologia e mitologia da religião, afirman<strong>do</strong> assim <strong>um</strong>a unidade subjacente" (www.wikipedia.org.).
o papel da nossa cultura erudita, feita à criatividade popular, que mescla<br />
as tradições mais díspares para <strong>com</strong>preender essa nossa nova versão <strong>do</strong><br />
mun<strong>do</strong> e de nós mesmos?" (1996, p. 16).<br />
Portanto, continuamos perseguin<strong>do</strong> <strong>um</strong>a teoria unifica<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> social<br />
<strong>com</strong> o ambiental, <strong>um</strong>a teoria que proponha <strong>um</strong> novo paradigma socioambiental,<br />
que traga bem-estar a to<strong>do</strong>s, <strong>com</strong> mais justiça e distribuição de<br />
renda e que deságue em <strong>um</strong>a melhor qualidade de vida para muitos e não<br />
só para os poucos afortuna<strong>do</strong>s, sejam eles <strong>do</strong> Norte ou <strong>do</strong> Sul.<br />
O espaço onde se procurou <strong>um</strong>a resposta mais intensamente foi nos chama<strong>do</strong>s<br />
Encontros de Cúpula Alternativos, paralelos aos encontros <strong>do</strong> grupo<br />
<strong>do</strong>s Países Mais Ricos, para discutir os r<strong>um</strong>os da economia mundial dentro da<br />
perspectiva <strong>do</strong> movimento ecológico (gABEIRA, 1994). Ainda não se chegou a<br />
<strong>um</strong> sistema acaba<strong>do</strong>, mas esses encontros levaram a <strong>um</strong>a visão <strong>do</strong> que pode<br />
ser <strong>um</strong>a economia ou <strong>um</strong> desenvolvimento alternativo. E esse desenvolvimento<br />
seria diferente daquele que acontece no modelo de produção capitalista<br />
e <strong>do</strong> socialismo real, consideran<strong>do</strong> aspectos fundamentais.<br />
a) Desenvolvimento alternativo versus necessidades h<strong>um</strong>anas: o desenvolvimento<br />
alternativo deve levar em conta as necessidades h<strong>um</strong>anas e<br />
não a produção <strong>do</strong> lucro <strong>com</strong>o ponto principal. Ao propor essa ideia, houve<br />
muitas dificuldades, pois o lucro sempre foi a mola mestra <strong>do</strong> sistema<br />
capitalista. A expressão "necessidades h<strong>um</strong>anas" precisa ser mais bem<br />
definida. Elas representam as necessidades materiais e não materiais. As<br />
necessidades materiais nós conhecemos: habitação/moradia, alimentação,<br />
educação, lazer, transporte, salários dignos etc. Em relação às necessidades<br />
materiais, muita coisa mu<strong>do</strong>u de, digamos, cinquenta anos para cá. A<br />
televisão, por exemplo, não era <strong>um</strong>a necessidade (assim <strong>com</strong>o o telefone).<br />
hoje, a televisão poderia representar <strong>um</strong>a importante fonte de lazer, educação<br />
e cultura para <strong>um</strong>a nação.<br />
As necessidades não materiais são muito difíceis de definir. Porém, as<br />
discussões evoluíram até o ponto de introduzir ideias, <strong>com</strong>o a possibilidade<br />
das pessoas conviverem em paz e harmonia, independentemente de raça,<br />
cre<strong>do</strong>, cultura, posição social e escolaridade; criatividade e iniciativa para<br />
tentar resolver os seus problemas de desenvolvimento e meio ambiente,<br />
entre outras.<br />
b) Desenvolvimento alternativo endógeno: o desenvolvimento alternativo<br />
tem que ser endógeno. Esse processo de desenvolvimento material tem que<br />
partir das necessidades internas da sociedade. é a sociedade, internamente,<br />
quem decide os seus caminhos. Isso quer dizer que não existe <strong>um</strong> modelo<br />
universal de desenvolvimento e que cada sociedade tem o direito de procurar<br />
o seu. Esse fenômeno não acontece no Brasil, onde a mentalidade é fruto da<br />
185
186<br />
sua colonização, cujo modelo é o capitalismo aplica<strong>do</strong> nos EuA e na Europa.<br />
Nós sempre nos vemos <strong>com</strong>o se fôssemos <strong>um</strong> cidadão <strong>do</strong>s EuA e da Eu-<br />
ropa amanhã — Complexo de vodka Orloff — sem imaginar <strong>um</strong> modelo<br />
ou circunstância própria. Não teríamos <strong>com</strong>o construir o colonialismo, o<br />
imperialismo e as próprias possibilidades planetárias em termos de recursos<br />
não renováveis. A Terra não suportaria o tipo de cons<strong>um</strong>o <strong>do</strong>s EuA<br />
e da Europa, reproduzi<strong>do</strong>s em escala mundial em to<strong>do</strong> o Terceiro Mun<strong>do</strong>.<br />
Então, teríamos que repensar o desenvolvimento não só porque nós temos<br />
as nossas características, <strong>com</strong>o também porque não é possível se desenvolver<br />
<strong>com</strong> <strong>um</strong> cons<strong>um</strong>o que o planeta não suportaria (aquecimento mais<br />
rápi<strong>do</strong> <strong>do</strong> planeta, mais lixo e mais poluição).<br />
c) Autossustentação: é o princípio <strong>do</strong> desenvolvimento <strong>do</strong> país (ou região)<br />
buscan<strong>do</strong> recursos internamente, não dependen<strong>do</strong> de fora para estimulá-lo.<br />
No Brasil ainda se fala que o nosso desenvolvimento será muito<br />
estimula<strong>do</strong> pelo <strong>com</strong>ércio exterior, pela venda fora <strong>do</strong> Brasil. Mas já existe<br />
<strong>um</strong>a corrente que fala em estimular o merca<strong>do</strong> interno. vamos criar <strong>um</strong>a<br />
situação em que a gente produza e cons<strong>um</strong>a, em que o dínamo <strong>do</strong> crescimento<br />
econômico esteja no Brasil.<br />
d) Consciência ecológica: essa consciência não significa pura e simplesmente<br />
<strong>um</strong>a consciência política, mas <strong>um</strong>a consciência na qual reside<br />
o próprio desenvolvimento, que passa a ter <strong>um</strong>a importância no cálculo<br />
econômico. Então, onde entra esse custo? Essa é <strong>um</strong>a crítica que a visão<br />
da economia alternativa tem da economia convencional burguesa. Ela não<br />
calcula o desgaste <strong>do</strong> meio ambiente <strong>com</strong>o perda a ser reparada, pois<br />
ela tem a perspectiva <strong>do</strong> produtor individual capitalista, cujo <strong>pensamento</strong><br />
é: o que for lucro é lucro, o que for prejuízo a gente socializa. E, às vezes,<br />
pode ser até pior.<br />
Portanto, temos a oportunidade de propor algo diferente, tanto para os<br />
nossos pares <strong>do</strong> Sul quanto para os formula<strong>do</strong>res das políticas <strong>do</strong> Norte.<br />
Estamos nessa encruzilhada: ou fazemos algo agora ou perderemos o bonde<br />
da história.
REFERÊNCIAS<br />
ACSELRAD, h. Meio ambiente e democracia. Rio de Janeiro: IBASE, 1992.<br />
gABEIRA, F. Princípios da economia alternativa. Doc<strong>um</strong>ento Interno <strong>do</strong> Parti<strong>do</strong> Ver-<br />
de, Seccional <strong>do</strong> Rio de Janeiro. 1994.<br />
MORIN, E. <strong>Para</strong> <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul. 2010. Mimeografa<strong>do</strong>.<br />
RIBEIRO, D. Os Índios e a civilização: a integração das populações indígenas no<br />
Brasil moderno. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1970.<br />
RIBEIRO, D. O povo brasileiro: A formação e o senti<strong>do</strong> <strong>do</strong> Brasil. 2. ed. São Paulo:<br />
Companhia das Letras, 1996.<br />
187
188<br />
sIMOes,<br />
CARlOs ARtexes<br />
Engenheiro eletrônico pela Universidade Federal <strong>do</strong> Rio de<br />
Janeiro (UFRJ) e pedagogo pela mesma Universidade. Mestre<br />
em Educação pela Universidade Federal Fl<strong>um</strong>inense (UFF).<br />
Professor <strong>do</strong> Centro Federal de Educação Tecnológica Celso<br />
Suckow da Fonseca.
Pensamento<br />
<strong>do</strong> Sul:<br />
construin<strong>do</strong><br />
<strong>um</strong>a nova<br />
civilização<br />
"O mais importante e bonito, <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, é isto: que as pessoas<br />
não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas — mas<br />
que elas vão sempre mudan<strong>do</strong>."<br />
(guimarães Rosa)<br />
O que tem caracteriza<strong>do</strong> a civilização atual é a sua capacidade de<br />
mudança de dinâmicas até então consideradas imutáveis. O que aparentemente<br />
poderia ser confundi<strong>do</strong> apenas <strong>com</strong> <strong>um</strong>a adaptação para a permanência<br />
de cost<strong>um</strong>es, privilégios e de relações hierárquicas de poder e<br />
exploração h<strong>um</strong>ana, também são possibilidades de reais transformações<br />
na cultura civilizatória. Novos mo<strong>do</strong>s de pensar o mun<strong>do</strong>, novas relações<br />
entre os seres h<strong>um</strong>anos e novas formas de produção material para a existência<br />
h<strong>um</strong>ana são potencialidades para <strong>um</strong> novo padrão civilizatório<br />
mais livre, justo e fraterno.<br />
Nesse cenário, a hegemonia econômica e cultural <strong>do</strong> Norte pode e deve<br />
ser questionada e a sua lógica, reelaborada <strong>com</strong> a participação da força<br />
emergente, e ainda pouco visível, <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul. Não se trata apenas<br />
de <strong>um</strong>a disputa e substituição da hegemonia territorial, mas <strong>um</strong>a síntese<br />
que considera a cultura e a <strong>com</strong>preensão <strong>do</strong>s povos <strong>do</strong> Sul, historicamente<br />
explora<strong>do</strong>s, que de alg<strong>um</strong>a forma sustentaram o desenvolvimento<br />
189
190<br />
material <strong>do</strong>s países "ricos" <strong>do</strong> Norte, na elaboração de <strong>um</strong>a <strong>com</strong>preensão<br />
universal para to<strong>do</strong>s os povos e <strong>um</strong>a nova civilização.<br />
O agravamento das condições naturais da existência h<strong>um</strong>ana coloca<br />
em xeque o ethos no qual se constitui o <strong>pensamento</strong> hegemônico na civilização<br />
atual. urge <strong>um</strong> consenso mínimo e <strong>um</strong>a postura ética que questione<br />
o nosso mo<strong>do</strong> de estar e atuar no mun<strong>do</strong> para o enfrentamento da crise<br />
planetária. A novidade da participação e contribuição <strong>do</strong>s povos <strong>do</strong> Sul,<br />
<strong>com</strong> singularidades e situação cultural especificas, passa a ser imperativo<br />
para a superação da degradação ambiental e da exclusão social ainda<br />
pre<strong>do</strong>minante no mun<strong>do</strong>. Emergem <strong>do</strong> Sul, em <strong>um</strong>a situação adversa e<br />
subalterna, <strong>um</strong>a cultura e <strong>um</strong>a forma de viver emancipa<strong>do</strong>ras, ligadas a<br />
<strong>um</strong>a nova consciência ecológica, a <strong>um</strong>a mistura étnica/racial configurada<br />
na tradição da solidariedade e da criatividade.<br />
O senti<strong>do</strong> <strong>do</strong> paradigma <strong>do</strong>minante é a conquista. O conhecimento<br />
é ass<strong>um</strong>i<strong>do</strong> <strong>com</strong>o forma de intervenção e <strong>do</strong>minação da natureza, o que<br />
corresponde a <strong>um</strong>a imagem de mun<strong>do</strong> na qual o ser h<strong>um</strong>ano tem a função<br />
<strong>do</strong> <strong>do</strong>mínio sobre o meio ambiente e os demais seres. O ethos vivencia<strong>do</strong><br />
é pouco sensível à alteridade. A homogeneização e a padronização<br />
ameaçam as originalidades e as singularidades culturais. Dessa forma, a<br />
natureza não passa de <strong>um</strong> depósito de recursos, algo a ser manipula<strong>do</strong>, e<br />
o diferente, aquilo que foge à razão instr<strong>um</strong>ental-analítica e à unificação<br />
tecno-econômica, algo a ser destruí<strong>do</strong>. A crise ecológica mostra a insustentabilidade<br />
dessas crenças. O progresso, entendi<strong>do</strong> <strong>com</strong>o crescimento<br />
ilimita<strong>do</strong> e linear, produziu degradação ambiental e subdesenvolvimento.<br />
A Terra não suportaria a universalização <strong>do</strong> patamar de cons<strong>um</strong>o e mo<strong>do</strong><br />
de vida <strong>do</strong>s países ricos.<br />
Erigir pilares para <strong>um</strong>a nova civilização exige <strong>um</strong> novo pensar, sentir,<br />
<strong>um</strong>a vontade de transformação <strong>com</strong> novos referenciais éticos e <strong>um</strong>a nova<br />
forma de <strong>com</strong>preender a h<strong>um</strong>anidade. A experiência <strong>do</strong>s povos <strong>do</strong> Sul tem<br />
elementos fundamentais para essa nova civilização. Eis o desafio: enfrentar<br />
a <strong>com</strong>plexidade da realidade h<strong>um</strong>ana, <strong>com</strong> <strong>um</strong>a <strong>com</strong>preensão ampla<br />
<strong>do</strong> ser h<strong>um</strong>ano e <strong>do</strong> universo, a partir da vivência das contradições <strong>do</strong><br />
modelo civilizatório até então desenvolvi<strong>do</strong>; preservan<strong>do</strong> <strong>um</strong>a sabe<strong>do</strong>ria<br />
nativa de valorização da relação homem-natureza e entre os seres h<strong>um</strong>anos.<br />
De <strong>um</strong> paradigma redutor, pauta<strong>do</strong> pela <strong>do</strong>minação e exploração,<br />
precisamos passar a <strong>um</strong> paradigma capaz de religar conhecimentos, de<br />
valorizar outras formas de relacionamento <strong>com</strong> a natureza e <strong>com</strong> outros<br />
seres h<strong>um</strong>anos e de apresentar <strong>um</strong> novo ethos e senti<strong>do</strong>. Como bem diz<br />
Leonar<strong>do</strong> Boff, "essa mudança precisa ser dialética, vale dizer, ass<strong>um</strong>ir<br />
tu<strong>do</strong> que é assimilável e benéfico <strong>do</strong> paradigma da modernidade e inseri-<br />
-lo dentro de outro diferente mais globalizante e benfazejo". ética, assim<br />
<strong>com</strong>preendida, é a descoberta <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> <strong>com</strong>o valor e não <strong>com</strong>o a con-
cepção utilitarista em que o mun<strong>do</strong> só possua valor na sua funcionalidade<br />
a serviço <strong>do</strong>s interesses de pequenos grupos e <strong>com</strong>o objeto de posse.<br />
<strong>um</strong>a iniciativa contra-hegemônica é o Fór<strong>um</strong> Social Mundial (FSM),<br />
evento "altermundialista" organiza<strong>do</strong> por movimentos sociais de diversos<br />
continentes, mas <strong>com</strong> centralidade organizativa no Brasil, <strong>com</strong> objetivo de<br />
elaborar alternativas para <strong>um</strong>a transformação social global. O slogan "<strong>um</strong><br />
outro mun<strong>do</strong> é possível" representa seu significa<strong>do</strong> para <strong>um</strong>a nova ordem<br />
social. O Fór<strong>um</strong> se realizou várias vezes (em 2001, 2002, 2003 e 2005),<br />
no Brasil, na cidade de Porto Alegre, capital <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Rio grande <strong>do</strong><br />
Sul; em 2004, na índia; de forma descentralizada em 2006; e em Nairóbi,<br />
quênia, em 2007. A nona edição <strong>do</strong> Fór<strong>um</strong> novamente teve lugar no Brasil,<br />
em Belém, capital <strong>do</strong> esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Pará.<br />
Outra iniciativa, organizada no Brasil, se refere à Economia Solidária<br />
<strong>com</strong>o <strong>um</strong>a forma de produção, cons<strong>um</strong>o e distribuição de riqueza (economia)<br />
centrada na valorização <strong>do</strong> ser h<strong>um</strong>ano e não <strong>do</strong> capital. Tem base<br />
associativista e cooperativista, e é voltada para a produção, cons<strong>um</strong>o e<br />
<strong>com</strong>ercialização de bens e serviços de mo<strong>do</strong> autogeri<strong>do</strong>, ten<strong>do</strong> <strong>com</strong>o finalidade<br />
a reprodução ampliada da vida. Preconiza o entendimento <strong>do</strong><br />
trabalho <strong>com</strong>o <strong>um</strong> meio de libertação h<strong>um</strong>ana dentro de <strong>um</strong> processo de<br />
democratização econômica, crian<strong>do</strong> <strong>um</strong>a alternativa à dimensão alienante<br />
e assalariada das relações <strong>do</strong> trabalho capitalista.<br />
Além disso, a Economia Solidária possui <strong>um</strong>a finalidade multidimensional,<br />
isto é, envolve a dimensão social, econômica, política, ecológica e<br />
cultural. Isto porque, além da visão econômica de geração de trabalho e<br />
renda, as experiências de Economia Solidária se projetam no espaço público,<br />
no qual estão inseridas, ten<strong>do</strong> <strong>com</strong>o perspectiva a construção de <strong>um</strong><br />
ambiente socialmente justo e sustentável. A Economia Solidária reafirma,<br />
assim, a emergência de atores sociais, ou seja, a emancipação de trabalha<strong>do</strong>ras<br />
e trabalha<strong>do</strong>res <strong>com</strong>o sujeitos históricos.<br />
Nesse cenário de mudanças culturais e elaboração de <strong>um</strong> <strong>pensamento</strong><br />
<strong>do</strong> Sul <strong>com</strong>o desenvolvimento de possibilidades de novo projeto civilizatório,<br />
vale a pena conhecer as concepções da "Trimembração <strong>do</strong> organismo<br />
social" apresentada pelo filósofo austríaco Ru<strong>do</strong>lf Steiner no início <strong>do</strong> século<br />
xx. A trimembração não é <strong>um</strong>a ideia interna de nenh<strong>um</strong>a corrente ou<br />
grupo, mas pertence à h<strong>um</strong>anidade toda.<br />
Assim <strong>com</strong>o os corpos vivos têm atividade nervosa, digestiva, circulatória<br />
etc., cada <strong>um</strong>a <strong>com</strong> seu funcionamento próprio, porém interdependentes<br />
e partes <strong>do</strong> mesmo corpo, assim todas as atividades e fatos da<br />
sociedade h<strong>um</strong>ana se distribuem em três grandes áreas: vida econômica,<br />
vida cultural, vida normativa. vida econômica é tu<strong>do</strong> o que produz bens,<br />
recursos, riquezas para o uso da sociedade inteira. vida cultural não é<br />
apenas arte, mas tu<strong>do</strong> o que tem a ver <strong>com</strong> conhecimento, ideias, valores<br />
191
192<br />
e capacidades h<strong>um</strong>anas, nas mais diversas áreas, <strong>com</strong>o pesquisa, educação,<br />
criação e outras formas de cultivo. vida normativa são as instâncias<br />
em que os diferentes atores da vida social decidem as regras <strong>do</strong><br />
jogo, fazem acor<strong>do</strong>s e cuidam para que esses acor<strong>do</strong>s sejam executa<strong>do</strong>s.<br />
São os espaços de discussão e representação, órgãos de administração,<br />
agências regula<strong>do</strong>ras, instâncias jurídicas etc. Cada <strong>um</strong>a dessas esferas<br />
de atividade tem por sua própria natureza <strong>um</strong> atributo ou lei de funcionamento:<br />
vida cultural = liberdade; vida normativa = igualdade; vida<br />
econômica = fraternidade.<br />
A lei saudável n<strong>um</strong>a esfera torna-se nociva na outra. A vida cultural<br />
é responsável pela criatividade da sociedade por meio da livre criatividade<br />
<strong>do</strong>s indivíduos. Nesse campo, igualdade significaria totalitarismo,<br />
massificação, estagnação. Na vida normativa, isto é, na decisão e<br />
execução <strong>do</strong>s acor<strong>do</strong>s sociais, cada ser h<strong>um</strong>ano tem valor igual ao de<br />
qualquer outro. Aqui o indivíduo não tem liberdade de impor nada. A<br />
vida econômica é responsável por suprir os seres h<strong>um</strong>anos daquilo de<br />
que necessitam. Aqui, liberdade de fazer o que se bem entender, sem<br />
levar em conta as necessidades sociais (<strong>com</strong>o quer o neoliberalismo),<br />
produz concentração e exclusão.
193
194<br />
sORIANO, luz<br />
INMACulADA MADeRA<br />
Nacida en Santo Domingo, República Dominicana. Licenciada<br />
en Educación (Ciencias Sociales-Orientación Escolar), <strong>do</strong>ctora<br />
en Ciencias Pedagógicas (Cuba) y <strong>do</strong>ctoranda en Ingeniería<br />
Informática-Sociedad de la Información y el Conocimiento<br />
(España). Postgra<strong>do</strong>s en psicología clínica, gestión, integración<br />
regional, relaciones internacionales y cooperación. Áreas de<br />
investigación: Internacionalización-Cooperación universitaria<br />
y uso de social medias en la formación. Actual Vicerrectora de<br />
Asuntos Docentes, Estudiantiles e Internacionales en la Universidad<br />
APEC. Miembro funda<strong>do</strong>r del grupo Complejidad RD.
Pensamiento<br />
del Sur y<br />
h<strong>um</strong>anismo<br />
latinoamericano<br />
en la trama de lo<br />
universal<br />
"La sabiduría cura la separación."<br />
(E. Tolle)<br />
Existe un Sur, a propósito de un Norte. Metáfora geográfica que de-<br />
vela y jerarquiza las condiciones y relaciones h<strong>um</strong>anas que han confi-<br />
gura<strong>do</strong>, siglo a siglo, una sociedad global y asimétrica. Evidencia, ade-<br />
más, la obnubilante vigencia del "pensamiento único", 10 cuyo esquema<br />
ideológico se escurre en el discurso y la praxis de segui<strong>do</strong>res y detrac-<br />
tores (MELLA, 2007). Pero sobre to<strong>do</strong>, contiene la emergencia de un<br />
pensamiento emancipa<strong>do</strong>r que, impulsa<strong>do</strong> desde el denomina<strong>do</strong> Sur,<br />
alcance estatura universal.<br />
<strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong> propone la construcción colectiva de ese pensamiento,<br />
mediante un esfuerzo que convoque y sistematice desde una mirada<br />
<strong>com</strong>pleja, saberes y haceres de to<strong>do</strong>s los sures, en to<strong>do</strong>s los tiempos, a<br />
favor de la h<strong>um</strong>anidad. Este propósito redimensiona la reflexión h<strong>um</strong>anista,<br />
<strong>com</strong>o herencia fundamental en la conformación de un Pensamien-<br />
10. Término atribui<strong>do</strong> a RAMONET (1995). Su uso fue a<strong>do</strong>pta<strong>do</strong> a fines del siglo XX, designan<strong>do</strong> la tendencia a expresar e<br />
imponer ideas con senti<strong>do</strong> hegemónico o <strong>do</strong>minante. La expresión se asocia principalmente a la supremacía del pensamiento<br />
"neoliberal" en la dinámica económica, política, social y ambiental del planeta, auspiciada por los países desarrolla<strong>do</strong>s.<br />
195
196<br />
to del Sur transforma<strong>do</strong>r. El h<strong>um</strong>anismo, <strong>com</strong>o elemento axiológico,<br />
corriente filosófica y práctica cotidiana, ha transita<strong>do</strong> en el pensamien-<br />
to latinoamericano a través de su historia. América Latina cristaliza al<br />
seno de una tradición h<strong>um</strong>anista particular y libera<strong>do</strong>ra. Ello hace necesario<br />
valorar la significación del h<strong>um</strong>anismo Latinoamericano en el<br />
marco de un Pensamiento del Sur para un mun<strong>do</strong> incluyente.<br />
PENSAMIENTO DEL SUR Y HUMANISMO LATINOAMERICANO<br />
Invocar un pensamiento del Sur <strong>com</strong>plejo, que proponga alternativas<br />
de convivencia para una h<strong>um</strong>anidad fracturada, constituye un desafío<br />
reivindicativo y esperanza<strong>do</strong>r. Por un la<strong>do</strong> supone "aprender que<br />
existe el Sur, aprender a ir hacia el Sur, aprender a partir del Sur y con<br />
el Sur" (DE SOuSA, 2009, p. 287), propician<strong>do</strong> una interacción dialógica<br />
entre colectivos y culturas, a fin de equilibrar el inoperante esquema<br />
global. A su vez, implica superar la disyuntiva Norte-Sur, reconectar los<br />
<strong>com</strong>ponentes planetarios naturales y sociales que han si<strong>do</strong> violentos y<br />
artificialmente dispersos y regenerar el actual pensamiento de la h<strong>um</strong>anidad<br />
(MORIN, 2011).<br />
Trascendien<strong>do</strong> los puntos cardinales, <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong> denuncia un mun<strong>do</strong><br />
en crisis ante el fracaso del progreso <strong>com</strong>o re<strong>sul</strong>ta<strong>do</strong> inexorable de la modernidad,<br />
las consecuencias de una homogenización impuesta, la radicalización<br />
de las singularidades, la desvalorización de la condición h<strong>um</strong>ana, la<br />
ampliación de la miseria, la destrucción ambiental. En este escenario, proclama<br />
la urgente necesidad de consolidar un pensamiento del Sur emergente,<br />
que articule un saber diverso e integra<strong>do</strong>r, capaz de re-problematizar<br />
el mun<strong>do</strong> en que vivimos y reactivar, a escala planetaria, la impronta<br />
h<strong>um</strong>anista presente en la identidad y la cultura del sur americano.<br />
Siglo a siglo, la orientación del pensamiento latinoamericano ha si<strong>do</strong><br />
consustancial a un h<strong>um</strong>anismo 11 que renace en la propuesta de un pensamiento<br />
del Sur. Las preocupaciones por el hombre, su naturaleza,<br />
esencia y condición lo diferencian desde sus albores (guADARRAMA,<br />
2003). En su sabiduría primigenia, la cosmovisión amerindia otorgó un<br />
lugar privilegia<strong>do</strong> al ser h<strong>um</strong>ano y su armonía con la naturaleza. La<br />
reducción del hombre autóctono y sus valores ba jo la lógica de la conquista<br />
(DE SOuSA, 2006), sitúan la disputa sobre su condición h<strong>um</strong>ana<br />
11. Como h<strong>um</strong>anismo se conoce a la corriente de pensamiento, ética y praxis h<strong>um</strong>ana que, a lo largo de siglos, ha afirma<strong>do</strong><br />
la centralidad, el valor y la dignidad del ser h<strong>um</strong>ano, cuyo interés primordial lo constituye la vida, la posición del ser h<strong>um</strong>ano<br />
en el mun<strong>do</strong>, su relación consigo mismo y con los demás seres sociales y naturales. Esta mirada incluye y trasciende<br />
la identificación del concepto h<strong>um</strong>anismo con épocas y movimientos filosóficos determina<strong>do</strong>s a través de la historia.
al centro de la problemática h<strong>um</strong>anista que emerge en el pensamiento<br />
escolástico del continente.<br />
El arribo de la Modernidad favoreció las ideas de reivindicación de<br />
lo aborigen y dignificación del hombre latinoamericano — F. J. Clavijero<br />
(México) —, precursoras del pensamiento político emancipatório en<br />
Latinoamérica. La crítica al <strong>do</strong>gmatismo impulsada por la ilustración<br />
criolla — Félix valera (Cuba) —, contribuyó a trascender el pensamiento<br />
escolástico y valorar la capacidad h<strong>um</strong>ana. Este espíritu h<strong>um</strong>anista y<br />
libera<strong>do</strong>r constituyó la plataforma educativa de los próceres de la independencia<br />
latinoamericana, ba jo la influencia de intelectuales <strong>com</strong>o Simón<br />
Rodríguez (venezuela) y Andrés Bello (Chile). Su semilla dio frutos<br />
en el pensamiento h<strong>um</strong>anista bolivariano, la gesta libertaria en el continente<br />
y en los procesos emergentes, autóctonos e integra<strong>do</strong>res que<br />
hoy reconfiguran el panorama latinoamericano (guADARRAMA, 2003).<br />
En la antigua España, in<strong>sul</strong>ar y bicéfala, la urgencia emancipa<strong>do</strong>ra<br />
de esclavos insurgentes da a la luz el primer país libre de América: haití.<br />
En Santo Domingo, la visión política y h<strong>um</strong>anista de Juan Pablo Duarte<br />
impulsa la independencia y propone un falli<strong>do</strong> proyecto de nación<br />
<strong>do</strong>minicana sustentada en la fe, la libertad, el patriotismo y la justicia<br />
(ALFAu, 1976).<br />
En la conformación histórica del h<strong>um</strong>anismo latinoamericano, antesala<br />
de un pensamiento del Sur, han conflui<strong>do</strong> las más variadas ideologías.<br />
Durante la segunda mitad del siglo xIx e inicios del xx, el positivismo<br />
latinoamericano, 12 su mayor influencia, promovió la transición<br />
de una moral teológica a una moral cívica, el senti<strong>do</strong> de solidaridad, la<br />
soberanía latinoamericana y el rol de la educación en la evolución de<br />
los pueblos — José Ingenieros (Argentina), E. J. varona (Cuba), J. Sierra<br />
(México), J. E. Rodó (uruguay), Eugenio M. de hostos (Puerto Rico). En<br />
ese marco, el h<strong>um</strong>anismo remonta en el pensamiento optimista y liberta<strong>do</strong>r<br />
de José Martí (Cuba) y corrientes <strong>com</strong>o el espiritualismo — Domingo.<br />
F. Sarmiento (Argentina) —, el socialismo y el marxismo — José<br />
Carlos Mariátegui (Perú) —, se insertaron en la tradición h<strong>um</strong>anista,<br />
evolucionaron sus bases éticas y denunciaron el carácter inh<strong>um</strong>ano de<br />
la sociedad (guADARRAMA, 2003; 2004).<br />
Durante el siglo xx, los antipositivistas latinoamericanos — A. khon<br />
(Argentina), A. Caso y J. vasconcelos (México), P. henriquez ureña (R.<br />
12. En América Latina, el positivismo presenta rasgos diferencia<strong>do</strong>res suis generis y as<strong>um</strong>e una perspectiva optimista, desaliena<strong>do</strong>ra,<br />
que confía en la ciencia, el progreso y el desarrollo industrial, pero sobre to<strong>do</strong> en el ser h<strong>um</strong>ano y su capacidad<br />
creativa. A diferencia del positivismo europeo, entre sus disonantes voces resurge la preocupación h<strong>um</strong>anista vigente en el<br />
pensamiento latinoamericano precedente y la potencia.<br />
197
198<br />
Dominicana) —, desde distintas ópticas reivindican la urgencia de un<br />
nuevo h<strong>um</strong>anismo y la emergencia de un sentimiento de unidad americanista.<br />
En las últimas décadas, el pensamiento reivindicativo del hombre<br />
americano se amplia y profundiza desde distintas formas y espacios:<br />
Filosofía de la liberación de E. Dussel (Argentina); Pedagogía del<br />
Oprimi<strong>do</strong> de P. Freire (Brasil), Teoría de la dependencia de Theotonio<br />
<strong>do</strong>s Santos (Brasil), filosofía latinoamericana de L. zea (México), entre<br />
otras; revelan<strong>do</strong> la intención <strong>com</strong>ún de alcanzar la autenticidad latinoamericana<br />
que propugna un pensamiento del Sur.<br />
EN LA TRAMA DE LO UNIVERSAL<br />
Recorrer la huella del h<strong>um</strong>anismo en América Latina revela que en<br />
este Sur, plural y diverso se ha pensa<strong>do</strong>, senti<strong>do</strong> y obra<strong>do</strong> desde siempre<br />
a través de miradas diversas que reivindican "el valor y de la dignidad<br />
de to<strong>do</strong> ser h<strong>um</strong>ano, quienquiera que sea, venga de <strong>do</strong>nde venga"<br />
(MORIN, 2011, p.3). Al mismo tiempo, la realidad continental evidencia<br />
la densa, sostenida y prevaleciente presencia de ideas, sistemas, prácticas<br />
y valores — autóctonos <strong>com</strong>o foráneos —, contradictorios a esta<br />
ética de la vida que retorna esperanza<strong>do</strong>ra en un pensamiento del Sur.<br />
<strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong> propone conocer desde el sur para cambiar al mun<strong>do</strong>.<br />
un "Sur" simbólico, diverso, vital, reconecta<strong>do</strong> al concierto de condiciones<br />
h<strong>um</strong>anas en el contexto planetario. Invita a reinventar "caminos improbables<br />
pero posibles, que permitirán caminar hacia la dirección de<br />
la metamorfosis, misión grandiosa y universal del pensamiento del Sur".<br />
Nos llama a recuperar un h<strong>um</strong>anismo sin fronteras ni tiempo y construir<br />
juntos un saber integra<strong>do</strong>r que cure la separación.
REFERENCIAS<br />
ALFAu, v. Ideario de Duarte. Santo Domingo: Dirección General de Cultura de la<br />
Secretaría de Esta<strong>do</strong> de Educación, Bellas Artes y Cultos, 1976.<br />
FRANCOvICh, g. H<strong>um</strong>anismo latino-americano. [S.l.]: Biblioteca Virtual universal,<br />
2003. Disponível em: . Acesso em:<br />
jan. 2011.<br />
guADARRAMA, P. Jose Martí y el h<strong>um</strong>anismo en América Latina. Bogotá: Convenio<br />
Andres Bello, 2003. (Colección Confluencias).<br />
guADARRAMA, P. Positivismo y antipositivismo en América Latina. Ciencias Socia-<br />
les, La Habana, 2004.<br />
MELLA, P. Las relaciones norte-sur. Barcelona: Cátedra de Ética y Pensamiento Cris-<br />
tiano, Instituto Químico de Sarrià, Santo Domingo, 2007. Conferencia não publica-<br />
da, versão digital.<br />
MORIN, E. <strong>Para</strong> un pensamiento del Sur. 2011. Mimeografa<strong>do</strong>.<br />
RAMONET, I. La Pensée unique. Le Monde Diplomatique, Paris, p. 1, janv. 1995. Dispo-<br />
nível em: . Acesso em:<br />
jan. 2011.<br />
SOuSA, B. Conocer desde el sur: para una cultura política emancipatoria. Lima:<br />
Fon<strong>do</strong> Editorial, 2006.<br />
SOuSA, B. Una epistemología del sur: la reivindicación del conocimiento y la<br />
emancipación social: CLACSO y siglo XXI. México: Consejo Latinoamericano de<br />
Ciencias Sociales, 2009.<br />
199
200<br />
sOtOlONGO, peDRO luIs<br />
CODINA<br />
Ph.D. en Filosofía; Ms.C. en Física. Presidente Funda<strong>do</strong>r de<br />
la Cátedra de Complejidad de La Habana. Organiza<strong>do</strong>r de<br />
Seminarios Bienales Internacionales Complejidad (2002,<br />
2004, 2006 y 2008), así <strong>com</strong>o de Talleres Cubanos de Complejidad<br />
(2003, 2005 y 2007). Miembro de la Comunidad de<br />
Pensamiento Complejo (Argentina); del Comité Académico<br />
Internacional del Instituto de Pensamiento Complejo <strong>Edgar</strong><br />
<strong>Morin</strong> (IPCEM). Editor Temático de la Revista Internacional<br />
Emergence, Complexity & Organization (E:CO) de E.U. Reino<br />
Uni<strong>do</strong>. Autor de Libros y artículos en varios países. Miembro<br />
de la Asociación Nacional de Escritores de Cuba (Uneac). Ha<br />
forma<strong>do</strong> a estudiosos de la Complejidad en países del Caribe,<br />
Centro y Sur América. Orden C. J. Finlay, la mayor otorgada a<br />
científicos cubanos por la obra de la vida.
hacia un<br />
pensamiento<br />
— <strong>com</strong>plejo y<br />
crítico — del<br />
Sur<br />
En Agosto del 2009, en Lima, al inaugurarse el Instituto Peruano<br />
de Pensamiento Complejo que lleva su nombre, los allí presentes es-<br />
cuchamos a <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong> expresar la necesidad e importancia de "un<br />
pensamiento del Sur"; arg<strong>um</strong>entán<strong>do</strong>nos que no se trata de rechazar<br />
cualquier idea o realidad proveniente de un Norte geográfico, sino de<br />
trascender el hegemonismo ejerci<strong>do</strong> por características de un mo<strong>do</strong> de<br />
vivir y pensar, desde la modernidad, sobre nuestra manera de conocer,<br />
de valorar, de sentir, de actuar y de vivir, en condiciones distintas a ese<br />
Norte. Como él mismo nos escribe en otro reciente <strong>do</strong>c<strong>um</strong>ento, se trata<br />
de poner en juego un pensamiento <strong>com</strong>plejo del Sur, y nos insta a que<br />
sea, asimismo, un pensamiento conscientemente crítico.<br />
<strong>Para</strong> ser fieles a ese llama<strong>do</strong>, es preciso no olvidar lo que alguien<br />
dijera: pensar <strong>com</strong>plejo es tener en cuenta to<strong>do</strong>-lo-que-debe-ser-teni<strong>do</strong>-en-cuenta;<br />
y que un pensar crítico es pensar para-no-dejar-que-lascosas-sigan-igual,…<br />
sino-para-propiciar-que-las-cosas-cambien; o sea,<br />
un pensar para la acción, para actuar. Entonces un pensar <strong>com</strong>plejo<br />
crítico es aquel que sabe tener en cuenta to<strong>do</strong>-lo-que-debe-ser-teni<strong>do</strong>en-cuenta-para-propiciar-que-las-cosas-cambien.<br />
y entonces lo primero<br />
que tenemos — y debemos — tener-en-cuenta es en qué consiste ese<br />
201
202<br />
aludi<strong>do</strong> hegemonismo proveniente del "Norte", ya que es lo-que-debe-<br />
mos-propiciar-que-cambie. y ese hegemonismo no "ha caí<strong>do</strong> del cielo",<br />
<strong>com</strong>o el maná bíblico, sino que ha emergi<strong>do</strong> — retroalimentán<strong>do</strong>lo y<br />
propicián<strong>do</strong>lo hasta hoy día — de to<strong>do</strong> un patrón de poder que se fue<br />
erigien<strong>do</strong> a partir de la modernidad, con<strong>com</strong>itantemente con una manera<br />
de producir e intercambiar bienes posee<strong>do</strong>ra de una impresionante<br />
capacidad para generar riquezas materiales y culturales, posibilitantes<br />
de bienestar (para <strong>com</strong>probarlo basta con <strong>com</strong>parar cómo se vivía en<br />
el siglo xvII — o aún en el xIx — y cómo se puede ya vivir ahora); pero al<br />
mismo tiempo, posee<strong>do</strong>ra de una igualmente impresionante incapacidad<br />
para distribuir y cons<strong>um</strong>ir de mo<strong>do</strong> justo y ético esa riqueza material<br />
y cultural que produce (para <strong>com</strong>probarlo basta con constatar hoy la<br />
treintena de países con significativo desarrollo y los más de ciento cincuenta<br />
países con escaso desarrollo).<br />
Semejante hegemonía a trascender plantea por otra parte, la dificultad<br />
de aprehender nuestras realidades "sureñas" (a partir de esa modernidad),<br />
sin su imbricación con las realidades "norteñas". No para justificarlas,<br />
sino para, desde tal pensamiento <strong>com</strong>plejo y crítico del Sur,<br />
<strong>com</strong>prender mejor su emerger, su desplegarse y cómo llegaron a ejercer<br />
su <strong>do</strong>minio sobre nosotros en sus diversas modalidades: la concentración<br />
"en el poder y en los desarrollos materiales", la valoración excesiva<br />
de "la técnica, de la economía, del cálculo, de la racionalización (tergiversa<strong>do</strong>ra<br />
de la racionalidad), de la rentabilidad, de la eficacia" (en y<br />
para el merca<strong>do</strong>), to<strong>do</strong> lo cuál nos previene <strong>Morin</strong> <strong>com</strong>o aspectos a<br />
ser trascendi<strong>do</strong>s por ese pensamiento <strong>com</strong>plejo y crítico del Sur para<br />
así poder propiciar-que-cambien hacia ese "mun<strong>do</strong> mejor que es posible".<br />
Tal pensar nos ayudará a <strong>com</strong>prender mejor que la historia de<br />
la colonialidad suramericana y caribeña y la de la modernidad eurocentrada,<br />
no son procesos independientes; que uno no ocurrió primero<br />
y el otro después, <strong>com</strong>o su consecuencia, sino que ambos constituyeron<br />
caras de una misma dinámica <strong>com</strong>pleja que marcó el <strong>com</strong>ienzo de un<br />
sistema-mun<strong>do</strong> que desde su eurocentrismo "tejió los hilos" de nuestro<br />
horizonte de senti<strong>do</strong> (de la manera cómo pensábamos, de cómo — y<br />
qué — conocíamos, de cómo — y qué — valorábamos y/o sentíamos y<br />
de cómo — y para qué — actuábamos); to<strong>do</strong> ello a través de ese patrón<br />
de poder que ya necesitamos propiciar-que-cambie.<br />
Patrón de poder y sistema-mun<strong>do</strong> que nos han conduci<strong>do</strong> a la globalización<br />
no sólo de las <strong>com</strong>unicaciones, de las transacciones <strong>com</strong>erciales<br />
y las operaciones financieras, de la información y el conocimiento<br />
(sin olvidar que millones y millones de seres h<strong>um</strong>anos aún no saben ni
leer ni escribir); sino que también nos han "globaliza<strong>do</strong> las crisis": la<br />
ambiental, la energética, la alimentaria, la financiera-económica, la de<br />
los valores, la de la política, la de la distribución de la riqueza (mientras<br />
la brecha entre los más ricos y los más pobres se incrementa), la<br />
de la convivencia h<strong>um</strong>ana (cons<strong>um</strong>o y tráfico de drogas; criminalidad<br />
organizada; precariedad y marginalidad económica; tráfico de personas,<br />
migraciones masivas). Lo cuál nos hace ver que vivimos no en una<br />
"época de cambios", sino en un cambio de época, urgi<strong>do</strong>s de una verdadera<br />
regeneración civilizatoria, <strong>com</strong>ponente de la cuál pueden — y<br />
deberían ser — artes de vivir "sureños" <strong>com</strong>o "el vivir Bien" boliviano, o<br />
"el Bien vivir" peruano o ecuatoriano; así <strong>com</strong>o el "Mío nada, To<strong>do</strong>-de-<br />
To<strong>do</strong>s" centroamericano, <strong>com</strong>o ilustraciones de nuestra especificidad<br />
multiétnica y multicultural rica y diversa, tantas veces omitida. Las que<br />
están reivindicán<strong>do</strong>se por un "Movimiento de los Movimientos" sociales<br />
(desde las bases de la sociedad), que reivindica asimismo las producciones<br />
locales auto-abastece<strong>do</strong>ras, to<strong>do</strong> <strong>com</strong>o una dialógica entre globalización<br />
y localización, que "rescata" a lo social "secuestra<strong>do</strong>" por lo<br />
político (y subordina<strong>do</strong>s ambos a la lógica de la economía del merca<strong>do</strong><br />
global). Por lo mismo, estamos obliga<strong>do</strong>s a constatar — nos gusten más<br />
o nos gusten menos (según sea el caso) — y a tener muy en cuenta<br />
(sin endiosarlas, ni satanizarlas), las realidades en nuestra región que<br />
evidencian que estamos vivien<strong>do</strong> en el Sur americano una auténtica<br />
época transicional, con procesos emergentes — de corta, media y larga<br />
duración — o si se prefiere, de cambios y transformaciones superficiales,<br />
otros de más profundidad y algunos de gran profundidad y densidad<br />
histórica (con dinámicas diferenciales inherentes, necesitadas de<br />
más estudio) — que están propician<strong>do</strong> y conducién<strong>do</strong>nos de manera<br />
no predictible, pero si previsible, hacia una nueva situación de bifurcación<br />
(de cambio cualitativo) de un proceso más global de alcance<br />
planetario de la ya aludida regeneración civilizatoria en la que nuestra<br />
región sureña, en particular la del hondón suramericano andino podría<br />
desempeñar — y está ya <strong>com</strong>enzan<strong>do</strong> a desempeñar — un papel de<br />
vanguardia de época. Son esos cambios en el plasto profun<strong>do</strong> de nuestra<br />
historia (los que se enlazan con las circunstancias y los cambios de<br />
larga duración), los que dejan una marca indeleble en las socialidades,<br />
fruto de los llama<strong>do</strong>s "acontecimientos ruptura". y son precisamente<br />
entre éstos últimos los que re<strong>sul</strong>ten en las bifurcaciones (en el lengua je<br />
de las Ciencias de la Complejidad) de escala mundial, los que podrían<br />
propiciar esa mutación civilizatoria cada vez más urgente y necesaria.<br />
No obstante, el resplan<strong>do</strong>r de otros acontecimientos también contemporáneos<br />
los hace proclives a ser sobrevalora<strong>do</strong>s en su inmediatez,<br />
203
204<br />
sin la suficiente perspectiva histórica profunda, no re-dimensionán<strong>do</strong>-<br />
los adecuadamente. Ello concierne a no desl<strong>um</strong>brarnos — y/o a que no<br />
nos desl<strong>um</strong>bren — con una visión "norteña" de la actual globalización —<br />
menos con su orientación neoliberal — <strong>com</strong>o si plasmara algo totalmente<br />
nuevo y marcará la culminación floreciente de ese aludi<strong>do</strong> patrón de<br />
poder, <strong>com</strong>o si éste fuera cada vez más sóli<strong>do</strong>, maduro e insustituible.<br />
Se nos plantea, por el contrario, a los del Sur, la necesidad de aprehender<br />
esa globalización "a contrapelo" de la historia que de ella nos cuentan.<br />
Lo que conduce a arg<strong>um</strong>entar que la presente globalización es una<br />
culminación, sí, pero de un proceso de "mundialización" <strong>com</strong>enza<strong>do</strong> a<br />
fines del siglo xv, con el inicio de la conquista y colonización de nuestro<br />
sub-continente latinoamericano y caribeño; culminación que marca no<br />
el auge y florecimiento de ese patrón de poder, sino el <strong>com</strong>ienzo epocal<br />
del fin del perio<strong>do</strong> histórico de su pre<strong>do</strong>minio, <strong>com</strong>o lo atestigua la ya<br />
mencionada multi-crisis global creciente que cada vez más padecemos.<br />
Desde la profunda convicción de que la convergencia del pensar<br />
<strong>com</strong>plejo y del pensar crítico re<strong>sul</strong>ta imprescindible para <strong>com</strong>prender<br />
los procesos que están ocurrien<strong>do</strong> en nuestro Sur, y en tanto ni el pensamiento<br />
<strong>com</strong>plejo ni el pensamiento crítico son espontáneos, sino que<br />
son fruto de una cierta disciplina y ejercicio del pensar, asimismo expresamos<br />
la convicción de que tanto más consciente deberá ser su articulación<br />
en un pensamiento — <strong>com</strong>plejo y crítico — del Sur. Es ese el<br />
pensamiento del Sur que necesitamos.
205
206<br />
sOuzA, MARIA AlICe<br />
lOpes<br />
Pós-graduada em <strong>Psi</strong>cologia da Educação pelo Instituto de<br />
Estu<strong>do</strong>s Avança<strong>do</strong>s em Educação da Fundação Getúlio Vargas<br />
(Iesae). Pedagoga <strong>com</strong> habilitação em Magistério e Supervisão.<br />
Especialista em Educação Especial pelo Instituto de<br />
Educação <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> Rio de Janeiro. Atua na Gerência de<br />
Educação e Ação Social <strong>do</strong> Departamento Nacional <strong>do</strong> SESC,<br />
desde 2007, <strong>com</strong> experiência em supervisão e coordenação<br />
pedagógica em escolas, regência de turmas da Educação<br />
Infantil e <strong>do</strong> Curso de Formação de Professores, <strong>com</strong> ênfase<br />
no processo de alfabetização.
contribuições<br />
"<strong>Para</strong> <strong>um</strong><br />
<strong>pensamento</strong><br />
<strong>do</strong> Sul"<br />
A releitura de <strong>um</strong> <strong>do</strong>s maiores escritores brasileiros e pensa<strong>do</strong>r das<br />
questões da vida e <strong>do</strong> cotidiano <strong>do</strong> Sul, guimarães Rosa, serviu-me de<br />
inspiração durante o estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> texto de <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong>. Destaco aqui os<br />
trechos que mais me marcaram: "Mire veja: o mais importante e bonito,<br />
<strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não<br />
foram terminadas — mas que elas vão sempre mudan<strong>do</strong>. Afinam ou desafinam.<br />
verdade maior. é o que a vida me ensinou" (ROSA, 2001, p. 39).<br />
E: "A gente tem que sair <strong>do</strong> sertão! Mas só se sai <strong>do</strong> sertão é toman<strong>do</strong><br />
conta dele e de dentro" (idem, p. 294).<br />
Outro autor a quem também recorri foi Paulo Freire, que desenvolveu<br />
conceitos muito próximos aos utiliza<strong>do</strong>s por <strong>Morin</strong>, <strong>com</strong>o, por exemplo:<br />
hominização, dialógica, esperança, racionalidade, problematização,<br />
fragmentação <strong>do</strong>s saberes, prática reflexiva, formação de professores.<br />
Como temas centrais que podem inspirar o <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul, <strong>Morin</strong><br />
aponta para a conciliação <strong>do</strong> senti<strong>do</strong> da diversidade concreta da<br />
vida, das crenças; a problematização <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> baseada no h<strong>um</strong>anismo<br />
<strong>com</strong>o valor e dignidade de to<strong>do</strong> ser h<strong>um</strong>ano; a propagação <strong>do</strong> h<strong>um</strong>anismo<br />
na "era planetária em que toda h<strong>um</strong>anidade vive <strong>um</strong>a <strong>com</strong>unidade<br />
de destino"; a problematização das nossas relações.<br />
207
208<br />
é preciso entender que a razão não é única, monolítica, simples;<br />
atentar para a "racionalidade aberta que reconhece os limites de sua<br />
capacidade de apreensão"; fazer a crítica à racionalização, <strong>com</strong>o racionalidade<br />
degenerada, fundada n<strong>um</strong>a lógica implacável e limitada;<br />
ampliar o entendimento sobre a existência de vários "suis" <strong>com</strong>o "nortes"<br />
e "misturar as heranças culturais mediterrâneas <strong>com</strong> as heranças<br />
culturais africanas e <strong>sul</strong>-americanas".<br />
A problematização da mundialização deve reunir e conjugar todas as<br />
heranças culturais. Desde a colonização, a escravidão, ainda presente no<br />
Sul, des<strong>do</strong>bra-se sob a forma de globalização, <strong>com</strong> novos perigos para a<br />
h<strong>um</strong>anidade, <strong>com</strong>o a degradação da biosfera, as diversas crises planetárias,<br />
o cons<strong>um</strong>o desenfrea<strong>do</strong> e os novos conflitos étnico-religiosos.<br />
Na insegurança sobre o futuro e na angústia <strong>do</strong> presente, o que resta<br />
é a volta às raízes. vivemos a crise <strong>do</strong> desenvolvimento, ao mesmo<br />
tempo <strong>com</strong>o crise da ocidentalização e crise da mundialização, trazen<strong>do</strong><br />
a miséria, que implica dependência e h<strong>um</strong>ilhação. A crise da mundialização<br />
é, também, a crise da unificação tecnoeconômica <strong>do</strong> globo,<br />
<strong>do</strong> capitalismo e das tele<strong>com</strong>unicações, que permitem que to<strong>do</strong>s os<br />
pontos <strong>do</strong> planeta estejam em conexão imediata — homogeneizante,<br />
<strong>com</strong>o ameaça às originalidades e às singularidades culturais, étnicas,<br />
nacionais, decorren<strong>do</strong> reações de retorno à nação, à etnia e, até mesmo,<br />
à religião. São <strong>do</strong>is grandes perigos para a h<strong>um</strong>anidade: a unificação<br />
abstrata e homogeneizante, que destrói as diversidades e, ao mesmo<br />
tempo, o fechamento das singularidades em si mesmas, tornan<strong>do</strong>-as<br />
abstratas, isolan<strong>do</strong>-as <strong>do</strong> resto da h<strong>um</strong>anidade.<br />
O desafio é encontrar <strong>um</strong> caminho para sair <strong>do</strong> antagonismo entre<br />
a diversidade fechada em si mesma e a unidade abstrata. A hegemonia<br />
<strong>do</strong> norte produz "a cegueira <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong> funda<strong>do</strong> essencialmente<br />
no cálculo", cego para a existência, para os sentimentos, para a consciência,<br />
"cego para o la<strong>do</strong> h<strong>um</strong>ano da h<strong>um</strong>anidade". Trata-se <strong>do</strong> h<strong>um</strong>anismo<br />
em sintonia <strong>com</strong> o que pensou Paulo Freire, <strong>com</strong>o "<strong>com</strong>promisso<br />
radical <strong>com</strong> o homem concreto. Compromisso nortea<strong>do</strong> pela transformação<br />
de qualquer situação objetiva na qual o homem concreto esteja<br />
impedi<strong>do</strong> de ser mais" (FREIRE, 1979, p. 22).<br />
Os conhecimentos separa<strong>do</strong>s, fragmenta<strong>do</strong>s, conforme os <strong>pensamento</strong>s<br />
<strong>do</strong>minantes <strong>do</strong> Norte, não permitem apreender a <strong>com</strong>plexidade<br />
<strong>do</strong>s fenômenos globais e o caráter fundamental de nossos problemas<br />
vitais; tornan<strong>do</strong> cada vez mais difícil a busca por saídas. E dificulta<br />
também a busca <strong>do</strong>s princípios éticos imprescindíveis às sociedades<br />
h<strong>um</strong>anas na formação <strong>do</strong>s laços entre a unidade e a diversidade, <strong>um</strong>a
vida solidária e amorosa, da qual nos fala Freire, ou ainda, <strong>com</strong>o nos di-<br />
zeres de Rosa: "<strong>um</strong> ainda não é <strong>um</strong>: quan<strong>do</strong> ainda faz parte <strong>com</strong> to<strong>do</strong>s"<br />
(ROSA, 2001, p. 201); "O mun<strong>do</strong> ali tinha de ser de se re<strong>com</strong>eçar" (idem,<br />
p. 474); "viven<strong>do</strong>, se aprende; mas o que se aprende, mais, é só a fazer<br />
outras maiores perguntas" (idem, p. 429).<br />
Sobre as experiências inova<strong>do</strong>ras implementadas e/ou em curso que<br />
ilustram o <strong>pensamento</strong> e/ou as identidades <strong>do</strong> Sul, podemos pensar<br />
nos movimentos culturais da periferia <strong>com</strong>o grande novidade <strong>do</strong> século<br />
xxI. Os novos movimentos culturais gera<strong>do</strong>s em favelas e periferias<br />
das grandes cidades repercutem e ultrapassam os limites da exclusão,<br />
influencian<strong>do</strong> as culturas urbanas. Como <strong>um</strong> fenômeno mais amplo, não<br />
restrito aos locais onde é engendra<strong>do</strong>, ressoam e renovam a cultura urbana<br />
de forma impactante.<br />
OS MOVIMENTOS ECOLÓGICOS EM BUSCA DE SAÍDAS PLANETÁRIAS<br />
Alguns marcos surgem no Sul, <strong>com</strong>o a Conferência das Nações unidas<br />
sobre Ambiente e Desenvolvimento, a Rio-92, quan<strong>do</strong> foram assina<strong>do</strong>s<br />
importantes acor<strong>do</strong>s ambientais globais da história da h<strong>um</strong>anidade.<br />
Entre eles, as Convenções <strong>do</strong> Clima e da Biodiversidade, a Agenda<br />
21, a Declaração <strong>do</strong> Rio para Meio Ambiente e Desenvolvimento e a Declaração<br />
de Princípios para Florestas.<br />
Apesar <strong>do</strong>s muitos <strong>com</strong>promissos ass<strong>um</strong>i<strong>do</strong>s, nem todas as nações<br />
assinaram os acor<strong>do</strong>s e não há o efetivo controle <strong>do</strong>s impactos ambientais<br />
que continuam a ameaçar a vida no planeta. E, além disso, permanecem<br />
em aberto questões <strong>com</strong>o a diminuição da pobreza no mun<strong>do</strong>,<br />
a fome, as desigualdades sociais e econômicas e o uso sustentável <strong>do</strong>s<br />
recursos naturais.<br />
FÓRUNS E MOVIMENTOS SOCIAIS<br />
é importante, ainda, ressaltar os movimentos sociais que surgiram<br />
nas últimas décadas, <strong>com</strong>o o <strong>do</strong>s trabalha<strong>do</strong>res rurais que fundaram<br />
<strong>um</strong> movimento social camponês, autônomo, em busca da reforma agrária<br />
e de propostas de transformações sociais para o país. Inicialmente<br />
forma<strong>do</strong> por posseiros atingi<strong>do</strong>s por barragens, migrantes, meeiros e<br />
pequenos agricultores, o movimento <strong>do</strong>s trabalha<strong>do</strong>res rurais conquistou<br />
novas formas de organização, incluin<strong>do</strong> a educação sob <strong>um</strong>a nova<br />
perspectiva e saberes, da alfabetização à formação acadêmica, em<br />
cursos universitários específicos <strong>com</strong> abordagens inéditas.<br />
Outro item que merece ser destaca<strong>do</strong> é o sucesso <strong>do</strong>s fóruns sociais,<br />
<strong>com</strong>o o Fór<strong>um</strong> Social Mundial, cria<strong>do</strong> <strong>com</strong>o contraponto ao Fór<strong>um</strong> Mun-<br />
209
210<br />
dial Econômico de Davos, tão marca<strong>do</strong> pelos acor<strong>do</strong>s e propostas neoli-<br />
berais, que reúne os mais diversos setores das sociedades. há também<br />
os fóruns mundiais <strong>com</strong>o o da Educação, <strong>do</strong> Turismo etc.: manifestações<br />
<strong>com</strong> temáticas tão diferentes que favorecem a busca por diminuir desigualdades,<br />
o respeito às diversidades e a preocupação em valorizar as<br />
diferentes manifestações h<strong>um</strong>anas.<br />
Apesar da redução <strong>do</strong> número de ditaduras pelo mun<strong>do</strong>, principalmente<br />
na América <strong>do</strong> Sul, e os avanços na consolidação <strong>do</strong>s direitos h<strong>um</strong>anos,<br />
não há ainda muito que <strong>com</strong>emorar em relação ao que ocorre,<br />
por exemplo, <strong>com</strong> a maioria <strong>do</strong>s povos africanos.<br />
Temos hoje a proposta da Economia Solidária <strong>com</strong>o outra forma de<br />
produção, cons<strong>um</strong>o e distribuição de riqueza, centrada na valorização <strong>do</strong><br />
ser h<strong>um</strong>ano e não no capital. Com base associativista e cooperativista,<br />
volta-se para a produção, cons<strong>um</strong>o e <strong>com</strong>ercialização de bens e serviços<br />
de mo<strong>do</strong> autogeri<strong>do</strong>. Trata-se <strong>do</strong> trabalho <strong>com</strong>o <strong>um</strong> meio de libertação<br />
h<strong>um</strong>ana em <strong>um</strong> processo de democratização econômica, nas dimensões<br />
social, econômica, política, ecológica e cultural. E aqui nos encontramos<br />
mais <strong>um</strong>a vez <strong>com</strong> o <strong>pensamento</strong> de guimarães Rosa: "Tu<strong>do</strong> o que já foi<br />
é o <strong>com</strong>eço <strong>do</strong> que vai vir, toda a hora a gente está n<strong>um</strong> cômpito. Eu<br />
penso é assim, na paridade. viver é muito perigoso, e não é não. Nem sei<br />
explicar estas coisas. <strong>um</strong> sentir é <strong>do</strong> sentente, mas outro é <strong>do</strong> senti<strong>do</strong>r"<br />
(idem, p. 328); "Eu sei que isto que estou dizen<strong>do</strong> é dificultoso, muito entrança<strong>do</strong>.<br />
Mas o senhor vai avante. (...) Eu queria decifrar as coisas que<br />
são importantes" (idem, p. 116).<br />
E, para concluir, cito as questões prioritárias a serem tratadas pelo<br />
olhar <strong>do</strong> Sul na direção de <strong>um</strong>a política de civilização:<br />
a) Juntar a prosa (<strong>do</strong> Norte) <strong>com</strong> a poesia (<strong>do</strong> Sul), integran<strong>do</strong> as contribuições<br />
benéficas <strong>do</strong> Norte <strong>com</strong> o sentimento de solidariedade e as artes de<br />
viver, de maneira extrovertida, <strong>com</strong>unicativa, <strong>com</strong> hospitalidade, preservan<strong>do</strong><br />
as qualidades poéticas, <strong>do</strong> Sul.<br />
b) O <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul deve ser <strong>com</strong>plexo, aberto às <strong>com</strong>plexidades<br />
da vida, às realidades h<strong>um</strong>anas e <strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, no senti<strong>do</strong> <strong>do</strong> que é teci<strong>do</strong><br />
em conjunto, o <strong>pensamento</strong> que religa o que foi artificialmente separa<strong>do</strong>,<br />
religa o que está disperso e poderia, assim, recuperar as qualidades e a<br />
poesia da vida.<br />
c) O diálogo permanente entre a razão e a paixão para alcançar <strong>um</strong>a<br />
nova sabe<strong>do</strong>ria, que valorize as virtudes <strong>do</strong> amor e <strong>do</strong> senti<strong>do</strong> de <strong>com</strong>unidade.<br />
Ass<strong>um</strong>ir a condição h<strong>um</strong>ana, a resposta às angústias da vida é <strong>um</strong><br />
encontro na <strong>com</strong>unidade, no amor, na <strong>do</strong>ação de si.
d) Nas sociedades, <strong>com</strong>o em to<strong>do</strong>s os seres h<strong>um</strong>anos, existem capaci-<br />
dades criativas a<strong>do</strong>rmecidas. Diz <strong>Morin</strong>: "As capacidades gera<strong>do</strong>ras <strong>do</strong>r-<br />
mem nas sociedades e despertam em épocas de crise, <strong>com</strong>o possibilida-<br />
des criativas de superação. A aspiração à harmonia permeia toda a história<br />
da h<strong>um</strong>anidade". Existem ilhas de harmonia na nossa vida cotidiana. Essa<br />
aspiração pode suscitar regenerações.<br />
e) Leonar<strong>do</strong> Boff propõe para a nova era "ecozóica" <strong>um</strong>a cosmologia<br />
da transformação: "Nós mesmos somos a parte consciente e inteligente <strong>do</strong><br />
universo e podemos enfrentar a crise, detectar o esgotamento de certos<br />
hábitos culturais e inventar novas formas de sermos h<strong>um</strong>anos, de produzirmos,<br />
cons<strong>um</strong>irmos e convivermos" (BOFF, 2009).<br />
f) que os seres h<strong>um</strong>anos exerçam a esperança crítica, <strong>com</strong>o presenças<br />
cria<strong>do</strong>ras, capazes de transformar a realidade em que estão inseri<strong>do</strong>s,<br />
"<strong>um</strong>a esperança crítica que move os homens para a transformação" (FREI-<br />
RE, 1979).<br />
Temos escolhas a fazer, pois o nosso sistema encontra-se condena<strong>do</strong><br />
à morte ou à metamorfose (transformação). <strong>Morin</strong> nos convida, n<strong>um</strong>a<br />
perspectiva de muita esperança, a buscar os caminhos improváveis,<br />
mas possíveis, que permitirão caminhar na direção da metamorfose,<br />
<strong>com</strong>o missão inexorável <strong>do</strong> <strong>pensamento</strong> <strong>do</strong> Sul.<br />
REFERÊNCIAS<br />
BOFF, Leonar<strong>do</strong>. Cosmologia da <strong>do</strong>minação em crise. 27 fev. 2009. Disponível em:<br />
. Acesso em: jan. 2011.<br />
FREIRE, Paulo. Educação e mudança. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.<br />
ROSA, João guimarães. Grande sertão: Veredas. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,<br />
2001.<br />
211
212<br />
VAllejO-GOMez,<br />
NelsON<br />
Es filósofo colombiano-francés. Magíster en Filosofía por la<br />
Universidad Sorbona Paris-IV. Doctor Honoris Causa de la<br />
Universidad Nacional de T<strong>um</strong>bes (Perú, 2007), Doctor Honoris<br />
Causa de la Universidad Nacional de Cajamarca (Perú, 2009),<br />
Doctor Honoris Causa de la Universidad de Caldas (Colombia,<br />
2010), ha publica<strong>do</strong> ensayos de filosofía política y de<br />
literatura en diferentes revistas de Colombia, Brasil, Venezuela,<br />
Esta<strong>do</strong>s-Uni<strong>do</strong>s, Rusia, Italia y Francia. Libros publica<strong>do</strong>s:<br />
<strong>Morin</strong>, h<strong>um</strong>anista planetario — Ensayos y entrevistas (2009),<br />
La Latinité à la recherche de l’Universel, en colaboración con<br />
Candi<strong>do</strong> Mendes (2000). Trad. en castellano, La latinidad en<br />
la búsqueda del universal (2007). El h<strong>um</strong>anista planetario<br />
— homenaje internacional a <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong>, editor en colaboración<br />
con Gustavo López Ospina (2001). Ha si<strong>do</strong> secretario particular<br />
de <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong>, secretario general de la Association<br />
pour la Pensée Complexe (APC) y asesor externo de la Unesco.<br />
Actualmente es Asesor del Director General de Educación<br />
media del Ministerio de Educación de Francia.
Pensamiento<br />
del Sur<br />
¿QUÉ TEMAS CENTRALES INSPIRAN EL PENSAMIENTO DEL SUR?<br />
a) La Modernidad: repensar y cuestionar sus aportes, a la luz de la era<br />
planetaria y del paradigma de <strong>com</strong>plejidad, a través de las oposiciones<br />
<strong>com</strong>plementarias que suscitan la Razón (ilustración), el Progreso (desarrollo),<br />
la Ciencia (bienestar), tenien<strong>do</strong> en cuenta la ecología de la acción<br />
que ha genera<strong>do</strong> emergencias contradictorias: razonamiento loco, desarrollo<br />
subdesarrolla<strong>do</strong>, ciencia inconsciente.<br />
b) El Renacimiento: retomar el arte de problematizar los conceptos de<br />
Individuo/Sujeto/hombre (el razonamiento), Naturaleza/Mun<strong>do</strong>/Ser (la realidad),<br />
Sociedad (la cultura, la educación, la política).<br />
c) El h<strong>um</strong>anismo (abstracto, cosmopolita, concreto).<br />
d) Crisis/Metamorfosis: "la misión grandiosa y universal del pensamiento<br />
del Sur es caminar hacia la metamorfosis" (MORIN, 2010). "La metamorfosis<br />
es propiamente un nuevo origen" (MORIN, 2011).<br />
e) Mestizaje genético, étnico, cultural ("la vía mestiza" elabora un h<strong>um</strong>anismo<br />
planetario que incorpora lo mejor de la cultura arcaica, tradicional,<br />
moderna).<br />
213
214<br />
f) Mundialización/globalización — Era Planetaria (proceso geográfico de<br />
territorialización / nacionalización / fronterización versus dinámica virtual<br />
de interrelación / religación / glocalización (anillo local/global, parte/to<strong>do</strong>).<br />
g) Pensamiento del Sur / pensamiento <strong>com</strong>plejo / Política de civilización.<br />
COROLARIO<br />
El pensamiento del Sur es una ilustración (<strong>com</strong>plexus antropo-sociopolítico-epistemológico)<br />
del pensamiento <strong>com</strong>plejo. Por consiguiente,<br />
establecer los conceptos y los razonamientos propios a un pensamiento<br />
del Sur requiere estudiar de entrada la epistemología <strong>com</strong>pleja (el<br />
paradigma de <strong>com</strong>plejidad, el concepto de anillo recursivo, el méto<strong>do</strong><br />
moriniano del pensamiento <strong>com</strong>plejo).<br />
Así pues, antes de abordar los temas centrales para <strong>com</strong>prender lo que se<br />
entiende por pensamiento del Sur, hay que consagrar una sesión de estudio<br />
al pensamiento sistémico que los sustenta (el paradigma de <strong>com</strong>plejidad). En<br />
particular, una sesión de recapitulación del macro concepto moriniano Unitas<br />
Multiplex (organización, sistema, interrelación), así <strong>com</strong>o de los principales<br />
principios sistémicos: a) El to<strong>do</strong> es más que la s<strong>um</strong>a de las partes; b) El to<strong>do</strong> es<br />
menos que la s<strong>um</strong>a de las partes; c) El to<strong>do</strong> es más que el to<strong>do</strong>; d) Las partes<br />
son a la vez más y menos que las partes; e) Las parte son eventualmente más<br />
que el to<strong>do</strong>; f) El to<strong>do</strong> es menos que el to<strong>do</strong>; g) El to<strong>do</strong> es insuficiente; h) El<br />
to<strong>do</strong> es incierto; i) El to<strong>do</strong> es conflictivo (EMILIO ROgER CIuRANA, 1997).<br />
No se trata de sustituir un reduccionismo analítico ("pensamiento<br />
del Norte") por otro reduccionismo ("pensamiento del Sur"). un pensamiento<br />
del Sur pretende ilustrar que, al tomar la "vía del mestiza je cultural<br />
planetario" (MORIN, 2011), se constata por <strong>do</strong>quier experiencias y<br />
emergencias que muestran la posibilidad de pensar de otra manera los<br />
conceptos tradicionales de la Modernidad, del h<strong>um</strong>anismo y de la Mundialización/globalización,<br />
en s<strong>um</strong>a, se trata de salir, <strong>com</strong>o primer paso,<br />
del paradigma en oposición/exclusión, disyunción/reducción. un pensamiento<br />
del Sur debe ser entendi<strong>do</strong> desde un pensamiento sistémico que<br />
refleje paradigmáticamente y no solo teóricamente lo que significa en la<br />
era planetaria el hombre, el mun<strong>do</strong>, la sociedad.<br />
El principio clave de la actividad mental propia a un pensamiento del<br />
Sur, <strong>com</strong>o a la de un pensamiento <strong>com</strong>plejo tiene en cuenta un proceso<br />
cognitivo estratégico, dialógico, recursivo y hologramático (un plus<br />
cualitativo a la lógica racional tradicional).<br />
¿QUÉ EXPERIENCIAS INNOVADORAS QUE SE IMPLEMENTARON Y/O<br />
ESTÁN EN CURSO ILUSTRAN EL PENSAMIENTO Y/O LAS<br />
IDENTIDADES DEL SUR?<br />
a) "Los siete saberes necesarios a la educación del futuro" (unesco, Paris,<br />
1999)
) "La Academia de la Latinidad" (Paris/Rio de Janeiro, 2000)<br />
c) "La base <strong>com</strong>ún de conocimientos y de <strong>com</strong>petencias" (ley de educación<br />
francesa de 2005 y decreto de 2006)<br />
d) "El Instituto de Pensamiento <strong>com</strong>plejo <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong> de la universidad<br />
Ricar<strong>do</strong> Palma" (Lima, 2009)<br />
¿CUÁLES SON LAS CUESTIONES PRIORITARIAS A TRATARSE POR LA<br />
MIRADA DEL SUR HACIA UNA POLÍTICA DE CIVILIZACIÓN?<br />
a) Identidad / Cultura / Educación / Desarrollo<br />
El pensamiento del Sur puede ser la propuesta estratégica para<br />
pensar un "nuevo origen", una "metamorfosis" planetaria en y desde la<br />
América latina; contribuyen<strong>do</strong> así a una matriz teórico práctica <strong>com</strong>pleja<br />
para renovar los currículos educativos, liberar las mentes, reorganizar<br />
estrategias de identidad, cultura y desarrollo a nivel local, ya no<br />
por medio de una "teología", una "ideología", una "guerrilla" o un plan<br />
estructural de tipo "FMI societal", sino gracias a un pensamiento del Sur,<br />
ético y laico, que anima una matriz paradigmática <strong>com</strong>pleja y reorganiza<br />
la triada individuo-naturaleza-sociedad, en beneficio de nuevas<br />
concepciones del desarrollo, la ciencia y la cultura.<br />
215
216<br />
VelAsCO, juAN MIGuel<br />
GONzAles<br />
Presidente de la Cátedra de Educación Trans<strong>com</strong>pleja La<br />
Paz (Bolivia). Coordina<strong>do</strong>r Doctora<strong>do</strong> y Post<strong>do</strong>ctora<strong>do</strong> de<br />
Educación-Complejidad EMI-La Paz. Crea<strong>do</strong>r de la Teoría Educativa<br />
Trans<strong>com</strong>pleja. Autor de varios obras sobre Currículo<br />
Complejo, Evaluación de los Aprendizajes y Complejidad. Aula<br />
Mente Social, Meta<strong>com</strong>plejidad, Condición H<strong>um</strong>ana. Editor<br />
y Director de Educación y Complejidad. Fractal, Ciencia con<br />
Conciencia para el cambio, Integra Educativa. Coordina<strong>do</strong>r<br />
para Latinoamérica del proyecto Red de Formación Transdisciplinar<br />
(RedFut) España-AECID. Miembro de la Red Mundial<br />
del Pensamiento Complejo. Miembro honorario del Instituto<br />
Peruano del Pensamiento Complejo <strong>Edgar</strong> <strong>Morin</strong>, Lima, Perú.<br />
Miembro del Centro de Estudio e Investigación de la Complejidad<br />
y la Transdisciplinariedad CEICT de la Universidad San<br />
Luís Gonzaga de Ica, Perú. Experto conferencista Internacional<br />
para Latinoamérica y Europa. Docente Internacional de<br />
Programas Doctorales <strong>com</strong>o Doctora<strong>do</strong> en Educación de la<br />
Universidad del Atlántico, en Barranquilla, Colombia.
econectar<br />
lo que está<br />
disperso: un<br />
pensamiento<br />
del Sur<br />
planetario<br />
Tal vez la palabra "Sur" sea la causante de confusión ante un pen-<br />
samiento que no divide o busca diferenciar <strong>do</strong>s posiciones contrarias,<br />
"el Norte", pero el pensamiento <strong>com</strong>plejo los entreteje y <strong>com</strong>plementa.<br />
Durante muchos siglos el pensamiento del Norte ha pre<strong>do</strong>mina<strong>do</strong> en el<br />
mun<strong>do</strong> y ha hecho que diversos aportes se afiancen sin reflexionar y autoanalizarse,<br />
llena de ilusiones tales <strong>com</strong>o la visión de democracia, los<br />
derechos h<strong>um</strong>anos, las autonomías, el materialismo sobre el h<strong>um</strong>anismo,<br />
el concepto de progreso, la ilustración etc. Sin embargo, en medio<br />
de este surgimiento ha esta<strong>do</strong> y estará el pensamiento del Sur, un pensamiento<br />
que permite a la h<strong>um</strong>anidad <strong>com</strong>plementar, problematizar,<br />
cuestionar nuestro existir y del universo, la planetarización <strong>com</strong>o una<br />
visión de conciencia ecológica. La visión de saberes ecologiza nuestra<br />
concepción de único y diverso por lo que la palabra clave que se deviene,<br />
analiza a cada momento o que justamente por la visión del pensamiento<br />
del Norte es "crisis", la misma que es vista en to<strong>do</strong> senti<strong>do</strong>, por<br />
ejemplo, crisis económica, política, ideológica, de desarrollo, material,<br />
y la más importante, la crisis de la h<strong>um</strong>anidad que no nos deja o nos<br />
hace pensar de manera abstracta de lo que es h<strong>um</strong>anidad, es ahí <strong>do</strong>nde<br />
la reivindicación de la condición h<strong>um</strong>ana juega un papel trascendental.<br />
217
218<br />
uno de los procesos reflexivos más importantes para el "Sur" es la<br />
condición h<strong>um</strong>ana que, vista desde un pensamiento del Sur, ubicará<br />
nuestro ser en el planeta y en el universo, hacien<strong>do</strong> creer en nuestro ser<br />
<strong>com</strong>ún y nuestra diversidad h<strong>um</strong>ana, y más profundamente en lo que<br />
nos identifica y nos une <strong>com</strong>o seres h<strong>um</strong>anos, hacien<strong>do</strong> <strong>com</strong>prender en<br />
qué condición, es decir ba jo qué circunstancias nacemos, crecemos,<br />
nos reproducimos y dejamos este mun<strong>do</strong> no solo en lo biológico o en<br />
lo material sino también nuestra trascendencia espiritual. Pero esta no<br />
está <strong>com</strong>pleta sin la visión poética, social, ecológica y diversa en realidades<br />
del Sur.<br />
uno de los momentos más significativos para el ser h<strong>um</strong>ano es su<br />
cotidianidad, <strong>do</strong>nde confluyen infinidad de hechos, circunstancias, relaciones<br />
y vivencias ba jo diversos criterios de pensamiento, vistos entre<br />
un mun<strong>do</strong> macro, micro o tal vez meso, es decir el de las <strong>com</strong>plejidades<br />
y hace que el ser h<strong>um</strong>ano refleje su energía, su materia y su espiritualidad.<br />
Es en su vida cotidiana <strong>do</strong>nde su condición de ser h<strong>um</strong>ano debe<br />
demostrar su existir, su razón de ser en el mun<strong>do</strong> y en el universo, el<br />
elemento que lo distingue <strong>com</strong>o único y <strong>com</strong>o diverso, <strong>do</strong>nde los bucles<br />
vincula<strong>do</strong>s a la razón, al sentimiento, al pensamiento, a su creatividad,<br />
a su grandeza interior y exterior se entremezclan para hacer de los seres<br />
h<strong>um</strong>anos <strong>com</strong>plexus, hombres del Sur.<br />
El pensamiento del Sur en su naturaleza más simple también involucra<br />
hablar de valores, por ejemplo, el valor de la vida, el de la búsqueda<br />
de la libertad, del respeto del otro y de sí mismo, de la búsqueda de<br />
la espiritualidad, de la vinculación del ser con su conciencia, y que en<br />
muchos casos parte de una visión individual a una conciencia social y,<br />
mucho más amplia, la conciencia planetaria.<br />
Este pensar en el Sur permite el acercamiento a la libertad del sujeto,<br />
esa libertad que muchas veces creemos alcanzarla pero que en la<br />
práctica estamos muy lejos de tenerla o la vemos de manera concreta,<br />
cuan<strong>do</strong> hay una gran ambigüedad abstracta que el pensamiento del<br />
Norte no nos deja ver otras posibilidades, nos hace ciegos.<br />
Pero en este pensamiento fragmenta<strong>do</strong> y ciego que nos ha deja<strong>do</strong><br />
el pensamiento del "Norte" hay muchas dispersiones teóricas, prácticas<br />
e ideológicas muy importantes para poder pensar un mun<strong>do</strong> diferente.<br />
Estas cegueras no son nuevas. Siempre han existi<strong>do</strong> ahí, y tampoco<br />
creo que sea el pensamiento del "Sur" una alternativa libre de falencias,<br />
errores o contradicciones. Sin embargo, sí creo que sea posible pensar<br />
en un pensamiento del Sur más optimista con la vida, el tiempo y el<br />
espacio, y, lo más importante, con una nueva forma de civilización, la
misma que durante muchos años ha trata<strong>do</strong> de emerger, lo ha hecho y<br />
ha aporta<strong>do</strong> importantes facetas en la historia de la h<strong>um</strong>anidad.<br />
Pero ¿Cuáles son las alternativas revolucionarias que nos permitirían<br />
ver un senti<strong>do</strong> innova<strong>do</strong>r o práctico en diversas realidades?, uno de<br />
ello es la creación para este 2011, en la ciudad más alta del mun<strong>do</strong>, del<br />
Primer Instituto Internacional para la Complejidad y el Pensamiento del<br />
Sur (IICPS) que traba jará por la integración de saberes y pensamientos,<br />
la <strong>com</strong>prensión, la difusión internacional, la investigación en líneas de<br />
interés entre naciones y la publicación de estas formas de pensamiento<br />
"lo que se teje en conjunto" y "reconecto lo que está disperso". Será un<br />
reto constituir este instituto en el Sur, desde el punto de vista geográfico,<br />
ya que es en Sudamérica <strong>do</strong>nde el pensamiento del Sur tiene mayor<br />
impulso, mayor traba jo y efervescencia mundial, de ahí que constituirlo<br />
en una de las ciudades más representativas de Sudamérica.<br />
De igual manera, el IICPS será un instituto que impulsará el traba jo<br />
en diversas líneas de interés. una de ellas será la educativa, <strong>do</strong>nde se<br />
impulsará la creación de la Primera universidad del Pensamiento del<br />
Sur (uPS). Lógicamente, este centro del saber deberá estar inmerso y<br />
ba jo los principios del pensamiento del Sur, buscan<strong>do</strong> esto que <strong>Edgar</strong><br />
<strong>Morin</strong> llama Tierra-patria y se empezará a constituir en la formación<br />
de forma<strong>do</strong>res, aspecto que considero poco desarrolla<strong>do</strong> aún desde el<br />
pensamiento <strong>com</strong>plejo. La uPS deberá sensibilizar al sujeto hacia una<br />
visión problematiza<strong>do</strong>ra del ser h<strong>um</strong>ano, planetaria, h<strong>um</strong>aniza<strong>do</strong>ra, que<br />
vincule saberes, la condición h<strong>um</strong>ana, la aplicación de los opera<strong>do</strong>res<br />
cognitivos <strong>com</strong>plejos, conteni<strong>do</strong>s transdisciplinares, y, lo más importante,<br />
una universidad con un alto nivel ideológico del Sur.<br />
uno de los mayores empoderamientos del pensamiento del Norte es<br />
el tema "salud": muy parcela<strong>do</strong>, desigual, y a lo largo de los años se han<br />
busca<strong>do</strong> metas que nunca se han c<strong>um</strong>pli<strong>do</strong>, <strong>com</strong>o ejemplo, la famosa<br />
frase "Salud para to<strong>do</strong>s" en el año 2000. El pensamiento del Sur deberá<br />
concientizar al profesional en salud hacia una atención en salud prioritaria,<br />
equitatitiva y diversa. Considero este tema muy importante para<br />
el pensamiento del Sur.<br />
Finalmente, el pensamiento del Sur genera una nueva forma de política<br />
civilizatoria, que a mi parecer ha esta<strong>do</strong> presente en la historia de<br />
la h<strong>um</strong>anidad, solo que en eterna lucha con el pensamiento del Norte.<br />
No quiere decir que existan <strong>do</strong>s ban<strong>do</strong>s literalmente separa<strong>do</strong>s, más<br />
bien los existen puros e híbri<strong>do</strong>s, con tiempos de aparición, y es ahí<br />
<strong>do</strong>nde quiero incidir el tiempo del pensamiento del Sur para reconectar<br />
to<strong>do</strong> lo que ha queda<strong>do</strong> disperso, en busca de una Tierra-patria, una<br />
219
220<br />
política civilizatoria más integra<strong>do</strong>ra y h<strong>um</strong>aniza<strong>do</strong>ra, es decir que nos<br />
permita salir de la prehistoria del conocimiento, de las cegueras de la<br />
ciencia, de la fragmentación de las disciplinas, de la falta de condición<br />
h<strong>um</strong>ana, sacarnos de la crisis de estrés, por una crisis emergente de<br />
cambio permanente.<br />
El pensamiento del Sur, no es sin el Norte, ya que en la unicidad está<br />
la diversidad y viceversa. Creo importante señalar que el pensamiento<br />
del Sur es así llama<strong>do</strong> porque tradicionalmente en el globo terráqueo<br />
los países del Norte han manteni<strong>do</strong> su empoderamiento sobre los del<br />
Sur, tal es el caso de Europa y áfrica o Norteamérica y Centroamérica,<br />
lo cierto es que cada país, cada región, cada localidad, ciudad u hogar<br />
tiene su propio pensamiento del Sur, este pensamiento más poético que<br />
prosaico, más multicultural, tradicional y poco valora<strong>do</strong> por el pensamiento<br />
del Norte. Con ello quiero decir que el pensamiento del Sur, si,<br />
tiene tradicionalmente un fuerte <strong>com</strong>ponente geográfico pero, más que<br />
to<strong>do</strong>, ideológico, con fuertes <strong>com</strong>ponentes re-civilizatorios.
221
222<br />
Licencia<strong>do</strong> en Ciencia Política por la Universidad de Buenos<br />
Aires (Argentina). Diploma de Honor. Doctoran<strong>do</strong> en Ciencias<br />
Sociales por la misma Universidad y Doctoran<strong>do</strong> en Sociología<br />
por la Universidad de Toulouse-1 (Francia). Becario de Investigación<br />
Doctoral del Consejo Nacional de Investigaciones Científicas<br />
y Técnicas de Argentina (Conicet). Becario de la Embajada<br />
de Francia y del Ministerio de Educación de la Nación<br />
Argentina. Co-funda<strong>do</strong>r y Coordina<strong>do</strong>r de la Comunidad de<br />
Pensamiento Complejo (CPC) (www.pensamiento<strong>com</strong>plejo.<br />
<strong>com</strong>.ar). Coordina<strong>do</strong>r del Grupo de Estudios Interdisciplinarios<br />
sobre Complejidad y Ciencias Sociales (GEICCS). Profesor<br />
de Meto<strong>do</strong>logía de la Investigación en Ciencias Sociales,<br />
Facultad de Ciencias Sociales, Universidad de Buenos Aires.<br />
Líneas de investigación: Pensamiento Complejo, Teoría de los<br />
Sistemas Complejos, Ciencias de la Complejidad, Epistemología<br />
Genética, Epistemología Política, Epistemología de las<br />
Ciencias Sociales, Meto<strong>do</strong>logía de las Ciencias Sociales.
temas<br />
centrales que<br />
inspiran el<br />
pensamiento<br />
del Sur<br />
El tema central del pensamiento del Sur es la problematización crítica<br />
de la hegemonía nor-occidental, con la finalidad de construir un pensarhacer<br />
alternativo que estimule la conservación y transformación radical<br />
de la civilización y la h<strong>um</strong>anidad. Esto abarca múltiples vías o temas:<br />
a) El mestizaje de herencias culturales diversas, expresa<strong>do</strong> <strong>com</strong>o sincretismo<br />
y unidad <strong>com</strong>pleja de lo diverso y plural, en <strong>do</strong>nde operaría una<br />
reapropiación crítica de los aportes del Norte (tradición greco-latina, cultura<br />
europea-anglosajona moderna) y del Sur (Latinoamérica, el Caribe y<br />
áfrica), tornan<strong>do</strong> posible la re<strong>com</strong>posición de la solidaridad, la responsabilidad,<br />
la <strong>com</strong>prensión, la <strong>com</strong>pasión, el amor.<br />
b) La denuncia y diagnóstico de las regresiones e implicancias sociales,<br />
políticas, económicas, éticas, culturales, epistémicas y ecológicas del modelo<br />
civilizacional nor-occidental, basa<strong>do</strong> en el cálculo, el lucro, la explotación<br />
y <strong>do</strong>minio de la naturaleza y de la h<strong>um</strong>anidad.<br />
c) El examen crítico de los mo<strong>do</strong>s en que operan y se expresan las<br />
estrategias de <strong>do</strong>minio, control y hegemonía nor-occidental en el plano<br />
del pensamiento, la cultura, la política, la economía, y sus mo<strong>do</strong>s de<br />
reproducción.<br />
223
224<br />
d) La crítica y denuncia de los fundamentos y estrategias del pen-<br />
samiento hegemónico del Norte en tanto sea racionalidad cerrada,<br />
instr<strong>um</strong>ental, reductora, disyuntiva y simplifica<strong>do</strong>ra, en vez que unidimensionalize<br />
lo multidimensional, unifique lo diverso y tienda a borrar<br />
y ocultar las diversidades y diferencias, hacien<strong>do</strong> aparecer ba jo categorías<br />
únicas y singulares las multiplicidades históricas, identitarias,<br />
culturales y cognitivas.<br />
e) La problematización del pensamiento occidental moderno y sus<br />
categorías naturalizadas de inteligibilidad de la realidad, mostran<strong>do</strong> las<br />
zonas de invisibilidad, ilegitimidad, ceguera y exclusión que produce;<br />
con la finalidad de rehabilitar, viabilizar y restaurar lo que ha si<strong>do</strong> oculta<strong>do</strong>,<br />
destrui<strong>do</strong>, ignora<strong>do</strong>, veda<strong>do</strong> y no tematiza<strong>do</strong> por el pensamiento<br />
del Norte, pero que ha si<strong>do</strong> constitutivo del pensar y actuar de los pueblos<br />
del Sur.<br />
f) La recreación del vínculo h<strong>um</strong>anidad-cosmos-naturaleza a partir de<br />
un concepto de vivir bien alternativo basa<strong>do</strong> en el respeto por la diversidad<br />
concreta y la religancia ecológica con la biósfera, que hunde sus raíces<br />
histórico-culturales en la idea de la Madre-Tierra (pachamama) de los pueblos<br />
y nacionalidades indígenas de América Latina.<br />
g) visibilización de los aportes, las riquezas y las diversidades socio-políticas,<br />
epistémicas y culturales de los pueblos del Sur; los cuales han si<strong>do</strong><br />
invisibiliza<strong>do</strong>s, oculta<strong>do</strong>s, deslegitima<strong>do</strong>s, extermina<strong>do</strong>s, reduci<strong>do</strong>s, unidimensionaliza<strong>do</strong>s,<br />
por parte del pensamiento hegemónico del Norte. Así,<br />
la finalidad del pensamiento del Sur consiste en la construcción y enraizamiento<br />
de alternativas políticas y epistémicas — a partir de la articulación<br />
de las experiencias y procesos históricos y actuales y, también, mediante la<br />
estimulación de otros nuevos-, que tornen posible una mundialización contra-hegemónica<br />
alternativa centrada en la solidaridad y la responsabilidad.<br />
EXPERIENCIAS INNOVADORAS IMPLEMENTADAS O EN CURSO QUE<br />
ILUSTRAN EL PENSAMIENTO DEL SUR<br />
a) Afirmación reiterada a lo largo de la historia del Sur de luchas contra<br />
distintas formas de <strong>do</strong>minación colonial e imperialista. guerras por la<br />
independencia en el siglo xIx. Revoluciones políticas y sociales del siglo<br />
xx en México, Cuba, Chile, Nicaragua, El Salva<strong>do</strong>r. La búsqueda de formas<br />
de gobierno que respeten la herencia histórico-cultural de los pueblos originarios:<br />
la construcción del Esta<strong>do</strong> plurinacional en Ecua<strong>do</strong>r y Bolivia, el<br />
zapatismo en México.<br />
b) Afirmación de la unidad del Sur mediante diversas políticas, procesos<br />
y dispositivos institucionales de unión. La experiencia del Mercosur y
la unasur, <strong>com</strong>o respuesta contra-hegemónica al neo-liberalismo (ALCA) y<br />
estrategia de centralismo en la política y el Esta<strong>do</strong>.<br />
c) La búsqueda de un pensamiento crítico y un conocimiento autónomo<br />
y no coloniza<strong>do</strong> en solidaridad con la acción política transforma<strong>do</strong>ra de la<br />
realidad social concreta: el pensamiento de Mariano Moreno, José Carlos<br />
Mariátegui, José Martí, víctor Raúl haya de la Torre, entre otros. El desarrollo<br />
de una ciencia funcional a las necesidades de los pueblos que incremente<br />
la autonomía productiva (Oscar varsavsky, Rolan<strong>do</strong> garcía, entre otros). La<br />
teoría de la dependencia. El pensamiento decolonial (Boaventura de Sousa<br />
Santos, Walter Mignolo, Enrique Dussel, Aníbal quijano, entre otros).<br />
d) La resistencia artístico-cultural en la poesía, la literatura, la pintura, el<br />
arte, la arquitectura, la música, el cine y la danza. Las luchas y resistencias<br />
de los pueblos y nacionalidades indígenas de América Latina, en muchos<br />
de nuestros países en pleno siglo xxI.<br />
e) Lanzamiento del libro colectivo La emergencia de los enfoques de<br />
la <strong>com</strong>plejidad en América Latina. Desafíos, contribuciones y <strong>com</strong>promisos<br />
para abordar los problemas <strong>com</strong>plejos del siglo XXI edita<strong>do</strong> por la Comunidad<br />
de Pensamiento Complejo, CPC.<br />
CUESTIONES PRIORITARIAS A TRATARSE POR LA MIRADA DEL SUR<br />
HACIA UNA POLÍTICA DE CIVILIZACIÓN<br />
a) vínculo entre conocimiento y política: Reforma de la ciencia. Crítica<br />
a la concepción <strong>do</strong>minante de ciencia <strong>com</strong>o régimen hegemónico de producción<br />
de verdad y de validación y legitimación de los conocimientos.<br />
Elaboración de una epistemología política <strong>com</strong>pleja que fundamente un<br />
concepto alternativo de ciencia inclusivo de criterios sociales, históricos,<br />
culturales y políticos de producción y validación de saberes. Consideración<br />
de la pertinencia y legitimidad de otras formas/sistemas de conocimiento<br />
h<strong>um</strong>ano (arte, filosofía, literatura, incluida la ciencia), especialmente, rehabilitan<strong>do</strong><br />
los saberes y formas de conocer de los pueblos del Sur.<br />
b) Reforma del conocimiento: Problematizar la disyunción entre las <strong>do</strong>s<br />
culturas (ciencia y filosofía) y la hiper-especialización disciplinaria de los<br />
conocimientos. Distinguir la transdisciplina y la interdisciplina y analizar la<br />
pertinencia de cada una para conducir la investigación empírica concreta.<br />
Reforma de los sistemas de ciencia y tecnología con la finalidad de educar<br />
a las nuevas generaciones de científicos en la práctica y la cultura de la<br />
investigación interdisciplinaria.<br />
c) Reforma de la educación: Redefinición de las finalidades de la educación<br />
(en to<strong>do</strong>s los niveles), incorporan<strong>do</strong> la educación para la ciudadanía<br />
225
226<br />
democrática y el tratamiento de los problemas <strong>com</strong>plejos fundamentales<br />
del Sur. Resistencia a la colonialidad cultural del saber científico euro-céntrico<br />
hegemónico. Profundización del auto-reconocimiento y estimulación<br />
de la autonomía cultural y subjetiva.<br />
d) Reforma del pensamiento: Estudio de las condiciones cognitivas, psico-sociales,<br />
socio-culturales y discursivas de producción, funcionamiento<br />
y transformación de los paradigmas, modelos mentales, representaciones<br />
sociales e ideologías para delinear un programa multidimensional de reforma<br />
del pensamiento.<br />
e) Investigación políticamente orientada en función de los problemas<br />
y necesidades sociales: Identificación de los problemas <strong>com</strong>plejos fundamentales<br />
de los pueblos del Sur situán<strong>do</strong>los en el contexto planetario.<br />
Elaboración de programas de investigación multi-país desarrolla<strong>do</strong>s con<br />
equipos multidisciplinarios y estrategias interdisciplinarias, que tiendan al<br />
diagnóstico e intervención sobre dichos problemas. Articulación de estos<br />
saberes en la formulación de políticas públicas.<br />
f) Desarrollo económico, social y ecológicamente justo y sustentable:<br />
Profundización y radicalización de la democracia más allá del formalismo<br />
normativo e institucional, pero respetán<strong>do</strong>lo. Incorporación de la idea de<br />
conflicto. Cuestionamiento del rol del esta<strong>do</strong> y de la economía de merca<strong>do</strong><br />
y exclusión. Construcción de un paradigma de bienestar alternativo, no<br />
cons<strong>um</strong>ista, no productivista, no salva<strong>do</strong>r, asenta<strong>do</strong> sobre un nuevo mo<strong>do</strong><br />
de vida y valor.<br />
g) Estrategia político-cultural: Diseño, planificación y ejecución de un<br />
plan estratégico de larga duración que integre los puntos anteriores, destina<strong>do</strong><br />
al enraizamiento político y cultural del "pensamiento del Sur" <strong>com</strong>o<br />
paradigma alternativo y contra-hegemónico. Esto requiere contemplar sus<br />
condiciones de posibilidad: realizar la más consensuada articulación de<br />
actores, grupos y experiencias en curso en el Sur; la conformación de un<br />
movimiento político-cultural y científico-académico por el pensamiento del<br />
Sur; el diseño de una estrategia <strong>com</strong>unicacional destinada a los distintos<br />
públicos (ciudadanos, educa<strong>do</strong>res, políticos, científicos, académicos, intelectuales<br />
etc.).
227
Esta publicação foi <strong>com</strong>posta na tipologia<br />
quicksand/Museo Slab <strong>com</strong> corpo 11/46,<br />
impressa em papel reciclato 90 g (miolo)<br />
e reciclato 220 g (capa).